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Execução Fiscal: Legitimidade Passiva E O Redirecionamento Da Execução Contra Os Sócios

RC: 89998
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CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

GUEDES, Daniela Ramos [1]

GUEDES, Daniela Ramos. Execução Fiscal: Legitimidade Passiva E O Redirecionamento Da Execução Contra Os Sócios. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 06, Ed. 06, Vol. 16, pp. 177-191. Junho de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/contra-os-socios

RESUMO

Sabe-se que, atualmente, cada vez mais, empresas cessam suas atividades sem o devido procedimento legal, ou seja, sem a devida comunicação à Junta Comercial, sem a quitação de débitos, entre outras obrigações. Observa-se, então, que o Judiciário, visando efetivar o cumprimento de decisões judiciais, passou a aplicar o mecanismo requerido pela Fazendo Pública para redirecionar a execução fiscal aos sócios dessa empresa, conhecido como desconsideração da personalidade jurídica, porém, para que a Fazenda consiga a desconsideração da pessoa jurídica e alcance os bens particulares dos sócios, devem ser observados diversos requisitos que, atualmente, são interpretados de forma ampla pelo Judiciário. Nessa conjuntura, o presente artigo visa apresentar quais são as hipóteses de responsabilização dos sócios-gerentes na constituição/execução de créditos tributários, assim como apontar os diferentes entendimentos jurisprudenciais e doutrinários acerca do marco temporal no redirecionamento da execução fiscal aos sócios. Sabendo-se, portanto, da existência do instituto da responsabilização de terceiros, prevista no artigo 135, III, do Código Tributário Nacional, no momento do redirecionamento da execução fiscal aos sócios-gerentes de uma sociedade empresarial, a legitimidade passiva e o seu marco temporal para tal, passou-se a observar controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais acerca do tema. Para melhor entender sobre o assunto e a controvérsia existente, realizou-se uma pesquisa em doutrinas e jurisprudências atuais, visando apontar os principais fundamentos aplicados em determinados casos concretos. Sendo assim, verificou-se que o Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, não oferece um entendimento consolidado, sendo possível perceber a adoção de três entendimentos distintos sobre a responsabilidade do sócio administrador, bem como três entendimentos distintos sobre o marco inicial para o redirecionamento da execução fiscal para os sócios.

Palavras-chave: Responsabilidade tributária, Redirecionamento da execução fiscal, Sócio.

1. INTRODUÇÃO

O órgão responsável pela constituição de créditos tributários é a Fazenda Pública, nas esferas federal, estadual e municipal, que se sujeita à Constituição Federal, bem como outras disposições legais e infra legais para administrar a área tributária do Estado.

Cabem às Procuradorias das Fazendas Públicas a recuperação desses créditos tributários na fase judicial de cobrança, garantindo o cumprimento da ordem jurídica em prol da sociedade.

Sendo assim, observa-se a necessidade de entender sobre os critérios e limites utilizados pelos órgãos supracitados, bem como entender as normas existentes para efetivar o adimplemento de um crédito tributário. Um dos mecanismos alternativos para tal é a responsabilização do sócio pelo inadimplemento da sociedade da qual fez ou faz parte. Pois, é através do redirecionamento fiscal na fase judicial da cobrança, que o fisco pode vir a alcançar os bens particulares dos sócios pelas dívidas tributárias das sociedades ao qual fazem/fizeram parte do quadro social.

Portanto, o foco do presente estudo residirá na análise de um dos aspectos mais controversos até a presente data a respeito do tema: qual o início do prazo de prescrição para o redirecionamento da execução fiscal.

Ainda, serão estudados os principais requisitos e fundamentos da responsabilidade do sócio na ocasião de encerramento das atividades empresariais sem o devido procedimento previsto em lei (dissolução irregular da pessoa jurídica), analisando-se a sua ligação não só com o art. 135, III, mas também com o art. 134, VII, ambos do Código Tributário Nacional, e com a teoria da desconsideração da personalidade jurídica. (BRASIL, 1966)

Assim, verificados os institutos supracitados bem como seus respectivos pressupostos legais, analisaremos o posicionamento adotado atualmente pelos tribunais no que tange ao marco inicial da prescrição no redirecionamento da execução fiscal.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1 RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA

A responsabilidade tributária é a obrigação de pagar pelo tributo, assumida pelo sujeito passivo da relação jurídico-tributária, perante a Fazendo, o Fisco, ou seja, quem deve pagar o tributo ou a penalidade pecuniária.

Desta feita, dá-se o nome de responsável pelo tributo o sujeito passivo da obrigação tributária que, ainda que não tenha a relação pessoal e direta com o fato gerador respectivo, tem seu vínculo com a obrigação tributária nascida de um dispositivo expresso em lei.

Ao instituir a responsabilidade tributária, percebe-se que a intenção do legislador foi assegurar à Fazenda Pública o efetivo recebimento dos créditos tributários devidos.

Eduardo Sabagg ensina:

Em princípio, o tributo deve ser cobrado da pessoa que pratica o fato gerador. Nessas condições, surge o sujeito passivo direto (contribuinte). Em certos casos, no entanto, o Estado pode ter necessidade de cobrar o tributo de uma terceira pessoa, que não o contribuinte, que será o sujeito passivo indireto, o responsável tributário. (SABBAG, 2009, p. 635)

Dessa forma, observa-se a importância do estudo da responsabilidade tributária no sistema jurídico brasileiro, conforme será abordado nesse trabalho.

2.2 PREVISÃO CONSTITUCIONAL.

Para Ruy Barbosa Nogueira “O poder de tributar é, portanto, uma decorrência inevitável da soberania que o Estado exerce sobre as pessoas de seu território, ao qual corresponde, por parte dos indivíduos, um dever de prestação. (NOGEIRA, 1995, p. 29)

No âmbito do direito tributário entende-se que essa relação demonstrada acima possui duas partes: na primeira, caracterizada como Ente Tributante, encontra-se o Estado (sujeito ativo); e na segunda, caracterizada como Contribuinte, encontra-se o indivíduo que tem o dever de pagar (sujeito passivo). Ou seja, o Estado é quem cobra e o Indivíduo é quem paga.

Assim, para o respeitável doutrinador Eduardo Sabbag:

É cediço que o Estado necessita, em sua atividade financeira, captar recursos materiais para manter sua estrutura, disponibilizando ao cidadão- contribuinte os serviços que lhe compete, como autêntico provedor das necessidades coletivas. A cobrança de tributos se mostra como uma inexorável forma de geração de receitas, permitindo que o Estado suporte as despesas necessárias à consecução de seus objetivos. (SABBAG, 2009, p. 650)

O fato do contribuinte se sujeitar ao poder do Estado se dá quando aquele, de um lado, atende à uma determinada hipótese de incidência (norma jurídica), que o leva à aceitação do ônus tributário, e este, de outro lado, obrigado igualmente a cumpri-la.

Deste modo, nessa relação entre sujeito ativo e passivo, no que tange ao ônus tributário, é imprescindível a correta identificação do sujeito passivo – contribuinte – bem como o reconhecimento de eventuais terceiros responsáveis, sejam na modalidade de substitutos tributários ou de corresponsáveis em caso de inadimplemento.

No Brasil, as limitações do poder de tributar são dispostas na Constituição Federal de 1988, em seus artigos 150, 151 e 152. Esses dispositivos limitam a capacidade de cobrar tributos, prescrevendo princípios a serem rigidamente seguidos, como, por exemplo, os princípios da anterioridade, da legalidade e da igualdade jurídica, especifica, ainda, as imunidades em matéria tributária, a tributação segundo a capacidade contributiva, a indelegabilidade da competência tributária, entre outros. (BRASIL, 1988)

Além disso, a Constituição Federal dispõe, também, no artigo 146, que cabe à lei complementar regular as limitações constitucionais ao poder de tributar (inciso II) e estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária (inciso III). (BRASIL, 1988)

Dessa forma, a identificação do sujeito passivo na relação tributária encontra-se revestida da necessidade de regulação por lei complementar, para que seja definido o fato gerador e contribuinte, bem como os respectivos tipos de lançamento dos créditos tributários.

2.3 PREVISAO LEGAL DO CTN.

Normalmente a responsabilidade tributária é do sujeito passivo da obrigação tributária, seja o responsável ou o contribuinte de fato, definidos, respectivamente, nos incisos I e II, do parágrafo único, do art. 121 do CTN. Entretanto, nas hipóteses previstas, de forma taxativa, nos artigos 134 e 135 do mesmo diploma legal, essa responsabilidade pode se estender a terceiros. (BRASIL, 1996)

2.4 PREVISÃO LEGAL DA LEI DE EXECUÇÕES

O artigo 4º da Lei N.º 6.830 de 22-9-1980, em seu inciso V, dispõe que: “a execução fiscal poderá ser promovida contra responsável, nos termos da lei, por dívidas tributárias ou não, de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado”. (BRASIL, 1980)

A partir do artigo legal supracitado infere-se que a possibilidade de cobrar crédito tributário do responsável pela pessoa jurídica é possível, conforme emerge da conjugação dos dispositivos do Código Civil descritos nos capítulos referentes à liquidação e dissolução das sociedades empresárias.

Notadamente o artigo 1016 do Código Civil dispõe sobre a responsabilidade pessoal dos sócios-administradores pelas obrigações da sociedade quando agirem de forma culposa ou com inobservância de lei. (BRASIL, 2002)

No que tange à dissolução irregular, o Código Civil não é expresso sobre a responsabilidade pessoal do sócio administrador, contudo, atualmente, entende-se que a dissolução irregular é considerada um ato contrário à lei. (MOURA, 2017)

De acordo com Gerson Luiz Rocha, ‘‘uma visão restrita não se coaduna com a finalidade desejada pela norma em análise, caminhando no sentido contrário ao seu objetivo’’. (ROCHA, 2009, p. 85)

Ora, vejamos o referido raciocínio:

É nessa linha de pensamento que se admite a responsabilidade solidária do gestor pela dívida não-paga pela pessoa jurídica, sempre que se verificar a dissolução irregular da sociedade comercial, ou seja, quando não obstante  a dívida inadimplida decorra das atividades regulares da empresa, sem que se possa atribuir ao sócio-gerente a prática de qualquer ilícito que tenha resultado propriamente na obrigação fiscal, a empresa vem a encerrar suas atividades clandestinamente, sem a observância das normas administrativas, comerciais e fiscais que regulam a dissolução societária. Nesses casos, tem-se a configuração de um ilícito que, embora posterior ao fato gerador da obrigação não-paga, configura ilegalidade atribuível ao gestor da pessoa jurídica e que, por esta razão, conduz à sua responsabilização pessoal pela dívida. (ROCHA, 2009, p. 85)

Na prática, na maioria das vezes, a Fazenda Pública busca inicialmente o patrimônio da pessoa jurídica, para, posteriormente, em caso de fracasso na execução, pesquisar bens pessoais dos administradores, o que se entende como coerente, uma vez que há um sistema de responsabilidade subsidiária.

Na jurisprudência, o denominado como redirecionamento da execução fiscal, acontece quando a ação de execução fiscal é ajuizada contra a pessoa jurídica devedora de um crédito tributário e, não havendo satisfação do crédito, inclui-se o responsável pela PJ no polo passivo do processo executivo. Admite-se, ainda, que a ação de execução fiscal seja diretamente ajuizada contra a sociedade e seu respectivo sócio administrador, se, o nome deste constar da Certidão da Dívida Ativa.

O redirecionamento da execução fiscal, conforme o que vem sendo permitido pelos tribunais, torna difícil a defesa efetiva do administrador contra o qual é postulada essa medida.

Verifica-se que, em verdade, a responsabilidade tributária atribuída aos sócios-administradores decorre da prática de ato ilícito praticado por estes (art. 135 do CTN), ato ilícito que deve ser apurado em processo próprio e específico para tal fim, no qual a Administração Pública irá oferecer, obrigatoriamente, direito de defesa. Daí, infere-se que o debate sobre a conduta do sócio-gerente não pode ser feito no mesmo processo de execução de execução fiscal. (BRASIL, 1966)

Contudo, observa-se que a jurisprudência, mesmo quando não há título executivo extrajudicial específico em nome do sócio-gerente, não considera o redirecionamento da execução fiscal como ato contrário aos princípios da ampla defesa e do contraditório, de forma que é assegurado ao respectivo sócio o direito de debater a matéria, por meio de Embargos à Execução, pois, a natureza dos Embargos à Execução é exatamente a configuração de uma ação paralela ao executivo fiscal, movida pelo devedor contra a Fazenda, tentando desconstituir o título objeto da execução fiscal. (STJ, 2007)

Ora, vejamos, então, os termos de um posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. EXECUÇÃO PROMOVIDA APENAS CONTRA A EMPRESA. SÓCIO CUJO NOME NÃO CONSTA DA CDA. ÔNUS DE PROVA QUE CABE AO FISCO. COMPROVAÇÃO NO SENTIDO DA DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE. POSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO. SÚMULA 7/STJ. DEMAIS DISCUSSÕES QUE DEVEM SER DIRIMIDAS EM SEDE DE EMBARGOS À EXECUÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. 1. (…). 3. Na hipótese em exame, a execução fiscal foi promovida apenas contra a empresa e da Certidão de Dívida Ativa –   CDA   –   não   consta   o   nome   dos   sócios.   Assim, considerando a jurisprudência que se firmou nesta Corte de Justiça, conforme acima delineado, conclui-se que, tendo sido a execução, posteriormente, redirecionada contra sócio cujo nome não consta da Certidão de Dívida Ativa, entende-se que cabe ao Fisco o ônus de provar que o sócio incorreu em alguma das hipóteses previstas no art. 135 do CTN. 4. O Estado do Rio de Janeiro, ao requerer o redirecionamento da execução fiscal contra os sócios, trouxe aos autos provas, examinadas no juízo da origem, de que a sociedade empresarial se dissolveu irregularmente, o que possibilitou a responsabilização dos sócios pelos débitos tributários da sociedade devedora. Assim, não há como elidir essa conclusão, pois, para tanto, seria necessária a análise das provas constantes dos autos, o que, no entanto, é inviável em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ. 5. Em execução fiscal somente podem ser arguidas, excepcionalmente, as questões de ordem pública, como aquelas pertinentes aos pressupostos processuais e às condições da ação, bem assim aquelas em que o reconhecimento da nulidade do título puder ser verificado de plano, desde que não seja necessária dilação probatória, sendo certo que as demais discussões devem ser levantadas pelo executado na via de embargos à execução. Recurso especial desprovido. (REsp 649.721/RJ)

Portanto, apesar de uma parcela da doutrina não aceitar esses argumentos e não aceitar a possibilidade do redirecionamento, constata-se que na jurisprudência do STJ predomina a possibilidade da responsabilização do sócio-gerente através do redirecionamento da execução fiscal, o que acontece, somente, com pedido específico de inclusão no polo passivo da execução fiscal.

3. DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA EMPRESA

Sabe-se que, atualmente, cada vez mais as empresas simplesmente cessam suas atividades sem a devida quitação de débitos, notadamente o débito fiscal e ‘‘desaparecem’’. Assim, através da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.201.993, visando coibir e evitar essa prática de dissolução irregular da pessoa jurídica, cada vez mais comum no cenário atual, bem como visando buscar o efetivo cumprimento das decisões judiciais, o judiciário consolidou uma orientação jurisprudencial de que a dissolução irregular passou a ser compreendida como um ato ilícito, o que permite o redirecionamento da execução fiscal para a pessoa do sócio-gerente da empresa. (STJ, 2019).

3.1 ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO E JURISPRUDENCIAL

A grande importância da matéria estudada no presente trabalho corroborou para a edição da Súmula nº. 435, em 2010, pelo Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual: ‘‘Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.’’ (STJ, 2010)

Nesse contexto, delimitou-se o entendimento no sentido de que a mera Certidão do Oficial de Justiça, apontando que a empresa deixou de funcionar no endereço cadastrado junto à Fazenda, é suficiente para autorizar e legitimar o redirecionamento da execução fiscal. Trata-se, portanto, de um indício claro de dissolução irregular.

Assim, se a empresa não for encontrada no endereço que fora informado à Fazenda, ou seja, aquele constante do contrato social arquivado na Junta Comercial, a empresa será considerada presumidamente irregularmente extinta. Esse entendimento aumenta as possibilidades de êxito e sucesso na execução fiscal, pois evita que a execução seja frustrada, infrutífera ou, ainda, prescrita por motivo de o Fisco não ter mais contra quem dirigir a cobrança do crédito fiscal.

Ademais, trata-se de presunção iuris tantum, isto é, presunção relativa, na qual se admite prova em contrário. Dessa forma, nada obsta que o sócio, depois de citado, ingresse com o recurso cabível, comprovando a inaplicabilidade do instituo do redirecionamento da execução fiscal, como, por exemplo, comprovando que a empresa continua exercendo sua atividade e que não houve dissolução, entre outras possibilidades. Nesse sentido, veja-se a ementa transcrita abaixo:

TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. EMPRESA NÃO LOCALIZADA. DISSOLUÇÃO IRREGULAR. REDIRECIONAMENTO. RESPONSABILIDADE. SÓCIO-GERENTE. ART. 135, III, DO CTN. 1. A não-localização da empresa no endereço fornecido como domicílio fiscal gera presunção iuris tantum de dissolução irregular. Possibilidade de responsabilização do sócio-gerente a quem caberá o ônus de provar não ter agido com dolo, culpa, fraude ou excesso de poder. (EREsp 716.412/PR)

3.2 FUNDAMENTO DA RESPONSABILIDADE DOS SÓCIOS

O art. 1.103 do Código Civil (BRASIL, 2002) dispõe taxativamente quais os deveres impostos ao sócio-gerente, quando liquidante, para a regular dissolução da sociedade:

Art. 1.103. Constituem deveres do liquidante:

I – Averbar e publicar a ata, sentença ou instrumento de dissolução da sociedade;

II – Arrecadar os bens, livros e documentos da sociedade, onde quer que estejam;

III – Proceder, nos quinze dias seguintes ao da sua investidura e com a assistência, sempre que possível, dos administradores, à elaboração do inventário e do balanço geral do ativo e do passivo;

IV – Ultimar os negócios da sociedade, realizar o ativo, pagar o passivo e partilhar o remanescente entre os sócios ou acionistas;

V – Exigir dos quotistas, quando insuficiente o ativo à solução do passivo, a integralização de suas quotas e, se for o caso, as quantias necessárias, nos limites da responsabilidade de cada um e proporcionalmente à respectiva participação nas perdas, repartindo-se, entre os sócios solventes e na mesma proporção, o devido pelo insolvente;

VI – Convocar assembleia dos quotistas, cada seis meses, para apresentar relatório e balanço do estado da liquidação, prestando conta dos atos praticados durante o semestre, ou sempre que necessário;

VII – Confessar a falência da sociedade e pedir concordata, de acordo com as formalidades prescritas para o tipo de sociedade liquidanda;

VIII- Finda a liquidação, apresentar aos sócios o relatório da liquidação e as suas contas finais;

IX – Averbar a ata da reunião ou da assembleia, ou o instrumento firmado pelos sócios, que considerar encerrada a liquidação.

Infere-se, então, que o ato ilícito, ou ainda, a infração à lei reside no descumprimento de um dever legal atribuído ao sócio administrador pelo Código Civil, o qual, nos casos de dissolução, deve realizar o ativo, pagar o passivo e ratear o remanescente entre os sócios, uma vez que o socio-administrador é a pessoal responsável por promover a regular liquidação da pessoa jurídica.

Contudo, é importante frisar que o mero inadimplemento não corresponde a uma infração à lei tributária, e sim, a dissolução irregular, pois, conforme leciona Coêlho (2010) “na Teoria Geral do Direito, todo descumprimento de dever legal ou contratual, i.e., constitui sempre uma transgressão da ordem jurídica (ordo juris).”

Assim sendo, em apertada síntese, a extinção irregular da sociedade, quando observado que esta extinção decorre de ato contrário à lei, leva à responsabilidade estabelecida pelo art.135, III, do CTN. (BRASIL, 1966)

Todavia, em que pese a adoção desse entendimento pela maior parte da doutrina e da jurisprudência, cumpre destacar que, recentemente, a 1ª e 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª. Região (2008) ressalva de forma veemente a aplicação desse artigo em todos os casos, devendo sempre ser analisado o caso concreto da dissolução irregular da empresa. Vejamos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO.          DISSOLUÇAO          IRREGULAR          NÃO CARACTERIZADA. 1. A responsabilidade pessoal dos dirigentes de pessoas jurídicas, prevista no art. 135 do CTN, não é objetiva, exigindo a configuração de alguma das hipóteses fáticas ali descritas. 2. A dissolução irregular da pessoa jurídica vem sendo admitida, pela jurisprudência, como fundamento          da responsabilidade pessoal        do        sócio-gerente  que administrava quando de sua extinção de fato, mas não tem suporte no art. 135 do CTN, que só cuida da responsabilidade por obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, não abrangendo, portanto, ações ou omissões posteriores ao nascimento da obrigação tributária. 3. A dissolução irregular da pessoa jurídica pode atrair a responsabilidade de seu administrador com fundamento no art. 10 do D 3.708/1919, segundo o qual “os sócios gerentes ou que derem o nome à firma não respondem pessoalmente pelas obrigações contraídas em nome da sociedade, mas respondem para com esta e para com terceiros solidaria e ilimitadamente pelo excesso de mandato e pelos atos praticados com violação do contrato ou da lei”. 4. É dever da pessoa jurídica, em hipótese de extinção, promover sua regular liquidação de acordo com os parâmetros legais, que protegem os interesses dos sócios e dos credores. A ausência dessas formalidades autoriza presumir que ocorreu dissipação dos bens da sociedade, em prejuízo dos credores, justificando o direcionamento da execução contra o administrador omisso. 5. Hipótese em que ausentes elementos concretos para se afirmar ter havido a dissolução irregular da executada, fundamento do pedido de redirecionamento. 6. Agravo não provido. (EREsp: 716412/PR)

Outrossim, pode-se afirmar que o que se verifica é o redirecionamento em razão de infração à lei, notadamente, quando o sócio-gerente não procede à extinção regular da empresa. E essa conduta corrobora para a presunção da ideia de que houve apropriação indevida dos bens da sociedade em benefício do próprio socio-administrador em detrimento da sociedade e seus credores.

3.3 MARCO TEMPORAL PARA O REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL PARA OS SÓCIOS

Tendo em vista tudo o que já fora exposto até aqui, importante ressaltar um dos aspectos que levantam significativo debate, notadamente, a definição temporal, variando entre doutrinadores, as ideias de concepção temporal do ilícito cuja imputabilidade se atribui ao administrador.

O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, não oferece um entendimento consolidado, sendo possível perceber a adoção de três entendimentos distintos para a aferição do marco inicial para a responsabilidade do sócio administrador responsável:

(i) a responsabilidade deve recair sob o sócio-gerente que estava ativo quando da época do fato gerador; (ii) o redirecionamento deve atingir somente o último sócio-gerente da pessoa jurídica (aquele responsável pela dissolução irregular); e (iii) a responsabilização somente deverá ser imputada ao sócio-gerente que exercia a gerência da sociedade empresarial tanto no momento de ocorrência do fato gerador quanto exercia a gerência da sociedade empresarial no momento da dissolução irregular. (STJ, 2020)

Pelo exposto, no próximo capítulo, abordaremos de maneira um pouco mais aprofundada, acerca da terceira corrente descrita acima, analisando seus fundamentos e requisitos.

3.4 GERÊNCIA À ÉPOCA DO FATO GERADOR E DA DISSOLUÇÃO IRREGULAR

A terceira corrente consiste, em síntese, em um tipo de combinação entre as suas correntes anteriores: a responsabilização do sócio-gerente pela dissolução irregular exigiria a sua permanência na sociedade tanto à época do fato gerador quanto no momento da dissolução irregular.

Desta forma, urge inferir que a corrente presume como responsável tributário aquele sócio-gerente que administrou a empresa à época dos fatos geradores, bem como era gerente à época de sua dissolução irregular.

A terceira corrente encontra justificativa para sua existência no julgamento do Agravo regimental no Recurso Especial nº. 1034238/SP (2009), de relatoria da Ministra Denise Arruda, a qual sustentou que a responsabilidade do sócio-gerente deve derivar, concomitantemente, do não pagamento do tributo e da dissolução irregular. Vejamos:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. CONTROVÉRSIA SOBRE A POSSIBILIDADE DE INCLUSÃO DO SÓCIO NO POLO PASSIVO DA EXECUÇÃO FISCAL. SUPOSTA DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE. RESPONSABILIZAÇÃO DO SÓCIO PELA SIMPLES FALTA DE PAGAMENTO DO TRIBUTO. IMPOSSIBILIDADE. FALTA DO NOME NA CDA. NECESSIDADE DE O EXEQUENTE COMPROVAR OS REQUISITOS DO ART. 135, III, DO CTN. 1. (…) 4. O pedido de redirecionamento da execução fiscal, quando fundado na dissolução irregular da sociedade executada, pressupõe a permanência de determinado sócio na administração da empresa no momento da ocorrência dessa dissolução, que é, afinal, o fato que desencadeia a responsabilidade pessoal do administrador. Ainda, embora seja necessário demonstrar quem ocupava o posto de gerente no momento da dissolução, é necessário, antes, que aquele responsável pela dissolução tenha sido também, simultaneamente, o detentor da gerência na oportunidade do vencimento do tributo. É que só se dirá responsável o sócio que, tendo poderes para tanto, não pagou o tributo (daí exigir-se seja demonstrada a detenção de gerência no momento do vencimento do débito) e que, ademais, conscientemente, optou pelo irregular dissolução da sociedade (por isso, também exigível a prova da permanência no momento da dissolução irregular). 5. Agravo regimental desprovido. (AgRResp: 1034238/SP)

Ante o exposto, constata-se que fora ampliada a possibilidade de êxito da execução fiscal, de forma que mesmo os sócios que não integram o quadro social podem ser citados para responder com seus bens particulares, pelos créditos tributários cobrados em execução fiscal.

Significa, portanto, que o tema em questão não diz respeito apenas às partes vinculadas à execução fiscal, mas, definitivamente, abarca a maneira pela qual os doutrinadores e julgadores encontraram de conferir uma maior efetividade às decisões judiciais, devendo-se inferir que no momento do redirecionamento da execução fiscal para os sócios, o próprio ordenamento processual civil acaba por efetivar o cumprimento de determinações judiciais.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nota-se que é legítimo o redirecionamento da execução fiscal contra os sócios, visando o cumprimento efetivo de decisões judiciais, quando do inadimplemento pela dissolução irregular da sociedade, ou seja, um ilícito previsto no artigo 135, inciso III, do CTN (BRASIL, 1966), sendo um instituto eficaz à disposição do Fazenda, pois, além de não afrontar o princípio da autonomia empresarial, permite que haja mais possibilidade de adimplemento de um crédito tributário, e, pode, ainda, alcançar os bens particulares do sócio-gerente que tenha praticado hipóteses legais de responsabilização tributária.

Ademais, conforme exposto, os tribunais passaram a considerar que a responsabilidade do sócio administrador, para os fins do art. 135, III, do CTN, possui presunção relativa, ou seja, depende de comprovação da prática dos atos referidos nesse dispositivo.

Atualmente, o entendimento majoritário é o de que, para o redirecionamento da execução fiscal contra os sócios, exige-se que o inadimplemento do crédito tributário pela empresa deve ter por origem a prática de um ato considerado ilícito (contrário à lei) por parte do sócio-gerente, cabendo ao Fisco o ônus da prova.

Destaca-se, também, que o pedido de inclusão de administrador no polo passivo da execução fiscal deverá ser requerido mediante provas que confirmem a ocorrência da prática de um ato contrário à lei, notadamente, a dissolução irregular da empresa, gerando, assim, a presunção relativa em favor do administrador. Contudo, esclarece-se que mesmo após o requerimento de redirecionamento da execução fiscal pelo Fisco, o sócio-gerente pode defender-se através de Exceção de Pré-Executividade ou, dos Embargos à Execução.

Oportuno ressaltar, ainda, que o STJ já pacificou na Súmula nº 435 que a mudança da sede da empresa sem a comunicação ao Fisco faz nascer a presunção juris tantum da dissolução irregular da empresa, permitindo o redirecionamento do polo passivo da execução fiscal.

Conforme exposto na presente pesquisa, a jurisprudência atribui a responsabilidade ao sócio-gerente à época dos fatos geradores, bem como era gerente à época de sua dissolução irregular. O referido entendimento acaba por ser visto e entendido como o mais razoável, uma vez que além de viabilizar a responsabilidade de um sócio perante terceiros para adimplir com o crédito tributário, leva em consideração o marco temporal para o redirecionamento. Pois, do contrário, qualquer socio gerente de uma sociedade ficaria sempre sujeito à responsabilidade contraída pela Pessoa Jurídica.

Por isso, Rinaldi (2016) expressa a importância do marco temporal na responsabilidade do sócio-gerente, por ser um aspecto extremamente relevante para compreensão e correta aplicação do instituto do redirecionamento da execução fiscal contra os sócios.

Ante o exposto, acerca do tema, todos os fatos e critérios devem ser analisados minuciosamente pelo julgador, a fim de que seja alcançado não só o princípio da efetividade do cumprimento das decisões judiciais, como também sejam observados os limites da desconsideração da pessoa jurídica para o redirecionamento da execução fiscal, sob pena de banalizar essa medida judicial em qualquer hipótese em que a Fazenda não consiga uma execução fiscal frutífera. O que não foi e não é a intenção do legislador.

REFERÊNCIAS

BOMFIM, Pacheco. O redirecionamento da execução fiscal e o incidente da desconsideração da personalidade jurídica. Local: Lumen Juris. 2016. Disponível em: https://www.academia.edu/36614392/O_redirecionamento_da_execu%C3%A7%C3%A3o_fiscal_e_o_incidente_de_desconsidera%C3%A7%C3%A3o_da_personalidade_jur%C3%ADdica> Acesso em: 20/12/2020.

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SABBAG, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

[1] Pós-Graduada Em Direito Tributário.

Enviado: Maio, 2021.

Aprovado: Junho, 2021.

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