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Livros Acadêmicos

5. Reflexões sobre os impactos psico-sociais da Síndrome da Imunodeficiência Humana adquirida na vida dos pacientes

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Pedro Henrique Tostes Braga [1] 

Maria Bernardina Cupertino [2]

Denise Monteiro da Silva [3] 

Sabrynna Brito Oliveira [4]

DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/livros/1736

 

INTRODUÇÃO

A síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS, do inglês Acquired Immunodeficiency Syndrome) é uma condição promovida pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV, do inglês Human Immunodeficiency Virus). O vírus possui efeito depressor do sistema imunológico, pois afeta primariamente os linfócitos TCD4+, promovendo uma abertura para patologias como tuberculose, doença pulmonar obstrutiva crônica, pneumonia, sífilis e doenças oportunistas (PINHO et al., 2017; VÉRAS et al., 2020).

Por ser uma Infecção Sexualmente Transmissível (IST), a AIDS se tornou estigmatizada desde a epidemia no século XX. Erroneamente, ela era atribuída de forma quase que exclusiva aos indivíduos homossexuais e profissionais do sexo. Esse fato dificultou o diagnóstico e tratamento dos indivíduos infectados. Nesse contexto, o Brasil se destacou como o primeiro país a prover assistência gratuita para os infectados, disponibilizando medicamentos antirretrovirais pelo Sistema Único de Saúde (SUS) desde 1996 (SANTOS et al., 2019).

Segundo estatísticas obtidas no Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS, UNAIDS (2020), estima-se que 81% das pessoas vivendo com HIV (PVH) no mundo já tem conhecimento de seu estado de saúde desde o final de 2019 e que 67% destes já iniciou a terapia antirretroviral, totalizando cerca de 25,4 milhões de pessoas de um montante de 38 milhões de infectados. Mas, o que significa viver e conviver com esse diagnóstico?

Estando ciente da discriminação, velada ou não, sofrida por PVH e das dificuldades e interações que podem decorrer do conhecimento de seu estado sorológico por terceiros (BELTRÃO et al., 2020), este estudo se apresenta como reforço para a humanização no ato de lidar com PVH. Assim, este trabalho objetivou avaliar os impactos psico-sociais que o diagnóstico de HIV/AIDS representa na vida dos pacientes.

DESENVOLVIMENTO

METODOLOGIA

Este estudo se baseou em uma revisão integrativa de literatura que contou com três etapas: 1) planejamento e escolha do tema; 2) busca de textos e artigos pertinentes utilizando como descritores os termos “HIV”, “Síndrome da Imunodeficiência Adquirida”, “qualidade de vida”, “estigma social” e “Brasil”, constituindo assim o referencial teórico; 3) seleção e inclusão dos trabalhos com maior relevância para a temática abordada, considerando publicações em português, a partir de 2017 e publicadas nas plataformas científicas Lilacs, SciELO, PubMed, Google Acadêmico e sites oficiais em saúde. Foram desconsiderados os artigos que abordavam temáticas voltadas apenas para políticas públicas de saúde e/ou legislações e/ou terapia antirretroviral.

RESULTADOS

Dos 26 artigos analisados, dezesseis foram selecionados como tendo maior relevância (Fig 1.) e, no total, foram compilados três tópicos: Das relações sociais e familiares; Fatores inerentes ao diagnóstico e tratamento; Fatores psicológicos inerentes ao indivíduo. 

Figura 1. Resultado da busca bibliográfica

Foi levado em conta um artigo parcialmente fora dos parâmetros, “The early spread and epidemic ignition of HIV-1 in human populations” de 2014, devido à importância no esclarecimento das origens da epidemia. Fonte: elaborado pelos autores, 2022.

I) DAS RELAÇÕES SOCIAIS E FAMILIARES

A epidemia do HIV/AIDS angariou diferentes tipos de atenções e opiniões, e enquanto inúmeros cientistas se moviam na busca por cura ou tratamento, a sociedade também reagiu quanto à nova ameaça. Muitos responderam à situação com preconceito e discriminação, fosse por medo ou falta de conhecimento (JESUS et al., 2017).

Os portadores do HIV passam por muitas dificuldades para ter uma vida melhor, isso se deve ao fato da cronicidade da doença e o preconceito familiar, uma vez que, por não ter muitas informações a respeito da doença, familiares acabam discriminando seus entes e isso acaba comprometendo o tratamento, a qualidade de vida e o bem-estar social (BELTRÃO et al., 2020).

Quando se torna pública a situação de um novo portador do vírus, este fica exposto ao julgamento social, e mesmo que haja prejuízo em ter relação sexual sem a devida proteção do preservativo, a responsabilidade que recai na PVH produz sofrimento que reflete em prostração no corpo atrelado a nova história do HIV/AIDS (UNAIDS, 2020).

Diante do reflexo do sofrimento vivido no âmbito familiar, as dificuldades se ampliam para a sociedade civil que, não estando inserida no meio científico, tem dificuldade com a falta de informação sobre a doença, o tratamento e os métodos para o cuidado. Este isolamento dificulta ainda mais as relações, cercando o assunto de “preconceitos de pessoas que os veem como ‘contaminados’ ou ‘condenados’, limitando seu suporte social” (JESUS et al., 2017) e muitos destes pacientes nem comentam em seus ambientes de trabalho, almejando evitar exposição (BARCELOS et al., 2020).

Partindo do ponto que a sociedade define o que é considerado como culturalmente normal, a exclusão social de PVH como reflexo de uma visão estereotipada acaba por impactar a vida dessas pessoas cognitivamente e emocionalmente (LOBO e LEAL, 2019).

Da parte do preconceito social, bem como do preconceito familiar, muito do estigma voltado ao diagnóstico está atrelado ao histórico da doença na década de 80, onde se tinha como população-chave homossexuais, pessoas promíscuas e usuários de drogas injetáveis (EW et al., 2018), marginalizados à época e ainda hoje.

O apoio familiar ou a falta deste entra de forma recorrente nos textos estudados, através de termos como autoimagem, aceitação, autoconfiança, rejeição, culpa e insegurança (BELTRÃO et al., 2020). Quando entra de forma positiva, auxilia a PVH a dar continuidade ao processo de viver apesar do diagnóstico, porém, quando entra de forma negativa afeta o indivíduo de tal forma que este pode ter até sua adesão ao tratamento comprometida.

II) FATORES INERENTES AO DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

Embora os avanços na medicina proporcionem uma vida normal às PVH, receber o diagnóstico da infecção ainda é apontado como fator desencadeante de tristeza e depressão. Autores afirmam que o choque do diagnóstico ainda se dá por conta do preconceito enraizado na sociedade e até mesmo nos pacientes (COUTINHO et al., 2018; SOUZA et al., 2019).

Segundo Souza et al. (2019), os efeitos colaterais decorrentes da terapia antirretroviral constituem outro impacto relevante para a adesão das PVH ao tratamento e consequente melhoria na qualidade de vida. Coutinho et al. (2018) complementa que o abandono terapêutico sujeita o paciente HIV positivo às patologias oportunistas, aumentando a necessidade de uma abordagem mais efetiva no âmbito da saúde pública.

III) FATORES PSICOLÓGICOS INERENTES AO INDIVÍDUO

A possibilidade de desenvolver uma depressão pode afetar na disposição da PVH para seguir corretamente a terapia antirretroviral, potencialmente interferindo em um prognóstico favorável, considerando a gama de possíveis reações para o diagnóstico clínico, havendo casos de pacientes que se sentem mais vulneráveis emocionalmente pós-diagnóstico, em contrapartida de pacientes que se demonstram mais resilientes (COUTINHO et al., 2018).

Outra questão abordada, a espiritualidade, pode entrar como um impacto psicológico, principalmente na esfera individual, por fornecer uma alternativa à PVHA, de modo que é relatado, em alguns casos, uma maior resiliência daqueles que se agarram alguma crença (ANGELIM et al., 2017). De acordo com Pinho et al. (2017), a religiosidade tem por fim o fortalecimento do paciente, fragilizado perante o diagnóstico. Assim, muitos pacientes utilizam a fé como alicerce, na busca por uma razão e entendimento de como prevalecer à doença, podendo aliviar a pressão do diagnóstico através de suas crenças (PINHO et al., 2017).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Mesmo com a disponibilidade de diagnóstico precoce, medicamentos e métodos preventivos, as PVH ainda sofrem com o peso do diagnóstico. Parte desse impacto vem do estigma enraizado na sociedade e parte da falta de informação em linguagem acessível para a população, pontos que se entrelaçam.

Acredita-se que à medida que a medicina avançar rumo à erradicação da epidemia do HIV e cada vez mais PVH alcançarem melhor qualidade de vida, poderemos ter base para erradicar o estigma social que essa condição carrega. Assim, faz-se importante modificar as percepções errôneas que acabam por promover um detrimento na autoestima e um sentimento de culpa nas pessoas HIV+.

REFERÊNCIAS

ANGELIM, R. C. M. et al. Processo de morte/morrer de pessoas com HIV/AIDS: perspectivas de enfermeiros. Revista Cuidarte, [S.L.], v. 8, n. 3, p. 1758, 1 set. 2017.

BARCELOS, S. C. et al. Revisão bibliográfica: Índice de estigma em relação às pessoas vivendo com HIV/AIDS Brasil. Revista Multidisciplinar em Saúde, [S. l.], v. 1, n. 4, p. 59, 01 dez. 2020.

BELTRÃO, R. P. L. et al. Saúde e qualidade de vida das pessoas vivendo com HIV/AIDS: uma revisão dos últimos 15 anos. Revista Eletrônica Acervo Saúde, Parnaíba, v. 40, n. e2942, p. 1-8, 21 fev. 2020.

COUTINHO, M. F. C. et al. Tratamento antirretroviral: adesão e a influência da depressão em usuários com hiv/aids atendidos na atenção primária. Saúde em Debate, [S.L.], v. 42, n. 116, p. 148-161, jan. 2018.

EW, R. de A. S. et al. Estigma e teste rápido na atenção básica: percepção de usuários e profissionais. Revista Brasileira em Promoção da Saúde, [S.L.], v. 31, n. 3, p. 1-11, 31 out. 2018.

JESUS, G. J. de. et al. Dificuldades do viver com HIV/Aids: entraves na qualidade de vida. Acta Paulista de Enfermagem, São Paulo, v. 30, n. 3, p. 301-307, jun. 2017.

LOBO, Ângelo Souza; LEAL, Maria Alice Ferreira. Comunicação de más notícias: a revelação do diagnóstico de hiv/aids e seus impactos psicológicos. In: Congresso Ibero-Americano em Investigação Qualitativa, 8., 2019, Lisboa. Atas. Lisboa: CIAIQ, 2019. v. 2, p. 549-558.

PINHO, C. M. et al. Coping religioso e espiritual em pessoas vivendo com HIV/Aids. Revista Brasileira de Enfermagem, Recife, v. 70, n. 2, p. 410-417, abr. 2017.

SANTOS, A. P. dos. et al. Fatores associados à qualidade de vida de pessoas com HIV/AIDS. Cadernos ESP – Revista Científica da Escola de Saúde Pública do Ceará, [S. l.], v. 13, n. 1, p. 27–36, 2019.

SOUZA, H. C. de. et al. Analysis of compliance to antiretroviral treatment among patients with HIV/AIDS. Revista Brasileira de Enfermagem, [S.L.], v. 72, n. 5, p. 1295-1303, out. 2019.

UNAIDS. Estatísticas. Organização das Nações Unidas, 2020. Disponível em: https://unaids.org.br/estatisticas/. Acesso em: 28 set. 2022.

VENTURA, A. M. Apostila de Virologia: Retrovírus. In: VENTURA, A. M. BMM 160: microbiologia básica para farmácia. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2018. Cap. 4. p. 1-12.

VÉRAS, J. de S. et al. Doenças Oportunistas em portadores de HIV/AIDS e cuidados da Equipe de Saúde. Id On Line Revista de Psicologia, [S.L.], v. 14, n. 50, p. 1349-1361, 29 maio 2020.

[1] Bacharel em Biomedicina. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0305-9484. Currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/4239973839831535.

[2] Pós-graduação em Enfermagem em Unidade de Terapia Intensiva (Unifenas), Bacharel em Enfermagem (Universo), Bacharel em Biomedicina (CEUNIH). ORCID: https://orcid.org/0009-0009-0328-159.

[3] Bacharel em Biomedicina. ORCID: https://orcid.org/0009-0003-8429-7437.

[4] Orientadora. Pós-doutorado em Microbiologia (UFMG), Doutorado (UFMG) e Mestrado (UFC) em Microbiologia, Bacharel em Biomedicina (UFPI). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9303-4338. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/2498047677232858.

Pedro Henrique Tostes Braga

Pedro Henrique Tostes Braga

Bacharel em Biomedicina. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0305-9484. Currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/4239973839831535.

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