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Arte e inclusão: o impacto do ensino de artes na percepção de mundo da pessoa com deficiência.

RC: 78965
1.175
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/arte-e-inclusao

CONTEÚDO

ARTIGO DE REVISÃO

SAKAGUCHI, Aline do Socorro Martins Pacheco [1]

SAKAGUCHI, Aline do Socorro Martins Pacheco. Arte e inclusão: o impacto do ensino de artes na percepção de mundo da pessoa com deficiência. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 06, Ed. 03, Vol. 08, pp. 104-118. Março de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/educacao/arte-e-inclusao, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/arte-e-inclusao

RESUMO

O presente estudo discorre acerca da arte como ferramenta no processo de inclusão social de pessoas com deficiência intelectual e de que forma estra prática enquanto ensino, promove condições para esses sujeitos desertarem em suas construções de sentido sobre si e sobre sua relação com o mundo. De modo que, para discorrer na discussão deste trabalho, apresentamos uma compreensão holística da arte na perspectiva do ensino e desenvolvimento humano, apontando conceitos sobre o entendimento da deficiência intelectual numa perspectiva psicológica e psiquiátrica, manifestando ainda o desenvolvimento legislativo e compreensivo brasileiro acerca da inclusão social, todos estes aspectos com base para compreender o transcurso da construção de sentido em pessoas com deficiência intelectual. De modo que a pesquisa se deu pelo método de revisão bibliográfica, consubstanciada especialmente pela compreensão de sentido proposta por Mary Jane Spink. Portanto, o estudo mostra sua relevância diante de uma discussão na interlocução de temas complexos e pouco explorados na literatura científica.

Palavras-Chave: Inclusão Social, Deficiência Intelectual, Construção de sentido.

INTRODUÇÃO

A arte fortalece seu registro na história da humanidade, sobretudo, por seu caráter desprendido de conceitos, e sua essência de constante renovação, uma vez que, ela se reflete e se finda em si própria. De modo que, a arte reverbera de maneira subjetiva e assim, ela pode funcionar como mediadora no processo de construção e reconstrução de sentidos, de forma consideravelmente peculiar a cada sujeito.

A ideia de construção de sentido nesse estudo, parte da compreensão de Mary Jane Spink e sua discussão acerca do modo como o processamento da linguagem na ação, contribui para um desenvolvimento consciente do sujeito, e sua perspectiva a respeito da dinâmica de interação social, como mola propulsora quanto ao modo que as pessoas agem e reagem diante de suas vivências.

Nesse sentido, o uso de ferramentas artísticas como meio de propiciar construção de sentido, em sujeitos dentro do campo da educação, se mostra como uma perspectiva promissora de desenvolvimento holístico, posto que, sua configuração é sensível às particularidades de cada pessoa.

Portanto, a arte se exprime como uma ferramenta que fomenta a inclusão, sobretudo, no processo de aprendizagem. Sendo a inclusão conceitualmente definida, como um processo que possibilita o desenvolvimento, respeitando as diferenças e primando pelo principio da dignidade humana.

Isto posto, a proposta deste estudo, visa apresentar conceitos atuais acerca da deficiência intelectual, refletindo sobre o ensino artístico como forma de inclusão desses sujeitos, e compreender se é possível e de que maneira a arte possibilita a construção de sentido das pessoas com o transtorno de deficiência intelectual.

METODOLOGIA

Esta pesquisa caracteriza-se como um estudo descritivo exploratório de caráter qualitativo, utilizando como método a Revisão Bibliográfica Sistemática (RBS) em artigos publicados entre os anos de 2013 a 2019. Esse método científico possibilita buscar e analisar artigos de uma determinada área da ciência, visto que esse tipo de pesquisa nos permite ter uma visão mais ampliada do tema, confrontar ideias ou concordância existentes entre os autores (GIL, 2008).

Para Gil (2008), a pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos, no qual é elaborada através de matérias documentais que se fundamenta das contribuições de diversos autores sobre determinado assunto.

Para a construção deste trabalho, foi delimitado o objeto de estudo e posteriormente feito uma pesquisa exploratória, cuja finalidade foi obter uma maior aproximação do tema por meio da leitura de textos, artigos, livros e um conjunto de dados estatísticos. Na análise dos textos, foram avaliados os contextos referentes ao entendimento, acerca do ensino em artes e sua repercussão na construção de sentido para pessoas com deficiência intelectual, e de que forma isso impacta em seu processo de inclusão social.

Assim, estabeleceram-se critérios de inclusão e exclusão para as buscas dos dados desta revisão bibliográfica. Características para inclusão: trabalhos científicos publicados no intervalo dos últimos 07 anos; artigos publicados em revistas científicas, disponíveis na íntegra e para acesso público com download gratuito em língua portuguesa; artigos relacionados com o processo de adoecimento mental no escopo da deficiência intelectual, inclusão social e ensino em artes. E para exclusão foram escolhidos os seguintes critérios: publicações em línguas estrangeiras; trabalhos que não estavam do período de publicação estabelecido; artigos duplicados.

Dentro dos critérios, buscou-se material de interesse na base de dados dos Periódicos Eletrônicos Scientific Eletronic Library Online (SCIELO), Biblioteca Virtual em Saúde (BVS)  e Google Acadêmico. A coleta de dados foi iniciada e finalizada no decorrer do mês de janeiro de 2020. Nesse processo foram selecionados 6 artigos que contribuíram na produção deste trabalho, a primeira leitura foi seguida de fichamento dos textos a fim de, compor as ideias da estrutura do trabalho. Os dados estão no quadro abaixo especificando: título; autor do texto; ano de publicação e base de dados.

Tabela 1 – Base de dados da Pesquisa Bibliográfica

Título Autor Ano Base de dados
A função social da escolar em discussão, sob a perspectiva da educação inclusiva. DAINEZ, D;

SMOLKA, A. L. B

2019 BVS
Habilidades adaptativas sociais e conceituais de indivíduos com deficiência intelectual. GUSMÃO, E. C. R et al. 2019 BVS
A disciplina de arte: Uma reflexão para a escola contemporânea HIRONO, L. B. 2013 GOOGLE ACADÊMICO
O olhar social da deficiência intelectual em escolas do campo a partir dos conceitos de identidade e de diferença PALMA, D. T;

CARNEIRO, R. U. C.

2018 SCIELO
Indicadores de desenvolvimento em crianças e adolescentes com QI igual ou inferior a 70.

Sentimentos infantis em relação à deficiência intelectual: efeitos de uma intervenção.

SOUZA, F. S;

BATISTA, C. G.

VIEIRA, C. M.

2016

2015

SCIELO

SCIELO

Total 6    

Fonte: Autora (2020)

DESENVOLVIMENTO

O ENSINO EM ARTES

As artes se configuram como um dos temas mais antigo na história da humanidade. A arte milenar oriental, os hieróglifos no Egito antigo, o teatro Grego, são apenas alguns exemplos. De modo que, na sociedade contemporânea, a arte exerce uma funcionalidade para além da questão estética ou artística, mas em ultima instância, como uma mediadora de discussões para questões sociais, cultural e educacional.

O ensino artístico no Brasil remonta historicamente ao período colonial. De forma que, os primeiros relatos que se tem da arte aplicada à educação, se deu através do ensino praticado pelos jesuítas, que se utilizava de músicas e pequenas representações teatrais para a catequização dos nativos (SILVA, 2013).

Assim, ao longo de nossa história, o ensino com base nas artes ganhou outras configurações. Durante o século XX transformações sociais e culturais importantes aconteceram, de modo a impactar diretamente no entendimento da sociedade acerca da relevância da arte no viés da educação.

Inicialmente, as disciplinas de cunho artístico eram mais voltadas para conceitos técnicos, tais como, disciplinas de desenhos, trabalho manual, canto e música, de forma que sua funcionalidade era aplicada de maneira mais mecanicista. Posteriormente, na segunda metade do século XX, o ensino em artes começou a adquirir aspectos mais expressivos, assim as disciplinas de artes plásticas, teatro e dança concentrava-se mais em explorar o potencial criativo dos alunos (BRASIL, 1997).

De modo que, por meio da Lei nº 5.692 de 11 de agosto de 1971 fica promulgado através das Diretrizes e Bases da Educação Nacional que a arte passaria a fazer parte oficialmente do contexto de ensino no Brasil. Assim, o texto discorre em seu art. 7º que “Será obrigatória à inclusão de Educação Moral e Cívica, Educação Física, Educação Artística e Programas de Saúde nos currículos plenos dos estabelecimentos de lº e 2º graus” (BRASIL, 1971). Portanto, esse avanço para a educação brasileira partiu da compreensão que:

A educação em arte propicia o desenvolvimento do pensamento artístico e da percepção estética, que caracterizam um modo próprio de ordenar e dar sentido à experiência humana: o aluno desenvolve sua sensibilidade, percepção e imaginação, tanto ao realizar formas artísticas quanto na ação de apreciar e conhecer as formas produzidas por ele e pelos colegas, pela natureza e nas diferentes culturas (BRASIL, 1997, p. 19).

 Dessa maneira, segundo Hirono (2013) nas últimas décadas, o ensino em artes no Brasil passou por transformações, que hoje lhe conferem a premissa de um ensino mais voltado para o processo de aprendizagem no despertar da criatividade e para construção de sentido.

A DEFICIÊNCIA INTELECTUAL

De modo conceitual, a deficiência intelectual é descrita no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtorno Mentais – DSM 5, como sendo um transtorno do neurodesenvolvimento, que é caracterizado principalmente pela condição do sujeito de déficit funcional, intelectual e adaptativo, que pode aferir os domínios conceitual, social e prático da vida da pessoa (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

Já na compreensão da Classificação de Transtornos Mentais e do comportamento da CID-10, a doença é descrita como retardo mental e está definida no código F70, que em sua conceituação diz que:

Retardo mental é uma condição de desenvolvimento interrompido ou completo da mente, à qual é especialmente caracterizada por comprometimento de habilidades manifestadas durante o período de desenvolvimento, as quais contribuem para o nível global de inteligência, isto é, aptidões cognitivas, de linguagem, motoras e sociais (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1993, p. 221).

A compreensão do DSM 5 para a CID 10, conceitualmente se equiparam embora, usem nomenclaturas diferentes, uma vez que  que, uma lei Federal do Estados Unidos, considerou a terminologia deficiência mental mais apropriada que retardo mental, por entender que o termo carrega em si um estigma de preconceito.

Assim, para finalidade diagnóstica, a pessoa para se caracterizar dentro do transtorno de desenvolvimento intelectual, precisa atender três critérios, que são eles:

A. Déficits em funções intelectuais como raciocínio, solução de problemas, planejamento, pensamento abstrato, juízo, aprendizagem acadêmica e aprendizagem pela experiência confirmados tanto pela avaliação clínica quanto por testes de inteligência padronizados e individualizados. B. Déficits em funções adaptativas que resultam em fracasso para atingir padrões de desenvolvimento e socioculturais em relação a independência pessoal e responsabilidade social. Sem apoio continuado, os déficits de adaptação limitam o funcionamento em uma ou mais atividades diárias, como comunicação, participação social e vida independente, e em múltiplos ambientes, como em casa, na escola, no local de trabalho e na comunidade. C. Início dos déficits intelectuais e adaptativos durante o período do desenvolvimento (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p. 33).

Deve-se levar em consideração que, respeitando a subjetividade de cada sujeito, vale ressaltar que no contexto da limitação, cada pessoa apresentará um grau de funcionalidade, que reflete o nível de gravidade da doença. Essa ponderação é avaliada, segundo a American Psychiatric Association (2014) de acordo com a aferição do funcionamento adaptativo de cada pessoa. De maneira que, os níveis podem ser entendidos nos graus leve, moderado, grave e profundo.

Para melhor compreender a diferenciação de cada um dos graus, será exposto um quadro descritivo de cada um dos níveis, considerando o entendimento para os domínios conceitual, social e prático.

Tabela 2 – Níveis de gravidade da deficiência intelectual

Nível Conceitual Social Prático
Leve Pensamento abstrato, função executiva (planejamento, estabelecimento de estratégias, fixação de prioridades e flexibilidade cognitiva) e memória de curto prazo, bem como uso funcional de habilidades acadêmicas (p. ex., leitura, controle do dinheiro), estão prejudicados. Imaturo nas relações sociais. Comunicação, conversação e linguagem são mais concretas e imaturas do que o esperado para a idade. Podem existir dificuldades de regulação da emoção e do comportamento de uma forma adequada à idade. Há compreensão limitada do risco em situações sociais; o julgamento social é imaturo, e a pessoa corre o risco de ser manipulada pelos outros. Os indivíduos em geral

necessitam de apoio para tomar decisões de cuidados de saúde e decisões legais, bem como para aprender a desempenhar uma profissão de forma competente. Apoio costuma ser necessário para criar uma família.

Moderada Assistência contínua diária é necessária para a realização de tarefas conceituais cotidianas, sendo que outras pessoas podem assumir integralmente essas responsabilidades pelo indivíduo. O julgamento social e a capacidade de tomar decisões são limitados, com cuidadores tendo que auxiliar a pessoa nas decisões. Amizades com companheiros com desenvolvimento normal costumam ficar afetadas pelas limitações de comunicação e sociais. Há necessidade de apoio social e de comunicação, significativo para o sucesso nos locais de trabalho. Costumam demandar apoio e oportunidades de aprendizagem por um longo período de tempo. Comportamento maladaptativo está presente em uma minoria significativa, causando problemas sociais.
Grave Pouca compreensão da linguagem escrita ou de

conceitos que envolvam números, quantidade, tempo  e dinheiro.

A linguagem falada é bastante limitada em termos de vocabulário e gramática. A fala e a comunicação têm foco no aqui e agora dos eventos diários. A linguagem é usada para comunicação social mais do que para explicações. O indivíduo necessita de apoio para todas as atividades cotidianas, inclusive refeições, vestir-se, banhar-se e eliminação. Comportamento mal-adaptativo, inclusive autolesão, está presente em uma minoria significativa.
Profundo Algumas habilidades visuoespaciais, como combinar e classificar, baseadas em características físicas, podem ser adquiridas. A ocorrência concomitante de prejuízos motores e sensoriais, porém, pode impedir o uso funcional dos objetos. Compreensão muito limitada da comunicação simbólica na fala ou nos gestos. Há ampla expressão dos próprios desejos e emoções pela comunicação não verbal e não simbólica. Depende de outros para todos os aspectos do cuidado físico diário, saúde e segurança, ainda que possa conseguir participar também de algumas dessas atividades. Aqueles sem prejuízos físicos graves podem ajudar em algumas tarefas diárias de casa, como levar os pratos para a mesa.

Fonte: AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION (2014)

Vale salientar que, esses conceitos acerca da deficiência intelectual, se caracterizam como padrões para compreensão diagnóstica da doença, mas jamais para entendimento do sujeito. Posto que, o nível potencial de desenvolvimento de uma pessoa não se limita a um diagnóstico, mas essencialmente por uma soma de fatores subjetivos ao seu ser, sua história de vida, o ambiente em que vive e principalmente as suas relações de contato.

Portanto, fica evidenciado que o entendimento da deficiência intelectual considera múltiplos fatores, aplicados em contexto diversos da vida do sujeito, considerando também os aspectos da doença a partir de níveis de gravidade, de acordo com a subjetividade de cada um, que prevê uma perspectiva na limitação do desenvolvimento, não sendo assim fatores imperativos na caracterização de todos os sujeitos diagnosticados com o transtorno.

INCLUSÃO SOCIAL

Durante muito tempo na história, o homem só era considerado um ser social se atendesse a todos os critérios que a sociedade considerava razoável para entendê-lo como tal. Ou seja, tudo ou todos aqueles que fugissem ao padrão de normalidade, era automaticamente estigmatizado e marginalizado, não sendo, portanto, infringido a ele o que hoje entende-se como direitos básicos de respeito a dignidade humana.

No Brasil, por meio da constituição de 1988 muitos desses estigmas foram quebrados de forma legislativa, uma vez que, para uma efetiva compreensão da sociedade, acerca dessas mudanças, seria necessária investidura de um novo entendimento sobre os deficientes, sobretudo, os deficientes intelectuais, como sujeitos de equivalência de direitos, claro respeitando a nova concepção de igualdade, proposta na nova carta magna brasileira, e fortalecida através da lei nº. 8.080/90, que institui o Sistema Único de Saúde (SUS), onde promove, por meio de suas diretrizes o direito a universalidade, igualdade e equidade (BRASIL, 1990).

Todavia, a fim de uma conscientização social mais efetiva acerca do direito dos deficientes e da necessidade de acolhimento social desses sujeitos, foi criada a lei de nº 13.146 de 6 de julho de 2015 que institui o estatuto da pessoa com deficiência. Assim, o entendimento oficial do estado por meio do artº 2 dessa legislação é de que:

Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (BRASIL, 2015).

Assim, o estado determinou que é dever de todos respeitar e assegurar condições de igualdade no direito e liberdade das pessoas deficientes, no intuito de promover sua inclusão social.

No aspecto do reconhecimento do sujeito com deficiência, Dainez e Smolka (2019) se utilizando da compreensão de desenvolvimento humano numa perspectiva de interação social proposta por Vygotsky, argumentam que o reconhecimento da especificidade da condição orgânica de cada sujeito é essencial na formulação da educação tanto do sujeito em si, como da sociedade como um todo.

A ARTE COMO MEDIADORA NA CONSTRUÇÃO DE SENTIDO

A arte, por seu caráter livre de apriorismo, se configura essencialmente como uma ferramenta propicia para o desenvolvimento heurístico do sujeito. E no campo da educação se formula ainda, como meio de “desenvolvimento do pensamento artístico, que caracteriza um modo particular de dar sentido às experiências das pessoas” (BRASIL, 1997, p. 15).

De maneira que, acerca da compreensão no contexto da construção de sentido, Rey (2007) aponta a ideia de sentido, de forma categorizada. Assim, o autor apresenta uma reflexão da perspectiva histórico-cultural, proposta por Vygotsky, como sendo aquela que parte da interação entre o pensamento e a linguagem; o cognitivo e o afetivo, ou em última instância a interação relacional entre sentido, personalidade e vida psíquica.

Embora, no entendimento do autor supracitado, a reflexão a respeito de sentido tenha sido uma construção inacabada na obra do Vygotsky; Rey (2007) concluiu que, sentido para o autor estava para além da linguagem, para além da fala, mas estava especialmente para a consciência, para o psicológico, para as emoções. E essa reflexão fica evidenciada quando o autor afirma que:

O sentido toma forma na representação conceitual de Vygotsky na relação com a fala interior, a qual ele apresenta como uma verdadeira produção psicológica, e não apenas como função, nem da linguagem, nem do pensamento tomadas isoladamente. Esse esforço para apresentar a complexa articulação entre pensamento, linguagem, fala, personalidade e consciência como sistema em movimento, representa, em si mesmo, um novo caminho para a reconstrução do mental (REY, 2007, p. 159).

Em outra perspectiva, Mary Jane Spink propõe uma perspectiva de construção de sentido, a partir da decodificação de uma linguagem de ação, que se exprime por meio das relações sociais cotidianas. De modo que, para compreender essa expressão de linguagem, a autora categoriza os elementos constitutivos em três, que são eles: a dinâmica, a forma e o conteúdo.

Na compreensão da autora, a dinâmica diz respeito ao modo que a comunicação é enunciada; as formas são as características dadas na interlocução da comunicação; e os conteúdos que se expressam como repertório linguístico, e que essencialmente permite a compreensão de que “conteúdos associam-se de uma forma em determinados contextos, e de outras formas em outros contextos. Os sentidos são fluídos e contextuais” (SPINK, 2010, p. 28).

A vista disso, basicamente o que Spink (2010) propõe, é que para compreender a elaboração de uma construção de sentido, é preciso que o contexto seja considerado de forma holística. Assim, a autora conceitua sentido da seguinte forma:

O sentido é uma construção social, um empreendimento coletivo mais precisamente interativo, por meio do qual as pessoas, na dinâmica das relações sociais, historicamente datadas e culturalmente localizadas, constroem os termos a partir dos quais compreendem e lidam com as situações e fenômenos a sua volta (SPINK, 2010, p. 34).

Ou seja, para a autora o sujeito vive constantemente construindo sentido, uma vez que, esta se dá na relação com o outro, pois é por meio dessa relação que nos é possível conceber a ideia de regras, valores, condutas. Sendo, portanto, essas noções, ou seja, o sentido, que possibilita nossa interação com o mundo.

No contexto das interações sociais, como mediadora para construção de sentidos, Viera (2015) salienta que, para o sujeito deficiente intelectual sua construção social indubitavelmente passa por conceitos representativos de imperfeição, incapacidade, desequilíbrio e estranheza, o que por sua vez, condiciona o surgimento de sentimentos de angustia e insegurança, inclusive, para ambas as partes. De modo que, essa relação entre estigmatizados e não estigmatizados é uma incógnita.

Nesse sentido, Spink (2010) fala quanto ao posicionamento, como sendo o modo no qual entramos em contato com o universo do outro. Modo este, que implica diretamente na maneira como a pessoa estabelecerá uma compreensão a respeito de si mesmo.

De compreensão igual, Palma e Carneiro (2018) salientam que quando trabalhamos o contexto da educação inclusiva, especialmente em casos de deficiência intelectual, é preciso conferir a compreensão de que existem múltiplas inteligências, de forma que, as habilidades cognitivas, geralmente caracterizadas como déficits em pessoas com deficiência intelectual, não são o único caminho para conseguir comunicação e resposta. E o que vai delinear esse processo, é principalmente o modo como percebo e me posiciono diante das particularidades do outro.

Os repertórios linguísticos segundo Spink (2010) são os termos ou as figuras de linguagem usualmente utilizadas, e elas são aderidas no nosso processo natural de interação social e aprendizagem. Interessante salientar que, ao lidar com pessoas com limitações cognitivas, como é o caso dos deficientes intelectuais, o nosso arcabouço linguístico de uso casual, pode não ser válido, uma vez que, a interação social e o processo de aprendizagem desses sujeitos não perpassam as mesmas casualidades de sujeitos neurotípicos, condicionando assim a particularidades do seu processo de construção de sentido.

Viera (2015) chama atenção para um dado comum e de importante reflexão na compreensão da construção de sentido em pessoas com deficiência intelectual, diante da relação interacional no contexto educacional. De modo que, a autora em sua pesquisa investigou os níveis de auto percepção de crianças com deficiência intelectual, concluído que, as crianças atribuem a si um sentimento de piedade, e que essa construção de sentido se dá devido à dificuldade na execução de atividades, e principalmente pelo como com a sociedade como um todo interage, fomentando contextos excludentes e de discriminação.

Assim, como meio de viabilizar diferentes construções de sentido em deficientes intelectuais no contexto da educação inclusiva, Souza e Batista (2016) ressaltam que a arte e as novas tecnologias podem ser utilizadas como alternativa no objetivo de superação das limitações, uma vez que estas ferramentas promovem desenvolvimento interno na perspectiva cultural.

De maneira complementar a este entendimento, Souza e Batista (2016) citando (GÓES, 2002, p.99) afirmam que “”. Entendendo aqui destino, como sendo o modo no qual as pessoas com deficiência irão se portar diante de suas vivências, corroborando assim, com a compreensão de Spink (2010) acerca da construção de sentido.

O gênero da fala diz respeito a expressão subjetiva ao contexto da comunicação. De modo que, a forma no qual irei me comunicar com outro tem base na percepção da particularidade típica a quem se destina (SPINK, 2010).

De modo que, diante dessa concepção, Gusmão et al (2019) salienta que a sociedade como um todo, e sobretudo, os educadores precisão encontrar o equilíbrio nesse modo de se expressar com as pessoas deficientes intelectuais, visto que, estão na posição de mediadores do processo de aprendizagem, podendo então, promoverem discussões fundamentais que possibilitem a construção de sentido nesses sujeitos

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A arte diante de toda sua premissa plural, indiscutivelmente se delineia como uma perspectiva de promoção de sentidos, por conduzir o processo de desenvolvimento humano a partir da subjetividade de cada sujeito. Sendo, portanto, uma excelente ferramenta no processo de aprendizagem e fomento das interações sociais, o que por sua vez, prevê um processo de inclusão social mais dinâmico e empático a particularidade de cada pessoa.

No contexto do transtorno de deficiência intelectual, os sujeitos são estigmatizados pela observância generalizada, de que são incapazes ou limitados em seu desenvolvimento. Sendo assim, é necessário ampliar o olhar diante da concepção do que está implicitamente relacionado, e que seja de relevância para o processo de desenvolvimento dessas pessoas.

Nesse estudo, foi possível refletir acerca do modo como a dinâmica nas interações sociais reflete diretamente na construção de sentido de pessoas com deficiência intelectual, e em última instância, observou-se também que os sentidos, enquanto construção social é coletiva, de forma que a relação impacta também os sentidos, no que tange ao modo de interação, na perspectiva também das pessoas neurotípicas, que se relacionam com sujeitos com deficiência intelectual.

Uma vez trazida essa reflexão, nos permitiu entender como os elementos no processo de comunicação, citados por Spink (2010), no contexto da linguagem de ação, influenciam diretamente no modo como as pessoas com deficiência intelectual se percebem e interagem com o mundo, sendo salutar estarmos atentos aos mecanismos que utilizamos, tais como: nossos repertórios linguísticos e gêneros de fala que intimamente pode gerar sentidos de angustia e desvalia nas pessoas que por conta de seu comprometimento cognitivo, não estão equiparados ao mesmo estilo linguístico e expressivo das pessoas comuns.

Portanto, concluímos que a arte se configura como notável ferramenta no processo de inclusão e construção de sentido no contexto da promoção de desenvolvimento saudável, por respeitar essencialmente o modo particularizado de expressão, e a subjetividade empírica na maneira como o sujeito com deficiência intelectual se relaciona com o mundo, como o outro e consigo mesmo.

REFERÊNCIAS

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais DSM-5. Porto Alegre. Artmed, 5. Ed. 2014.

BRASIL. Lei nº 5.692 de 11 de agosto de 1971. Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º graus, e dá outras providências. Presidência da República, 1971. Coleção Leis do Brasil. In: Camara dos deputados [on line]. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1970-1979/lei-5692-11-agosto-1971-357752-publicacaooriginal-1-pl.html. Acesso em 18 Jan. 2020.

BRASIL. Lei nº 8.080 de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Presidência da Republica. Casa Civil, 1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8080.htm. Acesso em: 10 Jan. 2020.

BRASIL, Parâmetros curriculares nacionais: Arte. Secretaria de Educação Fundamental, Ministério da Educação e Cultura, Brasília, 1997, p. 130.

BRASIL. Lei nº. 13.146 de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Presidência da República. Secretaria Geral, 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm. Acesso em: 19 Jan. 2020.

DAINEZ, D; SMOLKA, A. L. B. A função social da escolar em discussão, sob a perspectiva da educação inclusiva. Educ. Pesqui. São Paulo, v. 45, 2019.

GIL, A. C. Método e técnicas de pesquisa social. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2008.

GUSMÃO, E. C. R et al. Habilidades adaptativas sociais e conceituais de indivíduos com deficiência intelectual. Rev. Esc. Enferm. USP, 2019.

HIRONO, L. B. A disciplina de arte: Uma reflexão para a escola contemporânea. Monografia em arte educação, Faculdade Integrada da Grande Fortaleza, Ceará, 2013.

ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID 10: Descrições clinicas e diretrizes diagnósticas. Porto Alegre: Artmed, 1993.

PALMA, D. T; CARNEIRO, R. U. C. O olhar social da deficiência intelectual em escolas do campo a partir dos conceitos de identidade e de diferença. Rev. Bras. Ed. Esp. V, 24, n. 2, 2018. p. 161-172.

REY, F. G. As categorias de sentido, sentido pessoal e sentido subjetivo: sua evolução e diferenciação na teoria histórico-cultural. Psic. Da Ed. São Paulo, n. 24, v. 1, 2007, p. 155-179.

SILVA, B. G. Ensino de artes e a história da arte na educação. In: Portal da educação [online], 2013. Disponível em https://www.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/pedagogia/ensino-de-artes-e-a-historia-da-arte-na-educacao/67348. Acesso em 18 Jan. 2020.

SOUZA, F. S; BATISTA, C. G. Indicadores de desenvolvimento em crianças e adolescentes com QI igual ou inferior a 70. Rev. Bras. Ed. Esp. V. 22, n.4, 2016, p. 493-510.

SPINK, M. J. Linguagem e produção de sentidos no cotidiano [on line]. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2010. p.72.

VIEIRA, C. M. Sentimentos infantis em relação à deficiência intelectual: efeitos de uma intervenção. Psicologia Ciência e Profissão. v. 35, n. 2, 2015. p. 423-436.

[1] Graduada em Licenciatura Plena em Pedagogia. Pós-graduada em Psicologia Educacional com ênfase em Psicopedagogia. Mestranda em Comunicação, Linguagem e Cultura.

Enviado: Maio, 2020.

Aprovado: Março, 2021.

 

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Aline do Socorro Martins Pacheco Sakaguchi

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