O uso de novas tecnologias no trabalho do enfermeiro: uma revisão sistemática

ARTIGO DE REVISÃO

NERI, Ynnaê Côrtes da Silva ^[1], BRASILEIRO, Marislei de Sousa Espíndula ^[2]

NERI, Ynnaê Côrtes da Silva, BRASILEIRO, Marislei de Sousa Espíndula. O uso de novas tecnologias no trabalho do enfermeiro: uma revisão sistemática. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 04, Ed. 03, Vol. 10, pp. 113-124. Março de 2019. ISSN: 2448-0959.

RESUMO

A tecnologia apresenta grande importância no âmbito da enfermagem por tornar possível a captação de um maior número de informações, sendo comprovado ainda que, a informatização da enfermagem pode potencializar tanto a assistência voltada para o cuidado, como a gestão de processos e alcance de resultados (ÉVORA et al., 2000). Por isso, essa revisão sistemática tem como objetivo verificar a influência da tecnologia na atuação do enfermeiro. A busca foi realizada a partir dos descritores “nursing” and “tecnology”, encontrados 759 documentos relacionados, sendo que a partir dos critérios de inclusão, apenas 75 artigos estavam disponíveis na íntegra e foram submetidos à análise, 27 obtidos na base de dados BDENF, 27 na LILACS e 24 na MEDLINE, sendo 27 em inglês e 48 em português. Dos 75 artigos avaliados apenas 11 respeitaram os critérios de inclusão sendo artigos originais, disponíveis na íntegra, publicados entre 2010 e 2017, e que responderam a questão norteadora: Qual o impacto da tecnologia no trabalho do enfermeiro? Tecnologia está relacionada a comunicação, educação e informação. Concluímos que pouco é abordado o avanço tecnológico no ambiente de trabalho do enfermeiro. Contudo, todos os artigos trouxeram a conclusão de que quando são utilizadas as diferentes formas de tecnologias, são gerados inúmeros benefícios ao profissional e ao paciente.

Palavras-chave: Enfermagem, Tecnologia.

INTRODUÇÃO

A industrialização trouxe, além da modernização, o avanço tecnológico e a valorização da ciência em detrimento da saúde humana. Com a introdução da informática e de aparelhos modernos e sofisticados, foi possível garantir rapidez na luta contra as doenças e resolubilidade de problemas antes insolúveis (ARONE; CUNHA, 2007).

De acordo com a Associação Americana de Enfermagem (ANA), informática em enfermagem é uma especialidade que integra a Ciência da Enfermagem, a Ciência da Computação e a Ciência da Informação para gerenciar e comunicar dados, conhecimento e informação (HANNAH et al., 2009). É a informação eletrônica referente à prática clínica, administrativa, de pesquisa e de educação (TELLES, 2012).

A importância das tecnologias informacionais é destacada por apresentar resultados muito satisfatórios. Contribui para tal informação o fato de que ao utilizar o computador, ou qualquer outro meio processador de dados, abre-se a possibilidade à Enfermagem de captar um grande número de informações, bem como, coletar e registrar dados com mais agilidade no cuidado e segurança ao paciente (MATSUDA et al., 2014).

Nas últimas décadas, observa-se o despreparo profissional e o descompasso das organizações de saúde em acompanhar e incorporar avanços tecnológicos, assim como, diversificadas consequências dessa inclusão. Reconhece-se a importância e a relação dicotômica historicamente existente entre a humanização e a tecnologia. É desafiador e necessário, portanto, refletir sobre uma abordagem integradora, uma vez que a convivência com ambos é inevitável (ARONE; CUNHA, 2007).

No âmbito da enfermagem, espera-se o acompanhamento da evolução de tecnologias da informação, bem como a inserção destes recursos na prática gerencial e assistencial do enfermeiro. Autores apontam que a informatização da enfermagem pode potencializar tanto a assistência voltada para o cuidado, como a gestão de processos e alcance de resultados (ÉVORA, 2000).

É fundamental que o enfermeiro conheça as diferentes tecnologias existentes e suas formas de aplicação, para que com isso, otimize o trabalho de sua equipe e garanta a qualidade e rapidez na prevenção de doenças e promoção da saúde.

OBJETIVO

Elaborar uma revisão sistemática quanto ao uso de novas tecnologias no trabalho do enfermeiro e verificar a influência das diversas formas de tecnologia na atuação do profissional.

METODOLOGIA

Trata-se de uma revisão integrativa e sistemática da literatura científica constituída por seis etapas: o estabelecimento da hipótese ou questão de pesquisa; a amostragem ou busca na literatura; a categorização dos estudos; a avaliação dos estudos incluídos na revisão; a interpretação dos resultados; e a síntese do conhecimento ou apresentação da revisão (OLIVEIRA;PERES, 2015).

O levantamento de dados foi realizado através da consulta nas bases de dados BDENF, LILACS e MEDLINE; baseado no cruzamento dos descritores “nursing” and “tecnology”, presentes no título, resumo e assunto, e pesquisados simultaneamente. Foram definidos os idiomas inglês e português, que compõem maior quantidade de publicações científicas; artigos originais e disponíveis na íntegra; e que responderam à questão de pesquisa norteadora da revisão integrativa, que segue: Qual o impacto da tecnologia no trabalho do enfermeiro? Tecnologia esta relacionada à comunicação, educação e informação.

Os artigos foram avaliados através da leitura e classificação dos mesmos quanto aos critérios de inclusão. Fizeram parte do estudo aqueles artigos que tratavam do uso da tecnologia como instrumento de ensino, comunicação e pesquisa, a exemplo do computador, software, hipermídia, televisão, tablet e celular; publicados no ano de 2010 a 2017. Foram excluídos aqueles que abordavam a inovação tecnológica em aparelhagens do ambiente hospitalar, bem como, a tecnologia como metodologia de ensino. Para seleção dos artigos foram avaliados principalmente resultados e conclusão das pesquisas, observando cada tipo de tecnologia abordada e quais foram as suas influências no trabalho do enfermeiro.

O processo de extração de dados do artigo ocorreu de forma independente. Muitos artigos não estavam disponíveis para leitura e por isso não fizeram parte da revisão sistemática. A última busca foi realizada em 22 de Junho de 2017 tendo como número total 75 artigos disponíveis na íntegra.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

De acordo com os descritores definidos foram encontrados 759 documentos relacionados, sendo que a partir dos critérios de inclusão estabelecidos, apenas 75 artigos estavam disponíveis na íntegra e foram submetidos à análise, sendo 27 na base de dados BDENF, 27 na LILACS e 24 na MEDLINE; 27 em inglês e 48 em português.

Imagem 1: Fluxograma de pesquisa e resultados.

Dos 75 artigos avaliados apenas 11 estavam relacionados a tecnologia da informação, educação e comunicação, sendo que muitos deles apresentavam outro tipo de abordagem da tecnologia como por exemplo a aplicação de aparelhagens e inovações tecnológicas em diversas áreas. Além disso, na busca pelos artigos, foi impossibilitada a avaliação de muitos deles devido a necessidade de ser inscrito em revistas científicas para obter livre acesso. Dentre as limitações, os artigos pouco abordaram as tecnologias mais atuais no trabalho do enfermeiro, como é o caso do uso de tablet, celular e aplicativos voltados para a área da saúde.

Representados na Tabela 1, os artigos foram avaliados quanto ao nível de evidência científica através da classificação estabelecida pela “Oxford Centre for Evidence-based Medicine”. Destacados o ano de sua publicação, especificados os tipos de tecnologias utilizadas e resultados obtidos em cada um deles.

Tabela I – Resultados encontrados a partir da revisão sistemática realizada.

Fonte: NERI (2017).

Devido o tempo estabelecido para busca de artigos atuais, foram encontrados em sua maioria artigos do ano de 2014 e em menor número do ano de 2015. Dentro do total de artigos encontrados, apenas dois eram do ano de 2017, porém não se enquadraram aos critérios de pesquisa estabelecidos. Pode ser que durante a elaboração deste artigo, outros estudos tenham sido publicados, sendo avaliados somente aqueles selecionados entre março de 2017 a junho de 2017.

Os 11 artigos apresentaram em sua composição assuntos relacionados ao uso do computador, tendo ele como instrumento direto para desenvolver o trabalho tecnológico de ensino e aprendizagem ou como forma indireta de utilização, como na utilização de hipermídia, consultoria online, utilização de softwares e visualização de simulação e vídeos. Nenhum dos artigos avaliados abordou o uso do celular, que atualmente é utilizado como meio capaz de promover aprendizado e experiências voltadas para a área de trabalho exercida. O celular não mais se restringe a servir como um aparelho de comunicação interpessoal, mas concentra em si muitas possibilidades de uso do meio digital, transformando-se em um pequeno computador portátil (JORGE, 2013).

Não foi encontrado ainda qualquer pesquisa que abordasse o uso de tablets ou kindle no ambiente de trabalho do enfermeiro. A principal característica destes dispositivos é justamente serem móveis, o que propicia uma imediata atualização da informação, podendo facilitar a pesquisa ou troca de saberes entre os profissionais (SABOIA et al., 2013).

O avanço da tecnologia e da ciência no último século é superior a todos os avanços alcançados anteriormente, gerando impactos diretos sobre as organizações e as profissões relacionadas à saúde². Em 1995, já se percebia as mudanças trazidas pelos avanços tecnológicos. Em uma análise realizada na Universidade de Oregon foram comparados os anos de 1935, 1985 e 2005, e já foi percebido o progressivo deslocamento do modelo liberal da década de 30, onde a profissão era exercida com mínima tecnologia, para o atendimento da época, com aparelhos sofisticados e laços quase nulos de relacionamento entre médico e o paciente (GREENLICK, 1997).

O termo tecnologia tem ampla conotação e pode se referir às técnicas, métodos, procedimentos, ferramentas, equipamentos e instalações que possibilitam a realização e obtenção de produtos (ARONE; CUNHA, 2007). Suas formas podem ser agrupadas em três categorias: tecnologia dura: representada pelo material concreto como mobiliário, equipamentos; tecnologia leve-dura: que inclui os saberes estruturados pelas disciplinas, a exemplo da epidemiologia, odontologia, clínica médica, entre outras; e tecnologia leve: expressada como o processo de produção da comunicação, das relações de vínculos que conduzem ao encontro do usuário com necessidades de ações de saúde (MERHY; FRANCO, 1997).

Neste trabalho foi principalmente abordado o uso da tecnologia leve-dura e leve. Os 11 artigos puderam mostrar benefícios à sua aplicação no trabalho do enfermeiro e o quanto ele pode ser otimizado e bem realizado se complementados os métodos tecnológicos descritos. O uso do computador, supermídias, vídeos e acesso online imediato facilitaram o processo de aprendizado, tomada de decisões e aprimoramento das ações entre os profissionais enfermeiros e consequentemente dos pacientes como demonstrado nos resultados da Tabela 1.

No âmbito da enfermagem, espera-se o acompanhamento da evolução destas tecnologias da informação, bem como a inserção destes recursos na prática gerencial e assistencial do enfermeiro¹. A tecnologia computacional pode facilitar a organização e administração de informações, já que favorece a assistência de enfermagem e a disponibilização em tempo real para o gerenciamento. Recursos como, por exemplo, o Registro Eletrônico de Saúde, protocolos clínicos e programáticos, alertas, notificações, sistema de apoio e consulta assistida à distância (Telessaúde) aprimoram o trabalho dos profissionais de saúde, beneficiando consequentemente o atendimento ao paciente (BRASIL, 2016).

Estudos mostram que as habilidades tecnológicas aplicadas à prática clínica têm se mostrado vantajosas aos enfermeiros e também aos pacientes, e principalmente, quando adequadamente utilizadas, podem ter um impacto significativo sobre a evolução do quadro clínico dos pacientes (CAVALCANTE et al., 2011; BEMBRIDGE et al., 2010). Com a organização e sistematização das informações em sistemas eletrônicos, a operacionalização da comunicação é facilmente desenvolvida para resolução de problemas, complementando positivamente o conhecimento técnico-científico e humano dos enfermeiros frente ao assistido e à equipe multiprofissional (KOBAYASHI, 2015).

A forte presença da dimensão tecnológica no universo da enfermagem necessita ser revigorada por meio da valorização da natureza humana, quer no uso de produtos ou no próprio processo de cuidar, aplicando ao entendimento de tecnologia outras ênfases além da tecno-econômica, como a ética, a estética, a política e a social (ARONE; CUNHA, 2007).

É atribuição privativa do enfermeiro a direção do órgão de enfermagem integrante da estrutura das instituições de saúde, sendo de sua responsabilidade o planejamento, organização, coordenação, execução e avaliação dos serviços de assistência de enfermagem. Consequentemente é de sua responsabilidade ainda, os espaços onde a tecnologia se insere e os processos de inovação tecnológica repercutem sobre a qualidade do serviço oferecido. Por isso, é fundamental que o enfermeiro entenda e aplique novas tecnologias de forma a beneficiar o atendimento clínico, terapêutico e assistencial, bem como o processo de cuidar (ARONE; CUNHA, 2007).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi possível identificar no presente estudo que pouco se fala do avanço tecnológico no ambiente de trabalho. Refletindo ainda sobre o termo tecnologias móveis, que também foi pouco avaliada nos estudos identificados, elas propiciam o surgimento de novas percepções e noções imediatas ao momento do trabalho já que podem ser levadas a qualquer ambiente e serem aplicadas de diferentes formas pelos profissionais (SABOIA et al., 2013).

Contudo, todos os artigos que abordaram outros tipos de tecnologia aplicadas à prática do enfermeiro trouxeram a conclusão de que são gerados inúmeros benefícios tanto ao profissional quanto ao paciente. O uso do computador, que abrange a produção de vídeos, desenvolvimento de supermídias, acesso online à chats e pesquisas, quando bem utilizado pode transformar o trabalho do enfermeiro e ser primordial no exercício de ações em grupo ou direcionados ao paciente.

Sugere-se então que sejam desenvolvidas pesquisas com as novas formas de tecnologia e sua aplicabilidade na prática. Muitas delas podem trazer benefícios e malefícios à prática e precisam ser estudadas para que haja correto uso e sejam complementares ao trabalho do enfermeiro.

REFERÊNCIAS

ARONE, E.M.; CUNHA, I.C.K.O. Tecnologia e humanização: desafios gerenciados pelo enfermeiro em prol da integralidade da assistência. Rev Bras Enferm 2007 nov-dez; 60(6): 721-3.DOI: 10.1590/S0034-71672007000600019

BEMBRIDGE, E.; LEVETT-JONES, T.; JEONG, S.Y.S. The preparation of technologically literate graduates for professional practice: a review of the literature. Contemp Nurse. 2010;35(1):18-25. DOI: 10.1590/S0080-623420150000600014.

BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria-Executiva. Departamento de Monitoramento e Avaliação do SUS.   Política Nacional de Informação e Informática em Saúde / Ministério da Saúde, Secretaria-Executiva, Departamento de Monitoramento e Avaliação do SUS. – Brasília : Ministério da Saúde, 2016.

CAVALCANTE, R.B.; FERREIRA, M.N.; SILVA, L.T.C.; SILVA, P.C. Experiences of computing in nursing in Brazil: a study bibliographic. Journal of health Informatics. 2011.

ÉVORA, Y.D.M.; FÁVERO, N.; TREVIZAN MA, MELO MRAC. Evolução histórica da aplicação do computador na enfermagem (1965-1998). Acta Paul Enferm. 2000;13(2):143-47

GREENLICK, M. Educating physicians for the twenty-first century. Acad Med 1995;70:179-85.

HANNAH, K.J.; BALL, M.J.; EDWARDS, M.J.A. Introdução à informática em enfermagem. 3.ed. Porto Alegre: Artmed; 2009.

JORGE, G. A hora de trocar o celular. Jornal A Tarde: economia, Salvador. Abril de 2005.

KOBAYASHI, R.M.; LEITE, M.M.J. Technological competencies in cardiovascular nursing education. Rev Esc Enferm USP. 49(6): pag 971-977, 2015. DOI: 10.1590/S0080-623420150000600014.

MATSUDA, L.M.; HIGARASHI, L.H.; ÉVORA, Y.D.M.; BERNARDES, A. Percepção dos enfermeiros sobre o uso do computador no trabalho. Rev Bras Enferm, 2014. DOI: 10.1590/0034-7167.2014670613.

MERHY, E.E.; FRANCO, T.B. Em busca de ferramentas analisadoras das tecnologias em saúde: a informação e o dia a dia de um serviço, interrogando e gerindo trabalho em saúde. In: MERHY, E. E. Praxis en salud un desafío para lo publico. São Paulo: Hucitec, 1997.

OLIVEIRA, N.B.; PERES, H.H.C. Evaluation of the functional performance and technical quality of an Electronic Documentation System of the Nursing Process. Rev Latino Am Enfermagem [Internet]. 2015 [cited 2015 July 20];23(2):242-9. Available from: http://www.scielo.br/pdf/ rlae/v23n2/0104-1169-rlae-3562-2548.pdf DOI:10.1590/0104-1169.3562.2548

SABOIA, J.; VARGAS, P.L.; VIVA, M.A.A. O uso dos dispositivos móveis no processo de ensino e aprendizagem no meio virtual. Rev Cesuca Virtual, Rio grande do Sul, 2013.

TELLES, M.J. Why nurses need to learn informatics? [editorial]. J Health Inform [Internet]. 2012 [cited 2013 March 17]. Available from: file:///C:/Users/Cliente/Downloads/237-885-1-PB%20(2).pdf

^[1] Superior completo (Universidade de Brasília), Enfermeira.

^[2] Doutora, Professora.

Enviado: Agosto, 2018.

Aprovado: Março, 2019.