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A expressão do futuro do presente na Língua Portuguesa

RC: 69704
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/letras/futuro-do-presente

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

MONKEN, Priscila Mattos [1]

MONKEN, Priscila Mattos. A expressão do futuro do presente na Língua Portuguesa. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 12, Vol. 10, pp. 93-105. Dezembro de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/letras/futuro-do-presente, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/letras/futuro-do-presente

RESUMO

Visto a variedade das categorias linguísticas, identifica-se que o emprego do futuro do presente pode ser enunciado de diferentes formas. Deste modo, este artigo teve como objetivo analisar as formas verbais que expressam o futuro do presente dentro da Língua Portuguesa, verificando a ocorrência e o comportamento deste em cartoons. Posteriormente, em outros estudos, trataremos mais especificamente, na variante dos quadrinhos capixabas dos autores Milson Henriques e Zappa, sob o enfoque da teoria da Variação, apresentada por William Labov. Assim, fazendo uso da metodologia de revisão bibliográfica, analisaremos as três variantes que expressam o futuro de acordo com conceitos abordados por Dubois (2001), Houaiss (2001), Mateus et al (1986), entre outros. Concluímos que, nos quadrinhos, há o uso predominante de perífrase, denotando crença no evento expresso e revelando sentimentos da personagem. Entretanto, há necessidade de continuarmos os estudos a fim de ampliar os conhecimentos sobre a gramática tradicional com foco no futuro do presente.

Palavras-Chaves: Formas verbais, futuro do presente, variação linguística.

INTRODUÇÃO

No português do Brasil, o futuro do presente pode ser enunciado, enquanto categoria linguística, de várias formas, como a sintética (sairei), a perifrástica ou analítica (vou sair) e o presente do indicativo (saio). Cabe ainda citar, embora não sejam foco de nossa pesquisa, as formas modais (devo sair) e as formas triplas (vou começar a sair todas as noites).

Nosso trabalho baseia-se no corpus de quadrinho que será mais desenvolvido em outros estudos. Tal corpus possui uma linguagem escrita que se assemelha à linguagem oral, por ser inovadora e não se limitar a seguir servilmente os ditames da gramática normativa. Analisaremos as três variantes que expressam o tempo futuro, conforme dito acima. Objetivos, então, verificar a ocorrência e o comportamento do futuro do presente nos cartoons para mostrar quais são os contextos que favorecem uma determinada forma linguística, para confrontar posteriormente os dados da pesquisa como os de outras variedades linguísticas, como a linguagem oral em editoriais de jornais. Numa etapa seguinte, vamos analisar o processo de gramaticalização por que passa a construção estudada. Constatamos que a forma sintética é cada vez menos utilizada, já que vemos maior incidência das conjugações perifrásticas que se dispõem em ordem decrescente da intensidade da significação lexical do auxiliar. Notamos, também, que os verbos auxiliares perdem aos poucos a noção de tempo e se tornam modais, uma vez que os verbos na construção do futuro do presente perdem seu sentido pleno e adquirem um caráter de certeza e incerteza, suposição, condição, necessidade, exigência, possibilidade ou impossibilidade de um determinado acontecimento. Essa modalidade é definida por Ingedore Koch e Mário Villaça (2001) como “a gramaticalização das atitudes subjetivas do falante e sua transposição para o conteúdo do enunciado”.

Para um melhor entendimento de nossa pesquisa, esclarecemos alguns conceitos de futuro e tempo: o futuro é definido por Jean Dubois (2001, p. 300) como um “tempo que se situa o enunciado num momento posterior ao instante presente, depois do agora”. Afirma, também, que “o futuro se exprime por combinações de afixos verbais (Ele virá) ou por advérbios (Ele vem amanhã)”.

Para Houaiss (2001), o futuro do presente é um tempo verbal do modo indicativo que situa uma possível ação ou um estado em um instante posterior àquele no qual a fala se situa.

Já o tempo é conceituado por Jean Dubois (2001) como uma categoria gramatical geralmente associada a um verbo e que traduz diversas categorizações do tempo real ou natural. Maria Helena de Mira Mateus et al (1986, p. 104) acrescenta que “no português os tempos naturais são o presente, o passado e o futuro”, faz ainda a observação de que dado que o futuro exprime sempre um valor modal, em línguas em que não está gramaticalizado, é discutível considerá-lo um tempo.

METODOLOGIA

A TEORIA SOCIOLINGUÍSTICA

Todas as línguas, em qualquer momento histórico e em qualquer lugar, jamais serão iguais -uniformes-, sendo sua característica essencial a heterogeneidade. Se viajarmos pelo Brasil, poderemos observar distintos modos de falar que revelam divergências fonéticas, sintáticas, morfológicas, lexicais, semânticas, pragmáticas. Existem, sim, semelhanças, todavia as formas diferentes de expressar o que pensamos nos permitem avaliar os modos de falar como formas diversas de se expressar.

Mesmo quando estudamos os modos de falar das pessoas de um mesmo local, percebemos que a variedade da língua apresenta diferenças que correspondem a uma diversidade social como a origem geográfica, sexo das pessoas, etnia.

Os jeitos de falar dos brasileiros cultos varia também. No entanto, apresentam traços comuns significativos por serem falados por pessoas com formação superior de educação formal. Os falantes cultos, expostos à norma padrão constantemente, buscam, não raro, aproximarem-se de um ideal de língua culta que denominamos padrão.

O estudo das relações entre as variantes sociais e linguísticas que caracterizam determinado fenômeno linguístico chama-se sociolinguística. O advento dessa teoria -Sociolinguística- aconteceu na década de 60 nos Estados Unidos, sobretudo graças aos trabalhos de Labov, os quais nos mostram que a língua muda e varia, acentuando a inadequação de teorias linguísticas as quais tratam a língua como imutável. O objetivo da sociolinguística, conforme em Alkmin (2001), é estudar a língua falada em situações reais de uso.

Segundo Labov (apud TARALLO, 1990), o termo Sociolinguística é redundante, já que todo estudo da linguagem é -ou deveria ser- social, pois a linguagem é um acontecimento social, que baseia todas as sociedades. Labov, desde suas pesquisas iniciais, relaciona fenômeno linguístico a fato social. Assim, nota-se que a variação linguística existente pode ou não possuir um caráter estigmatizado ou, ao contrário, de prestígio social. De acordo com Scherre (2000), na língua portuguesa, muitos fenômenos como a ausência de concordância -nominal, verbal- é estigmatizada, enquanto usos como o do imperativo não o é. Verificamos que o uso da forma perifrástica para indicar o futuro do presente não é estigmatizado, sendo, inclusive, utilizado com frequência em textos escritos.

Interessa à Sociolinguística verificar que fatores influenciam o uso da forma sintética para indicar o futuro do presente e de suas variantes, no caso a forma perifrástica (ir + infinitivo) e do presente do indicativo. Para essa análise, a sociolinguística variacionista utiliza um programa estatístico, o Varbrul 2S, que permite calcular os fatores que mais atuam sobre o fenômeno em questão.

A VISÃO SOBRE O FUTURO DO PRESENTE EM ALGUMAS GRAMÁTICAS DA LÍNGUA PORTUGUESA

As Gramáticas Normativas do português enumeram alguns usos dos tempos verbais sem aludir aspectos subjacentes ao seu significado e a seu funcionamento, relacionando intimamente tempo verbal a tempo cronológico, mesmo diante de usos verbais em que não existe essa relação. Voltam-se para a língua escrita, pois ditam regras para regular e medir a língua escrita literária, sem considerar as variações linguísticas, como a alternância da forma sintética de expressão de futuro (farei) pela forma perifrástica (vou fazer). Assim, não oferecem um estudo completo sobre os verbos, visto que suas considerações, apesar de terem contribuído muito para o estudo que hoje nos propomos, são insatisfatórias. Partindo da detecção desse aspecto, utilizamos a gramática descritiva e a gramática funcionalista para se contraporem à visão tradicional da língua. A Gramática Funcionalista, segundo Maria Helena de Moura Neves (1997), tem seu interesse voltado para a verificação de como se obtém a comunicação de uma língua, o que implica considerar as estruturas das expressões linguísticas como configurações de funções, sendo cada uma dessas vistas como um diferente modo de significação na oração. Desse modo, as várias formas do futuro são analisadas aí tendo como referência parâmetros como cognição e comunicação, processo mental, interação social e cultura, mudança e variação, aquisição e evolução.

Na Gramática de Ingedore Koch e Mário Villaça (2001), vemos que o verbo serve para marcar a posição que os fatos enunciados ocupam no tempo, e que este enquanto categoria gramatical, é realizado exclusivamente pelo verbo e, enquanto categoria nocional, por morfemas, lexemas e outras expressões. Os autores contribuem para o estudo do futuro ao diferenciarem a forma simples e composta, acrescentando à visão tradicional a noção de aspecto. Assim, o futuro simples é tido como tempo mais linear, pois indica fatos posteriores ao momento da enunciação, enquanto o futuro composto é usado para exprimir o futuro como acontecimento acabado, não indicando propriamente relações temporais.

Na gramática descritiva, tentam-se explicar os mecanismos linguísticos que envolvem determinados usos das formas analítica e sintética do futuro do presente.

Nossa pesquisa é sobre o viés da análise linguística proposta por Labov, na qual temos variantes linguísticas que, de acordo com Tarallo (1990), são maneiras diferentes de dizermos a mesma coisa em um mesmo contexto sem alteração semântica. Verificamos, sob tal ótica, a preferência de algumas formas em vez de outras, isso acontece porque a linguagem expressa não só o indivíduo por seu caráter de criação, mas também o ambiente social por seu caráter de repetição, de aceitação de norma.

O CORPUS DA PESQUISA: A ANÁLISE DOS QUADRINHOS

Penha Lins (2002), em seus estudos sobre os textos de quadrinhos, diz que esses são uma modalidade própria da linguagem e que operam com dois códigos de signos gráficos: a imagem e a linguagem escrita. Dos elementos que compõem os quadrinhos, o que dá mais dinamicidade ao texto são os balões, que, segundo a autora, ampliam o nível de significação. Lyyten (1985) lista, além do mais utilizado, o balão-fala, outros como o balão-pensamento, balão-berro, balão-medo, e esclarece que palavras e expressões são economizadas pelos efeitos deste ou daquele balão.

A onomatopeia aparece nos quadrinhos associada a uma figura ou situação, complementando, assim, a linguagem e facilitando a interpretação ou a indução dessa.

Moya (1977) fala sobre a inclusão de palavras no campo imagético dos quadrinhos. Afirma que as palavras sofrem um tratamento plástico, passam a ser desenhadas, tornando-se elementos importantes para o texto.

As tiras de quadrinhos são publicadas diariamente em páginas internas de jornal e suas narrativas são estruturadas a partir de códigos, do linguístico e do visual. Essa linguagem tão inovadora que junta visual com verbal, que nos aproxima da língua falada, de uma realidade social e que muitas vezes nos revela humor, é a base ideal para nossos estudos de variação do uso do futuro do presente, porquanto os quadrinhos nos oferecem um estudo sobre uma linguagem escrita que por se aproximar da oral nos permite entrar em um universo criativo e ao mesmo tempo preso a regras gramaticais.

A PERÍFRASE IR + INFINITIVO

O uso da forma perifrástica para designar o futuro do presente é pouco discriminado no português. Cada vez mais os falantes da língua portuguesa optam pelo uso da perífrase ir + infinitivo no lugar do futuro, o que nos conduz à crença de que estamos diante de um processo de gramaticalização da perífrase.

A forma perifrástica está entrando na língua falada para codificar a modalidade inerente ao tempo futuro e codificar aspecto aos poucos.

O futuro não permite a expressão de uma modalidade factual, visto que possui um valor temporal, o qual só aceita asserções conforme a avaliação da possibilidade ou da impossibilidade que o falante faz sobre a ocorrência de um estado de coisas. Neste sentido, tal circunstância compromete a determinação do valor de verdade da suposição quando ela é enunciada, permitindo afirmar que sempre existe um valor modal ligado ao valor temporal.

Para expressar o futuro, o falante utiliza várias formas verbais, como o presente do indicativo, o futuro do presente do indicativo e a forma perifrástica, a qual é raramente prevista nas gramáticas tradicionais.

Comumente o verbo ir + infinitivo é considerado como auxiliar temporal, o qual indica futuro, no entanto, com menos frequência, temos o verbo ir como auxiliar de aspecto ou como verbo modal. Estudiosos consideram o verbo ir como modal, exceção de Almeida (1980), não justificam tal classificação. Temos, assim, um questionamento em torno do futuro, se este pertence à categoria de tempo ou à categoria modo. Tradicionalmente, vemos como categoria tempo, como afirma Siqueira (1987) e Silva (1997), que consideram os verbos modais, no máximo, como exceção. Outros estudiosos, como Mattoso Câmara Jr., veem a expressão modalidade como básica e a de tempo como derivada. Deste modo, defende Câmara (1957, p. 223), apresentando argumentos funcionais e diacrônicos: “o advento da categoria de futuro não é determinado pela necessidade da expressão temporal, concretizam-no certas necessidades modais, de sorte que o futuro começa como mudo”. Eugenio Coseriu (1957) mantém uma posição intermediária, considerando que o futuro vivido é realmente um tempo modal. Maria Carlota Rosa (1994), por sua vez, estabelece a distinção entre futuro e futuridade, sendo o primeiro uma categoria morfológica, conforme verificamos nos morfemas indicadores daquele tempo verbal, e a futuridade uma noção que designa o futuro do presente do modo indicativo como modo e não como tempo verbal. Sten (apud ROSA, 1999) considera a temporalidade básica no futuro e fala de certos usos modais, que considera derivados da função temporal.

Questionamos se, no caso do verbo ir + infinitivo, a designação de futuridade é a sua função primordial, indicada por seu aspecto morfológico de auxiliar, ou se o “ir” designa futuridade pela própria semântica do verbo, sendo, portanto, um fato secundário, como nos verbos modais dever e ter de que são considerados auxiliares temporais por Ilari (1997).

IR NO SISTEMA DOS VERBOS MODAIS NUMA DESCRIÇÃO ACIONAL

Em uma análise da semântica do verbo ir + infinitivo, sob o ângulo da Teoria da Ação, verificamos que ir se insere, com exceção do uso no pretérito perfeito do modo indicativo, no sistema semântico dos verbos modais, e isso nos dois usos que chamamos de orientação acional e epistêmico. No âmbito da Teoria de Ação, elaborada para os verbos modais do alemão, por Brunner Redder (1983), que é também aplicável aos verbos modais da Língua Portuguesa, os verbos modais no emprego não-epistêmico fazem parte de dois conjuntos semânticos: um conjunto que designa objetivos acionais (pertencem a este subconjunto, em português: ir, querer, desejar, pretender, tencionar, pensar em, gostar de, haver de) e o outro conjunto qualifica e pondera alternativas de ação (poder, saber, ser capaz de, dever, precisar de, ter de, ter que, e, como verbos modais impessoais: caber, convir, cumprir, dar para, haver que, relevar, ser de, ser lícito, ser mister, ser necessário, ser possível, ser precioso).

Os verbos modais que designam um objetivo acional se diferenciam entre si quanto aos seguintes aspectos:

– Posição nas frases do processo de ação

– (não) Identidade entre agente formador do objetivo acional e agente realizador de objetivo acional

– Certeza do objetivo acional

-Questão se o objetivo acional está situado dentro ou fora do espaço controlado pelo agente.

Os verbos modais que qualificam e ponderam alternativas de ação se diferenciam na tematização de três questões:

– A questão na qual se baseia a existência da alternativa de ação em questão;

– A questão de qual é o peso atribuído à alternativa de ação em questão, em relação às outras alternativas possíveis, presentes no estoque de conhecimentos dos parceiros de comunicação;

– A questão de que resulta o peso atribuído à alternativa de ação em questão.

Os verbos modais epistêmicos diferenciam-se:

– Quanto à gênese da qualificação epistêmica, se é evidencial (pretender e parecer) ou inferencial (poder, dever, ter de ter que e não precisar);

– Quanto ao tipo da inferência responsável pela fonte da evidência;

– Quanto à probabilidade do estado de coisas tematizadas (apenas os verbos modais epistêmicos-inferenciais)

 FUTURO DO PRESENTE: VISÃO SOCIOLINGUÍSTICA

Conforme visto na seção referente à metodologia, a Sociolinguística Laboviana se propõe a estudar a relação existente entre a língua e a sociedade, considerando o sistema linguístico como heterogêneo, porém passível de sistematização. Interessa à Sociolinguística verificar a existência de formas variantes e se tais formas tendem a se tornarem uma mudança ou não. Yacovenco (2002) pondera que, ao estudar um fenômeno em variação ou mudança, é preciso que se sigam as seguintes etapas: restrições; encaixamento, avaliação e transição; implementação. Na fase das restrições, estabelecemos as variáveis, sociais ou linguísticas, as quais influenciam o fenômeno analisado. No caso do futuro do presente, tomando por base o estudo de Gibbon (2001), estabelecemos as seguintes variáveis linguísticas: modo verbal, tipo semântico do verbo, pessoa do discurso, influência dos verbos auxiliares, marcas de futuridade. Acrescentamos o fator paralelismo como atuante sobre o uso de uma das variáveis independentes.

Na etapa denominada encaixamento, analisamos como a variação e mudança afeta a gramática de uma língua. Ainda nessa fase, ocorre a avaliação, que se refere “ao estudo sobre as mudanças e seus efeitos sobre a estrutura linguística e a eficiência comunicativa” (YACOVENCO, 2002, p. 158). Para tanto, fundamentamos a pesquisa no Funcionalismo Americano, para que se procure explicar, com base nos preceitos dessa teoria, a gramaticalização da forma perifrástica. Essa etapa será mais desenvolvida em trabalhos futuros.

A transição e a implementação referem-se à mudança linguística propriamente dita. A primeira verifica os estágios intermediários entre a variação e a mudança, enquanto a segunda procura avaliar quais são os fatores envolvidos na efetivação da mudança linguística.

Analisaremos, a seguir, os fatores linguísticos que influenciam o uso do futuro do presente na Língua Portuguesa.

MODO VERBAL

De acordo com Gibbon (2003), a perífrase tende a aparecer vinculada aos tempos do modo indicativo e é inibida pelo subjuntivo, uma vez que este modo é tido como o da incerteza, da dúvida e da hipótese, ao passo que o indicativo marca a certeza sobre a asserção. Gibbon verifica, então, a influência do modo do verbo da oração vinculada sobre o uso da forma perifrástica. Segundo alguns autores (MATEUS et al., 1993 apud GIBBON, 2003), a forma perifrástica deveria ser interpretada como modal, expressando certeza quanto à realização do fato expresso na asserção. Entretanto, notamos que, por o modo indicativo exprimir a modalidade, a indicação de tempo futuro é expressa pela forma perifrástica, estando, portanto, essa forma em processo de gramaticalização, não lhe cabendo totalmente a função de codificar tempo, pois sua motivação inicial seria assinalar a modalidade.

TIPO SEMÂNTICO DO VERBO

Conforme salienta Gibbon (2003), os verbos, que se caracterizam por indicar movimento, restringem o uso da forma perifrástica para indicar o futuro do presente, pois, caso ocorresse o uso da perífrase, haveria uma marcação dupla de movimento. Assim, verbos com denotação de movimento são mais propensos ao uso do presente ou da forma sintética para indicar o futuro do presente. Por outro lado, observamos (GIBBON, 2003) que o principal fator condicionante do uso da forma perifrástica é o caráter estático do verbo, tanto na oração vinculada ao dado quanto no próprio verbo principal que faz par com o IR na perífrase.

PESSOA DO DISCURSO

Conforme o estudo de Gibbon (2003), um dos fatores condicionantes do uso da forma perifrástica é a participação de interlocutores, isto é, a presença da primeira e segunda pessoa do discurso, uma vez que, ao lado da noção de temporalidade, há, como já afirmado, a noção de modalidade na expressão do futuro pela forma analítica. Uma das questões abordadas é a de que a presença de interlocutores favorece a expressão de certeza e demais intencionalidade, na enunciação, daí o favorecimento da forma perifrástica. Contrariamente, o fator que inibe essa forma é o uso da terceira pessoa do discurso, possivelmente por ser uma forma que não envolve participantes da interação, não havendo, portanto, o comprometimento com o enunciado.

CONCLUSÕES PARCIAIS

Acreditamos que nos quadrinhos, devido ao nosso estudo inicial, tenhamos mais o uso da perífrase, denotando mais crença no evento expresso pelas personagens como também revelando sentimento. Notamos que em situação de maior informalidade a perífrase é muito utilizada e assim, no gênero híbrido dos quadrinhos, achamos que essa seria uma justificativa da escolha por tais formas de expressão.

Ao iniciarmos nossa pesquisa, sentimos necessidade de ampliarmos o conhecimento sobre as propostas das gramáticas tradicionais a respeito da expressão do futuro do presente. Em razão disso, continuaremos nossos estudos em prol de um ensino mais humanizado e para vida, o qual rompa com a dinâmica de repetir e reproduzir conteúdo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BECHARA, Evanildo. Moderna gramática da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Lucerna, 2002.

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CUNHA, Celso e CINTRA, Lindley. Nova gramática do português contemporâneo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,2000.

GIBBON, Adriana de Oliveira. A expressão do tempo futuro na língua falada de Florianópolis: gramaticalização e variação. Boletim da Abralin. N 26, vol. 2, 2003:29-32.

GIBBON, Adriana de Oliveira. A gramaticalização da forma perifrástica (ir+infinitivo) como codificadora do tempo futuro: o percurso a partir de fatores semânticos, discursivos e sociais. Cadernos do CNLF, série IV, n7, 2000 (versão on-line).

JOHNEN, Thomas. Da integração semântica de ir + infinitivo no sistema dos verbos modais numa perspectiva de descrição semântica no âmbito de uma teoria de ação. Filologia e linguística portuguesa. São Paulo, Humanitas, V. S, pl143-176, 2003.

LINS, Maria da Penha Pereira. O humor em tiras de quadrinhos: uma análise de alinhamentos e enquadres em Mafalda. Vitória: Grafer,2002.

LUFT, Celso Pedro. Moderna Gramática Brasileira. São Paulo: Globo,2000.

MATEUS, Maria Helena Mira et al. Gramática da língua portuguesa. Coimbra: Almedina,1983.

NEVES, Maria Helena de Moura. A gramática funcional. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

NEVES, Maria Helena de Moura. A gramática funcional. São Paulo: Martin Fontes, 2001.

NEVES, Maria Helena de Moura. Gramática do português falado. Vol. VII. São Paulo: editora da UNICAMP, 1999.

VILELA, Mário e KOCH, Ingedore Villaça. Gramática da Língua Portuguesa. Coimbra: Almedina, 2001.

[1] Mestrado em Cognição e Linguagem. Especialização em Revisão de textos. Graduação em Letras Português.

Enviado: Dezembro, 2020.

Aprovado: Dezembro, 2020.

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Priscila Mattos Monken

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