ARTIGO ORIGINAL
ANTUNES, Priscila de Fatima Cavalcante Bueno [1], JESUS, Isabela Bonfá de [2]
ANTUNES, Priscila de Fatima Cavalcante Bueno. JESUS, Isabela Bonfá de. Interpretação e qualificação do Streaming e suas possíveis implicações na tributação. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 09, Ed. 10, Vol. 01, pp. 94-127. Outubro de 2024. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/ciencias-sociais/interpretacao-e-qualificacao, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/ciencias-sociais/interpretacao-e-qualificacao
RESUMO
O presente trabalho analisará as operações de streaming, seus conceitos e a sua natureza jurídica, buscando como classificar e tributar adequadamente o streaming no contexto brasileiro de regulamentação deficitária e disputas entre entes federados. A relevância do estudo justifica-se pela crescente importância econômica do streaming e pela necessidade de segurança jurídica para o setor. Para tanto, a metodologia utilizada será feita de forma qualitativa, baseada em pesquisa bibliográfica, abordando a abordar a evolução do tema, a característica transnacional de seus negócios, a necessidade de regulamentação e o histórico de guerra fiscal até a consolidação do tema no âmbito jurisprudencial das Cortes Superiores. O estudo aborda a evolução regulatória, destacando a necessidade de uma legislação específica e as possíveis implicações da Reforma Tributária em curso. Conclui-se que a criação de uma lei complementar específica para o streaming pode ser uma solução viável para harmonizar os interesses dos diversos atores envolvidos no ordenamento jurídico vigente ou por meio de regulamentação com a iminente Reforma Tributária.
Palavras-chaves: Streaming, Direito tributário, Competência residual, Licenciamento.
1. INTRODUÇÃO
O objetivo do estudo é analisar, dentre as questões práticas relacionadas à tributação das novas tecnologias, os contratos que os envolvem e questões como novos mercados, conceitos do direto privado que refletem na definição da natureza jurídica desses contratos e as operações fronteiriças no contexto geral da tributação, em especial aquelas compreendidas como streaming, operadas por plataformas de abrangência internacional, como Netflix, Amazon, HBO, Spotify e outras.
O assunto merece ênfase diante do contínuo avanço da tecnologia, da massificação dos acessos e da popularização do serviço aliados a escassez de soluções no cenário jurídico atual (entre elas a recém promulgada reforma tributária) seja pela legislação, seja pela jurisprudência.
Ao analisar os desafios impostos ao direito através dos institutos do direito privado, é possível qualificar juridicamente as operações realizadas nesse cenário tecnológico, desenvolvendo algumas considerações a respeito das decisões já proferidas nas Cortes Superiores para essas celeumas aqui trazidas.
A problemática consiste na dificuldade de subsunção da realidade do mundo fenomênico às normas já existentes no ordenamento jurídico brasileiro, em face da intangibilidade e imaterialidade dessas novas tecnologias, vulgarmente conhecida pela virtualização. Essa problemática desafia princípios e regras consolidados no nosso ordenamento jurídico, como o aspecto temporal e espacial da regra matriz de incidência tributária, por exemplo.
Em tempos disruptivos, há um infinito número de obras intelectuais, das quais a internet permite que o conteúdo da obra seja divulgado e disseminado em todo o mundo em pouco tempo, sem ter transferência permanente ao usuário e sem precisar de grande suporte de armazenamento (arquivos físicos e digitais). A existência do termo “intransferibilidade” seria suficiente para a caracterização do aspecto material de um imposto que pretenda tributar essa nova realidade digital?
Neste cenário, há que se ressaltar que os conceitos não acompanharam referida revolução digital, pois as novas tecnologias e os contratos que as regulam no mundo jurídico estão atrelados aos antigos conceitos já determinados no nosso ordenamento jurídico, criados em um mundo analógico, o que pode ser um entrave para o pleno desenvolvimento econômico dos bens digitais e da respectiva tributação justa e eficiente desses mesmos bens.
A internet foi sem sombras de dúvidas um dos maiores acontecimentos da humanidade nos últimos tempos, inaugurando um período de revolução tecnológica na sociedade, com alto grau de conhecimento e processamento de dados. Com a revolução tecnológica, também surgiram diversos desafios a serem enfrentados por juristas, como a manutenção da privacidade, segurança de dados, proteção aos direitos autorais, além da discussão acerca da situação jurídica aplicável em questões contratuais e na obrigação tributária que os cerca.
É certo de que o Direito, como uma ciência social que emana normas de conduta, tem o papel de disciplinar as condutas realizadas por agentes no ambiente físico e virtual, de modo a acompanhar a evolução tecnológica ao definir critérios e regras que permitam a incidência de tributação sobre os signos presuntivos de riqueza expressados pelas novas tecnologias que surgem a todo momento, tal como o streaming, objeto do presente trabalho.
Neste artigo abordaremos especificamente a natureza jurídica das operações envolvendo o streaming, nas quais há produção intelectual protegida por norma legal e quais os efeitos dessas classificações para fins da tributação vigente.
Para alcançar esse objetivo, adotamos uma metodologia de pesquisa qualitativa que levou em consideração a abordagem dedutiva. O estudo baseou-se então na análise das normas vigentes, a literatura especializada, que incluiu a doutrina, a jurisprudência dos tribunais superiores no que se refere ao direito tributário e a propriedade intelectual, com foco nas questões relacionadas aos serviços de streaming nesse cenário. Esta abordagem metodológica permite examinar os conceitos jurídicos aplicáveis, proporcionando uma compreensão abrangente do tema e formulação de propostas para harmonizar os interesses dos contribuintes e fisco nesse cenário de constante evolução.
2. A EVOLUÇÃO DO STREAMING – CONCEITOS E OS POSSÍVEIS MODELOS DE CONTRATO
O avanço e a expansão das tecnologias e dos serviços digitais propiciaram aos usuários o manejo facilitado de downloads de músicas, filmes e outros conteúdos num disco rígido como CDs, DVDs, pen drives, além de outros desde a década de 1990.
Hoje em dia as novas tecnologias continuam em largo aprimoramento e contínua expansão. Nesse cenário, há diversas tecnologias digitais, tais como o Cloud Computing – armazenamento de dados em “nuvens” virtuais, Vídeos on Demand (VoD) – conteúdos ofertados ao espectador de acordo com sua vontade, jogos on line praticados de forma simultânea entre participantes localizados em qualquer lugar do mundo e, por fim, o streaming.
Essas tecnologias, movimentam bilhões de dólares ao redor do mundo, frequentemente são conhecidas como Over The Top (OTT), já que a distribuição dos conteúdos é realizada aos usuários através de plataformas pela internet.
Com base nas respostas dadas pelos usuários numa plataforma educacional online, podemos afirmar que o streaming é uma tecnologia conhecida pela transmissão de dados contínuos por meio de um computador, no qual é possível o oferecimento do serviço de exibição de diversos títulos cinematográficos e de músicas de forma remota. Ainda, as plataformas de streaming permitem o aluguel desses conteúdos, onde os consumidores podem assistir os filmes escolhidos com acesso por determinado período de tempo, baseado no plano de assinatura de cada membro por um determinado valor mensal, o qual é atualizado e personalizado devido a algoritmos de recomendação, o que torna toda a tecnologia ainda mais atrativa (Brainly, 2020).
O Governo Federal, por meio do Ministério das Comunicações, criou grupo de trabalho para estudar propostas de atualização dos Serviços de Acesso Condicionado (GT-SeAc) e assim definiu o streaming:
Streaming se refere à tecnologia de transmissão contínua de dados pela Internet que podem ser acessados pelos usuários sem a necessidade de download prévio. A tecnologia já existe há alguns anos, mas sua popularização tem acompanhado a otimização da Banda Larga. O carregamento do conteúdo nesse formato é realizado enquanto o arquivo está sendo acessado, permitindo o acesso praticamente em tempo real ao conteúdo. Com o streaming é possível transmitir conteúdos ao vivo, possibilitando inclusive a interação entre o público e o produtor, ou gravados, sem que os dados tenham que ser armazenados em computador, smart TV, celular, tablet ou quaisquer outros dispositivos, sobretudo móveis (Brasil, 2020a).
Com essa tecnologia, não é necessário o download definitivo do arquivo a ser executado nos dispositivos dos usuários (como computadores e celulares), culminando na eliminação desse software específico para o recebimento do sinal. O conteúdo é recebido por meio contínuo e temporário aos assinantes das plataformas de streaming, de modo que é possível ter acesso sem interrupções e sem transferir a informação para o computador do usuário. Sendo assim, uma pessoa pode assistir o conteúdo que lhe convém, em tempo real, estando em qualquer lugar do mundo, seja território brasileiro ou em outra jurisdição, desde que conectado a uma rede de internet.
Assim, com maior capacidade de compressão de arquivo e envio de dados, o streaming vem se consolidando como mídia alternativa aos meios tradicionais como televisão tradicional e televisão por assinatura e até mesmo do rádio, se expandindo e se popularizando cada vez mais, fazendo parte do cotidiano dos brasileiros. Dentre os streamings mais conhecidos e que atuam de forma global, podemos citar Youtube, Google, Netflix, Youtube, Amazon, Spotify, Amazon Prime e Disney.
Nesse modelo de negócio, a tecnologia utilizada para difusão de áudio, filmes e séries é capaz de quebrar barreiras geográficas e ter informações do mundo todo em tempo real (na maioria das vezes) na palma da mão, demonstrando uma simplicidade (de uso) do ponto de vista do consumidor, com preço atraente e facilidade de acesso.
Devido a massificação do streaming e diante do aumento de players de mercado, nos EUA o streaming ultrapassou a audiência da televisão a cabo, segundo dados da consultoria Nielsen, sendo 34,8% do tempo em frente à televisão utilizado exclusivamente em plataformas de streaming (Jones, 2022).
E esse avanço permitiu o surgimento em massa de diversas empresas com diversos modelos de negócios voltadas especialmente para esse mercado de transmissão e difusão de vídeos, o que consolidou um novo comportamento de usuários e empresas.
A título de informação, atualmente a Netflix possui uma base de assinantes estimadas em 221,6 milhões ao redor do mundo, mesmo após queda de 200 mil assinantes no primeiro trimestre de 2022, sendo que sua receita no primeiro trimestre de 2022 cresceu em 10%, resultando em US$ 7,87 bilhões (CNN Brasil, 2022), demonstrando a grande capacidade contributiva do setor da economia digital.
Contudo, os players do mercado de streaming ainda enfrentam inúmeros desafios que podem prejudicar a competitividade com as tecnologias tradicionais de entretenimento, como TVs por assinatura, livros físicos e rádios, como regulação desatualizada, assimetrias de tratamento jurídico entre os países, estrutura dos contratos e não menos importante – a tributação, com diversas e relevantes discussões diante da subsunção a determinada espécie de tributo e as lacunas legislativas no que se refere a tributação e a sua regulamentação. A essência dessas novas tecnologias é a intangibilidade e a ausência de barreira geográfica, o que torna a tarefa de regulação dessas incidências uma tarefa árdua.
O streaming como tecnologia disruptiva e lucrativa tem a atenção de vários países no que se refere a regulamentação e tributação, tanto é que a OCDE (Organização para Cooperação de Desenvolvimento Econômico), organização econômica formada por 37 países, está abordando os problemas tributários decorrentes da arrecadação predatória por parte dos Fiscos sobre as riquezas geradas no ambiente virtual, além de lutar pela liberdade econômica.
Para tanto, a OCDE implementou dois pilares para enfrentar os desafios fiscais oriundos da digitalização da economia. No Pilar 1, pretende-se que os lucros auferidos por empresas multinacionais com rendimento global acima de 20 bilhões sejam realocados nas jurisdições de mercado a cada ano, com o fim de que os países em desenvolvimento possam ter proveito ganhos dessas empresas e também para evitar a dupla tributação.
Já no Pilar 2, a OCDE estuda modos para assegurar que essas mesmas empresas multinacionais paguem um valor mínimo de tributação, independentemente do local em que estabelecidas ou da forma pela qual foram criadas, evitando a falta de tributação das riquezas geradas no mundo digital, o que reafirma a transferência de lucros das multinacionais para países com baixa tributação.
2.1 ASPECTOS GERAIS SOBRE MARCO REGULATÓRIO DO STREAMING NO BRASIL
Dada a rápida evolução, aliada à ausência de fronteiras tecnológicas dos negócios que envolvem o streaming, bem como da diferenciação dos negócios tradicionais, a necessidade de regulamentação é uma pauta necessária em âmbito global ou nacional.
Por se tratar de players de vários países de todo o mundo, em especial do Estados Unidos (onde estão localizados os maiores agentes do mercado de streaming), as transformações estão ocorrendo de maneira muito rápida, com grandes impactos sobretudo para a indústria brasileira (Ti Inside, 2023).
A regulamentação engloba temas de várias áreas, dentre elas, a análise da regulamentação do serviço de telecomunicação, ainda que de acesso condicionado, promoção da coerência e da isonomia regulatória visando aumentar a competitividade das empresas. A regulamentação de questões tributárias também é pauta!
No Brasil, há poucos avanços sobre a agenda regulatória do streaming seja pela Anatel (Brasil, 2023a), que é o órgão responsável pela regulamentação das condições e distribuição de conteúdo audiovisual, seja pela Ancine, órgão responsável pela regulamentação de produção, programação e empacotamento, com requisitos para o estímulo à produção e à programação brasileiras (Brasil, 2013).
Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei (PL) n. 8.889/2017 que pretende regulamentar os conteúdos de audiovisual por demanda e o streaming, sob o pretexto de que os provedores não atendem as condições de distribuição do conteúdo brasileiro, pretende-se regulamentar os serviços de acesso condicionado, acesso ao consumidor.
Ao que parece, a agenda regulatória para o mercado de streaming no Brasil não se distanciará das legislações do SeAC, da Lei Geral de Telecomunicações (Lei 9.472/1997) e a Lei 12.485/2011, o estudo atual diz respeito ao fomento do acesso aos títulos nacionais e regionais como forma de implementação e valorização da cultura brasileira, visando uma redução dos preços e melhoria da qualidade do serviço, com mais pluralidade e diversidade nos conteúdos audiovisuais ofertados aos assinantes, ao oferecimento desses serviços por parte de empresas globais sem representação no Brasil e o possível impacto desses serviços nas empresas locais.
Em novembro de 2020, o Ministério de Estados das Comunicações criou o grupo de trabalho cuja pauta era realizar estudos e elaborar proposta de atualização do marco jurídico referente aos Serviços de Acesso Condicionado (GT-SeAC) (Brasil, 2020b), visando em síntese uma competição mais justa, apoio às produções brasileiras e no que tange a tributação, a pauta pretende a diminuição da carga tributária, já que a elevada carga impossibilitaria o crescimento e alcance do conteúdo em pequenas
No que tange a tributação, o Grupo de Trabalho identificou os principais impostos, taxas incidentes sobre as empresas que ofertam o streaming, sendo IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, Condecine, ICMS, ISS, Contribuições ao FUST, FISTEL, etc[3].
Não houve consenso no que tange a regulação, dado o fato de que o grupo de trabalho somente pautou questões principiológicas, debatendo de maneira genérica a carga regulatória dos conteúdos, nele inclusos o streaming, não adentrando em questões referentes ao marco legal.
As atividades do grupo foram concluídas, com diagnóstico consolidado e com recomendações pautadas, em consenso, na necessidade de uma reforma tributária mais ampla, manifestando a necessidade de uma tributação mais equânime e coordenada entre os entes federativos e os players de mercado, diminuindo o custo do cumprimento das obrigações acessórias e reduzindo a assimetria entra as diversas modalidades de VoD.
2.2 A NATUREZA JURÍDICA DOS CONTRATOS DE STREAMING – CONTRATO DE LICENÇA E A CESSÃO TEMPORÁRIA DE USO – LEI 9.609/1998 E LEI 9.610/1998
As plataformas digitais que prestam serviço baseado na tecnologia do streaming, grosso modo ofertam um catálogo com ampla gama de conteúdo de áudio e vídeo cultural, artístico, esportivo, informativo, dentre outros permitindo o acesso mediante a aplicação de conexão de internet, rede mundial de computadores, mediante uma contraprestação pecuniária denominada, na maioria das vezes, de plano periódico de assinatura (mensal, anual etc.).
Existem duas modalidades na plataforma conhecidas como live streaming, que é uma transmissão de dados ao vivo e em tempo pela internet aos dispositivos conectados e streaming on demand, onde o usuário está no controle do que vai assistir, quando e onde, acessando os dados ao mesmo tempo em que os recebe, sem a necessidade de download, controlando sua exibição (Techtudo, 2013).
O artigo 110 do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966), determina a inalterabilidade dos conceitos de direito privado na interpretação da legislação tributária, é necessário então analisar os contratos de streaming à luz dos institutos jurídicos pertinentes. Nesse contexto, é possível inferir que a contratação do serviço de streaming envolve como atividade principal a disponibilização de conteúdo através de cessão, ou seja, o usuário tem acesso a plataforma de streaming por meio de um contrato típico de licenciamento de direito de uso.
Essa relação se configura através de um contrato típico de licenciamento de direito de uso, conforme estabelecido no artigo 9º da Lei nº 9.609/1998 (Lei do Software). O usuário, ao acessar a plataforma de streaming, está essencialmente adquirindo uma licença temporária para uso do conteúdo disponibilizado. Esta interpretação não prejudica o reconhecimento de outras atividades importantes, porém secundárias, como o pleno funcionamento do software conforme descrito na Lei do Software. Desta forma, a natureza jurídica predominante do streaming alinha-se mais com o conceito de cessão de direitos.
Seja qual for a modalidade do contrato, a atividade preponderante é a utilização do software disponibilizado pelo contratante; relevante dizer que o direito de uso e de exploração da obra audiovisual permanecem com os detentores originais das obras e de maneira alguma há transferência definitiva ao usuário. Desta forma, a natureza jurídica predominante do streaming alinha-se mais com o conceito de cessão de direitos.
Nesse contexto, o conteúdo disponibilizado ao usuário é derivado de uma obra intelectual cuja propriedade intelectual é protegida pela Constituição Federal, em seu artigo 5º, incisos XXVII e XXVIII. Significa dizer que, em termos jurídicos, não há possibilidade de transferência, cessão ou tampouco licenciamento desses direitos. O produtor da obra audiovisual é o titular detentor dos direitos a ele pertencente, esses chamados direitos intelectuais são naturalmente incorpóreos
O streaming então é uma tecnologia que permite ao usuário ter acesso a um bem produzido advindo de obra intelectual, cuja titularidade não é comercializada. Ademais, nesse contrato o usuário sempre tem acesso de modo temporário e instantâneo ao conteúdo, todavia, esse conteúdo não lhe pertence e tampouco fica gravado em seu aparelho, embora isso seja possível no período em que perdurar a condição de assinante, entendido esse como parte do contrato, período em que haverá a possibilidade de fazer o download temporário do conteúdo digital.
A propriedade intelectual recebe proteção legal específica, o regime civil de proteção dos direitos do bem do autor é regulado pela Lei n. 9.610 de 19 de fevereiro de 1998, conhecida por “Lei dos Direitos Autorais”, que identifica o autor da obra e protege sua produção e demais questões relativas à propriedade intelectual, independentemente do meio físico ou intangível que sejam comercializadas.
O direito de propriedade intelectual protege a obra seja ela material ou material, isto é, a criação é protegida.
Já a Lei n. 9.609, de 19 de fevereiro de 1998 cuida da propriedade intelectual de programa de computador e de sua comercialização, estabelecendo regramentos quanto ao direito do autor e o bem por ele produzido – a sua propriedade intelectual.
Em razão da disponibilização ser temporária, da possibilidade de uso apenas, o objeto do contrato consiste na cessão temporária de uso de obras audiovisuais e quaisquer infrações aos respectivas direitos serão passíveis de sanções na forma legal.
Em sentindo contrário, Salvador Cândido Brandão Júnior (2021), entende que há dois bens jurídicos distintos e delimitados: a) propriedade intelectual – direitos de autor sobre o software, bem infungível; b) uma unidade produzida a partir desse direito autoral – produto que pode ser considerado mercadoria e um bem fungível, que será o objeto de licença de uso para proteger o item ‘a’, qual seja a propriedade intelectual, ao mesmo tempo em que proporciona a circulação da mercadoria.
A bem da verdade, não há transferência de direitos patrimoniais sobre a obra. A transferência total, quando ocorre, nada mais é do que a cessão de direitos e não contrato de compra e venda, apto a efetuar a respectiva transferência a outrem, é o que expressa o artigo 49 da Lei n. 9.610/1998.
Art. 49. Os direitos de autor poderão ser total ou parcialmente transferidos a terceiros, por ele ou por seus sucessores, a título universal ou singular, pessoalmente ou por meio de representantes com poderes especiais, por meio de licenciamento, concessão, cessão ou por outros meios admitidos em Direito, obedecidas as seguintes limitações:
I – a transmissão total compreende todos os direitos de autor, salvo os de natureza moral e os expressamente excluídos por lei;
II – somente se admitirá transmissão total e definitiva dos direitos mediante estipulação contratual escrita;
III – na hipótese de não haver estipulação contratual escrita, o prazo máximo será de cinco anos;
IV – a cessão será válida unicamente para o país em que se firmou o contrato, salvo estipulação em contrário;
V – a cessão só se operará para modalidades de utilização já existentes à data do contrato;
VI – não havendo especificações quanto à modalidade de utilização, o contrato será interpretado restritivamente, entendendo-se como limitada apenas a uma que seja aquela indispensável ao cumprimento da finalidade do contrato (Brasil, 1998).
Do mesmo modo, a lei dos direitos autorais prevê que a aquisição do original de uma obra, ou de exemplar, não confere ao adquirente qualquer dos direitos patrimoniais do autor, o que implica dizer que para a questão do streaming diretamente por meio de internet, nas modalidades aqui tratadas, não há qualquer alteração de domínio apta a ensejar a transferência de titularidade sobre a obra intelectual, é que dispõe ao artigo 37 da Lei n. 9.610/1998.
3. CONSIDERAÇÕES SOBRE A TRIBUTAÇÃO DO STREAMING E O POTENCIAL CONFLITO DE COMPETÊNCIA ENTRE O ISS E O ICMS
No Brasil, a popularização do uso do streaming tem suscitado uma série de questionamentos, seja no âmbito jurídico, seja no âmbito regulatório. Como podemos entender esse desafio e como classificar corretamente, determinando sua tributação em um cenário de regulamentação deficitária?
O desafio começa no problema semântico fundamental: o que é o streaming? Trata-se de um serviço ou mercadoria? Esta distinção é fundamental pois implica na definição do regime tributário aplicável. A ausência de regulamentação clara e específica deixa espaço para interpretação divergentes e desse modo, as autoridades fiscais de vários entes federados pretendem regulamentar a tributação dessa atividade.
No entanto, a intangibilidade característica dessas tecnologias intensifica as disputas entre os entes federativos. Cada esfera governamental — municipal, estadual e federal — argumenta ter competência para tributar essas operações, baseando-se em diferentes interpretações da natureza do streaming. Tampouco a intangibilidade dessas tecnologias fez com que diminuíssem a disputa dos entes federados. Pelo contrário, a disputa ganhou novos contornos.
Essa disputa ganha novos contornos à medida que surgem questões como: Qual é a natureza jurídica precisa das operações de streaming? Qual é o fato gerador nessas transações? Qual ente federativo tem legitimidade para tributar essas atividades? As respostas a essas perguntas têm implicações significativas não apenas para as empresas do setor, mas também para os consumidores e para a o fisco, já que irá influenciar na arrecadação de cada ente.
O desenvolvimento do mundo globalizado trouxe problemas e aspectos negativos principalmente ao nosso sistema tributário brasileiro, pois não havia na época do nascedouro da lei a pluralidade e intensidade dos negócios que ocorre no atual mundo, principalmente no que se refere as empresas multinacionais que tem um papel central na economia digital, devido ao rápido deslocamento, avanços tecnológicos que demandam repensar e requalificar alguns institutos do nosso sistema tributário.
Essas transações dificultam a determinação do ente federado competente para a cobrança do respectivo tributo, ainda mais, no caso de transações efetuadas inteiramente em ambientes de negócios virtuais, que tem como pressuposto a indeterminação semântica supramencionada.
Nossa Constituição Federal delimitou a competência tributária de maneira clara, reservando para a lei complementar a tarefa de dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; regular as limitações constitucionais ao poder de tributar, além de estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária e mesmo com os limites bem estabelecidos, os conflitos relativos as novas tecnologias permanecem.
Segundo se depreende do texto constitucional, no artigo 156, III, os municípios podem instituir impostos sobre serviços de qualquer natureza, não compreendidos no artigo 155, II, definidos em lei complementar.
A título de exemplo, o Município de São Paulo, no artigo 1º da Lei n. 13.701/2023 preceitua que o ISS tem como fato gerador a prestação de serviços conhecidos como streaming – “Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdo de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e periódicos (exceto a distribuição de conteúdo pelas prestadoras de Serviço de Acesso Condicionado, de que trata a Lei nº 12.485, de 12 de setembro de 2011, sujeita ao ICMS)” (Brasil, 2003). Respectiva lei foi alterada pela Lei 18.066/2023, o qual reduziu a alíquota do imposto para 2% (São Paulo, 2023).
Pois bem, com a lei complementar, estabeleceu-se a lista de serviços cuja atividades hipoteticamente se subsomem ao conceito constitucional de serviços. Superada a discussão sobre a taxatividade da lista de serviços, fato é que a alteração da Lei Complementar 116/2003 efetuada pela Lei Complementar 157/2016, inseriu o item 1.05 – Licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação é hipótese de incidência do Imposto Sobre o Serviços.
No entanto nem sempre foi assim; o conflito entre estados e municípios vem de longa data!
Os estados defendiam a incidência do ICMS em razão da padronização do bem, de sua circulação no mercado, além da ausência de personalização e, em sentido contrário, para que se configurassem como serviço, os municípios defendiam a incidência do ISS pela ausência de transferência (licença de uso), além de ser um bem incorpóreo e se tratar de uma obrigação de fazer, prestada com habitualidade e mediante contraprestação, aliado ao fato dessas materialidades estarem previstas em lei complementar[4].
Grande parte da doutrina também defende a incidência de ICMS nos bens digitais, admitindo a possibilidade de evolução do conceito de mercadoria para que sejam inclusos os bens incorpóreos, a exemplo da energia elétrica ou da mercadoria virtual, dentre eles Marco Aurélio Greco (2011) que admite a possibilidade de evolução da mercadoria.
Poder-se-ia inclusive afirmar atualmente que a mercadoria virtual está inserida no ciclo de circulação econômica o que aproximaria da incidência do ICMS, no entanto, o respectivo imposto tem como núcleo material os negócios jurídicos onerosos em que haja efetivamente a transferência de um domínio, a necessidade de tradição, isto é, a mercancia propriamente dita.
Ainda que se considere a possibilidade de um bem intangível vir a ser mercadoria, o nosso entendimento reside na impossibilidade de incidência do ICMS diante da ausência de transferência de titularidade da propriedade do direito autoral da tecnologia do streaming, já que o contrato de licença de uso em momento alguma destina a sua propriedade intelectual ao usuário.
Grande parte das inovações acontecidas nos últimos tempos, levaram o Supremo Tribunal Federal revisitar o tema, principalmente sobre o prisma que os softwares são comercializados por meio de downloads nos ambientes das nuvens (cloud computing), não tendo mais aquela antiga associação ao software de prateleira e software por encomenda.
Novos entendimentos da Secretaria da Receita Federal do Brasil também são exaradas tendo como fundamento a dicotomia prateleira/encomenda, contudo demonstrando que esse entendimento já está ultrapassado, isto porque quando da análise da incidência de Imposto sobre a Renda Retido na Fonte consolidou seu entendimento no sentido de que os valores pagos pelo usuário final a residente no exterior para fins de aquisição ou renovação de licença de uso de software, independentemente de customização ou do meio empregado na entrega, estariam o sujeitos à incidência do respectivo imposto, é o que vemos na Solução de Consulta COSIT 75, de 31 de março de 2023.
LICENÇA DE USO DE SOFTWARE. PAGAMENTO, CRÉDITO, ENTREGA, EMPREGO OU REMESSA PARA O EXTERIOR. USUÁRIO FINAL. AQUISIÇÃO OU RENOVAÇÃO. ROYALTIES. TRIBUTAÇÃO.
Os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos em a residente ou domiciliado no exterior, pelo usuário final, para fins de aquisição ou renovação de licença de uso de software, independentemente de customização ou do meio empregado na entrega, caracterizam royalties e estão sujeitos à incidência de Imposto sobre a Renda na Fonte (IRRF), em regra, sob a alíquota de 15% (quinze por cento).
Dispositivos Legais: Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998, arts. 1º, 2º e 9º; Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, art. 7º, inciso XII; Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018, arts. 44 e 767.
BENEFICIÁRIO RESIDENTE OU DOMICILIADO EM PAÍS COM TRIBUTAÇÃO FAVORECIDA. ALÍQUOTA MAJORADA.
Na hipótese de o beneficiário ser residente ou domiciliado em país com tributação favorecida, a alíquota do IRRF sobre os royalties devidos pela licença de uso de software será de 25% (vinte e cinco por cento).
Dispositivos Legais: Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, art. 24; Decreto n9.580, de 22 de novembro de 2018, arts. 44 e 748.
Na Solução de Consulta COSIT 107, publicada em 13 de junho de 2023[5], que trata da tributação nos pagamentos devidos à título de aquisição de licença no exterior, a Secretaria da Receita Federal do Brasil entendeu que pela incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte, sob a ótica dos direitos autorais, e quanto ao CIDE, entendeu pela sua incidência somente quando houver a transferência da correspondente tecnologia, nos termos do art. 2º, §2º da Lei 10.168/00.
As decisões mencionadas sobre a tributação do software, no que tange ao posicionamento do Supremo Tribunal Federal nos indica que as novas operações envolvendo transferência típicas da economia digital não poderiam ser tributadas por meio de ICMS.
No que tange ao ISS, o Supremo Tribunal Federal definiu que as cessões de direito de uso como no caso da locação – Súmula 31[6] – não são passiveis de tributação por meio do ISS de competência municipal. O contexto da edição da súmula se deu naquelas operações que somente estavam presentes a obrigação de dar ou de entregar, ou seja, não contemplava contratos mistos eis que esse tributo municipal somente poderia incidir sobre obrigações de fazer, a cuja matriz conceitual não se ajusta a figura contratual da locação de bens móveis.
Após a jurisprudência evoluiu, deixando de segregar as obrigações de dar e de fazer, conforme se verifica da ADI 3142[7] e do RE 592.501/1[8], tendo como premissa a análise de contratos complexos com operações mistas (obrigação de fazer e obrigação de dar).
Não se traduz, nesse contexto, uma obrigação de fazer já que se trata de uma cessão provisória de um conteúdo on line consubstanciado na sua configuração pré-concebida a qualquer potencial assinante, ou seja, na disponibilização onde uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante certa retribuição, tal qual definida pelo artigo 565 do Código Civil.
Desta maneira, não há dúvidas de que os contratos envolvendo operações de streaming não se subsomem a definição de serviço, portanto não fazer parte do critério material da incidência do ISS, isso porque o artigo 156, III da Constituição Federal delimita o campo de atuação dos municípios somente a obrigações de fazer e nunca a obrigação de dar, tal qual pacificado pelo Supremo Tribunal Federal.
Contudo, o que não mudou até a presente data é que a obra advinda desse software é produto de uma obra intelectual, protegida pela Lei 9.609/1998 e Lei 9.610/1998.
Ante essa premissa, considerando que existe apenas o direito de uso, sem transmissão da propriedade do direito intelectual, entendemos que o streaming é excluído do conceito de serviço, entendemos que não se pode tributar o download de softwares, incluindo o streaming de vídeos e áudios por meio da competência de ISS.
3.1 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL – DECISÃO “SOFTWARE DE PRATELEIRA” E “SOFTWARE PERSONALIZADO”: ICMS VS. ISS
Embora a questão esteja longe de ser pacificada é de extrema importância relatar o histórico da discussão sobre o software, ainda que naquela oportunidade tenha se delimitado somente sobre a incidência do ISS versus ICMS.
A discussão inicial sobre os negócios envolvendo software foram constituídas inicialmente na diferenciação entre software de prateleira e software de encomenda ou personalizado, a disputa inicial chegou ao Supremo Tribunal Federal no ano de 1998 por meio do Recurso Extraordinário nº 176.626, sendo considerado ainda hoje umas das balizas que norteiam a tributação de softwares.
A diferenciação entre os tipos de softwares avançou sob o crivo do relator Ministro Sepúlveda Pertence – o software de prateleira (off the shelf) e software sob encomenda ou personalizado. O software de prateleira era considerado aquele colocado à venda, visando atender a um mercado em geral, o termo prateleira era porque o software era encontrado nas grandes lojas e pontos comerciais do Brasil e vendido para um público vasto.
Era necessário um meio físico, o corpus mechanicum (disquete, CD, DVD), servindo como um tipo de embalagem para o software produto e neste sentido, poderia ser considerado mercadoria
Já o software por encomenda é aquele considerado para atender a uma demanda específica de um ou poucos usuários diante das necessidades especificas deste – software produto, considerado então como um bem incorpóreo, intangível e de criação intelectual e não se confundindo a aquisição do exemplar com o licenciamento ou cessão de uso:
I. Recurso extraordinário: prequestionamento mediante embargos de declaração (Súm. 356). A teor da Súmula 356, o que se reputa não prequestionado é o ponto indevidamente omitido pelo acórdão primitivo sobre o qual “não foram opostos embargos declaratórios”. Mas se, opostos, o Tribunal a quo se recuse a suprir a omissão, por entendê-la inexistente, nada mais se pode exigir da parte (RE 210.638, Pertence, DJ 19.6.98).
II. RE: questão constitucional: âmbito de incidência possível dos impostos previstos na Constituição: ICMS e mercadoria. Sendo a mercadoria o objeto material da norma de competência dos Estados para tributar-lhe a circulação, a controvérsia sobre se determinado bem constitui mercadoria é questão constitucional em que se pode fundar o recurso extraordinário.
III. Programa de computador (“software“): tratamento tributário: distinção necessária. Não tendo por objeto uma mercadoria, mas um bem incorpóreo, sobre as operações de “licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador” ” matéria exclusiva da lide “, efetivamente não podem os Estados instituir ICMS: dessa impossibilidade, entretanto, não resulta que, de logo, se esteja também a subtrair do campo constitucional de incidência do ICMS a circulação de cópias ou exemplares dos programas de computador produzidos em série e comercializados no varejo – como a do chamado “software de prateleira” (off the shelf) – os quais, materializando o corpus mechanicum da criação intelectual do programa, constituem mercadorias postas no comércio (Brasil, 1998).
Já no ano de 2021, o Supremo Tribunal Federal finalizou o julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 1945 e 5659 que discutiam as operações com licenciamento de softwares realizadas por transferência eletrônica de dados, na análise da incidência de ICMS, de competência estadual sobre as respectivas operações com software. Ao final decidiu que alguns dispositivos invocados que pretendiam a incidência de ICMS de seria inconstitucional.
Ao longo do debate do julgamento, com base em premissas constitucionais, sobretudo sobre a prevalência da lei complementar para resolução de conflitos em matéria tributária, que as operações com licenciamento de softwares são campo de materialidade do ISS. Naquela oportunidade, o relator Ministro Dias Toffoli afirmou que a discussão sobre a diferenciação dos tipos de softwares não mais seria suficiente para a definição da materialidade do tributo, em razão primordialmente das mudanças tecnológicas ocorridas desde o início daquela ação até os dias atuais, reforçando que devem ser aplicadas as mesmas regras gerais aplicadas às demais prestações de serviços.
Neste sentido, há grande acerto na decisão, principalmente levando-se em conta que a jurisprudência e as decisões não podem ficar alheios aos fatos sociais, sobretudo pela expansão da economia digital e a sua grande e rápida disseminação.
N’outro julgamento – RE 688.223, cujo tema é 590 do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, a discussão foi a respeito da incidência de ISS sobre contratos de licenciamento ou de cessão de programas de computador (software) desenvolvidos para clientes de forma personalizada e citando e aplicando a ratio decidendi das ADIs 5659 e 1945 reforçou o entendimento de que a tradicional distinção entre software de prateleira (padronizado) e por encomenda não pode subsistir mais.
A prevalência pela incidência do imposto municipal se baseou no fato de que o software nada mais é do que um serviço resultante do esforço humano independente de seu tipo, pois haveria o desenvolvimento de um programa de computador (software), sejam eles de qualquer tipo, além de presentes nos demais serviços prestados ao usuário, como no help desk, nas atualizações etc.
4. ANÁLISE DOS INSTITUTOS PRIVADOS PARA NO CONTEXTO DA TRIBUTAÇÃO DO STREAMING
Na delimitação das competências tributárias, verificamos a adoção de institutos do direito privado para determinar a materialidade seja direta ou indiretamente e, por que razão, não se pode afastar a aplicação do artigo 110 do Código Tributário Nacional que, por sua vez deve ser utilizado para análise de institutos para fins de construção do sentido dos negócios envolvendo as operações de streaming.
Do mesmo modo o artigo 109 do Código Tributário Nacional preceitua que devem ser utilizados para a pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários.
Rafael Marinangelo (2022), afirma que os conceitos jurídicos se referem ao mundo exterior a eles, não é possível conhecer adequadamente a definição de contrato sem considerar a realidade econômico social subjacente.
Significa dizer que a partir desses comandos, os conceitos do direito privado devem ser considerados e absorvidos, sendo de extrema importância a atividade hermenêutica e como afirma José Maria de Arruda Andrade (2006), entre a liberdade total do intérprete ou a sua vinculação cega a lei, há uma realidade toda a estudar, e essa realidade disruptiva da economia digital não pode afastar das referências e balizas legais.
Neste aspecto, o direito privado define através da Lei do Software – Lei 9.609/1998 que a comercialização do software se dá por meio de contrato de licença de uso, consignado, de forma facilmente legível pelo usuário, o prazo de validade técnica da versão comercializada.
Da análise da natureza do contrato de streaming que pode ser considerado um negócio jurídico complexo, com situações complexas e mistas, ele compreende uma permissão ao usuário de utilização daquela obra, pelo prazo previsto dentro do contrato ou documento fiscal de aquisição do mesmo (artigo 9º, parágrafo único da Lei 9609/1998).
A prevalência da natureza jurídica que o contrato veicula é a cessão de direito de uso e licenciamento, no sentido de “tornar-se disponível” a reprodução no ambiente virtual. Neste aspecto, entendemos que é essa premissa que deve nortear a tributação e a União e os demais entes federativos devem observar.
4.1 NECESSIDADE DE LEI COMPLEMENTAR PARA TRIBUTAÇÃO DO STREAMING
Considerando a interpretação e qualificação do streaming, o possível conflito de solução seria a tributação da cessão de direito de uso por meio de competência residual da União, nos termos do artigo 154, I da Constituição Federal.
Ressaltamos que as competências da União, dos Municípios e do Distrito Federal foram definidas todas pela Constituição Federal. Neste aspecto, salutar afirmar que a União poderá criar impostos, desde que não tenham hipótese de incidência ou base de cálculo próprias daqueles discriminados nos artigos 153, 155 e 156 da Constituição Federal.
Importante anotar que Betina Treiger Grupenmacher (2016), entende que, na ausência de lei complementar federal instituidora de tal exação, não há possibilidade de que a cessão de direitos seja objeto de tributação pelas pessoas políticas de direito público”
Isto é, não há previsão para tributação de impostos com a materialidade do streaming exposto nesse trabalho, pois o direito positivo não é adaptado para as respectivas bases de tributação.
Neste aspecto, a União poderia criar em caráter privativo, ao menos em tese, um novo imposto desde que obedecidos todos os regramentos do Texto Maior, dentre eles o princípio da legalidade, da anterioridade, dentre outros.
Ressaltamos que há em andamento um Projeto de Lei de n. 2.331/22 que regulamenta os serviços de vídeo sob demanda (VoD), incluindo a modalidade de streaming. O projeto irá para análise pela Camara dos Deputados (Brasil, 2024a).
4.2 REFORMA TRIBUTÁRIA E OS DESAFIOS NA TRIBUTAÇÃO DO STREAMING
Se não bastasse toda a celeuma envolvendo a tributação do streaming, recentemente o Sistema Tributário Nacional foi alterado, por meio da promulgação da Emenda Constitucional 132, de 20 de dezembro de 2023, com o objetivo principal de adaptação, evolução e simplificação da legislação tributária, justiça social e maior segurança jurídica na relação entre Fisco e Contribuinte (Brasil, 2023b)
A Reforma Tributária, como ficou conhecida, trouxe alguns dilemas para o setor de tecnologia com a instituição do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) de competência subnacional e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) de competência federal, tributos que se assemelham ao Imposto sobre Valor Agregado (IVA) adotado por diversos países (Brasil, 2024b).
De acordo com o artigo 156- A da Emenda Constitucional 132/2023, as hipóteses de incidência do IBS e da CBS são os mesmos, quais sejam, operações com bens materiais ou imateriais, inclusive direitos (inciso I), ou com serviços, além de importações desses mesmos elementos (inciso II). O objetivo da definição dessa materialidade, com inspiração no IVA Europeu, é abranger todas as novas tecnologias, afastando discussões sobre a natureza jurídica envolvida (Brasil, 2023c).
Isso se dá em razão do uso intensivo das tecnologias pelos mais variados setores da economia, que reclamam sua essencialidade para a competividade e o desenvolvimento da nação. O uso de tecnologia envolve atividades como desenvolvimento de software, inteligência artificial, processamento e armazenamento de dados, dentre outros e é dentro desse contexto que tributação da cessão de direito de uso deve ser analisada.
No contexto da Reforma Tributária, o IBS e a CBS somente serão beneficiados nas hipóteses expressamente delimitadas na Constituição Federal e o setor de tecnologias não é um deles, ainda que tenha sido objetivo de pleito pela Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes) (2023).
Por outro lado, a Reforma Tributária garante ampla não-cumulatividade (artigo 149-B e artigo 156-A, inciso VIII da EC 132/2023), retirando as diversas restrições à utilização de crédito vigentes no sistema atual, de modo que a carga tributária efetiva somente pode ser analisada no caso concreto, especialmente diante da elasticidade do preço aos consumidores.
Diante disso, há incerteza sobre eventual aumento da carga tributária incorrida pelo setor de tecnologia daqui para a frente, mas considerando que não é o tema dessa discussão, nele não adentraremos (Baptista, 2024).
O constituinte, com o novo sistema tributário instituído pela Emenda Constitucional n. 132/2023, deve contemplar as competências impositivas da cessão de direitos – streaming como passível de incidência tributária. Neste cenário, a tributação do software, streaming possui um novo capítulo de desafios está por vir, sobretudo pela regulamentação que advirá com as Leis Complementares.
A expectativa é que a partir de agora, haja regulamentação sobre o streaming levando em consideração a cessão de direitos e que a guerra entre entes federados deixe de existir ou ao menos seja reduzida e que traga ao fim a segurança jurídica ao Fisco e Contribuinte.
5. CONCLUSÃO
Considerando todo o exposto nesse trabalho, buscamos responder a questão central de como o streaming deve ser tributado no sistema tributário atual. No entanto, nossa análise leva a entender que o streaming não pode ser tributado por ICMS em razão de não haver transferência da propriedade apta a consolidar a subsunção aos critérios da regra matriz de incidência tributária, tampouco não há subsunção ao ISS em razão de não se configurar em uma prestação de fazer propriamente dita.
A solução mais adequada, dentro do ordenamento jurídico vigente, seria a criação de um tributo federal, isso porque dentro do campo de competência impositiva residual conferida pelo artigo 154, inciso I da Constituição Federal.
A tributação das operações jurídicas que envolvam software e consequentemente streaming poderia ser inserida levando em consideração a sua natureza jurídica, de acordo com as Lei 9609 e 9610/1998, desenhando de forma cabal a regra matriz de incidência tributária do respectivo tributo trazendo segurança jurídica para a relação jurídica tributária subjacente, levando em consideração todo o arcabouço tecnológico e operações complexas advindas desses novos negócios. Contudo, com a Reforma Tributária aprovada e a necessidade de regulamentação de seus diversos aspectos, um novo panorama se aproxima
Concluímos, portanto, que a tributação do streaming requer uma abordagem inovadora à luz da complexidade e particularidades desse modelo de negócio digital os contratos que os permeiam aliado aos demais pontos levantados nesse estudo.
Ainda que os fatos desse novo tributo revelem grande aptidão econômica por parte do sujeito passivo, os contribuintes virtuais, deverão se ater à obediência aos princípios norteadores inseridos na Constituição Federal de modo que a resolução dos conflitos de competência exigirá esforços contínuos e colaboração de players dos mercados, cooperação quiçá internacional.
Assim o objetivo final é a garantia a segurança jurídica almejada seja com o ordenamento positivo vigente ou com as alterações que hão de vir, para o Estado, para os contribuintes, sejam eles provedores ou usuários de serviços de streaming.
REFERÊNCIAS
ABES – Associação Brasileira das Empresas de Software. Reforma Tributária. 2023. Disponível em: https://abes.com.br/reforma-tributaria/. Acesso em: 17 out. 2024.
ANATEL. Agenda Regulatória. Disponível em: https://www.gov.br/anatel/pt-br/regulado/agenda-regulatoria/2023-2024. Acesso em: 30 set 2024.
ANCINE. Agenda Regulatória. Disponível em: https://www.gov.br/ancine/pt-br/assuntos/atribuicoes-ancine/regulacao/agenda-regulatoria. Acesso em: 30 set. 2024.
ANDRADE, José Maria de Arruda. Interpretação da Norma Tributária. São Paulo: MP Editora, 2006, p. 186.
BAPTISTA, Rodrigo. Reforma tributária pode levar a aumento de preço da internet, alerta setor de TI. Agência Senado, 2024. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2024/08/28/reforma-tributaria-pode-levar-a-aumento-de-preco-da-internet-alerta-setor-de-ti. Acesso em: 30 set 2024.
BRAINLY. O que é streaming? 2020. Disponível em: https://brainly.com.br/tarefa/25074452. Acesso em: 30 set 24.
BRANDÃO JUNIOR, Salvador Cândido. O software como mercadoria e sua distinção da propriedade intelectual: uma revisão dos conceitos de circulação e de mercadoria. 2021. Tese (Doutorado) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2021. Pag. 77. Disponível em: https://doi.org/10.11606/T.2.2021.tde-14072022-094750. Acesso em: 17 out. 2024.
BRASIL. Agência Nacional de Telecomunicações 2023-2024. Publicado em 19/01/2023a. Disponível em < https://www.gov.br/anatel/pt-br/regulado/agenda-regulatoria/2023-2024>. Acesso em: 30 set 2024.
BRASIL. Agência Nacional do Cinema – ANCINE. Agenda Regulatória. Publicado em 01/01/2013. Disponível em: https://www.gov.br/ancine/pt-br/assuntos/atribuicoes-ancine/regulacao/agenda-regulatoria. Acesso em: 30 de set de 2024.
BRASIL. GT-Seac – Minuta de relatório para discussão com a sociedade. Portaria N 1.277, 9 de novembro de 2020a. disponível em: https://www.gov.br/mcom/pt-br/media/acesso-a-informacao/docs-de-acoes-e-programas/gt_seac/minuta-de-relatorio-consulta-versaopublicada.pdf. Acesso em: 22 set. 2022.
BRASIL. Projeto de Lei. PL 8889/2017. Dispõe sobre a provisão de conteúdo audiovisual por demanda (CAvD) e dá outras providências. 18/10/2017. Disponível em https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2157806. Acesso em: 30 mar. 2024.
BRASIL. Ministério das Comunicações. Grupo de Trabalho do SeAC. 2020b. Disponível em: https://www.gov.br/mcom/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/programas-projetos-acoes-obras-e-atividades/grupo-de-trabalho-do-seac. Acesso em: 30 mar. 2024.
BRASIL. Lei Nº 13.701 de 24 de dezembro de 2003. Altera a legislação do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS. Legislação Municipal. Publicada na Secretaria do Governo Municipal, em 24 de dezembro de 2003. Disponível em: https://legislacao.prefeitura.sp.gov.br/leis/lei-13701-de-24-de-dezembro-de-2003. Acesso em: 17 out. 2024.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 176626 / SP – São Paulo. Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE. Julgamento: 10/11/1998, Publicação: 11/12/1998. Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur108939/false>https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search?base=acordaos&sinonimo=true&plural=true&page=1&pageSize=10&queryString=re%20176.626&sort=_score&sortBy=desc. Acesso em: 23 set. 2022.
BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto regulamenta cobrança de tributo para os serviços de streaming. 2024a. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/1083832-projeto-regulamenta-cobranca-de-tributo-para-os-servicos-de-streaming/. Acesso em: 17 out. 2024.
BRASIL. Emenda Constitucional Nº 132, de 20 de dezembro de 2023. Altera o Sistema Tributário Nacional. Brasília, em 20 de dezembro de 2023b. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc132.htm. Acesso em: 17 out. 2024.
BRASIL. Ministério da Fazenda. Próximos passos da Reforma Tributária. YouTube, 2024b. Disponível em: https://www.gov.br/fazenda/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/reforma-tributaria/reforma-tributaria. Acesso em: 30 set 2024.
BRASIL. Resultados do grupo de Trabalho sobre a Reforma Tributária. Tribunal de Contas da União, 2023c. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/arquivos/2023/09/28/relatorio-grupodetrabalho-reformatributaria_web-_1_.pdf. Acesso em: 17 out. 2024.
BRASIL. Lei n. 9472, de 16 de julho de 1997. Dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações, a criação e funcionamento de um órgão regulador e outros aspectos institucionais, nos termos da Emenda Constitucional nº 8, de 1995. Brasília, 16 de julho de 1997.
BRASIL. Lei n. 12.485, de 12 de setembro de 2011. Dispõe sobre a comunicação audiovisual de acesso condicionado; altera a Medida Provisória nº 2.228-1, de 6 de setembro de 2001, e as Leis nºs 11.437, de 28 de dezembro de 2006, 5.070, de 7 de julho de 1966, 8.977, de 6 de janeiro de 1995, e 9.472, de 16 de julho de 1997; e dá outras providências. Brasília, 12 de setembro de 2011.
BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Brasília, 25 de outubro de 1966.
BRASIL. Lei n. 9609, de 19 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre a proteção da propriedade intelectual de programa de computador, sua comercialização no País, e dá outras providências. Brasília, 19 de fevereiro de 1998.
BRASIL. Lei n. 9610, de fevereiro de 1998. Altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências. Brasília, 19 de fevereiro de 1998.
BRASIL. Lei n. 10.168, de 29 de dezembro de 2000. Institui contribuição de intervenção de domínio econômico destinada a financiar o Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação e dá outras providências. Brasília, 29 de dezembro de 2000.
BRASIL. Supremo Tribunal federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 1945.
BRASIL. Supremo Tribunal federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 5659.
BRASIL. Supremo Tribunal federal. Recurso Extraordinário – RE 688233.
BRASIL. Projeto de Lei n° 2331, de 2022. Altera a Medida Provisória nº 2.228-1, de 6 de setembro de 2001, e a Lei nº 12.485, de 12 de setembro de 2011, para incluir a oferta de serviços de vídeo sob demanda ao público brasileiro como fato gerador da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional – CONDECINE.
BRASIL. Emenda Constitucional nº 132, de 20 de dezembro de 2023. Altera o Sistema Tributário Nacional. Brasília, em 20 de dezembro de 2023.
BRASIL. Câmara dos Deputados. PL 8.889/2017. Brasília: Camara dos Deputados, 2024.
BRASIL. Solução de Consulta Cosit nº 75, de 31 de março de 2023.
CNN BRASIL. Netflix tem 1ª queda de assinantes em uma década e projeta mais perdas. 19 abr. 2022. Disponível em https://www.cnnbrasil.com.br/business/netflix-tem-1a-queda-de-assinantes-em-uma-decada-e-projeta-mais-perdas/. Acesso em: 22 set. 2022.
GRECO, Marco Aurélio. Sobre o Futuro da Tributação: a Figura dos Intangíveis. Revista Direito Tributário Atual, [S. l.], n. 25, p. 108–120, 2011. Disponível em: https://revista.ibdt.org.br/index.php/RDTA/article/view/1580. Acesso em: 1 abr. 2024.
GRUPENMACHER, Betina Treiger. Incidência de ISS sobre streaming é inconstitucional. Consultor jurídico, 2016. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2016-dez-20/betina-grupenmacher-iss-streaming-inconstitucional/. Acesso em: 30 mar. 2024.
JONES, D. Streaming passa televisão a cabo em audiencia pela primeira vez nos EUA. Valor Econômico, 2022. Disponível em https://valor.globo.com/empresas/noticia/2022/08/19/streaming-passa-televisao-a-cabo-em-audiencia-pela-primeira-vez-nos-eua.ghtml. Acesso em: 21 ago. 2022.
MARINANGELO, Rafael. Indenização Punitiva e o dano Extrapatrimonial na disciplina dos contratos. São Paulo: Foco Editora, 2022, p. 146.
SÃO PAULO. Casa Civil. Prefeito sanciona lei que reduz impostos de plataformas de streaming. Sexta-feira, 29 de dezembro de 2023. Disponível em: https://capital.sp.gov.br/web/casa_civil/w/noticias/359879. Acesso em: 20 set. 2024
TECHTUDO. Conheça o streaming tecnologia que se popularizou na web. 2013. Disponível em: https://www.techtudo.com.br/noticias/2013/05/conheca-o-streaming-tecnologia-que-se-popularizou-na-web.ghtmlDi. Acesso em: 21 ago. 2022.
TI INSIDE. Mercado global de streaming pode movimentar US$ 14 bi até 2027. 2023. Disponível em: https://tiinside.com.br/15/09/2023/mercado-global-de-streaming-pode-movimentar-us-14-bi-ate-2027/. Acesso em: 17 out. 2024.
APÊNDICE – NOTA DE RODAPÉ
3. Disponível em: https://www.gov.br/mcom/pt-br/acesso-a-informacao/aco.es-e-programas/programas-projetos-acoes-obras-e-atividades/grupo-de-trabalho-do-seac – item IV – pag 128. Acesso em: 24 set. 2024.
4. ADI 1945, adi 5659 STF. (RE) 688223.
5. Imposto sobre a Renda Retido na Fonte – IRRF
LICENÇA DE USO DE SOFTWARE. PAGAMENTO, CRÉDITO, ENTREGA, EMPREGO OU REMESSA PARA O EXTERIOR. USUÁRIO FINAL. AQUISIÇÃO OU RENOVAÇÃO. ROYALTIES. TRIBUTAÇÃO.
Os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos em a residente ou domiciliado no exterior, pelo usuário final, para fins de aquisição ou renovação de licença de uso de software, independentemente de customização ou do meio empregado na entrega, caracterizam royalties e estão sujeitos à incidência de Imposto sobre a Renda na Fonte (IRRF), em regra, sob a alíquota de 15% (quinze por cento).
Dispositivos Legais: Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998, arts. 1º, 2º e 9º; Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, art. 7º, inciso XII; Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018, arts. 44 e 767.
BENEFICIÁRIO RESIDENTE OU DOMICILIADO EM PAÍS COM TRIBUTAÇÃO FAVORECIDA. ALÍQUOTA MAJORADA.
Na hipótese de o beneficiário ser residente ou domiciliado em país com tributação favorecida, a alíquota do IRRF sobre os royalties devidos pela licença de uso de software será de 25% (vinte e cinco por cento).
Dispositivos Legais: Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, art. 24; Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018, arts. 44 e 748.
Solução de Consulta parcialmente vinculada à Solução de Consulta Cosit nº 75, de 31 de março de 2023.
SERVIÇO TÉCNICO DE MANUTENÇÃO. ATUALIZAÇÃO DE VERSÃO SEM AQUISIÇÃO DE NOVA LICENÇA. PAGAMENTO, CRÉDITO, ENTREGA, EMPREGO OU REMESSA PARA O EXTERIOR. TRIBUTAÇÃO.
A prestação do serviço técnico de manutenção, incluindo atualização de versão do software, desde que essa atualização não origine novo licenciamento ou prorrogação do prazo da licença original, quando remunerada a residente ou domiciliado no exterior, estará sujeita à incidência de IRRF à alíquota de 15% (quinze por cento).
Caso o prestador do serviço seja residente ou domiciliado em país ou dependência enquadrado como de tributação favorecida, incidirá a alíquota de 25% (vinte e cinco por cento).
Dispositivos Legais: arts. 748 e 765 do Anexo do Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018.
Assunto: Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – CIDE
LICENÇA DE USO DE SOFTWARE. ATUALIZAÇÃO DE VERSÃO COM AQUISIÇÃO DE NOVA LICENÇA. PAGAMENTO, CRÉDITO, ENTREGA, EMPREGO OU REMESSA PARA O EXTERIOR. SEM TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA. NÃO INCIDÊNCIA.
A Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico não incide sobre a remuneração a residente ou domiciliado no exterior pela licença de uso de programa de computador (software), incluindo a aquisição de versão de atualização do software, através de nova licença ou prorrogação do prazo da licença original, salvo quando envolver a transferência da correspondente tecnologia.
Dispositivos Legais: art. 2º, § 1º-A, da Lei nº 10.168, de 2000.
SERVIÇO TÉCNICO DE MANUTENÇÃO. ATUALIZAÇÃO DE VERSÃO SEM AQUISIÇÃO DE NOVA LICENÇA.
A Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incide sobre a remuneração a residente ou domiciliado no exterior, em caso de contratação de serviço técnico de manutenção pela atualização da versão do próprio software, desde que não origine novo licenciamento, à alíquota de 10% (dez por cento).
Dispositivos Legais: art. 2º, § 2º, da Lei nº Lei nº 10.168, de 2000.
Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep
IMPORTAÇÃO. SOFTWARES DE PRATELEIRA. DOWNLOAD. LICENÇA DE USO. SERVIÇOS CONEXOS. CONTRATO. PREVISÃO CONCOMITANTE DE LICENÇA DE USO E SERVIÇOS CONEXOS. INCIDÊNCIA.
No contrato de licenciamento de uso de softwares a obrigação de fazer está presente no esforço intelectual, seja a aquisição por meio físico ou eletrônico, o que configura contraprestação por serviço prestado os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a beneficiário residente ou domiciliado no exterior como remuneração decorrente dessa adesão, incidindo a Contribuição para o PIS/Pasep-Importação sobre tais valores, nos termos do inciso II do art. 7º c/c o inciso II do art. 3º da Lei nº 10.865, de 2004.
A Contribuição para o PIS/Pasep-Importação incide sobre os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no exterior, como contraprestação à prestação de serviços decorrentes de contratos de licenciamento de uso de softwares, como a manutenção e o suporte a esses relacionados.
REFORMA PARCIALMENTE A SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 303, DE 2017; A SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 374, DE 2017; A SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 262, DE 2017; A SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 448, DE 2017 E A SOLUÇÃO DE DIVERGÊNCIA Nº 2, DE 2019.
Dispositivos Legais: arts. 21, 22 e 23 da Lei nº 4.506, de 30 de novembro de 1964; arts. 1º, 2º, 6º, e 9º a 12 da Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998; arts. 1º, 3º, 4º e inciso II do art. 7º da Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004.
Assunto: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins
IMPORTAÇÃO. SOFTWARES DE PRATELEIRA. DOWNLOAD. LICENÇA DE USO. SERVIÇOS CONEXOS. CONTRATO. PREVISÃO CONCOMITANTE DE LICENÇA DE USO E SERVIÇOS CONEXOS. INCIDÊNCIA.
No contrato de licenciamento de uso de softwares a obrigação de fazer está presente no esforço intelectual, seja a aquisição por meio físico ou eletrônico, o que configura contraprestação por serviço prestado os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a beneficiário residente ou domiciliado no exterior como remuneração decorrente dessa adesão, incidindo a Cofins-Importação sobre tais valores, nos termos do inciso II do art. 7º c/c o inciso II do art. 3º da Lei nº 10.865, de 2004.
A Cofins-Importação incide sobre os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no exterior, como contraprestação à prestação de serviços decorrentes de contratos de licenciamento de uso de softwares, como a manutenção e o suporte a esses relacionados.
REFORMA PARCIALMENTE A SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 303, DE 2017; A SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 374, DE 2017; A SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 262, DE 2017; A SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 448, DE 2017 E A SOLUÇÃO DE DIVERGÊNCIA Nº 2, DE 2019.
Dispositivos Legais: arts. 21, 22 e 23 da Lei nº 4.506, de 30 de novembro de 1964; arts. 1º, 2º, 6º, e 9º a 12 da Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998; arts. 1º, 3º, 4º e inciso II do art. 7º da Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004.
6. “É inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza – ISS sobre operações de locação de bens móveis.”
7. Ação direta de inconstitucionalidade. Direito Tributário. ISS. Relações mistas ou complexas. Orientação da Corte sobre o tema. Subitem 3.04 da lista anexa à LC nº 116/03. Locação, sublocação, arrendamento, direito de passagem ou permissão de uso, compartilhado ou não, de ferrovia, rodovia, postes, cabos, dutos e condutos de qualquer natureza. Interpretação conforme. Necessidade de as situações descritas integrarem operação mista ou complexa. Local da ocorrência do fato gerador. Ausência de violação dos princípios da razoabilidade ou da proporcionalidade. 1. Nas relações mistas ou complexas em que não seja possível claramente segmentar as obrigações de dar e de fazer – “seja no que diz com o seu objeto, seja no que concerne ao valor específico da contrapartida financeira” (Rcl nº 14.290/DF-AgR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Rosa Weber) –, estando a atividade definida em lei complementar como serviço de qualquer natureza, nos termos do art. 156, III, da Constituição Federal, será cabível, a priori, a cobrança do imposto municipal. Aplicação do entendimento ao subitem 3.04 da lista anexa à LC nº 116/03. 2. O art. 3º, § 1º, da LC nº 116/03 não viola os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Ele estabelece que se considera ocorrido o fato gerador e devido o imposto em cada município em cujo território haja extensão de ferrovia, rodovia, postes, cabos, dutos e condutos de qualquer natureza, objetos de locação, sublocação, arrendamento, direito de passagem ou permissão de uso, compartilhado ou não. Existência de unidade econômica, para fins de tributação, em cada uma dessas urbes, ainda que o sujeito passivo não tenha nelas instalado unidade de gerenciamento de atividades, filial ou mesmo infraestrutura operacional para calcular ou pagar o imposto. 3. Ação direta de inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente, conferindo-se interpretação conforme à Constituição Federal ao subitem 3.04 da lista anexa à LC nº 116/03, a fim de se admitir a cobrança do ISS nos casos em que as situações nele descritas integrem relação mista ou complexa em que não seja possível claramente segmentá-las de uma obrigação de fazer, seja no que diz com o seu objeto, seja no que concerne ao valor específico da contrapartida financeira.
8. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO TRIBUTÁRIO. ISS. ARRENDAMENTO MERCANTIL. OPERAÇÃO DE LEASING FINANCEIRO. ARTIGO 156, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. O arrendamento mercantil compreende três modalidades, [i] o leasing operacional, [ii] o leasing financeiro e [iii] o chamado lease-back. No primeiro caso há locação, nos outros dois, serviço. A lei complementar não define o que é serviço, apenas o declara, para os fins do inciso III do artigo 156 da Constituição. Não o inventa, simplesmente descobre o que é serviço para os efeitos do inciso III do artigo 156 da Constituição. No arrendamento mercantil (leasing financeiro), contrato autônomo que não é misto, o núcleo é o financiamento, não uma prestação de dar. E financiamento é serviço, sobre o qual o ISS pode incidir, resultando irrelevante a existência de uma compra nas hipóteses do leasing financeiro e do lease-back. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
[1] Doutoranda – Pós-Graduação- Stricto sensu- PUC-SP- Pontifícia Universidade Católica – (em curso) – Direito Constitucional e Processual Tributário. Mestre – Pós-Graduação- Stricto sensu- PUC-SP- Pontifícia Universidade Católica -Direito Constitucional e Processual Tributário. Especialista- Pós-Graduação- Lato sensu- EPD – Escola Paulista de Direito Tributário. Bacharel em direito- Faculdades Integradas de Itapetininga. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8881-3967. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/4140423271829159.
[2] Orientadora. Doutora e Mestre – Pós-Graduação- Stricto sensu- PUC-SP- Pontifícia Universidade Católica. Atualmente é Vice Coordenadora da Pós-Graduação Stricto Sensu (Mestrado/Doutorado) do Núcleo de Direito Constitucional e Processual Tributário da PUC/SP, Professora de Direito Tributário e Processo Tributário da graduação e pós-graduação do Mestrado e Doutorado da PUC/SP, Ex-Juíza Contribuinte do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo (TIT/SP) por 6 anos, Membro efetivo da Comissão da OAB de Direito Tributário, Ex-Membro efetivo da Comissão da OAB de Contencioso Administrativo Tributário. Economista pela FAAP. Sócia do escritório Bonfá de Jesus Advogados. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Tributário. Autora do livro: Manual de Direito e Processo Tributário, 5a edição, ed. Thomson Reuters-Revista dos Tribunais, 2019. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3152-7839. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8302310539840338.
Material recebido: 01 de agosto de 2024.
Material aprovado pelos pares: 03 de outubro de 2024.
Material editado aprovado pelos autores: 17 de outubro de 2024.