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Cotejo crítico da possibilidade e dos limites da liberdade contratual nos Pactos Sucessórios

RC: 77435
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CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

CALAND, Lucas Alves Silva [1]

CALAND, Lucas Alves Silva. Cotejo crítico da possibilidade e dos limites da liberdade contratual nos Pactos Sucessórios. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 06, Ed. 03, Vol. 01, pp. 45-55. Março de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/pactos-sucessorios

RESUMO

Análises sobre o pacto sucessório e suas implicações no âmbito do direito brasileiro. A questão das sucessões sempre demandou inúmeras situações, dentre elas está aquela que fala da herança do de cujus, quase sendo sempre objeto de lides judiciais. Neste sentido, a figura jurídica do pacto sucessório, por muitos outros ordenamentos utilizada, no  nosso é vedada por completo. A pesquisa buscará entender os motivos primários de tal negativa, além de que apresentar-se-á visões de flexibilidade sobre tal possibilidade de parte da herança servir como meio de contrato sucessório. O tema demanda inúmeras questões de natureza diversa, seja no âmbito social ou legislativo, sendo ambos – a nível de ordenamento pátrio – no sentido de rigidez contra a questão, dispensando por completo os indicativos constitucionais e civilistas da disponibilidade daquilo que é privado.

Palavras-Chave: Sucessão, Pacto sucessório, Herança.

1. INTRODUÇÃO

De muito a questão sucessória demanda investigações, interpretações, discórdias e até mesmo fora motivo para guerras. Assim, a sucessão nunca se deu como tema pacífico, muito ao contrário, basta olhar-se a história do direito para entender que ele vai se organizando e mudando conforme as mudanças sociais, na mesma senda deveriam seus principais institutos acompanharem, porém não raro, em alguns institutos ocorre uma espécie de estagnação.

Esta estagnação legislativa parece ter alcançado de forma mais estrondosa a questão sucessão, pontualmente no que concerne à questão do denominado pacto sucessório, instituto jurídico vedado no ordenamento pátrio, mas mito utilizado em ordenamentos alienígenas.

Como já dito, esta modalidade de contrato não é algo de novo, sua origem remonta a Roma e sociedades de seu tempo. Todavia, a mais emblemática situação ocorre na Idade Média em Portugal onde D. Henrique reconhece como D. Raimundo como seu legítimo herdeiro do Reino de Leão e Castela, o que gerou inúmeros questionamentos sociais e jurídicos, levando várias legislações a banirem tal possibilidade de seu ordenamento.

Quanto ao tema, a doutrina brasileira ainda é muito parca sobre a questão, muitas das vezes limitando-se aos preceitos legislativos previstos, principalmente, no Código Civil Brasileiro, geralmente tendo como essência o artigo 426.

Com efeito, a genérica proibição estatuída no art. 426 do CC não impede que sejam estabelecidas análises sobre os limites impostos quando da sucessão.

Ora, a questão demanda, apesar da vedação do art. 426 do Código Civil, inúmeros questionamentos, posto que a vontade daquele que em vida pretende fazer um contrato de seu patrimônio (que será revestido em herança) deixa de valer, passando o Estado a definir vedação da própria vontade do pactuante, o que em simplória análise soa como uma espécie de esgarçamento de vontade sobre bens próprios e privados.

Ainda que, como já dito, pouquíssima literatura se debruce sobre o tema, os ensinamentos alienígenas, nos permitem dividir os negócios jurídicos citados em três modalidades: a primeira seria a denominada de pactos institutivos (quando se dispõe da própria herança); a segunda, de pactos renunciativos (renúncia á herança de nacional); e, a terceira de pacto hereditate tertii (trata da renúncia à futura herança) (SILVA, 2018).

Ainda que se apresentem em formas diferenciadas, os pactos sucessórios em seu todo, esbarram na vedação legislativa já mencionada alhures, que possui como (tal vedação), principalmente, a vulneração aos bons costumes, posto que em seguindo esta trilha, o negócio jurídico perpetrado teria como base resolutiva a esperança na morte daquele de cuja sucessão se trata, o que se revesteria em uma sucessão contratual (pactícia), rompendo com aquela ordem pública sucessória.

De outra senda, argumenta-se que aqueles modelos de pactos sucessórios, trariam lesões invencíveis ao direito de revogabilidade do autor da herança. A final argumentativa, diz que se for possível tal negociação, teríamos a presença de lesão irreversível ao herdeiro presuntivo.

Com efeito, a proibição mantida até hoje (artigo 426 do CC), sobre a questão pactual da herança de pessoa viva, se traduz em fruto do modelo romano  e, especialmente, francês do direito civilista, todavia, a sociedade ao longo dos tempos se modificou tendo suas relações sofrendo profundas mudanças estruturais e conceituais, de forma a trazer para o cerne da questão situações como o planejamento dos bens para além da morte.

2. SUCESSÃO

Ao analisar-se o tema pacto sucessório, temos de pronto de entender alguns conceitos e características do que seja essa sucessão, posto que muitas são as questões que permeiam a matéria.

Sucessão em seu sentido mais amplo significar dizer da transferência de direito de uma pessoa para outra, a qual pode ocorrer durante a vida do transferente, por isso denominada de sucessão intervivos; ou ainda, ou em razão da morte (sucessão causa mortis), e se dá através do processo conceituado como inventário.

Com efeito, ao tratar-se diretamente do direito das sucessões, fala-se daquele direito oriundo da situação de morte, onde estarão presentes a figura do autor da herança (de cujus), ou aquele que com a morte se faz necessário abrir-se a sucessão; os sucessores, que são aqueles que deverão receber os bens oriundos da herança do de cujus.

De outra sorte, tem-se a herança (pode ser definida como espólio) que nada mais é do que a universalidade das relações deixadas pelo falecido a serem transferidas aos sucessores. A parcela da herança designada a cada sucessor é chamada de quinhão hereditário.

Podemos de logo dizer de duas modalidades de sucessão: a sucessão testamentária e a definida como legítima ou legal (art. 1.786 do Código Civil).

Quando se fala em sucessão legal, tem-se aquela sucessão que a própria lei a determina, onde o legislador trouxe à ordem a vocação hereditária, e por isso, traça a ordem daqueles que serão chamados para suceder.

Em outra via, diz-se que a sucessão é testamentária quando o autor da herança, através de testamento, elege seus sucessores e apresenta seus quinhões.

A sucessão também pode ser por título universal ou a título singular. Ao tratar-se da sucessão a título universal, tem-se a sucessão onde existe uma atribuição de quotas hereditárias aos sucessores ou quando houver apenas a figura de um único herdeiro e este receber in totum a herança.

Já a sucessão singular, é aquela que a transferência é toda determinada (bens determinados às pessoas determinadas). Neste caso, o bem determinado é chamado de legado e o beneficiado é denominado de legatário.

Vale ressaltar que a sucessão legítima sempre ocorre na forma universal, enquanto que a sucessão testamentária poderá ocorrer em título universal ou singular.

2.1 DOS FUNDAMENTOS DO DIREITO DE SUCESSÃO

O direito de sucessão possui seus fundamentos mais primários em três vertentes axiológicas: religiosa, biológica ou antropológica e a jurídica.

Por muito as sucessões, no contexto histórico, foi delineada apenas com base nos instrumentos para subsistência de cultos a antepassados (TARTUCE, 2016).

Pela visão antropológica ou biológica, os pais transmitem aos filhos não só os caracteres orgânicos, mas também, as qualidades psíquicas, de forma a resultar da lei o garantimento da propriedade pessoal.

No que concerne à questão jurídica, liga-se diretamente ao tema do direito de propriedade no causa mortis, caracterizado pela perpetuidade e estabilidade das relações jurídicas (FARIAS et al, 2019).

2.2 MOMENTO DA ABERTURA DA SUCESSÃO

Segundo o Código Civil de 2002, a existência da pessoa natural ocorre com a morte. E com a morte dar-se a necessidade de abertura da sucessão (delação sucessória), ressalte-se que esta morte pode ser em caráter real ou mesmo na morte presumida (ocorrendo nos casos em que a pessoa será considerada morta, todavia, não há presença do corpo).

Quanto a questão comoriência (art. 8º do CC), o direito busca identificar aquele que falece primeiro, de forma a dizer-se se houve ou não a transmissão de direitos.

Dias (2016)  diz que “se dos recursos técnicos não forem suficientes para apurar o momento da morte, considera- se que a morte foi simultânea”.

Quanto ao lugar onde deverá ser aberta a sucessão (art.1.785) o local da abertura da sucessão será o último domicílio do de cujus. Por isto, é necessário conhecer o local do domicílio do falecido para que seja eleito o foro competente para o ajuizamento da ação.

3. ARTIGO 426 DO CÓDIGO CIVIL

Para o Direito Brasileiro Civilista só existe uma forma de negociação  todo um patrimônio, é o negócio jurídico unilateral mortis causa (testamento), sendo necessário ato de vontade do testador e solenidades exigidas, atingindo sua eficácia com evento morte. Assim, até que o citado evento ocorra, o testador possui condições de revogá-lo, desta forma, não há de se falar na presença de um contrato bilateral de sucessão (pacto sucessório).

Neste sentido, o Código Civil brasileiro prescreve a proibição de que os contratos tenham por objeto a herança de pessoa viva (artigo 426). O dispositivo, alocado nas disposições gerais dos contratos, é a repetição literal da regra prevista no Código Civil de 1916. Embora não contemple uma consequência para a inobservância do preceito, pode-se dizer que a nulidade do pacto sucessório, é uma junção legislativa civilista ocorrida entre os artigos 166 e 426 do CC, de onde se pode defluir que na presença de tal pacto, de logo haverá nulidade absoluta do ato jurídico, e ressalte-se que não se trata de ato anulável, ele nasce nulo de pronto, por isso, torna-se impossível de render efeitos.

Interessante o posicionamento de Caio Mário Silva Pereira (2017, p. 63) ao dizer da impossibilidade do pacto sucessório, o fazendo ao exercer crítica severa a esta possível modalidade de negócio jurídico, verbis:

Seja no fato de somente se admitirem como formas de dispor os testamentos e codicilos, seja na regra proibitiva formal de quaisquer contratos que tenham por objeto herança de pessoa viva, seja ainda na condenação moral que lhe opõem os doutos, [posto a] contrariedade aos bons costumes, por determinar o surto de sentimentos imorais; o votocaptanae mortis; a contrariedade ao princípio da liberdade de testar, por ser característica essencial das disposições de última vontade, qual seja revogabilidade e, por fim, o potencial lesivo dos pactos sucessórios em relação aos sucessíveis.

Com efeito, na lição do autor, se pode depreender inúmeros argumentos para que seja impossibilitado o negócio jurídico pretenso do pacto sucessório, já que ele além de tudo sobejaria desnaturada a revogabilidade das disposições de última vontade, tendo em vista que o contratante teria vedada qualquer resilição unilateral do pacto, de forma a estar impossibilitado de regular a sua própria sucessão.

Para melhor compreensão da vedação externada pela Lei e seguida pelas decisões, trazemos à baila alguns julgados capazes de demonstrar a isonomia do entender sobre o pacto sucessório:

 Agravo de Instrumento. Inventário. Decisão que não reconheceu a agravante como única herdeira. Acordo sobre herança de pessoa viva. Descabimento. Manutenção da decisão. Com efeito, a herança de pessoa viva é mera expectativa de direito, inadmitindo-se discussão a seu respeito, conforme artigo 426, do CC, que prevê a impossibilidade de que seja objeto de contrato. Agravo desprovido (BRASIL, 2018, p. 3).

No mesmo sentido o Superior Tribunal de Justiça disse em Agravo Interno que;

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM PROCESSO DE INVENTÁRIO. TRANSAÇÃO SOBRE HERANÇA FUTURA. NULIDADE. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Não configura ofensa ao art. 535, I e II, do Código de Processo Civil o fato de o Tribunal de origem, embora sem examinar individualmente cada um dos argumentos suscitados, adotar fundamentação contrária à pretensão da parte recorrente, suficiente para decidir integralmente a controvérsia. 2. Acórdão recorrido que manteve a nulidade de cessão de direitos hereditários em que os cessionários dispuseram de direitos a serem futuramente herdados, expondo motivadamente as razões pelas quais entendeu que o negócio jurídico em questão não dizia respeito a adiantamento de legítima, e sim de vedada transação envolvendo herança de pessoa viva. 3. A reforma do julgado demandaria, necessariamente, o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, providência incompatível com a via estreita do recurso especial, nos termos da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça. 4. Embora se admita a cessão de direitos hereditários, esta pressupõe a condição de herdeiro para que possa ser efetivada. A disposição de herança, seja sob a forma de cessão dos direitos hereditários ou de renúncia, pressupõe a abertura da sucessão, sendo vedada a transação sobre herança de pessoa viva. 5. Agravo interno não provido. (BRASIL, 2017, p. 2).

Assim, do até o momento explicitado, se tem que o pacto sucessório esbarra em inúmeros entraves, se não nos de ordem legislativa e decisórias, tem-se ainda os de ordem cultural/moral, os quais por vezes se revestem de mais rigor do que a própria lei.

Todavia, merece dizer que a vedação do pacto sucessório previsto no artigo 426 do Diploma Civilista não impede que alguém realize liberalidades em vida com seus bens integrantes de seu patrimônio, e se tratando de descendentes e cônjuges, qualquer valor doado será considerado adiantamento sujeito à colação ao tempo do óbito, de igual forma, nenhuma vedação há ao ascendente que deseja, por ato entre vivos, de logo realizar a partilha de bens que compõem o seu patrimônio, ressalvando que não deverá ocorrer prejuízo à legítima dos herdeiros necessários. O que é plenamente explicado por Itabaiana de Oliveira (2015, p. 93), quando afirma que:

A partilha em vida pode ser formalizada por ato entre vivos ou de última vontade. Neste último caso, chama-se partilha-testamento, pois é o testamento o instrumento por meio do qual o ascendente distribuirá os bens entre os herdeiros necessários, preenchendo lhes o respectivo quinhão, mas a aquisição da propriedade dos respectivos bens só acontecerá com o falecimento do ascendente, devendo ser respeitada a divisão estipulada no testamento. Realizada por ato inter vivos, recebe também a denominação de partilha-doação, porque é através do contrato de doação que normalmente ela se opera. Mas também pode sê-la feita por via de outros instrumentos jurídicos idôneos que determinem a transferência, à título gratuito, da propriedade, a exemplo da alteração de contrato social que contemple cláusula de cessão gratuita de quotas. É irrelevante a forma que o ato se reveste. A partilha, em si, é instituto dotado de autonomia e, franqueada a possibilidade de ser realizada em vida, constitui negócio jurídico cujo objeto é a repartição ou distribuição dos bens que compõem a herança futura do disponente.

Por certo, a partilha em vida é um ato jurídico especial que visa de logo proporcionar aos sucessores a aquisição antecipada dos bens que só a morte do ascendente lhes proporcionaria. Este ato, entende-se, não pode ser uma doação já que esta possui caráter revogável, enquanto que o ato jurídico especial da partilha não poderá sofrer reversão.

Resumindo, ainda que haja vedação expressa sobre o pacto sucessório, tem-se na presença da herança três outros negócios jurídicos, que sejam, a partilha em vida (artigo 2.018), as disposições de última vontade (artigo 1.786), e o adiantamento de legítima (artigo 544), todos previstos no Código Civil Pátrio.

Ora, como já patenteado, essa modalidade de negócio jurídico aceito em outras legislações alienígenas[2], deixou de ser objeto de pesquisas mais aprofundadas pela doutrina que se limitou ao que disse o Código Civil de 1916 e corroborou o atual Diploma Civilista, de forma que tal limitação doutrinária estancou de certa forma possíveis questionamentos que se faziam e se fazem necessários para o mais amplo desenvolver do direito pátrio.

A complexidade do pacto sucessório talvez tenha sido a grande problemática que causadora de que a simplicidade da Lei fechou qualquer que fossem os argumentos em favor do referido pacto. Mas, de outro lado, a mesma complexidade alinhada à sua diversidade e heterogeneidade tornam mola propulsora para que se busque entender e romper com essa solidez legislativa-proibitiva.

Segundo Tepedino (2009, p, 382),

É necessário deslocar a atenção para os aspectos teleológicos e axiológicos dos atos de autonomia negocial, para o seu merecimento de tutela segundo o ordenamento jurídico. Sobeja que a interpretação não deve ser, mesmo diante de um tal negócio jurídico, simplesmente lógica e finalizada à subsunção, na sua mecânica silogística, num processo em que a própria norma infraconstitucional influencia a norma hierarquicamente superior. Na perspectiva atual, a fundamentação hermenêutica é axiológica, e não lógica. Por valores constitucionais que devem impregnar cada julgado, ou cada núcleo legislativo, ou cada categoria do direito infraconstitucional. Imaginando-se a aludida recíproca influência do processo interpretativo, acaba-se por eternizar noções culturais ou consuetudinárias ultrapassadas e reprovadas pela sociedade, contra a ordem pública constitucional, em favor de esquemas mentais misoneístas, construídos no passado e adotados de forma servil e acrítica pelo intérprete.

Assim, se pode defluir das explicações acima mencionadas, que o pact sucessório se faz merecedor de novas observações que se desliguem (de certa forma) na normalização civilista vigente, e vise buscar um equilíbrio maior entre aquele que detêm o património e seus sucessores, de forma a interagir diretamente com as mudanças sociais vigentes.

A simplicidade de apresentação de motivos que eram vigentes na época do Código de 1916 (e que foram corroboradas pelo de 2002), já se fazem inteiramente questionáveis.

4. CONCLUSÃO

Assim, os pactos sucessórios são institutos merecedores de mais aprofundamento pela doutrina, posto que em suma se destinam a regular a atribuição de condição de herdeiro, a renúncia antecipada à sucessão não aberta.

A sua proibição absoluta estatuída desde o Código Civil de 1916 e confirmada pelo atual Código Civil, perfez com que a doutrina em sua maioria esmagadora, deixasse de se debruçar sobre o tema, apenas passando a repetir os argumentos do próprio Código Civilista.

Basta estudar-se o direito comparado para ver-se o alargamento das hipóteses excepcionadas pela legislação estrangeira, principalmente no tocante à França, de onde o Direito Brasileiro (diretamente) recepcionou tal vedação.

A apreciação das mais diversas situações em que a questão do evento morte é admitido como o meio de eficácia do negócio jurídico demonstra que a alegação proibitiva brasileira termina por não sustentar-se, posto que a centralidade do argumento de que o pacto sucessório tem por base a esperança da morte do outro, já possui admissibilidade em várias modalidades contratuais estatuídas no ordenamento pátrio, caso dos contratos post mortem, da substituição fideicomissária, da doação com cláusula de reversão, do usufruto vitalício, do direito de acrescer, do seguro de vida, dentre outros.

Constata-se, ademais, da análise das demais razões da proibição, como a afronta à ordem pública sucessória, à liberdade de testar e o potencial lesivo dessas convenções, que elas não se aplicam a todas as expressões dos pactos sucessórios indistintamente. Daí a revisitação crítica do sistema proibitivo, ao menos no que tange ao seu fundamento e ao regime comum e unitário de nulidade traçado no Código Civil.

Como observado, o evento votum mortis, é admitido em inúmeras situações como fator relevante a um dos sujeitos envolvidos na relação. O que por certo destoa daquela proibição genérica prevista no artigo 426 do Código Civil que aufere total impossibilidade do pacto sucessório, retirando força dos próprios princípios constitucionais e desprezando a atividade hermenêutica que deve ser, sempre, meio para a ponderação sobre aqueles juízos de pronto generalizantes que se apresentavam com rigidez inquestionáveis. Neste sentido, merecedor de outras análises é o pacto sucessório que se apresenta como via de possibilidades do próprio exercício natural sobre a coisa privada, sempre útil à satisfação dos interesses sociais e particulares.

O trabalho não possuiu a perspectiva de fechar a questão, muito ao contrário se quis mais um aguçador da problemática, pois o tema é merecedor de inúmeras outras reflexões, necessárias para o alongamento do debate que se faz mister, principalmente diante de questão de tamanha relevância para o direito e sociedade como um todo, devendo se estender na busca de melhores soluções resolutivas.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgInt no REsp: 1341825 SC 2012/0184431-5, Relator: Ministro Raul Araújo, Data de Julgamento: 15/12/2016, Quarta Turma, Data de Publicação: DJe 10/02/2017.

_______. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. AI: 70078443033 RS. Relator: José Antônio Daltoe Cezar. Data de Julgamento: 18/10/2018, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 19/10/2018)

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. São Paulo: Melhoramentos, 2019, p. 92, ISBN 978-8553607242.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson; BRAGA NETTO, Felipe. Manual de Direito Civil: volume único. Salvador: JusPodvim, 2019, p. 288, ISBN 978-85-442-2557-8.

GOMES, Orlando. Direitos reais. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 72, ISBN: 9788530942595.

OLIVEIRA, Arthur Vasco Itabaiana de. Tratado de Direito das Sucessões. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 82, ISBN 9789974008403.

PELUSO, César. Código Civil Comentado: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Manoele, 2019, p. 931, ISBN: 978-8520459027.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Direito das sucessões. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 827, ISBN 9788530979355.

PERLINGIERI, Pietro. Perfis de direito civil: introdução ao direito civil constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 49.

SILVA, Rafael Cândido da. Pacto Sucessório e Contrato de Herança: estudo sobre a autonomia privada na sucessão causa mortis. Salvador: Juspodvm, 2018, p. 291, ISBN: 978-85-442-2732-9.

TARTUCE, Fábio. Manual de Direito Civil. São Paulo: GEN, 2016, p. 73, ISBN 978-8530988401.

TEPEDINO, Gustavo. O direito civil-constitucional e suas perspectivas atuais. In: Obrigações. Estudos na Perspectiva Civil-Constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2009, p. 31, ISBN 978-8571475144.

APÊNDICE – REFERÊNCIA DE NOTA DE RODAPÉ

2. PERLINGIERI, Pietro. Perfis de direito civil: introdução ao direito civil constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 49, “Conforme já se reconheceu a doutrina estrangeira, a proibição dos pactos sucessórios é por vezes percebida como um obstáculo desarrazoado ao ‘livre desdobramento da autonomia privada, como um fator de bloqueio a impedir a persecução de interesses substancialmente merecedores de tutela”.

[1] Mestrando em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade Portucalense, Especialista em Direito Constitucional pela Faculdade Faveni e em Direito Penal e Processual Penal pela Faculdade Estácio de Sá. Graduado em Direito pela Universidade Estadual do Piauí.

Enviado: Janeiro, 2021.

Aprovado: Março, 2021.

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Lucas Alves Silva Caland

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