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O Direito Sistêmico no âmbito da Educação Jurídica – Uma análise da aplicabilidade da técnica de Constelação Familiar Sistêmica como meio de resolução de conflitos

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CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

SILVA, Mário Augusto Paixão Da [1], JUNIOR, Nelson Saule [2]

SILVA, Mário Augusto Paixão Da. JUNIOR, Nelson Saule. O Direito Sistêmico no âmbito da Educação Jurídica – Uma análise da aplicabilidade da técnica de Constelação Familiar Sistêmica como meio de resolução de conflitos. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 08, Vol. 09, pp. 05-23. Agosto de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/direito-sistemico

RESUMO

O presente trabalho faz uma análise sobre a repercussão da inserção do Estudo Sistêmico das Constelações Familiares no Direito e a sua utilização para operadores da lei na prática dos fóruns e tribunais como meio de resolução de conflitos. Compõe-se por pesquisa científica que faz uso de materiais históricos e qualitativos, tendo sido efetuada através de pesquisas em livros, revistas, boletins, sites e jurisprudências disponíveis sobre a matéria. O tema abordado trata da possibilidade de apresentar o Direito Sistêmico enquanto novo método para resolução consensual de conflitos no Poder Judiciário. O objetivo do trabalho é expor um comparativo de resultados e demonstrar a eficácia alcançada pelos julgamentos dos casos familiares quando da utilização do método sistêmico. A principal intenção é apresentar dados que mostram que as decisões do poder judiciário, tão somente, não conseguiam alcançar o resultado esperado no Direito de Família acarretando problemas supervenientes entre as partes que não ficavam satisfeitas e não entendiam que seu problema estava resolvido, voltando assim a promover novas demandas no judiciário. Através de estudos e resultados dos processos judiciais, pode-se verificar que as sentenças proferidas através da utilização do método sistêmico entre as partes, por meio da constelação familiar, conseguiram alcançar, de maneira objetiva e subjetiva, todos os envolvidos, de modo que, além de reduzir, de maneira mais célere, o número de processos existentes nas varas da família, igualmente diminuiu a distribuição de novas demandas. Por fim, o que se espera demonstrar neste trabalho é que o Direito Sistêmico consegue levar aos indivíduos um senso de justiça mais completo do que os métodos tradicionais vêm apresentando para a sociedade e, assim, considerar a possibilidade de ampliação desta técnica e inserção do método em outras jurisdições que atuam em Direito de Família, bem como no currículo de formação dos profissionais do Direito.

Palavras chaves: Constelação Familiar no Direito, direito sistêmico, Direito de Família, bens jurídicos tutelados, resolução de conflitos.

1. INTRODUÇÃO

Inexoravelmente, a vida é feita de conflitos. Diversos estudos científicos na área da psicologia e educação demonstram que é preciso abandonar os discursos sobre a paz e a harmonia no ambiente escolar enquanto objetivos idealizados. Conforme Perrenoud (PERRENOUD, 2000) mais produtivo é pensar os conflitos como expressão de uma capacidade de recusar e de divergir que está no princípio de nossa autonomia e da individualização de nossa relação com o mundo.

Dessa forma, entende-se que o conflito é um importante mecanismo de transformação, à disposição dos educadores, na medida em que pode ser convertido em um componente da ação coletiva. Nesta medida, cada professor funciona como uma espécie de mediador, capaz de antecipar e atenuar os confrontos decorrentes do conflito em grupo. Esse trabalho é essencialmente preventivo, consistente em impedir que as divergências se convertam em reações violentas ou fora de controle.

Para Perrenoud, uma das competências dos professores seria exatamente trabalhar o restabelecimento da Lei (com letra maiúscula), com foco na prevenção da violência que permite a vida em sociedade. Na visão do sociólogo, seria competência de os professores instaurar a Lei, não como uma autoridade instaura a não-violência, através da ameaça de uma violência legítima, mas pelo livre consentimento, pelo reconhecimento dos alunos de que a vida seria intolerável se cada um fosse o inimigo de todos. Em suma, através de uma redescoberta do contrato social caro a Rousseau (IDEM, 2008).

É evidente para o cientista social que os professores não podem contentar-se em lembrar aos alunos que a “violência não compensa”, mas devem avançar rumo à construção de pontes relacionais. De modo que lutar contra a violência na escola exige além da retórica uma elaboração coletiva para a ressignificação dos atos de violência que nos circundam.

Este processo permite que os alunos possam atribuir um novo significado a acontecimentos traumáticos através da mudança de sua visão de mundo, limpando a memória emocional de determinadas situações. Esse novo significado que se dá tem a ver com a liberação da carga emocional ou energia densa que ficou de alguma experiência vivida.

Logicamente, o professor não tem a obrigação de dar conta de todo esse trabalho, todavia, como mediador natural do grupo, ao exercitar a sua sensibilidade de observação, tem condições de identificar possíveis situações de conflito e encaminhá-las para outras esferas de resolução, como o atendimento psicopedagógico em estabelecimentos que disponibilizam este serviço.

É neste cenário que se insere a possibilidade de aplicação da constelação familiar sistêmica, um método de visualização e resolução de conflitos criada pelo filósofo e psicoterapeuta alemão Anton Suitbert Hellinger.

Trata-se de uma psicoterapia de tipo breve que enfatiza as emoções e as energias do inconsciente, trabalhadas como um sistema. Nesta perspectiva, a dinâmica da constelação demonstra que existe uma ligação inconsciente capaz de influenciar mutuamente as pessoas dentro de um sistema: seja ele uma família, uma escola, uma empresa, uma repartição pública, uma cidade ou até um país. Para Possato (2008) esta ligação, quando não está ajustada, gera conflito, dor e dificuldades de relacionamento. Ao passo que, estando ajustada, naturalmente, cada indivíduo busca a sua realização pessoal, de forma independente, respeitando os outros, mas sem se deixar influenciar pelas atitudes alheias.

Preza-se, portanto, pela liberdade individual, na medida em que cada um deve exercer os seus papéis equilibrando dois fiéis da balança, o ato de dar e o ato de receber nas relações. É somente dessa forma que as pessoas e os grupos obtêm a harmonia e o equilíbrio (POSSATO, 2008).

O método desenvolvido por Bert Hellinger (2006) é baseado em três leis sistêmicas denominadas ordens do amor, que são o direito ao pertencimento, a ordem de precedência e o equilíbrio entre dar e receber. A partir dessas três leis derivam inúmeras outras, que podem ser observadas em qualquer relacionamento – principalmente quando ocorre a crise ou conflito, decorrente da violação de alguma das leis sistêmicas.

De acordo com a elaboração de Bert Hellinger (2006), o direito ao pertencimento revela a importância de cada indivíduo em seu sistema de origem. De modo que todos têm direito a pertencer ao sistema, com forte valorização dos vínculos intergeracionais. Quando esses vínculos são quebrados ou não são reconhecidos ocorre um desequilíbrio no sistema, a partir dos quais surgem os conflitos.

A ordem de precedência ou hierarquia diz respeito a quem chegou primeiro na família, considerando os mais velhos, bisavós, avós, pais, que devem ser tratados com respeito, pois foi através deles que houve a manutenção da família sistêmica. Esta ordem coloca em primeiro plano aqueles que chegaram primeiro para manter o equilíbrio do sistema.

Já a lei do equilíbrio entre dar e receber é baseada no entendimento de que todo ser é dotado da capacidade de troca. Oferece a outros os seus dons, capacidades e habilidades e recebe de volta na mesma proporção o que é importante para satisfazer as suas necessidades de sobrevivência, crescimento e desenvolvimento. Quando o indivíduo dá mais do que recebe emergem conflitos em função do desequilíbrio do sistema. Uma das formas de manter o equilíbrio, então, é por meio da gratidão. Ao reconhecer e agradecer o que está recebendo, o indivíduo é capaz de retribuir ao outro na mesma proporção.

Como veremos mais adiante neste artigo, a Constelação Familiar Sistêmica ganha cada dia mais espaço e relevância como método de resolução de conflitos no poder judiciário, por meio de uma elaboração específica, denominada Direito Sistêmico.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1 DIRETRIZES DO DIREITO SISTÊMICO

O termo Direito Sistêmico foi criado pelo juiz Sami Storch (2013), do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia – TJBA. Em sua atuação no poder judiciário, ele utiliza as constelações familiares sistêmicas como método de resolução de conflitos.

O magistrado destaca que o Direito Sistêmico não é um novo ramo do direito, mas representa uma evolução natural da ciência dos relacionamentos, que ganhou visão sistêmica através da obra de Bert Hellinger (2006). Na prática, segundo o próprio juiz, é a aplicação da ciência jurídica com um viés terapêutico, ou seja, a utilização das leis para tratar questões geradoras de conflitos sob a ótica das constelações familiares.

O primeiro passo para a aplicação do direito sistêmico nas atividades jurisdicionais do magistrado, que atua na Comarca de Valença, no interior do Estado da Bahia, foi adaptar algumas práticas na condução das conciliações, nas audiências e no uso da palavra pelas partes e advogados. No momento seguinte o magistrado decidiu promover palestras vivenciais, convidando as partes em litígio que tinham processos em sua vara a participarem de Constelações Familiares de forma voluntária, encontros realizados no próprio fórum.

A eventual negativa ao convite não interfere no andamento ou no resultado do processo, que segue o seu rito normal, mas o doutor Sami Storch (2013) faz questão de frisar. “Mas, se vierem, têm muito a ganhar”.

Com a realização desses encontros, anteriores às audiências de conciliação, foram obtidos resultados promissores, com alto percentual de acordos firmados. Tudo porque as pessoas começaram a participar de dinâmicas e vivências em que podiam olhar para os seus conflitos sob um outro ângulo. Segundo o Conselho Nacional de Justiça em 100% dos processos dos quais as partes constelaram houve acordo.

A Justiça na Bahia avança firmemente com a conciliação, alavancando sua produtividade a cada edição da SNC, ainda que limitada esta ótica à esfera da justiça estadual, vem ocupando sempre as primeiras colocações do ranking nacional e em apenas 4 anos incrementou o número absoluto de acordos na ordem de 500%, atingindo-se, ao final de todas as edições ocorridas, a cifra expressiva de 54.438 acordos, que imperiosamente propiciam, pelo fim do custo de oportunidade da sua existência, outros 54.438 processos voltarem a tramitar (VIVAS, 2011, p. 43).

Desta forma, o Direito Sistêmico nasceu com a perspectiva de auxiliar na resolução de conflitos e atualmente já é aplicado em tribunais de pelo menos 16 Estados e no Distrito Federal, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça. Este movimento mobiliza juízes, mediadores, promotores, advogados, defensores públicos e servidores do poder judiciário, garantindo aos jurisdicionados uma forma rápida e eficiente de solução dos seus problemas.

Atualmente o Direito Sistêmico, através das constelações familiares, já é aplicado em diversas áreas, como no Direito de Família (em processos de divórcio, guarda e pensão alimentícia), Direito Penal (em casos de violência doméstica, constelações com agressores, vítimas e agentes do Estado; em constelações com adolescentes autores de atos infracionais, suas famílias e vítimas), mas o juiz Sami Storch (2016) destaca um exemplo extraído do Direito de Família para demonstrar a importância da aplicação do Direito Sistêmico.

Numa ação de divórcio, a solução jurídica relativa aos filhos menores pode ser simplesmente definir qual dos pais ficará com a guarda, como será o regime de visitas e qual será o valor da pensão. É o que usualmente se faz. Mas de nada adiantará uma decisão judicial imposta se os pais continuarem se atacando. Independentemente do valor da pensão ou de quem será o guardião, os filhos crescerão como se eles mesmos fossem os alvos dos ataques de ambos os pais. Uma ofensa do pai contra a mãe, ou da mãe contra o pai, são sentidas pelos filhos como se estes fossem as vítimas dos ataques, mesmo que não se deem conta disso. Sim, porque sistemicamente os filhos são profundamente vinculados a ambos os pais biológicos. São constituídos por eles, por meio deles receberam a vida (STORCH, 2016)

Nesta senda, o Direito Sistêmico trabalha e interpreta os conflitos ocultos das partes, pois cada uma delas tem um motivo particular para estar envolvido daquela forma (ou como vítima, ou credor, devedor, agressor). Esses motivos ocultos podem ter raízes profundas, que não necessariamente estarão no processo ou relacionadas ao outro polo da relação processual, mas ligados por vínculos ao passado familiar de cada um, inclusive de gerações anteriores.

Acredita-se que o Direito Sistêmico pode ser exercido por todos os aplicadores do direito porque representa uma nova postura diante das demandas do dia a dia profissional, como explica o Procurador de Justiça aposentado do Ministério Público do Mato Grosso do Sul, Amilton Plácido da Rosa.

A primeira forma de aplicação do Direito Sistêmico é a postura. Aqui não se busca mudar o “o que fazer”, mas o “como fazer”. O Operador do Direito pode continuar a fazer as mesmas coisas, porém agora as fará com uma postura diferente, com uma postura respeitosa, sistêmica e fenomenológica, levando em conta as três leis inconscientes que regem todos os sistemas vivos.

Dessa forma, o juiz, o advogado, o promotor e o defensor público olharão as partes com outros olhos, procurando, sem julgamento, descobrir qual ou quais leis sistêmicas foram violadas por elas e/ou pelo sistema delas para que elas chegassem àquele conflito.

A partir daí, aplica-se as intervenções sistêmicas necessárias, ali mesmo na audiência ou se aconselha a realização de uma constelação familiar, caso seja necessário e de interesse das partes envolvidas.

Quando um juiz recebe as partes e seus advogados com essa postura, de respeito e amor, a audiência ocorre de uma forma harmônica e conciliadora. Todos sentem o respeito que reina no ambiente e percebem que dali sairá um bom resultado para todos os envolvidos no problema. É um ir ao âmago da questão. É um ir à alma dos seres humanos, para obter uma conciliação do coração de cada um dos envolvidos no conflito.

Enfim, o segredo é abrir-se para o sentir, para o coração, e estudar a fundo as abordagens sistêmicas, de modo a estar, nas audiências, e em todas as situações da vida, numa postura amorosa e sistêmica. Eis aí o segredo: quando estamos nesta postura o essencial surge, levando-nos a solução verdadeira (ROSA, 2016).

O jurista adepto de uma postura sistêmica não está obrigado a constelar. A constelação é apenas um dos procedimentos desta ciência psicoterapêutica. As comarcas que atuam com o Direito Sistêmico, geralmente oferecem às partes, em momento posterior ao recebimento da ação, palestras vivencias, oficinas sistêmicas e outras práticas sistêmicas que contemplam o método das constelações familiares.

As constelações são organizadas pelos temas dos processos – por exemplo, partes de processos de divórcio ou disputa de guarda de filhos participam de uma constelação. Demandantes de um processo de violência doméstica participam de outra e assim por diante.

Nestes encontros, as partes são acolhidas pela equipe da comarca e, em ambiente coletivo, são levadas a refletir sobre temas comuns entre elas, seja divórcio, guarda, alimentos, partilha de bens, procedimentos da Lei Maria da Penha, inventários, violências praticadas por menores infratores e agentes em geral, dentre outros.

A pessoa que se dispõe a colocar sua questão para ser constelada informa em qual tipo de processo está envolvida e quantos filhos tem em comum com a outra parte. Em respeito ao segredo de justiça que rege os procedimentos da Vara da Família, o juízo não permite que as partes falem detalhes ou nomes, para não expor intimidades naquele âmbito.

As constelações seguem o modelo tradicional, sempre com uso de representantes para evitar exposição pessoal de quem se dispõe a colocar a sua questão para análise. Às vezes, conforme o caso, ao final, as próprias pessoas envolvidas são convidadas a assumir seus lugares na constelação.

Em cada sessão são colocadas somente duas ou três constelações e o juiz prioriza temas com os quais as outras pessoas possam se identificar, no caso da comarca em análise, aqueles que tratam basicamente sobre a relação do casal e as causas da crise, bem como da posição e postura em relação aos filhos, tirando-os do cerne do conflito e liberando-os do peso decorrente do conflito.

O diagrama a seguir, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça, detalha o método de realização das constelações familiares sistêmicas no âmbito do poder judiciário.

Figura 01 – Constelação Familiar

Fonte: Site CNJ.

A partir de agora serão descritos os procedimentos adotados pelo criador do Direito Sistêmico no seu trabalho diário atualmente à frente da Vara Cível de Valença, cidade localizada a 124 quilômetros de Salvador/BA.

No estudo de caso a seguir, descreveremos a técnica da constelação familiar aplicada para a resolução de um conflito envolvendo uma senhora que recorreu ao poder judiciário por meio da Defensoria Pública para pedir a internação compulsória de sua filha para tratamento de dependência química.

A mulher foi atendida pelo juiz Sami Storch. A constelação é realizada no auditório do fórum. Após uma conversa inicial, algumas das 120 pessoas presentes são chamadas para representar o caso. Estão presentes na sessão de constelação a autora do pedido de interdição, no caso, a mãe, junto com o marido, e a filha interditada. O curioso é que neste atendimento realizado na Comarca de Valença, até a droga causadora da dependência da jovem (o crack) ganhou representação e também foi interpretada por uma pessoa.

Dentro da dinâmica, todos começam a interagir, conduzidos pelo magistrado. Após a costumeira explicação sobre as ordens sistêmicas, o juiz Storch (2015) iniciou uma meditação explicando aos presentes como funcionam as constelações.

No momento seguinte, a mãe da jovem dependente química procurou o juiz e se voluntariou para participar da constelação e representar a si mesma durante a dinâmica. A mulher estava acompanhada de uma assistente social, já ciente de seu caso.

A filha desta senhora era viciada em crack e por causa da dependência química desenvolveu transtornos mentais. A mãe relata que ela ameaçava e agredia pessoas na rua com uma faca e quebrava tudo dentro de casa. Não havia meios de fazê-la aceitar qualquer ajuda ou tratamento médico, se recusando a tomar os remédios receitados. Sem alternativas, a mãe entrou na Justiça para obrigar a filha a se internar numa clínica de recuperação e desintoxicação. A liminar foi concedida pelo juiz e a filha foi internada.

A Constelação foi iniciada com pessoas representando a filha viciada, a mãe, o avô da garota e o próprio crack. O personagem que fazia o papel da droga se colocou entre mãe e filha, impedindo que as duas se comunicassem. Durante a experiência, algumas histórias vieram à tona, como por exemplo, a revelação de que a mãe havia sido forçada pelo pai a se casar. Por esse motivo cortou o vínculo com ele, o que a fez sofrer muito. Além disso, a exclusão do avô gerava grande mágoa também para a filha que mergulhou no mundo das drogas.

Na análise do caso, feita pelo juiz Storch (2015), a droga representa para o viciado alguém da família que foi excluído, de modo que o envolvimento com o mundo das drogas passa a ser uma fuga para compensar a ausência de um ente querido.

Depois de muita resistência, a mãe da jovem conseguiu encarar a pessoa que representava o seu pai e o abraçou, estabelecendo um processo de ressignificação daquela situação em sua vida. Em seguida, a sessão foi encerrada.

Alguns dias depois, a assistente social que acompanhava a mãe comunicou ao juiz que ela estava bem mais tranquila e havia retomado o contato com a filha em uma conversa por telefone. Ao mesmo tempo, a instituição de tratamento onde a jovem foi internada informou que houve uma expressiva melhora no quadro psicológico da paciente.

O relato do juiz conclui que esses resultados são associados à Constelação Familiar. De acordo com o magistrado, é comum, após a realização das dinâmicas, observar uma mudança substancial no relacionamento das partes envolvidas, como, por exemplo, mães que reestabelecem o contato com os filhos, adolescentes que cumprem medida socioeducativa deixam a violência de lado, pessoas que disputam a guarda de crianças entram em acordo.

Agora, outro caso no qual o juiz Sami Storch (2015) atuou diretamente e obteve sucesso absoluto com a aplicação do Direito Sistêmico.

Um casal brigava na Justiça em 25 processos por causa de um divórcio. As ações tratavam da guarda dos filhos, pensão alimentícia, violência doméstica e ocultação de bens. Trinta dias depois de participarem de uma sessão de Constelação, o casal entrou em acordo e resolveu quase todos os processos em uma única audiência. E há uma razão para isto, segundo o magistrado.

As pessoas desenvolvem uma raiva e não percebem que isso está encobrindo uma dor. Na Constelação Familiar, percebem a dor do outro, não só as suas atitudes, e isso funciona como uma espécie de absolvição (CNJ, 2018).

As comarcas que aplicam o direito sistêmico finalizam as demandas judiciais, não retornando ao juízo com pedidos de cumprimento de sentença ou novo processo dos fatos já acordados, ou até mesmo aqueles que são sentenciados.

O juiz explica que em audiências nas ações de divórcio, alimentos e disputa pela guarda dos filhos, em que há forte animosidade e resistência para a realização de um acordo, as partes já chegam manifestando mágoa e raiva. Por isso, não permite que elas se queixem ou promovam ataques mútuos, pois isso alimentaria o conflito e a necessidade de retorsão imediata.

Ao contrário, o juiz pede silêncio e explica que, apesar do sentimento de conflito a que estão vinculados naquele momento, as partes estão ali por causa de uma história de amor.

Um dia ambos se conheceram e se gostaram. Tiveram momentos de prazer e, quando foram casados e têm filhos em comum (na maioria dos casos isso ocorreu), viveram um amor. Talvez tenham se apaixonado. Quando casaram e se expuseram à possibilidade de ter um ou mais filhos juntos, certamente tiveram sonhos, fizeram planos, se imaginaram numa família feliz e harmônica. Fizeram promessas um ao outro, e com isso alimentaram a esperança de um futuro feliz, juntos.

Ao dizer isso, costumo observar que ambos já estão emocionados, ao verem-se no começo de seu relacionamento e lembrarem do profundo amor que tiveram.

E prossigo, falando da dor da separação: depois de tanta expectativa, perceberam que o outro não era como imaginavam. Cada um tem hábitos que o outro não esperava; cada um quer lidar com os filhos de forma diferente; não demonstra respeito como se esperava, em relação ao parceiro e à sua família; não demonstra carinho como se esperava; e assim por diante. Então as partes percebem que aquele sentimento de mágoa e raiva, na verdade, encobre a profunda dor que sentem pela falência do relacionamento (STORCH, 2015, p. 57).

O magistrado prossegue o relato da audiência que, frequentemente, é marcada por forte emoção, com ambas as partes chorando diante do juiz. Neste momento os cônjuges não se lembram mais da raiva e da vontade de vingança, pois, na concepção do juiz, entraram em contato com o sentimento primário da dor. A dor que precisa ser vista e vivenciada, para que possa dar lugar à paz.

Sami Sorch (2015) aproveita o momento para relembrar frases de impacto comumente disparadas nas brigas entre casais, do tipo, “seu pai não presta”; “ele não paga nem sua pensão”, “ele não vale nada”; “sua mãe não te educa direito, ela não sabe de nada”, “é uma vagabunda”, “não quero vocês convivendo com aquele sujeito”.

Depois convida o homem e a mulher a imaginarem como o filho deles se sente ao ouvir frases como essas; e explica que as demonstrações de desrespeito e desconsideração entre os pais podem gerar conflitos internos nos filhos, com dificuldades de relacionamento, de concentração e de aprendizagem na escola, abrindo margem também para o tortuoso caminho das drogas.

Isso porque o filho sente uma profunda conexão com cada um dos pais e é constituído por ambos. Negar a importância e o valor de qualquer um dos pais tem, para o filho, o efeito de negar a sua própria importância. Faz com que, internamente, ele se sinta desintegrado e vazio. Essa criança se sente amada, se não vê os próprios pais respeitarem sua origem? (IDEM, 2015).

A partir daí o juiz explica a importância de deixar o filho fora do conflito, e sugere que os dois genitores se imaginem proferindo a ele frases com conteúdo de ressignificação do tipo: “eu e seu pai/sua mãe temos problemas, mas isso não tem nada a ver com você; nós somos adultos e nós resolvemos”; “fique fora disso; você é só nosso filho”; “eu gostei muito do seu pai/sua mãe, e você nasceu de um momento de amor que tivemos”; “eu e seu pai/sua mãe estaremos sempre juntos em você”; “quando eu olho para você, vejo seu pai/sua mãe”, ratifica.

Sami Storch (2016) reconhece que a apresentação desse cenário para o casal com as explicações sobre o impacto negativo do desprezo e do desrespeito mútuo na frente dos filhos é uma forma eficaz de permitir a mediação de conflitos familiares, pois depois dessa intervenção por parte do magistrado, na maioria dos casos, as partes reduzem suas resistências e tornam-se mais maleáveis a um acordo.

Com isso, basta ao juiz homologar o acordo para que produza os efeitos de uma sentença. Assim, evita-se, a necessidade de uma instrução processual, que poderia ser exaustiva, demandando uma nova audiência para ouvir testemunhas, que poderiam agravar os rancores e prejudicar a relação entre as partes. Para piorar o cenário, ante à animosidade dos litigantes, a prolação de uma sentença impondo uma solução está sujeita, muitas das vezes, a não ser cumprida, marcando por insatisfação ambos os envolvidos.

2.2 A INSERÇÃO DO DIREITO SISTÊMICO NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO

Os meios de solução de conflitos e a autocomposição são disciplinados pela Lei nº 13.140/2015, que trata sobre a mediação judicial e extrajudicial.

A lei define a mediação como atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia. Obviamente que na mediação judicial, os mediadores não estão sujeitos à prévia aceitação das partes, sendo a audiência realizada pelos profissionais indicados pelo juízo.

Como expressão da autonomia da vontade das partes, o procedimento é de livre aquiescência e ninguém pode ser compelido a aderir, participar ou mesmo a permanecer na mediação, caso não queira.

Pode ser objeto de mediação o conflito que verse sobre direitos disponíveis ou sobre direitos indisponíveis que admitam transação, podendo a mediação abarcar todo o conflito ou somente parte dele. Em se tratando de consenso das partes sobre direitos indisponíveis, mas transigíveis, o acordo deve ser homologado em juízo, exigida a oitiva do Ministério Público.

Vale destacar o conteúdo do Art. 24 da Lei 13.140/2015:

Art. 24. Os tribunais criarão centros judiciários de solução consensual de conflitos, responsáveis pela realização de sessões e audiências de conciliação e mediação, pré-processuais e processuais, e pelo desenvolvimento de programas destinados a auxiliar, orientar e estimular a autocomposição (BRASIL, 2015, p. 5).

Assim, temos que a lei tornou imperativa a implementação dos centros de solução consensual de conflitos no Poder Judiciário para que esteja à disposição de todos os jurisdicionados. A composição e a organização dos centros são definidas pelo respectivo tribunal, observadas as normas do Conselho Nacional de Justiça.

Nesse diapasão, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) reconhece a aplicação das Constelações Familiares Sistêmicas em procedimentos judiciais, sendo esta forma de resolução de conflitos autorizada pela Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estimula práticas adequadas de tratamento dos conflitos, em conformidade com a disposição do novo Código de Processo Civil, que reforça a adoção das medidas alternativas para a pacificação social.

A juíza auxiliar da Corregedoria do CNJ, Sandra Silvestre, considera a Constelação Familiar e outras práticas sistêmicas como um poderoso instrumento de pacificação social.

O sistema judicial brasileiro cada vez mais avança para um sistema de múltiplas portas, fazendo que o cidadão possa ter acesso à Justiça por diferentes meios e mecanismos” disse. Para a juíza, o direito sistêmico é mais um importante caminho que “se fortalece cada dia mais, mostrando que veio para ficar (CNJ, 2018).

Para o Doutor Sami Storch (2013), a legislação positiva não teria condições de guiar algumas demandas de contexto pessoal, haja vista, terem abrangência mais delicada e profunda, as quais atingem partes mais íntimas em cada ser humano.

Os conflitos entre grupos, pessoas ou internamente em cada indivíduo são provocados, em geral, por causas mais profundas do que um mero desentendimento pontual, e os autos de um processo judicial dificilmente refletem essa realidade complexa. Nesses casos, uma solução simplista imposta por uma lei ou por uma sentença judicial pode até trazer algum alívio momentâneo, uma trégua na relação conflituosa, mas, às vezes, não é capaz de solucionar verdadeiramente a questão, de trazer paz às pessoas (STORCH, 2013).

Como já visto, inicialmente, o método de Constelação Familiar foi usado para solucionar conflitos entre parentes, principalmente relacionados às separações, pensões alimentícias e uso de entorpecentes.

No ano de 2012, o sucesso das conciliações na seara do Direito de Família na comarca de atuação do Juiz Sami Storch incorreu na diminuição considerável das demandas judiciais na proporção de 91% (noventa e um por cento).

Considerando estes índices de aproveitamento, a utilização da técnica foi expandida pelo território brasileiro passando a estar presente como forma alternativa de solução de conflitos em outras comarcas, aplicada por outros juízes e demais operadores do direito.

A metodologia de aplicação do Direito Sistêmico no Judiciário chegou a ser condecorada com o prêmio menção honrosa em 2014, no Estado de Goiás.

Entretanto, somente em 2015, o Direito Sistêmico tomou maior força com o advento do Novo Código de Processo Civil, que trouxe um entendimento mais voltado para a solução de conflitos através da conciliação, mediação e arbitragem com o principal intuito de aproximar o direito do campo mais humano e, consequentemente, diminuir as excessivas demandas processuais, muitas vezes desnecessárias.

Em seu Artigo 3°, parágrafo 3°, o Novo Código de Processo Civil prevê:

Art. 3º, § 3º. A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial (BRASIL, 2015).

Além da previsão legal contida no Novo CPC, que deu maior ênfase à mediação, o Direito Sistêmico também se encontra alinhado aos moldes da Resolução nº 125/2010 do CNJ, que cuida para que o direito à solução de conflitos seja alcançado através da utilização de meios adequados à natureza da causa.

Artigo 1º. Fica instituída a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, tendente a assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade (CNJ, 2010).

Em uma visão geral sobre o tema, a professora Fernanda Tartuce citando Athos Gusmão Carneiro, apresenta um panorama considerando a importância da mediação e a necessidade de aprofundamento dos operadores do direito nesta dinâmica de solução de conflitos.

Em face das tradicionais previsões sobre conciliação em nossa legislação processual, de alguma maneira a interação entre as lógicas do julgamento e do consenso sempre existiu. O reforço no estímulo à adoção dos meios consensuais, contudo, exige dos operadores do direito uma imersão mais aprofundada sobre aspectos importantes da vertente auto compositiva (TARTUCE, 2016, p.4).

Um número crescente de magistrados tem engajado esforços para incorporar o Direito Sistêmico às rotinas judiciais, aperfeiçoando seus conhecimentos das técnicas de Constelações Familiares, visando encontrar a verdadeira solução sistêmica para os conflitos trazidos à sua apreciação. Por consequência, este cenário registra altos índices de aproveitamento nos acordos que são obtidos através da implementação desta técnica.

Assim, considerando o atual panorama em que se verifica o congestionamento processual nos órgãos jurisdicionais brasileiros e com as inovações abordadas pelo novo Código de Processo Civil, é imprescindível a introdução de novas formas e métodos que busquem a resolução dos conflitos, objetivando a solução consensual entre as partes. O que vem se tornando mais comum.

O Judiciário, conjuntamente com a sociedade, tem seguido ao encontro destas técnicas de ação para resolverem o cerne do problema de uma maneira duradoura e eficaz, e não somente através de um contentamento momentâneo.

2.3 O DIREITO SISTÊMICO E A EDUCAÇÃO JURÍDICA

Como prática emergente dentro e fora do procedimento judicial, o direito sistêmico por meio das constelações familiares merece um tratamento especial no que diz respeito à sua incorporação na base curricular dos cursos de direito de todo o país. É medida urgente a ser tomada ante à progressiva utilização deste método de resolução amigável de conflitos.

O advogado Mário Augusto Paixão da Silva, mestrando da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, defende a inclusão do Direito Sistêmico como disciplina optativa nos cursos de Graduação e Pós-graduação em Direito.

Desta forma, os futuros advogados, juízes, promotores, defensores públicos, delegados de polícia já sairiam da universidade e ingressariam no mercado de trabalho com um importante cabedal jurídico sobre a matéria e, mais do que isso, já sairiam predispostos a evitar a judicialização dos conflitos, o que resultaria em benefícios inestimáveis para toda a sociedade.

Este enfoque de valorização dos meios de resolução amigável de conflitos merece maior atenção das faculdades de direito. A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos, o que inclui, particularmente o direito sistêmico e as constelações familiares, devem ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.

Neste sentido, a educação jurídica deve enxergar o Direito Sistêmico como uma ferramenta aplicável à vida profissional de todos os operadores do direito, pois através de uma visão sistêmica é possível atingir resultados mais profícuos.

Esse novo conhecimento deve ser trabalhado em sala de aula, por meio da oferta de matérias regulares, optativas, oficinas, seminários e, principalmente, como novo ponto a ser explorado nas várias modalidades de prática jurídica, a começar pela clínica jurídica da PUC/SP, que se destina a atender pessoas sem condições financeiras de demandar em juízo.

Na obra “Constelações Familiares na Advocacia Sistêmica – Uma prática humanizada”, a advogada Bianca Pizzatto Carvalho ensina como o profissional do direito pode incorporar os conhecimentos deste novo paradigma na relação diária com clientes e na própria relação com o poder judiciário.

De tal modo, aos advogados cabe a tarefa de favorecer as condutas positivas e não estimular ações ou reações que caminham ao oposto daquilo que podemos chamar de Justiça Sistêmica. Se os advogados são indispensáveis à administração da Justiça, que façam da sua profissão o exercício do que é direito, começando com a sua postura com o cliente e depois a cooperação e o respeito à própria estrutura judiciária (PIZZATO, 2018, p. 48/49).

Deste modo, o que se tem é um novo olhar para a advocacia ante às novas possibilidades de solução de conflito inseridas nas normas jurídicas. Um novo modelo de advocacia, mais humanizada e consensual que desafia todos aqueles profissionais que não se sentem confortáveis com o modelo clássico da advocacia litigante a trilharem um novo caminho repleto de possibilidades.

De forma ampla, os professores devem estimular os alunos à prática da autocomposição, privilegiando o debate de ideias, a formulação de propostas e o estabelecimento de acordos para escapar da judicialização dos problemas mais comuns da sociedade. O processo judicial deve ser visto como a última medida, quando estiverem esgotadas todas as formas de solução consensual de conflitos.

A prática pedagógica mostra que o direito sistêmico pode ser aplicado na própria sala de aula, na medida em que os alunos encampem uma nova postura na aplicação da ciência jurídica. As leis são as mesmas, o conjunto fático-probatório de determinado processo também é próprio e não muda. O que muda é a forma como os atores do processo se posicionam diante de determinado conflito.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

De forma contínua, o processo de evolução do Direito confere novas formas de aplicação jurídica para a sociedade.

Neste cenário, o Direito Sistêmico surge como importante instrumento para a solidificação dos meios consensuais de resolução de conflitos.

Graças a esta nova visão, que reconhece e aplica a ciência jurídica, buscando conhecer as verdadeiras causas geradoras de conflitos, é possível imaginar uma Justiça alicerçada em valores nobres, como as leis do amor que interligam todos os seres humanos.

Este novo paradigma põe em xeque a visão clássica segundo a qual “o que não está nos autos não está no mundo” ou mais “que os autos não comportam sentimentos”.

A prática das constelações nas comarcas de diversos estados brasileiros mostra que há um universo de possibilidades fora do processo judicial. Há conflitos, medos, choros, revolta, reconhecimento de responsabilidades, arrependimento e perdão. Ingredientes como estes tornam a decisão entre as partes envolvidas em um conflito muito mais satisfatória do que uma sentença judicial que opera poderes de forma compulsória.

O principal resultado das constelações familiares sistêmicas é que os demandantes assumem cada um a sua parcela de responsabilidade e fazem concessões recíprocas em razão deste juízo operado pelo coração. Logo, há aceitação, concordância, manifestação de vontade, porque o acordo emana do íntimo das pessoas após o processo de sensibilização das constelações familiares.

Cada um é colocado no seu devido lugar, na ordem certa, sem supressões, sem desequilíbrio, valorizando as ordens do amor defendidas por Bert Hellinger (2006) e o Direito Sistêmico que proporciona aos diversos atores envolvidos em um conflito, sejam elas partes, juízes, promotores, defensores, ou qualquer outro envolvido antes e durante o processo, que possam encontrar o seu lugar.

O processo de sensibilização que está em curso e ganhou forma pelas mãos do juiz Sami Stoch agora precisa ser alavancado, disseminado como conhecimento cíclico nos cursos jurídicos brasileiros. As universidades precisam ensinar os alunos a utilizarem a visão sistêmica para enxergar os problemas com outros olhos.

Essa transformação passa pela inclusão do Direito Sistêmico como matéria obrigatória e/ou optativa nos currículos dos cursos jurídicos, valorizando a abordagem transdisciplinar porque estamos falando de uma visão que perpassa todos os ramos do direito e não se confunde e nem concorre com nenhum deles. Portanto, podem coexistir perfeitamente e sem nenhum óbice.

Por fim, os estudantes precisam apreender as ferramentas de sensibilização para atuarem de forma decisiva na mediação de conflitos através das técnicas do direito sistêmico, especialmente a constelação familiar sistêmica.

Não é obrigatória a instauração de uma lide formal para que se chegue à uma decisão justa.

Através da livre negociação, da consciência e da manifestação de vontade, é possível atingir a verdadeira Justiça, aquela que brota do coração e que satisfaz plenamente os indivíduos.

REFERÊNCIAS

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CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ. Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010. Dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário. Brasília/DF: 2010. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/files/resolucao_comp_125_29112010_19082019150021.pdf. Acesso em: 9.jun.2019.

FENALAW DIGITAL. Entenda o que é Direito Sistêmico. Publicado em 18. jul. 2018. Disponível em: https://digital.fenalaw.com.br/2018/07/18/entenda-o-que-e-direito-sistemico/. Acesso em: 9.jun.2019.

FREITAS, Rosalina; NUNES, Soraya. A conciliação e a mediação no CPC/2015. Diário de Pernambuco. Recife, Publicado em 16. mai. 2017. Disponível em: https://conima.org.br/conciliacao-mediacao-cpc2015/. Acesso em: 9.jun.2019.

HELLINGER Bert. A simetria oculta do amor: porque o amor faz os relacionamentos darem certo. Revisão técnica de Esther Frankel, Milton Corrêa e Mimansa Farny. 6ª ed. São Paulo: Cultrix, 2006.

PERRENOUD, Philippe. Dez novas competências para ensinar. Trad.: Patrícia Chittoni Ramos. Porto Alegre: Artmed, 2000.

PIZZATTO, Bianca. Constelações Familiares na Advocacia Sistêmica – Uma Prática Humanizada. 2ª ed.  Joinvile/SC: Manuscritos, 2018.

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VEZZONI, Marina. Direito Processual Civil. 2ª ed. atual. Barueri SP: Manole, 2016.

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[1] Mestrando em Direito Urbanístico – PUC/SP; especialista em direito ambiental (FMU/SP); especialista em direito eleitoral (IDP/Brasília); especialista em jornalismo científico (LABJOR/UNICAMP); graduado em Direito (FMU/SP); graduado em Comunicação Social – Jornalismo (UFPA).

[2] Orientador. Doutorado em Direito. Mestrado em Direito. Especialização em Direito.

Enviado: Agosto, 2020.

Aprovado: Agosto, 2020.

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Mário Augusto Paixão Da Silva

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