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A análise das obras literárias sob a égide da intolerância

RC: 34898
222
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/ciencias-sociais/egide-da-intolerancia

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

SILVA, Letícia Torrão e [1]

SILVA, Letícia Torrão e. A análise das obras literárias sob a égide da intolerância. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 04, Ed. 07, Vol. 13, pp. 173-193. Julho de 2019. ISSN: 2448-0959

RESUMO

O objetivo desse artigo é analisar a diversidade de obras de literatura, concedendo exemplos, que abordam a temática da intolerância, um tema presente por toda a história e que merece destaque na contemporaneidade. A intolerância manifesta-se na sociedade de diversas formas. Nesse sentido, como a literatura é um reflexo do corpo social, ou seja, do seu pensamento e do que ocorre nele, é possível identificar a presença da intolerância nas obras literárias, retratando, assim, a própria reação da sociedade acerca desse tema. Ademais, é possível identificar que nem todas as obras possuem a mesma perspectiva, variando de acordo com a cultura do local e tempo em que foram escritas, considerando, também, a visão do próprio autor a respeito da perspectiva social desse tema, podendo estabelecer críticas ou reafirmá-la.

Palavras-Chave: literatura, sociedade, intolerância, obras literárias.

INTRODUÇÃO

A intolerância é um fenômeno que, infelizmente, perdura através da história. Ela se caracteriza pela dificuldade em aceitar o outro, ou seja, quem possui costumes, hábitos, ou, até mesmo, características físicas diferentes do que determinada cultura considera como padrão em um dado período de tempo.

O diferente causa espanto, uma vez que há receio quanto a mistura de culturas e modificação dos costumes originais. Desse modo, é possível “entender” o motivo dos imigrantes serem tão rejeitados. Todavia, esse pensamento, mostra-se infundado, uma vez que a interação de culturas só tende a engrandecer os conhecimentos. Ademais, o preconceito baseia-se em características superficiais, que são comandadas pelo irracional, por isso não encontraram fundamento algum na lógica. Nesse sentido, Bobbio se pronuncia

(…) preconceito uma opinião ou um conjunto de opiniões, às vezes até mesmo uma doutrina completa, que é acolhida acrítica e passivamente (…) resiste a qualquer refutação racional, vale dizer, a qualquer refutação feita com base em argumentos racionais. Por isso se diz corretamente que o preconceito pertence à esfera do não racional, ao conjunto das crenças que não nascem do raciocínio e escapam de qualquer refutação fundada num raciocínio. (BOBBIO, 1909, p.103)

Na contemporaneidade, parte do Oriente Médio vive uma crise política e social, estando, constantemente, em guerra civil, nas quais muitos inocentes, inclusive crianças e idosos, são mortos. Assim, essas pessoas buscam abrigo em outros locais, uma vez que em sua terra não é mais possível sobreviver. Para isso, se arriscam nos mares, na maioria das vezes, acompanhados de suas famílias, enfrentando tempestades e outras adversidades naturais. Ademais, não há mantimentos para todo o decorrer da viagem, sendo necessário passar por períodos em que até a comida se torna escassa.

Além disso, quando chegam no país em que buscam abrigo, muitas vezes, são rejeitados e encontram as fronteiras fechadas, não tendo para onde ir, e morrem. Esse recuo dos países, principalmente europeus, a oferecer refúgio aos imigrantes ocorre por causa da intolerância. Assim, a rejeição ocorre motivada pelo sentimento preconceituoso e instantâneo, ou seja, sem analisar as questões anteriores que o imigrante sofreu e a sua real necessidade de abrigo. Nesse sentido, Sayad se manifesta

(…) o imigrante só existe na sociedade que assim o denomina a partir do momento em que pisa em seu território; o imigrante “nasce” nesse dia para a sociedade que assim o designa. Dessa forma, ela (a sociedade) se arvora o direito de desconhecer tudo o que antecede esse momento e esse nascimento. Esta é outra versão do etnocentrismo: só se conhece o que se tem interesse de conhecer (…) (SAYAD, 1998, p.16)

Os motivos alegados para o não acolhimento são a economia e os recursos do espaço territorial. Contudo, Estados mais fracos economicamente e com menos recursos em seus territórios já acolheram e enfrentaram crises de imigração como as de hoje em dia. A Turquia, o Paquistão e o Líbano, por exemplo, estão dentre os países que mais acolheram os imigrantes da crise atual. Segundo os dados expostos no jornal Globo: “95% estão em países vizinhos a conflitos e crises, a maioria em regiões em desenvolvimento. Cerca de 3,5 milhões de sírios estão na Turquia, no Líbano e na Jordânia. Mais de 500 mil somalianos estão no Quênia. Mais de 2 milhões afegãos estão no Paquistão e no Irã. ”[2]

Desse modo, é perceptível que os motivos alegados não são os principais para o não acolhimento dos refugiados, mas sim o sentimento xenófobo. Dessa forma, torna-se evidente que os países europeus se esqueceram que sua população causou crises de imigrações no período da Segunda Guerra Mundial, indo, principalmente, para países que, anteriormente, haviam colonizado, facilitando, desse modo, a superação da dificuldade de se adaptar a um novo idioma. Nessa perspectiva, percebe-se que, hoje, rejeitar os que chegam em suas terras é incoerente com seus atos passados, já que, outrora, esses, que atualmente rejeitam os imigrantes, buscaram refúgio para afastar-se da guerra que viviam.

Nesse contexto, os países que rejeitam os imigrantes descumprem o Estatuto dos Refugiados – Convenção de 1951, já que em um de seus comandos está presente a ideia de acolhimento dos imigrantes.

“Nenhum dos Estados Contratantes expulsará ou rechaçará, de maneira alguma, um refugiado para as fronteiras dos territórios em que a sua vida ou a sua liberdade seja ameaçada em virtude da sua raça, da sua religião, da sua nacionalidade, do grupo social a que pertence ou das suas opiniões políticas. ” (CONVENÇÃO DE 1951, art. 33)

O antropólogo Roque de Barros Laraia no seu livro “Cultura: um conceito antropológico” defende que a cultura está em constante mudança e que essa dinâmica deve ser compreendida, a fim de evitar comportamentos preconceituosos.

Concluindo, cada sistema cultural está sempre em mudança. Entender esta dinâmica é importante para atenuar o choque entre as gerações e evitar comportamentos preconceituosos. Da mesma forma que é fundamental para a humanidade a compreensão das diferenças entre povos de culturas diferentes, é necessário saber entender as diferenças que ocorrem dentro do mesmo sistema. Este é o único procedimento que prepara o homem para enfrentar serenamente este constante e admirável mundo novo do porvir. (LARAIA, 2001, p. 101)

Dessa forma, é possível compreender que a alteridade, capacidade de identificar e aceitar o diferente, e a tolerância devem ser praticadas, a fim de que todas as culturas não se percam com o tempo, mas se atualizem e aumentem tanto sua abrangência quanto seus campos do saber.

Nesse contexto, a literatura auxilia na mudança ou manutenção de determinada perspectiva, podendo ser benéfica e auxiliando na desconstrução da intolerância, despertando os indivíduos para a compreensão da barbárie de alguns atos humanos, ou conceder respaldo ao preconceito e divulgá-lo. Nesse sentido, o livro “Mein Kampf” de Adolf Hitler, estimulou o pensamento preconceituoso e xenófobo, principalmente, em relação aos judeus, usando-os como espécie de “justificativa” para a crise que a Alemanha enfrentava na época.

Entretanto, também há obras literárias que valorizam e concedem papéis de destaque para pessoas marginalizadas, colocando-as no centro da sociedade, nem que, somente, pelo instante em que se lê. Esse é o caso de “A tenda dos milagres”, livro de Jorge Amado, que valoriza um homem mestiço, sem formação acadêmica e representante do sincretismo religioso. Sendo assim, o protagonista, seguindo a dinâmica cultural do país, seria ser rejeitado e estaria à margem da sociedade. Contudo, ele é retratado como um intelectual autodidata, possuindo uma inteligência tanto racional quanto social, advinda do convívio nas ruas.

Dessa forma, é visto que a literatura pode ser danosa a sociedade, reproduzindo seus preconceitos e, por eles estarem fixados no corpo social, não serem reconhecidos como nocivos, aumentando seus impactos. Todavia, para que isso não ocorra é preciso analisar cada obra, a partir de uma visão crítica, a fim de que ela não tenha poder de distorcer os fatos e se tornar uma ameaça.

(…) relações entre literatura e sociedade, apresenta-nos a necessidade de uma reflexão sobre como os métodos sociológicos de abordagem do texto literário, ou mais especificamente a chamada sociologia da literatura, entenderiam o problema da representação da realidade pela literatura (ARAÚJO NETO, 2007, p. 16)

Assim, é perceptível a relação direta existente entre sociedade, literatura e intolerância, uma vez que uma pode gerar e reproduzir a outra. Desse modo, há uma troca de conceitos entre as três vertentes, que se constroem mutuamente. Nesse sentido, para conseguir obter uma percepção completa do que determinada obra pretende transmitir é necessário que os seus métodos de elaboração, incluindo o público alvo, sejam identificados.

1. RELAÇÃO DA SOCIEDADE COM A LITERATURA

Para compreender a relação que a sociedade estabelece com a literatura é preciso que o poder catártico das obras seja analisado, pois é por meio dele que os indivíduos conseguem identificar-se com o que está sendo retratado, reconhecendo a si próprios durante a leitura da obra. Nesse contexto, é possível que o enredo ou as análises apresentadas despertem no leitor novas perspectivas sobre a realidade social, ou reforcem as que já possuem.

A palavra “catarse” vem do grego “kátharsis” e significa “purificação”. Esse conceito foi utilizado em diversas áreas do conhecimento, como a medicina, psicanálise, filosofia e literatura. Na Grécia Antiga, Aristóteles entendia que a encenação de um drama possuía poder catártico, despertando certa sensação nos seus espectadores e purificando-os, uma vez que os seus sentimentos seriam liberados e, com isso, haveria a purificação da alma. Marilena Chauí, analisando os textos de “A Poética”, esclarece essa ideia.

O sentimento que se apresenta em certas almas de forma violenta existe, de certo modo, em todas. Por exemplo, a piedade e o temor, e ainda o entusiasmo, pois esta paixão também produz suas vítimas. Mas, sob a influência das melodias sagradas, quando sentiram os efeitos dessas melodias, vemos tais almas, que foram excitadas até ao delírio místico, restauradas, como se tivessem encontrado a cura e a purificação. O mesmo tratamento deve ser aplicado aos que estão inclinados para a piedade, para o terror ou outra paixão, bem como a todos os outros, desde que sejam susceptíveis de padecer tais paixões. Todos esses necessitam ser purificados de algum modo e suas almas necessitam ser aliviadas ou satisfeitas. (CHAUÍ, 1994, p. 339)

Isso significa que os espectadores conseguiriam se identificar com o que era retratado e, por meio dessa experiência, liberar sentimentos reprimidos e, até mesmo, aprender a resolver e superar situações que ainda não vivenciaram, mas comuns na vida, por exemplo, o término de um relacionamento ou a perda de um ente querido. Assim, haveria uma purificação de sentimentos reprimidos e o aprendizado com situações ainda não presenciadas.

Desse modo, a catarse ajudaria na psique das pessoas, já que causaria um alivio de tensão provocado pela liberação de determinado problema incutido no psicológico. Nesse sentido, a literatura possui o mesmo poder de provocar empatia e identificação com a história que as encenações gregas, fazendo com que seus leitores aprendam com determinadas situações sem, necessariamente, precisarem vivenciá-las anteriormente. As encenações, assim como a literatura, são vistas, pois, como uma lição.

(…) suscitar no espectador paixões que imitem as que ele sentiria se, de fato, os acontecimentos trágicos acontecessem e devem, a seguir, oferecer remédios para essas paixões, fazendo o espectador sair do teatro emocionalmente liberado ou capaz de liberar-se do peso de suas emoções. O espectador deve aprender, pela imitação (pelo espetáculo oferecido), o bem e o mal das paixões, o que podem fazer de terrível ou benéfico para os humanos. (CHAUÍ, 1994, p. 338)

Portanto, a literatura transcende a configuração formal e gramatical do texto, para que a compreensão e identificação dos indivíduos com o mundo social, de fato, se concretize. Por meio da compreensão desse panorama, é possível que haja uma mudança de pensamento, devido a uma análise, por outra perspectiva, da realidade. Assim, é possível que histórias que retratem e concedam destaque a preconceitos sociais consigam modificar o pensamento dos leitores sobre aquele tema, fazendo-os compreender a barbárie existente em determinadas atitudes.

(…) para a análise da experiência do leitor ou da ‘sociedade de leitores’ de um tempo histórico determinado, necessita-se diferenciar, colocar e estabelecer a comunicação entre dois lados da relação texto e leitor. Ou seja, entre o efeito, como momento condicionado pelo texto, e a recepção, como momento condicionado pelo destinatário, para a concretização do sentido como duplo horizonte – interno ao literário, implicado pela obra, e o mundivivencial, trazido pelo leitor de uma determinada sociedade. Isso é necessário a fim de se discernir como a expectativa e a experiência se desencadeiam e para saber se, nisso, se produz um momento de nova significação. (JAUSS, 1979, p. 49)

Jauss expõe de modo claro que é preciso analisar o efeito do texto sobre o leitor, a partir do momento histórico e a cultura vivida pelo leitor, a fim de que se possa compreender se houve uma “nova significação”, ou seja, se o leitor aprendeu, de fato, com o enredo e se, de algum modo, afetou sua visão da sociedade, modificando-a.

Há certas técnicas literárias que conseguem captar uma maior atenção do leitor e provocar reflexões mais profundas acerca do tema. Nesse sentido, a ironia, por exemplo, é um método muito utilizado para dizer o contrário do que realmente deseja expressar, acarretando muitas vezes um sentimento de indignação no leitor e, assim, levando-o a pensar sobre a situação expressa.

Além disso, a ironia também pode se caracterizar pela inversão de situações, colocando o oprimido da realidade social no lugar privilegiado, causando um certo desconforto nos que se percebem retratados à margem da sociedade pela literatura e, fazendo-os refletir e, certas vezes, mudar seu pensamento sobre a situação oposta. Camila Alavarce faz, em seu livro, uma análise sobre a ironia e sua capacidade de modificar o pensamento e percepção de mundo dos indivíduos

(…) à medida que convidam o sujeito para colaborar na construção do sentido, esses discursos são vias para instaurar um movimento de reflexão e, consequentemente, de ampliação do conhecimento e da percepção crítica (…) É realmente significativa a possibilidade de esses discursos alargarem a visão de mundo do sujeito, permitindo que ele acesse outras realidades ou, ainda, que delineie sua própria forma de enxergar e entender a realidade (que pode destoar, e muito, do senso comum ou da concepção da maioria). (ALAVARCE, 2009, p.12)

Outro recurso utilizado com essa finalidade é o exagero ou a hipérbole, demonstrando, por meio de uma situação em que a realidade social é aumentada e seus defeitos conseguem ficar mais evidentes, o quanto uma ação pode ser repulsiva. Nesse caso, a reflexão ocorre porque o acontecimento retratado causa espanto, levando o leitor a pensar sobre como a situação retratada se concretiza na realidade social, percebendo, dessa forma, o quão reprovável ela é.

Além disso, é presente a necessidade de compreender os reflexos da literatura na sociedade, e foi com essa finalidade que surgiu a sociologia da literatura. Essa vertente de estudo foi analisada na obra de Antônio Cândido. Assim, em seu livro, ele identifica como e em qual medida a literatura reflete práticas sociais, analisando o “externo”, ou seja, a realidade social, e o “interno”, isto é, o campo literário.

(…) o externo importa, não como causa, nem como significado, mas como elemento que desempenha um certo papel na constituição da estrutura, tornando-se assim, interno (CANDIDO, 2006, p.14)

Há a necessidade de se analisar, na literatura, qual o objetivo da obra e o público alvo que o autor buscou atingir, para, então, compreender sua função social. Essa intenção, geralmente, vem junto com um aspecto ideológico. Nesse sentido, a obra de Adolf Hitler, por exemplo, dissemina ideais nazistas e corrobora um discurso de ódio e intolerância, visando unir os alemães em torno do seu próprio ideal, possuindo, assim, um viés ideológico que pode ser identificado pelo contexto da obra, seu objetivo e público alvo. Há, portanto, a aplicação do meio social como um meio de explicação de suas ideias, fornecendo, por meio do livro, elementos para validar esse pensamento e causar determinado efeito sobre as massas de leitores que absorvem esses ideais.

Desse modo, o jeito pelo qual a realidade social vai ser retratada na obra depende da percepção do autor sobre essa, uma vez que há a modificação do meio social, a partir de sua percepção e fazendo com que, por meio da obra, seus leitores sejam convencidos de sua perspectiva acerca dos fatos sociais. Há, portanto, em toda obra, uma concepção pessoal e subjetiva.

Em sua obra “Literatura e sociedade”, Antônio Cândido, também diferencia dois tipos de arte. Há, nesse contexto, a arte de agregação e a de segregação.

No primeiro caso, a arte seria mais acessível à população e, também, por causa do público que teria acesso a ela, retrataria com mais frequência o mundo social que cerca os indivíduos, concedendo destaque a grupos marginalizados e alvos de pensamentos intolerantes. Assim, essas obras utilizam-se do sistema simbólico vigente, sendo compreendidas pela maioria da população. (CANDIDO, 2006)

Já a arte de segregação preocupa-se em modificar o sistema simbólico, tornando-se, assim, mais restrita. Por isso, sua mensagem só é alcançada por uma parte dos indivíduos, restringindo, desse modo, seu público leitor. Essa arte pode abordar temas mais eruditos, visando ao interesse de seu público alvo ou temas sociais, mas de modo mais sofisticado, a fim de direcionar uma crítica a determinado público ou, a fim de corroborar a concepção de seus leitores. (CANDIDO, 2006)

Mas se considerarmos apenas a predominância de um ou de outro, a distinção pode ser mantida, o que nos interessa aqui sobremaneira, pois foi feita com o pensamento em dois fenômenos sociais muito gerais e importantes: a integração e a diferenciação. (CANDIDO, 2006, p. 33)

Dessa forma, é evidente que a sociedade e a literatura são diretamente relacionadas, uma vez que o autor se inspira e transforma acontecimentos reais para atingir, de algum modo, seus leitores que também exercem o trabalho de pensar sobre a obra com base nas situações reais. Assim, a literatura não é mero reflexo da vida social, pois cada uma possui valor individual e subjetivo, concedido por quem a escreve e identificado pela perspectiva de quem a lê.

2. LITERATURA COMO REFLEXO DA INTOLERÂNCIA: MEIN KAMPF

Como pôde um livro unanimemente considerado patético, politicamente confuso, de leitura aborrecida e, em suma, ridículo, tornar-se tão nefastamente eficaz? Qual o poder de fascinação que ainda exerce? A quem se dirige e porquê? (KOSCHORKE, 2016, contracapa)

O livro escrito por Adolf Hitler teve sua origem, enquanto esse se encontrava preso, por causa da tentativa de derrubar o governo alemão da época (República de Weimar), durante o Putsch da Cervejaria de Munique, em 1923.

Como visto anteriormente, para compreender sua dimensão é preciso analisar o objetivo do livro e qual seu público alvo. Nesse sentido, a obra era destinada aos membros do partido nacional socialista (nazista), a fim de fomentar o sentimento de nação alemã e aumentar o ódio contra os que, segundo esse grupo, estariam prejudicando os arianos a alcançar a grandeza a qual estariam destinados. Essa grandeza era relativa tanto ao poder e prestígio quanto a dimensão territorial.

Inicialmente, o livro foi vendido em dois volumes. O primeiro foi publicado em 1925 e era autobibliográfico, servindo, posteriormente, para compreender a mente do ditador nazista e buscar as origens da sua raiva tão profunda. Já o segundo era sobre as ideias nazistas e buscava abordar os motivos da Alemanha ter perdido a Primeira Guerra Mundial. Nessa perspectiva, atualmente, o livro continua sendo grande fonte de inspiração para o ressurgimento de ideias nazistas, sendo, por isso, proibido em diversos países. Todavia, é também por meio de sua leitura que pode ser compreendida a dimensão dos danos causados e a importância dessa ideologia ser combatida.

O próprio Hitler reconhece que, apesar de seu livro possuir o poder de influenciar o pensamento social, o seu discurso era o que, de fato, iria fazer com que houvesse uma adesão da grande maioria da população alemã às suas ideias. “(…) se conquistam adeptos menos pela palavra escrita do que pela palavra falada e que, neste mundo, as grandes causas devem seu desenvolvimento não aos grandes escritores, mas aos grandes oradores” (HITLER, 2001, prefácio). Por isso, há uma grande importância de se divulgar as ideias expostas nesse livro, a fim de que a população identifique melhor as ideias preconceituosas e, com isso, situações como as da Segunda Guerra Mundial não voltem a ocorrer.

No livro, Hitler estimula a intolerância contra diversos grupos, como homossexuais, ciganos, negros. Todavia, a vertente mais criticada e descrita explicitamente como inimiga no livro são os judeus. Esses seriam a principal causa da rendição da Alemanha na guerra, agindo contra os interesses da nação, pois haviam boicotado a guerra, devido aos prejuízos aos seus negócios. É explícito no livro que a motivação do ódio quanto aos judeus é referente à questão econômica.

Economicamente, eles criam para os Estados tal situação que as empresas oficiais, deixando de dar rendas, são subtraídas à direção do estado e submetidas à fiscalização financeira do judeu. No terreno político, recusam eles ao Estado os meios para sua subsistência, destroem as bases de toda e qualquer defesa nacional, aniquilam a crença em uma chefia, desprezam a história e o passado, e enlameiam tudo que é expoente de grandeza real (…). A religião é ridicularizada. Bons costumes e moralidades são taxados de coisas do passado, até que os últimos esteios de uma nacionalidade tenham desaparecido. (HITLER, 2001, p. 210)

Outrossim, Hitler criticava ramos que contribuíam para a democracia, como a imprensa, já que, segundo ele, essa pregava o pacifismo enquanto havia diversos soldados e médicos morrendo no front de batalha, desestimulando, assim, a luta e, por isso seria uma das responsáveis pela derrota da Alemanha na Primeira Guerra.

É perceptível, portanto, que o ditador, pela escritura do livro, concedia um caminho delineado para exercer suas ideias, uma vez que já criticava elementos que promoviam a liberdade de expressão, como a imprensa e a democracia. É importante destacar que esses ideais eram pertencentes ao próprio Hitler e compartilhados por alguns indivíduos, mas para possuir uma maior abrangência o ditador utilizava-se da concepção de nação, a fim de unir os alemães em torno de um objetivo comum e fazê-los seguir suas ideias.

Nesse ponto, Hitler valoriza a condição de nação, inclusive exaltando o sacrifício dos homens por objetivos mascarados em seu livro como “comuns a toda população alemã”, ou seja, introduz por essa ideia que o sacrifício de alguns é necessário para a prosperidade da coletividade sob a ótica nacionalista, estimulando o “desejo” de participar da guerra e defender o país, pois, sob essa visão, somente seria digno quem estivesse disposto a morrer pela nação.

Quanto mais aumenta a disposição para sacrificar interesses puramente pessoais, tanto mais se desenvolve a capacidade para erigir comunidades mais importantes. É o ariano que apresenta, de modo mais expressivo, essa disposição para o sacrifício do trabalho pessoal, e, sendo necessário, até da sua própria vida que arrisca em favor dos outros (…) a significação intrínseca de toda organização repousa sobre o princípio do sacrifício. (HITLER, 2001, p.193)

Outrossim, a afirmação de Koschorke, exposta anteriormente- que o livro é considerado, pela maioria dos escritores e intelectuais, patético do ponto de vista de sua elaboração escrita e lógica- fica evidente quando as contradições presentes no livro são observadas.

Uma dessas questões é a aliança da Alemanha com a Itália e a Inglaterra, que, no livro, são expressas como os únicos países aliados possíveis, não por possuírem a mesma ideologia, mas por terem um inimigo comum, a França. Essa repulsa à França é ocasionada pelo pensamento de que o país invadiria a Alemanha pelo oeste para expandir seu território. Isso apresentaria uma ameaça à raça ariana, porque havia muitos franceses de pele escura, devido a miscigenação com os povos colonizados. Todavia, esse sentimento de ódio é também derivado do inconformismo de Hitler com o Tratado de Versalhes, que retirou territórios alemães para integrar parte da França.

Outra contradição evidente é a crítica a Rússia, por causa da sua nação, que seria marxista, portanto, não confiável, o que os tornava um país inimigo, com o qual não poderiam ser feitos acordos. Entretanto, durante a Segunda Guerra Mundial, Adolf Hitler e Joseph Stalin assinaram um pacto de não agressão. Outra importante questão que é abordada no livro é o: “espaço vital”, a dimensão territorial para que o povo alemão se desenvolvesse. Nesse ponto, ele compara a extensão territorial russa com a alemã, escrevendo que era injusta a distribuição das dimensões, visto que eram decorrentes do acaso e deveriam ser mudadas.

É perceptível, a partir dessa análise, que o livro possuía diversas incoerências com o realizado na realidade. A questão é: seus leitores não perceberam que os ideias expostos no livro eram decorrentes do próprio escritor e que Hitler agiria a qualquer custo, a fim de alcança-los, mesmo que essas atitudes contrariassem algumas de suas ideias expostas no livro? Alcir Lenharo nos concede uma diretriz para essa resposta, demonstrando que a força da ideologia de Hitler estava na sua inovação: a influência psicológica capaz de tornar os indivíduos cegos para a realidade e enxergar somente os ideais que “conduziriam” a sociedade alemã a sua antiga prosperidade. “A novidade do nazismo era sua força psicológica, que predispunha todos, trabalhadores ou não, a aceitarem ou assumirem seu corpo ideológico” (LENHARO,1986, p. 11).

Os ideais presentes no livro não estavam em evidência somente na Alemanha, mas em grande parte da Europa, porque os cidadãos dos países que foram derrotados na Primeira Guerra não queriam admitir sua culpa, transferindo-a aos estrangeiros, principalmente os que moravam nos seus países. Desse modo, o preconceito ganhou destaque e a miscigenação era identificada como a causa do fracasso.

Isso é um fenômeno perfeitamente natural: todo cruzamento entre dois seres de situação um pouco desigual na escala biológica dá, como produto, um intermediário entre os dois pontos ocupados pelos pais (…). Semelhante união está, porém, em franco desacordo com a vontade da Natureza, que, de um modo geral, visa o aperfeiçoamento da vida na procriação. (…). Não se deve misturar com o mais fraco, sacrificando assim a grandeza própria. (…) em toda mistura de sangue entre o Ariano e povos inferiores, o resultado foi sempre a extinção do elemento civilizador. (HITLER, 2001, p.185 e 186)

Dessa forma, Hitler aproveitou o momento propício para a divulgação de suas ideias e conseguiu fazer com que os indivíduos apoiassem e disseminassem seu pensamento. Ele escondeu seus interesses pessoais por trás de uma mensagem nacionalista e de retomada do sentimento de nação e da época gloriosa- em que a Alemanha era um Império- instaurando um desejo na população de enfrentar uma guerra, a fim conseguir territórios e, assim, retomar seu prestígio.

4. LITERATURA COMO CRÍTICA: TENDA DOS MILAGRES

Em contraponto com “Mein Kampf”– que ficou marcado na história por pregar a intolerância e disseminar o ódio- “Tenda dos Milagres” descontrói diversos paradigmas preconceituosos presentes na sociedade. Além disso, as situações atrozes da Segunda Guerra Mundial foram abordadas no livro de Jorge Amado, inclusive citando Adolf Hitler, a fim de originar uma reflexão sobre seus pensamentos cruéis. “(…) se Hitler ganhasse a guerra poderia ou não matar tudo que não fosse branco puro, acabando de vez com o resto do povo? ” (AMADO, 2008, p.32).

Nesse contexto, é imprescindível, para analisar o papel relevante do livro na desconstrução do preconceito existente no Brasil, o entendimento de seu enredo, que engloba duas fases. Na primeira, retrata a trajetória de um estrangeiro que vem ao Brasil para conhecer a terra de Pedro Archanjo, o autor de um dos seus livros favoritos. Na segunda, acompanha o cotidiano do protagonista e destaca suas características principais.

Na primeira parte, o homem, que antes era desconhecido, começa a ser procurado pela imprensa, por causa da avaliação positiva de um estrangeiro sobre sua obra. O homem é Pedro Archanjo e, por não se encaixar nos moldes valorizados pela sociedade, nunca havia recebido o reconhecimento devido por seu trabalho, até que um estrangeiro o elogiou.

Nesse sentido, estamos diante de um bom ponto de partida para uma reflexão acerca do modo que o povo brasileiro enxerga a si próprio. Nesse contexto, o interesse instantâneo que a impressa desperta por Pedro Archanjo, por causa da opinião estrangeira, retrata o quanto os brasileiros se subvalorizam e como são suscetíveis e influenciados pelos olhares alheios, valorizando mais a cultura e percepções de indivíduos de outros países do que dos próprios conterrâneos. O historiador brasileiro Emmanuel Gomes também expõe essa visão acerca do tema.

Essa é uma característica do brasileiro, resultado adquirido após 322 anos de colonização portuguesa, depois, cem anos de domínio inglês e dos últimos cem anos de influencias dos Estados Unidos. A dominação gerou a falsa ideia de “inferioridade total”, a sensação de que todas as coisas de fora, estrangeiras, são melhores que as nossas. (GOMES, 2013)[3]

É evidenciado, dessa forma, o “complexo de vira-lata” do brasileiro, que tende a ver a si mesmo como subdesenvolvido e inferior, valorizando somente o que é diferente, como exposto em uma das crônicas de Nelson Rodrigues. “Por “complexo de vira-latas” entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo (…)” (RODRIGUES, 1993, p.51)

Desse modo, a intolerância aparece de maneira incomum. O preconceito ocorre perante a opinião do igual e não do “outro”, acontecendo uma inferiorização da perspectiva que vem da mesma origem. Essa também é uma forma de intolerância, só que, muitas vezes, mais difícil de perceber, pois não há uma discriminação do “outro”, mas uma valorização desse, aliada a uma depreciação do que possui a mesma nacionalidade.

O livro também aborda a vida de Pedro Archanjo, mostrando suas características e valorizando suas raízes africanas, religião e inteligência. Ele conseguiu ser cientista por honoris causa, uma vez que não possuía formação acadêmica, mas aprendeu diversos conteúdos com a sua vivência. Em suma, o personagem incomoda a elite, por ser a junção do que essa mais detestava: um homem mestiço de origem humilde, que conseguiu sobressair intelectualmente, gerando, por isso, raiva e desprezo em relação as suas opiniões, por parte da elite acadêmica.

Nessa perspectiva, Nilo Argolo é a personificação desse sentimento. Esse personagem é um professor da Faculdade de Medicina e pratica o racismo científico com Pedro Archanjo, uma vez que duvidava de sua capacidade intelectual por causa de sua cor e origem. Nilo possuía a ideia de que havia uma superioridade da raça ariana sobre as outras, desenvolvendo teorias racistas e, dessa forma, indo de encontro às ideias de Archanjo.

Nesse ponto, é identificado o preconceito contra a raça de Archanjo. Contudo, o autor utiliza-se de ironia na fala de personagens, o que evidencia os defeitos do discurso intolerante. No trecho do livro a seguir, é evidente a ironia feita a respeito do preconceito com a cor negra. Afinal, a miscigenação é uma forte característica do povo brasileiro.

Brancos? Mestre Pedro, não me venha com brancuras na Bahia. Não me faça rir, que não posso, as dores me cortam. Quantas vezes já lhe disse que branco puro na Bahia é como açúcar de engenho: tudo mascavo. (AMADO, 2008, p.214)

Há, também, no enredo, Pedrito Gordo, um delegado que persegue os praticantes de religiões de matrizes africanas. Desse modo, explicita-se, na obra, a intolerância religiosa enraizada na sociedade brasileira. No livro de Eduardo de Assis Duarte há análise do caráter militante presente na obra de Jorge Amado e a influência que essa exerce sobre a mudança de perspectiva da sociedade brasileira sobre os fatos que a cercam.

(…) o escritor passa a combinar a denúncia social e o intento militante – que constituem a faceta propriamente realista de sua ficção – com uma série de expedientes narrativos de comprovada empatia popular: o heroísmo idealizado dos personagens, sobretudo dos líderes como Balduíno, Pedro Bala ou Juvêncio; o clima de aventura que emoldura as façanhas do herói; a construção maniqueísta de figuras e situações conflitivas, levando à estereotipia dos vilões; o acento de melodrama recobrindo a denúncia das injustiças como forma de enfatizar o sofrimento dos humildes (…). (DUARTE, 1996, p.34)

É evidente, por meio dessa análise que, em sua obra, Jorge Amado contraria os estereótipos sociais, colocando Pedro Archanjo como o personagem principal da trama, superando os preconceitos que lhe são impostos. Sendo, nesse sentido, um intelectual que, mesmo sem formação acadêmica, conseguiu ser bedel em uma Faculdade de renome. Um homem culto que, dentro de um ambiente acadêmico preconceituoso, defendia a miscigenação e se dedicava a áreas de estudos não valorizadas pela elite da Faculdade. Além disso, conseguiu sobressair no que diz respeito a escrita de livros, captando a atenção do estrangeiro para os temas que defendia.

O personagem principal, Pedro Archanjo, pode ser resumido como: a personificação do que a elite desprezava. Dessa forma, o autor explicita todos os preconceitos sofridos e nos concede uma visão diferente da geralmente difundida na sociedade brasileira, pois Archanjo supera os preconceitos sofridos.

[4] Pedro Archanjo é mestre e exemplo da grandeza da solução brasileira do problema das raças: a fusão, a mistura, o caldeamento, a miscigenação – e para honrar sua memória, por tantos anos relegada ao esquecimento, nada mais indicado do que um conclave de sábios no qual se afirme mais uma vez a tese brasileira e se denuncie os crimes do apartheid, do racismo, do ódio entre os homens (AMADO, 2008, p.102)

Há, portanto, no livro, ensinamentos que fazem o leitor refletir acerca da sociedade em que vive e os preconceitos escondidos na percepção da realidade. Para isso, Jorge Amado utiliza um tom de deboche com as práticas preconceituosas, ridicularizando-as. Além disso, existem, durante a narrativa, “lições de moral” explícitas durante o texto- como a citada acima. Desse modo, Jorge Amado alerta seus leitores para as discriminações existentes e vai de encontro às ideias intolerantes disseminadas na sociedade.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É possível perceber, mediante a observação das análises apresentadas, que a literatura pode servir para incentivar e disseminar a intolerância ou para desconstruí-la- por meio da utilização de técnicas linguísticas- a fim de estimular o pensamento crítico acerca de determinadas situações que ocorrem frequentemente na sociedade.

Assim, alguns livros provocam um efeito catártico nos indivíduos, levando-os a identificarem-se com as obras e refletirem sobre suas próprias atitudes e as de pessoas de seu convívio.

Desse modo, a literatura estimula o leitor à compreensão do “outro”, pois por meio dela é possível compreender as culturas e costumes diversificados e valorizá-los. Além disso, permite identificar-se no lugar do outro, assumindo o papel de reprimido socialmente, quando os enredos abordam as situações de maneira diferente de como realmente ocorrem na sociedade, invertendo papéis e situações sociais. Nesse sentido, o opressor se vê no lugar do marginalizado e compartilha, mesmo que momentaneamente e de modo ficcional, a dor do “outro”. Por isso, as obras influenciam a mudança de comportamento em relação à intolerância, preconceito e discriminação, uma vez que propiciam empatia.

Entretanto, nem sempre a literatura estimula a desconstrução da intolerância, muitas vezes, contribuindo para que ela cresça. Exemplo desse tipo de obra é o livro “Mein Kampf” de Adolf Hitler, que dissemina a intolerância. Por isso, é importante possuir um pensamento crítico acerca do que se lê, para que os indivíduos não sejam influenciados por quaisquer ideias expostas.

Os sentidos atribuídos às suas formas e aos seus motivos dependem das competências ou das expectativas dos diferentes públicos que dela se apropriam. Certamente, os criadores, os poderes ou os experts sempre querem fixar um sentido e enunciar a interpretação correta que deve impor limites à leitura. Todavia, a recepção também inventa, desloca e distorce. (CHARTIER, 1999, p.9)

Desse modo, é perceptível que a elaboração da literatura é um trabalho conjunto entre autor e leitor, uma vez que o primeiro escreve a obra e transpõe para ela suas reflexões acerca do tema, pretendendo, assim, influenciar e direcionar a percepção do leitor. Já o segundo, modifica a leitura pela sua própria visão acerca da sociedade e da situação narrada. Dessa forma, a obra é alterada pelo leitor, que a interpreta a partir de um ponto de vista diferente do de quem a escreveu.

Assim, com um pensamento crítico perante as obras literárias é possível refletir sobre o seu conteúdo e utilizar o conhecimento transmitido da melhor maneira possível. Para isso, é imprescindível analisar a ideia por trás da obra, assim como seu contexto social e o público alvo a qual foi destinada, a fim de que haja uma percepção completa do enredo e não ocorra a perpetuação ou reforço de preconceitos sociais, mas a mitigação desses, por meio da análise crítica que a literatura estimula.

6. REFERÊNCIAS

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4. O trecho transcrito representa a homenagem prestada a Pedro Archanjo após sua morte e evidencia o reconhecimento do que sofreu em vida e os ensinamentos que concedeu, por meio da superação dos preconceitos.

[1] Discente em Direito na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro.

Enviado: Janeiro, 2019.

Aprovado: Julho, 2019.

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Letícia Torrão e Silva

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