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A Violência Doméstica/Intrafamiliar Contra A Mulher: Caminhos Para Seu Enfrentamento

RC: 81190
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/seu-enfrentamento

CONTEÚDO

ESTADO DA ARTE

SCHONS, Sandra [1], SAVITSKI, Luciana [2]

SCHONS, Sandra. SAVITSKI, Luciana. A Violência Doméstica/Intrafamiliar Contra A Mulher: Caminhos Para Seu Enfrentamento. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 06, Ed. 03, Vol. 16, pp. 73-98. Março de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/seu-enfrentamento, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/seu-enfrentamento

RESUMO

A violência doméstica/intrafamiliar mostra-se como uma das principais formas de violência identificada e combatida atualmente. Trata-se de um problema a nível mundial, que atinge mulheres de todas as classes sociais, idades, religiões e etnias.  O objetivo principal desse estudo foi refletir sobre a violência doméstica/intrafamiliar contra a mulher e as estratégias de enfrentamento à luz das discussões teóricas. O estudo apontou reflexões à cerca das variadas formas de violência bem com os instrumentos legais que visam garantir os direitos das mulheres. Além disso, vislumbra a necessidade de políticas públicas a fim de desconstruir os conceitos patriarcais que sustentam a desigualdade de gênero que muitas vezes, justificam a violência contra a mulher e então construir uma nova cultura da não violência e de valorização dos direitos humanos, necessitando, sobretudo, mudanças de comportamentos e de costumes, o que envolve a participação do Estado, da família e da sociedade de forma mais ampla.

Palavras-chave: Violência, Violência Doméstica/Intrafamiliar, Intervenção.

1. INTRODUÇÃO

A violência é um fenômeno histórico que perpassa as relações sociais. Contudo, no contexto atual sua repercussão tem ganhando destaque nos discursos sociais, exigindo a ampliação de estudos, para sua melhor compreensão, e ações de combate, especialmente por parte do Estado.

Entre suas manifestações, a violência contra a mulher mostra-se como uma das principais formas identificadas e combatidas atualmente, refletindo as relações desiguais de gênero, que tomam por base as características biológicas (de sexo) para delimitar as características das relações sociais entre homens e mulheres.

Historicamente à mulher foram delimitados um espaço (o privado, especialmente do lar) e um papel social (de mãe, cuidadora) a serem ocupados e cumpridos, caracterizando-a como o sexo frágil; já ao homem destinou-se o espaço público (de tomada de decisões) e um papel social (de provedor e protetor), caracterizando-o como referência de poder.

São nas relações afetivas entre homens e mulheres que se reflete uma das principais formas de desigualdade de gênero: a violência doméstica e/ou intrafamiliar. Oculta nos lares, nas mais diversas formas de acometimento, ela reafirma, cotidianamente o suposto poder que o homem tem sobre a mulher.

Em contraponto a essa compreensão, as lutas feministas traçadas no percurso histórico denunciaram o sofrimento e preconceito vivido pelas mulheres. Como destacam Signori e Madureira (2007, p. 9): “Nos últimos anos, a luta pela cidadania feminina tornou-se mais evidente e o fenômeno da violência contra a mulher, até pouco tempo ignorado ou mantido sob domínio privado, emergiu, sendo tratado como uma violação dos direitos humanos.”.

Ainda que tenhamos avançado nas discussões e no reconhecimento dos direitos das mulheres, que tenha aumentado a sua participação nas relações políticas e econômicas, ela é ainda discriminada pelo simples fato de ser mulher (SIGNORI; MADUREIRA, 2007), o que também fortalece a propagação de ações violentas em suas relações afetivas, refletindo sua complexidade e sua diversidade: trata-se de um problema a nível mundial que atinge mulheres de todas as classes sociais, idades, religiões e etnias.

Por isso, faz-se necessário refletir sobre a violência doméstica/intrafamiliar contra a mulher e as estratégias de enfrentamento desse tipo de violência na atualidade, sendo essa a proposta central desse artigo.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 A VIOLÊNCIA

A violência contra a mulher, em suas especificidades, compõe o rol de manifestação do fenômeno violência: trata-se de uma problemática social e historicamente construída, que se manifesta de formas diferenciadas, em níveis maiores ou menores, mais ou menos aceitos em cada sociedade, em cada época e cultura.

Por sua característica, cientificamente há uma série de definições para o termo. Nesse estudo a violência é entendida nos termos da Organização Mundial de Saúde (OMS), como “[…] o uso de força física ou poder, em ameaça ou na prática, contra si próprio, outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade que resulte ou possa resultar em sofrimento, morte, dano psicológico, desenvolvimento prejudicado ou privação” (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1996 apud DAHLBERG; KRUG, 2006, p. 1165).

Observamos, então, que a violência é desencadeada de forma intencional. Corroboramos com as afirmações que Hoffmann (2012, p. 20) de que em tal fenômeno “[…] há o desejo, a intenção de destruir, de desmanchar, de ofender ou de humilhar o outro”.

O intuito é de causar algum dano a vítima, por meio da perpetração de ações físicas, psicológicas ou sexuais ou, ainda, pela omissão, podendo ter resultados visíveis ou não, tornando-as mais difíceis de serem constatadas.

Hoffmann (2012) constatou, em seus estudos, que a violência não deve ser entendida como um fenômeno homogêneo, pois assume diversas formas e práticas sociais, políticas, físicas, psicológicas, morais, culturais, econômicas, sexuais, ecológicas, educacionais, que sofre variação na época e lugar em que ocorre.

Nessa direção, podemos afirmar que não existe uma causa única para a violência, mas sim vários fatores que influenciam e interagem entre si para que o fenômeno ocorra, ou seja, “Normas culturais predominantes, pobreza, isolamento social e fatores como abuso de álcool, de drogas e acesso a armas de fogo são fatores de risco” (DAHLBERG; KRUG, 2006) e somados a esses fatores há interação de fatores biológicos e subjetivos.

No entanto, Zimbardo (2008 apud HOFFMANN, 2012, p. 18) menciona que nos atos violentos comumente há interação de três conjuntos de fatores: as características psicológicas das pessoas envolvidas no ato de violência, vítimas e agentes da violência; a situação, que sofre influência de líderes e do meio social em que as pessoas estão inseridas e, o sistema, referente ao contexto político e estratégico em que a violência é praticada.

Outro importante apontamento sobre o fenômeno aqui estudado é realizado por Hoffmann (2012) que afirma que a violência se manifesta de forma explicita e/ou implícita.  Na primeira situação, a violência é facilmente reconhecida e amplamente divulgada, se manifesta nos roubos, homicídios, guerras, atentados, dentre outros episódios.

Já na segunda situação, a violência é velada e por isso as pessoas não se tornam tão sensíveis as suas manifestações, sendo muitas vezes naturalizadas – como exemplos podemos citar a desigualdade social, o preconceito e outras nuances que ocorrem de forma mais silenciosa, por vezes acaba não sendo reconhecida com tal, haja vista que solicita reflexão e analises para o entendimento de sua nocividade.

Assim entendida, quando nos reportamos a violência contra as mulheres, podemos dizer que ela assume tanto forma explicita quanto implícita no cotidiano, repercutindo a desigualdade nas relações de gênero, que carrega consigo a naturalização de ações violentas da sociedade e, em grande parte, as justifica. Por isso, na sequência discutiremos as especificidades da violência contra a mulher, com destaque a violência doméstica/intrafamiliar.

2.2 A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

A violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres tem ganhado destaque nos noticiários e também nas ações de combate propostas pelo Estado. Como vimos, ela reflete as chamadas relações de gênero, ou seja, a construção social e histórica das desigualdades entre homens e mulheres apoiadas na diferença entre sexos (que se referem as diferenças biológicas entre machos e fêmeas).

Assim, podemos entender que as relações de gênero demonstram “[…] uma manifestação das relações de poder historicamente desiguais entre homens e mulheres, com dominação da mulher pelo homem, sua discriminação e a interposição de obstáculos ao seu pleno desenvolvimento” (SIGNORI; MADUREIRA, 2007, p.7).

Devemos destacar, ainda, que essa é uma problemática construída e afirmada nos valores patriarcais, nos valores construídos socialmente que reconhecem e reafirmam (no discurso e na ação) o “supremo” poder do homem, seja no espaço público ou no espaço da vida privada.

Não são as diferenças biológicas entre homens e mulheres que determinam o emprego da violência. São os papéis sociais impostos a mulheres e homens, reforçados por culturas patriarcais que estabelecem relações de dominação e violência entre os sexos (TELES; MELO, 2002, p. 114).

Embora percebamos as transformações das configurações familiares em nossa sociedade, fato é que nelas, em grande parte, os homens ainda representam a referência do grupo. Essa compreensão acaba por influenciar as relações de poder entre homem e mulher que consequentemente proporciona a reafirmação historicamente construída de superioridade do homem e, assim, a violência doméstica/intrafamiliar.

Desencadeada nas relações afetivas, a violência doméstica/intrafamiliar pode ser definida como “[…] aquela ação de dominação infligida à mulher pelo homem com o qual tem ligações afetivas e que objetiva mantê-la sob jugo” (PORTO; COSTA, 2010, p. 481).

Atualmente, a delimitação da problemática se orienta no texto da Lei 11.340, de 2006, conhecida como Lei Maria da Penha. Segundo seu texto, a violência contra a mulher é definida como “[…] qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”. Ela pode ocorrer “[…] no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas”; “[…] no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa” e “[…] em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação”. (BRASIL, 2006, art.5º).

Por ser essa Lei, orientadora das discussões e construção de ações de combate à violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres, nos pautaremos, na sequência, para discutir as faces da problemática em tela.

2.2.1 AS FACES DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA/FAMILIAR CONTRA AS MULHERES

Por muito tempo, os estudos científicos identificaram a violência doméstica/familiar contra as mulheres por meio de três faces: a violência física, a violência sexual e a violência psicológica. Com a promulgação da Lei Maria da Penha, somadas a essas faces foram reconhecidas também a violência moral e a violência patrimonial. Por ser essa Lei a referência de discussão e de construção de ações de combate a violência contra a mulher, nesse estudo identificaremos suas faces a partir do texto legal.

Nessa direção, a violência física pode ser compreendida como “[…] qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal” (BRASIL, 2006, art. 7º, parágrafo I). Essa forma de violência estende-se desde um empurrão ou tapa, até lesões graves que comprometem a vida da pessoa. Por isso, ela se configura como uma “[…] violação dos direitos humanos”, sendo a que “[…] mais se evidencia aos olhos da sociedade” (SIGNORI; MADUREIRA, 2007, p.7) e a mais denunciada, especialmente quando assume um caráter extremo, colocando em risco a vida das mulheres.

Em se tratando da violência psicológica, ela pode ser entendida como “[…] qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões” (BRASIL, 2006, art. 7º, parágrafo II).

Ela ocorre mediante:

[…] ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação (BRASIL, 2006, art. 7º, parágrafo II).

Devemos destacar que “[…] a violência psicológica […] é a mais encontrada, principalmente nas modalidades de humilhações, xingamentos e desprezo” (FONSECA; RIBEIRO; LEAL, 2012, p. 310. Embora seja de difícil identificação (pois não deixa marcas físicas), ela é reconhecida como a expressão mais presente nas relações afetivas, podendo evoluir e/ou compor as outras formas de violência.

Além disso, Silva, Coelho e Caponi (2007, p. 98) referem que essa forma de violência, muitas vezes, também não é identificada pela própria vítima, haja vista a naturalização da violência nas relações sociais e afetivas, especialmente entre homens e mulheres. Suas manifestações podem não serem reconhecidas por estarem associadas a fenômenos emocionais frequentemente agravados pelo álcool, a perda do emprego, problemas com os filhos, sofrimento ou morte de familiares e outras situações de crise.

Por suas características, a violência psicológica pode acarretar danos maiores às mulheres do que, por exemplo, a violência física que “[…] pode ser mais facilmente esquecida do que uma pressão, uma humilhação ou uma ameaça” (SIGNORI; MADUREIRA, 2007, p.10), por isso, para “[…] as mulheres, o pior da violência psicológica […] é […] a tortura mental e convivência com o medo e terror” (SILVA; COELHO; CAPONI, 2007, p. 99).

Nessa direção, as autoras citadas alertam que se percebe comumente uma:

[…] prioridade dada para a violência que provoca consequências físicas graves em detrimento das graves consequências psicológicas. Tem-se, assim, uma dupla omissão da violência psicológica: a falta de referência ao fato na mídia e os poucos estudos existentes sobre o tema (SILVA; COELHO; CAPONI, 2007, p. 98).

Esses elementos somados fortalecem a naturalização da violência psicológica, fazendo com que as mulheres que a vivenciam e a própria sociedade aceitem e justifiquem as atitudes do autor da violência.

Sobre a violência sexual, ela é entendida como:

[…] qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos (BRASIL, 2006, art. 7º, parágrafo III).

Como vemos no conceito apresentado, a violência sexual não aborda apenas o ato sexual em si, mas também ações que se relacionam ao exercício da sexualidade da mulher. Ela se fortalece nos valores morais, culturais e religiosos que perpassam a sociedade, direcionando o papel que a mulher deve exercer no relacionamento: ela deve ser recatada, satisfazer sexualmente seu parceiro e garantir a perpetuação de sua família.

As diversas manifestações da violência sexual são “[…] comuns nos relacionamentos amorosos e conjugais” (GIORDANI, 2006, p. 256), mas justamente por ocorrer em relações afetivas consensuais e de difícil discussão, não são consideradas aos olhos da sociedade como atos de violência.

Muitas vezes, em seus relacionamentos, as mulheres se submetem a relações sexuais com seus parceiros mesmo não querendo. Giordani (2006) também aponta que é comum as mulheres cederem a vontade dos homens, temendo que os parceiros procurem outras mulheres, abandonem a família, recusem apoio financeiro e até por temor de agressões.

Em se tratando da violência patrimonial, ela é entendida como:

[…] qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades (BRASIL, 2006, art. 7º, parágrafo IV).

Segundo Giordani (2006, p. 154), o corpo da mulher não é castigado, mas o comportamento do agressor visa afetar de alguma forma a suas decisões, pois envolve a negação da utilização de bens materiais e econômicos necessários para a garantia de sua identidade e independência. Assim, a mulher torna-se mais dependente e submissa aos desejos e decisões de seu parceiro.

Por fim, na Lei Maria da Penha a violência moral representa “[…] qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.” (BRASIL, 2006, art. 7º, parágrafo V). Nesse tipo de violência há a intenção de denegrir a imagem e a honra da mulher, as injúrias e ofensas lançadas pelos agressores podem ir muito além de inofensivos palavrões.

Os xingamentos tendem a causar constrangimento, diminuição da autoestima, de forma a ridicularizar e humilhar a vítima perante outras pessoas, inclusive familiares.

2.2.2 AS POSSÍVEIS CONSEQUÊNCIAS E O PACTO DE SILÊNCIO CONSTRUÍDO

Em suas diferentes faces, a violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres, muitas vezes, é sutil e de difícil constatação, até porque pode não ser admitida pela própria mulher. Também difícil é a percepção da gravidade de suas consequências, pois o autor da violência é alguém com quem a mulher tem uma ligação afetiva e acaba justificando seus atos, entre outros fatores, pelo “[…] ciúmes, problemas financeiros e álcool” (SIGNORI; MADUREIRA, 2007, p.13).

Entre as consequências de suas manifestações podemos citar os danos físicos. Nos estudos de Fonseca, Ribeiro e Leal (2012, p. 308) evidenciam-se uma ampla gama de problemas para a saúde e qualidade de vida da mulher, afirmando-a uma problemática que reflete diretamente na área de segurança pública e na área da saúde, entre outras.

As mulheres procuram os serviços de saúde tentando buscar solução para o sofrimento e para outras consequências decorrentes da violência sistemática, a qual já faz parte da rotina da família ou do casal. Assim, na maioria das vezes, a busca pelos serviços de saúde é motivada pelas consequências da violência já vivenciada, mesmo que não haja a consciência, por parte da vítima, de que a mesma está vivendo nesse estado.

Os danos físicos, na maioria dos casos, são rapidamente reparáveis, ao contrário das consequências psicológicas, que interferem diretamente na saúde mental e qualidade de vida da vítima e das pessoas do seu convívio. Entre os danos físicos e psicológicos manifestados, Silva, Coelho e Caponi (2007, p. 100) destacam “[…] dores crônicas (costas, cabeça, pernas, braços etc), síndrome do pânico, depressão, tentativa de suicídio e distúrbios alimentares”.

Evidencia-se que a violência vai muito além dos danos físicos, os quais são os primeiros a serem associados por nós. Cabe ressaltar que os danos psicológicos por vezes são mais danosos, pois pode ocorrer da ferida externa sair, até mesmo o roxo e hematomas mais graves cicatrizarem, enquanto o sofrimento psicológico acompanha a vítima pelo resto de sua vida e pode jamais ser superado.

A prevenção da violência psicológica deve ser pensada como uma estratégia de prevenção da violência de modo geral, Silva, Coelho e Caponi (2007) concluem que as estratégias de prevenção da violência devem levar em consideração o fato da violência psicológica ser o ponto inicial que deflagra toda violência doméstica,   sendo assim, ressalta-se a necessidade de uma compreensão de que a violência psicológica, se contida, pode servir como tática de redução das demais violências.

Em se tratando das consequências físicas, vale ressaltar os danos trazidos com atos de violência sexual. Nesses casos, as mulheres estão mais propensas a desenvolverem problemas de saúde, pois aumenta o risco do contágio de doenças sexualmente transmissíveis, pela impossibilidade de se protegerem por terem dificuldade de “[…] negociação do sexo seguro com o uso da camisinha” (GIORDANI, 2006, p. 255), que também pode levar a uma gravidez indesejada, decorrente de uma relação sexual forçada.

Também são identificadas consequências sociais, pois a vítima tende a se afastar do convívio social e apresentar queda no rendimento das atividades diárias e no trabalho. Em geral percebem-se consequências a todas as áreas da vítima, refletindo em uma queda da qualidade de vida.

Mesmo trazendo graves dados a vida das mulheres, Fonseca, Ribeiro e Leal (2012, p. 308) esclarecem que “A maioria das vítimas permanece coagida a um relacionamento baseado, muitas vezes, na dependência financeira e emocional, levando a eventos cíclicos de violência”, o que torna mais difícil para a mulher cessar a violência e procurar ajuda.

O Panorama da Violência contra as Mulheres no Brasil (2016), que avaliou indicadores da violência, advertiu que a violência doméstica/intrafamiliar não se dá de forma constante, ela costuma percorrer três fases distintas.

Primeiramente se dá a acumulação de tensão, onde ocorrem agressões mais sutis, de forma verbal e passam a agregar agressões leves, no entanto a partir de tais fatos a tensão entre as partes tende a aumentar, até o fato de atingir a segunda fase, a explosão, onde ocorrem as agressões mais graves. Na terceira fase, a chamada lua de mel, o comportamento do autor da violência passa a ser amoroso e gentil, promete mudanças de comportamento, como uma forma de tentar compensar a agressão.

Esse processo cíclico torna mais difícil a constatação e a intervenção na realidade. Na fase da lua de mel, o fato do autor da violência mostrar-se arrependido faz com que a vítima se desestabilize, acreditando que o fato não ocorrerá mais, continuando na relação e não denunciando o ocorrido.

No entanto, essa fase geralmente dá lugar a novos pequenos atos de violência, dando inicio a nova fase de acumulação de tensão, que tende a dar forma um novo ciclo de violência.

No Panorama da Violência contra as Mulheres no Brasil (2016, p. 6) ficou evidenciado que:

[…] as fases tornam a se repetir mais frequentemente e, mais do que isso, a cada retomada do ciclo, a fase da explosão se torna mais violenta, podendo ter por consequência, caso não seja interrompida, o feminicídio, ou seja, o assassinato da mulher pelo agressor. Outros desfechos trágicos também são possíveis, podendo a mulher em situação de violência vir a cometer suicídio, ou mesmo a assassinar seu agressor.

Como podemos perceber, a violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres é um fenômeno cultural, social, multifacetado e multicausal, refletindo a complexidade do problema. Por isso, entender suas especificidades é essencial para construir estratégias de enfrentamento capazes de romper com a ideologia de naturalização de desigualdade entre homens e mulheres.

3. METODOLOGIA

Para atingir o objetivo desse estudo, a metodologia adotada pauta-se na pesquisa de natureza qualitativa que segundo Richardson (1999) caracteriza-se pela tentativa de uma compreensão detalhada dos significados e características situacionais de um dado fenômeno.

Nessa direção, buscamos respostas na profundidade dos fenômenos, de forma compreensiva e complexa. Isso porque, a pesquisa qualitativa se ocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ou não deveria ser quantificado (MINAYO, 2008).

Assim, buscamos compreender a problemática da violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres numa perspectiva mais profunda, considerando os diferentes elementos e características que a compõem e que garantem sua complexidade.

Para tanto, orientamo-nos pela pesquisa bibliográfica, realizada com base em publicações de autores de diferentes fontes, incluindo livros, artigos, revistas científicas e páginas da internet.

Para Severino (1941, p. 122), a pesquisa bibliográfica se realiza a partir do registro disponível, decorrente de pesquisas anteriores. Entre os materiais utilizados, podemos destacar aqueles que se direcionam a compreensão da violência e das especificidades da violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres, considerando os elementos sócio-históricos que a compõe, as suas faces, o pacto de silêncio estabelecido entre os envolvidos, bem como a importância de intervenção e as estratégias construídas nessa realidade.

Autores como Giordani (2006), Hoffmann (2012), Teles e Melo (2002) se tornaram referência de nossa análise, assim como documentos legais, tais como a Lei Maria da Penha e a Constituição Federal de 1988. Também nos orientamos em estudos estatísticos, especialmente no documento intitulado Panorama da Violência contra as Mulheres no Brasil (2016).

Os dados apresentados em tal documento nos permitiram reconhecer a realidade empírica do fenômeno estudado, bem como, a partir dele, tecer reflexões e análise sobre ele, pautado nos diferentes autores citados. Assim, as informações teóricas e os dados estatísticos nos permitiram avançar na compreensão do mesmo, ultrapassando visões reducionistas ou fatalistas.

4. OS CAMINHOS PARA O ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA/INTRAFAMILIAR CONTRA AS MULHERES NO CONTEXTO ATUAL

Avaliando o contexto das sociedades patriarcais, a violência doméstica/intrafamiliar é considerada um tema de difícil abordagem, pois questiona a instituição familiar e desvela um problema que foi, por muito tempo, assunto apenas da família.

Por isso, Porto e Costa (2010) afirmam que essa é uma discussão que traz à tona um aspecto delicado, pois a violência acontece no espaço privado e solicita o rompimento com o pacto de silêncio estabelecido e sustentado pelo discurso da intimidade.

A intervenção nessa realidade pode causar desconforto aos envolvidos, uma vez que o que era idealizado, o espaço ‘sagrado do lar’, passa a ser questionado, tornando-se objeto de investigação. Essas idealizações, frutos de uma construção cultural, vão desde a percepção do lar como um lugar seguro, livre de conflitos, até as idealizações do papel de cada membro da família.

Diante dos desafios apresentados, cabe ao Estado construir alternativas legais e de intervenção na realidade, capazes de conter e romper com a violência sofrida por mulheres em suas relações afetivas. Essa afirmativa se sustenta na Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2004), art. 226, parágrafo 8º, que relata que “O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.

Dessa forma, o Estado assume o compromisso com o enfrentamento de qualquer forma de violência, entre elas a violência contra a mulher desencadeada nas relações afetivas. Nessa realidade, após amplas e históricas lutas do movimento feminista (nos cenários internacional e nacional), do envolvimento de instituições internacionais de defesa dos direitos humanos (que proporcionou a discussão e a construção de documentos de referências para os diversos países) a violência contra a mulher foi denunciada e ganhou visibilidade.

Como já evidenciado, a violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres sempre existiu, outrora era encarada como natural. Em 1993, na Conferência Mundial de Direitos Humanos, ela passou a reconhecida como uma violação dos direitos das mulheres e, que mesmo que ocorra no ambiente privado, é uma violação aos direitos humanos (TELES; MELO, 2002).

No Brasil, somente em setembro de 2006 situações de violência doméstica/intrafamiliar passaram a ser tratadas em sua especificidade por um instrumento legal, a Lei 11.340, a Lei Maria da Penha[3]. Ela foi elaborada, então, depois de um longo histórico de lutas, como forma de amparar as mulheres que antes sofriam os mais diversos tipos de violência. Assim, reflete o anseio da população feminina.

O artigo 2º da referida Lei afirma que:

Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social (BRASIL, 2006).

A principal alteração que a Lei Maria da Penha trouxe foi a expansão da compreensão da violência, abrangendo além das violências física, psicológica e sexual, as violências moral e patrimonial, anteriormente trabalhadas em nosso estudo.

Essa expansão reafirmou a necessária intervenção na realidade das mulheres, fortalecendo os serviços já propostos e criando novos serviços direcionados a elas. Isso ocorreu mediante a aprovação da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, em 2007, tendo como finalidade:

[…] estabelecer conceitos, princípios, diretrizes e ações de prevenção e combate à violência contra as mulheres, assim como de assistência e garantia de direitos às mulheres em situação de violência, conforme normas e instrumentos internacionais de direitos humanos e legislação nacional (BRASIL, 2011a, p. 2).

A partir da aprovação dessa Política, os eixos de trabalho foram delimitados (a prevenção, o combate, a assistência e a garantia de direitos) e o governo federal lançou o chamado Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência Contra a Mulher, com o intuito de integrar as diferentes instâncias de governo (Federal, Estaduais e Municipais) “[…] para o planejamento de ações que consolidassem a Política Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra as Mulheres por meio da implementação de políticas públicas integradas em todo território nacional” (BRASIL, 2011b).

Nessa direção, conforme o Panorama da Violência contra as Mulheres no Brasil (2016, p. 23), a Lei Maria da Penha, a Política de Enfrentamento e o Pacto estabelecido proporcionaram as mulheres “[…] demandar a intervenção do Estado para interrupção do ciclo de violência”.

É importante destacar que a Lei brasileira indicada se orienta principalmente em dois documentos internacionais. A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, ratificada no ano de 1984, e a Convenção para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra mulher, conhecida ainda como Convenção de Belém do Para, ratificada pelo Brasil em 1995.

Citando a Convenção de Belém do Pará, em seu texto encontram-se os direitos protegidos, que incluem o respeito à vida, à integridade física, psíquica e moral, à liberdade e a segurança pessoal, à dignidade e a proteção da família, direito a uma vida livre de tortura, com igualdade perante a lei e ao direito simples e rápido (OEA, 1994).

No que tange os deveres por parte do Estado, ele deve:

[…] abster-se qualquer ação ou prática de violência, agir com diligência para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, incluir na legislação interna normais penais, civis e administrativas para prevenir punir e erradicar a violência contra mulher, adotar medidas que exijam que o agressor  abster-se de fustigar, perseguir, intimidar, ameaçar, machucar, ou pôr em perigo a vida da mulher, modificar leis, práticas jurídicas ou legislativas que respaldem a persistência ou tolerância com a violência, estabelecer procedimentos justos e eficazes, medidas de proteção julgamento oportuno e acesso efetivo a tais procedimentos e ressarcimento, compensação ou reparação ao dano. (STREY; AZAMBUJA; JAEGER, 2004, p. 77)

Tais tratados internacionais adotados pelo Brasil criam obrigações perante a comunidade internacional e principalmente às mulheres (TELES; MELO, 2002). O Brasil, como signatário dessas Convenções, então, afirmou que o poder público é responsável por garantir esses direitos, criando políticas que visem afirmar os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares, no sentido de resguardá-las de toda forma de violência, crueldade e opressão.

Nessa direção, as políticas públicas atuam de forma complementar as normas jurídicas: agregando espaços normativos e buscando concretizar os direitos e princípios previstos no ordenamento jurídico, de forma objetiva, bem como construindo estratégias de intervenções planejadas no combate à violência contra as mulheres (BANDEIRA; ALMEIDA; CAMPELO, 2006).

Entendemos, então, que é necessária a criação, implementação e reforma dos serviços especializados no atendimento a mulheres vítimas de violência, tais como a Casa Abrigo, as Delegacias da Mulher, os Centros de referência de Atendimento à Mulher.

A Lei Maria da Penha prevê o atendimento integral às mulheres e entre as estratégias propostas está a implementação de Casas Abrigos, que devem acolher a mulher em situação de violência e seus dependentes menores (BRASIL, 2006). Devem se constituir em espaços seguros, oferecendo moradia temporária a esses sujeitos, afirmando-se como um serviço essencial no combate à violência doméstica/intrafamiliar, isso porque o fato da mulher retornar ao lar depois de feita a denúncia a expõe a novas situações de violência (SIGNORI; MADUREIRA, 2007).

Outra proposta de acolhimento às mulheres em situação de violência são as Delegacias de Atendimento à Mulher, que visam oferecer atendimento policial especializado, que deve ser orientado pela empatia e pelo não julgamento ou pré-conceitos. Nesse ambiente, as vítimas são acolhidas, ouvidas e orientadas quanto aos procedimentos cabíveis, a fim de garantir a sua segurança e de seus familiares, bem como orientar para prevenir que novos fatos ocorram.

A Lei Maria da Penha prevê, nos art. 22 (relacionadas ao autor da violência) e os arts. 23 e 24 (relacionados à vítima), a aplicação de medidas protetivas de urgência, que amplia “[…] o seu acesso à rede de atendimento especializada, que inclui desde o acolhimento psicossocial e jurídico até o abrigamento das mulheres e seus filhos (as) nos casos de grave ameaça e risco de morte” (BRASIL, 2011c, p.11).

Mesmo com a ampliação desse serviço no país, fato é que nem todas as situações de violência são denunciadas. Ao averiguarmos o chamado “Relógio da Violência”[4], promovido pelo Instituto Maria da Penha, somos informados que a cada 2 segundos uma mulher é vítima de violência física ou verbal no Brasil.

Identificando essas informações a cada hora, no dia 25/02/2019, às horas 12 horas e 40 minutos, o Relógio nos informou que 23.078 mulheres já haviam sido vítimas de violência física ou verbal no Brasil. O Relógio também nos informou, considerando esse mesmo horário, que a cada 2,6 segundos uma mulher é vítima de ofensas, humilhações, xingamentos (17.605 mulheres no dia); a cada 6,3 segundo uma mulher é ameaçada de violência (7.225 mulheres no dia); a cada 6,9 segundos uma mulher é vítima de perseguição (6.650 mulheres no dia); a cada 7,2 segundos uma mulher é vítima de violência física (6.364 mulheres no dia); a cada 62 minutos uma mulher é vítima de arma de fogo (372 mulheres no dia); a cada 16,6 segundos uma mulher é ameaçada com faca ou arma de fogo (2.764 mulheres no dia) e que a cada 22,5 segundos uma mulher é vítima de espancamento ou tentativa de estrangulamento (2.028 mulheres no dia).

Mesmo percebendo a dimensão do fenômeno, fato é que esses casos, em sua maioria, não foram e não serão denunciados. Isso porque, como já afirmamos antes, as mulheres comumente procuram o serviço quando a violência assume sua face mais perversa, aproximando-a da morte (do feminicídio[5]), além disso, pode ocorrer a subnotificação dos casos, especialmente quando envolve profissionais das diversas áreas que não conseguem identificar a violência sofrida pelas mulheres.

Ainda, em se tratando das ações previstas no combate a violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres somam-se a esses serviços os Centros de Referência de Atendimento à Mulher (CRAM), espaço de acolhimento integral à vítima e seus familiares. Eles devem disponibilizar variados serviços a fim de atender a mulher nas suas necessidades mais básicas e também mais complexas. São previstos atendimento psicológico e social, orientação e assistência jurídica, bem como encaminhamentos para demais órgãos que se fizerem pertinentes a fim de garantir cidadania da vítima (BRASIL, 2006).

Como podemos observar até o momento, os serviços disponibilizados às mulheres foram ampliados e fortalecidos, tanto na Lei quanto na Política proposta. Mas, além das mulheres e de seus dependentes, esses instrumentos também reconhecem a necessidade de atuar junto ao autor da violência.

A Lei Maria da Penha propôs tanto o aumento da punição ao autor de violência, reconhecendo-a como um crime, quanto a importância dos trabalhos de acompanhamento e responsabilização dos autores da violência. Afirma-se a necessidade dos autores da violência receberem atendimento nos Centros de Educação e de Reabilitação, no intuito de promover uma mudança psicossocial e cultural.

Citada no art. 35 (inciso V) e no art. 45 da referida Lei, esses Centros devem promover reflexões sobre a igualdade de gênero. Para tanto, devem ser formados grupos de reflexão, que promovam discussões sobre a masculinidade, a feminilidade, valores culturais, mudança de comportamento e cultura (BRASIL, 2006).

Acompanhados por uma equipe multiprofissional, os grupos têm a possibilidade de desconstruir conhecimentos preconceituosos que, em tese, justificam a violência em suas relações afetivas cotidianas, bem como de proporcionar a construção de afinidades entre os participantes e, assim, a troca de experiências e propostas de superação da violência, fortalecendo a cultura do diálogo.

Mesmo sendo uma importante proposta de intervenção, o que se evidencia no cenário brasileiro é que essa proposta não vem sendo proporcionada pelo Estado de forma mais abrangente; são poucos os Centros de Educação e de Reabilitação e/ou os projetos dessa natureza, geralmente desenvolvidos por instituições de ensino superior ou instituições não governamentais.

Essa realidade demonstra, por um lado, a falta de estrutura financeira, material e humana do Estado, diante de um processo cada vez maior de desresponsabilização e, por outro, o difícil rompimento com as relações desiguais de gênero, presentes tanto no cotidiano da vida das pessoas, quanto na compreensão dos legisladores e executores das políticas sociais.

Para além do trabalho com os sujeitos diretamente envolvidos (a vítima e o autor da violência), afirma-se a importância do trabalho preventivo da violência e promocional dos direitos das mulheres. Assim, o combate à violência doméstica/intrafamiliar não pode apenas envolver homens e mulheres que vivenciam essa situação, mas também deve envolver a sociedade em geral, de forma a se repensar questões de gênero.

Uma sociedade livre de preconceitos e estereótipos deve contar prioritariamente com ações educativas, a fim de promover a igualdade, a dignidade e o respeito entre homens e mulheres. Por isso, a Lei Maria da Penha prevê “[…] a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia” (BRASIL, 2006, art. 8º, parágrafo VIII) pautados, entre outras estratégias, em campanhas educativas direcionadas ao público escolar e à sociedade em geral, no intuito de disseminar o conhecimento sobre os direitos humanos das mulheres.

Para além das ações pontuais e de rompimento com a violência já desencadeada, ações preventivas devem ser desenvolvidas. Nesse sentido, Bandeira, Almeida e Campelo (2006, p.256) referem ainda que as políticas públicas não devem somente ter a finalidade punitiva do autor da violência, mas devem trabalhar o combate à violência por meio da educação, a fim de evitar que ela ocorra.

É importante lembrar que:

Os costumes, a educação e os meios de comunicação tratam de criar e preservar estereótipos que reforçam a ideia de que o sexo masculino tem o poder de controlar os desejos, as opiniões e a liberdade de ir e vir das mulheres (TELES; MELO, 2002, p. 18).

Por meio de ações socioeducativas é possível incutir nos sujeitos a importância do respeito a igualdade de gênero, mais difícil que se alterar a legislação é mudar a mentalidade das pessoas, pois:

Estereótipos, preconceitos e discriminações fazem parte de nossa cultura e estão profundamente inculcados nos indivíduos […] fazendo com que sejam reprodutores desta cultura que naturaliza e banaliza condutas violentas e performances desiguais entre homens e mulheres (CORTIZO; GOYENECHE, 2010, sp.).

Como podemos perceber as alternativas de intervenção e prevenção da violência são amplas e solicitam a realização de um trabalho intersetorial e em rede.

O conceito de rede de enfrentamento à violência contra as mulheres diz respeito à atuação articulada entre as instituições/serviços governamentais, não-governamentais e a comunidade, visando ao desenvolvimento de estratégias efetivas de prevenção e de políticas que garantam o empoderamento e construção da autonomia das mulheres, os seus direitos humanos, a responsabilização dos agressores e a assistência qualificada às mulheres em situação de violência (BRASIL, 2011a, p.13).

As estratégias construídas, seja na promoção, na prevenção e na intervenção do problema, preveem estreita conexão entre as instituições governamentais (Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação) e não governamentais para complementar e maximizar o trabalho.

Nessa direção, a capacitação dos profissionais envolvidos é fundamental e possui inclusive previsão legal, pois a forma como a vítima e autor da violência serão atendidos está intimamente relacionada a condução do problema: um atendimento desqualificado, estereotipado e que venha a julgar as partes dificilmente acarretara mudanças nos envolvidos e o rompimento da violência.

Infelizmente, a realidade que se percebe é a naturalização da violência até mesmo por quem é encarregado por fazer a Lei ser cumprida e/ou por intervir sobre essa realidade. Por se tratar de uma problemática histórica e social, muitos profissionais podem perpetrar os conhecimentos de senso comum sobre o tema, em detrimento das reflexões científicas e legais.

Assim, a capacitação dos diversos profissionais envolvidos, nas diferentes áreas de atuação, afirma-se como uma importante estratégia para o fortalecimento das ações de combate à violência em tela, pois permite a eles discutir a temática da violência, apreender os conceitos teóricos que a perpassam, promover a desconstrução dos conhecimentos de senso comum e a estabelecer troca de experiências.

De forma mais ampla, mesmo sendo o Estado o principal responsável por garantir a intervenção na área, fato é que isso não ocorre à parte da participação da sociedade e da família, de forma mais ampla, trabalhando constantemente para o rompimento das desigualdades de gênero, logo, para o rompimento do ciclo da violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Percorrendo a literatura na área, observamos em nosso processo de estudo que o problema da violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres é um fenômeno complexo: construído histórica e culturalmente, está enraizado nas relações sociais.

Ele reflete as relações desiguais de gênero, uma construção social que delimite os papeis e espaços a serem ocupados por homens e mulheres, logo, afirma uma suposta superioridade de poder do homem sobre a mulher.

Fruto de uma sociedade patriarcal, as desigualdades de gênero se manifestam em preconceitos e atitudes, especialmente no ambiente doméstico e familiar, onde o homem torna-se “dono” do corpo, dos pensamentos e da vida da mulher.

Assim manifestam-se a violência doméstica/intrafamiliar, perpetrada pela violência física, pela violência psicológica, pela violência sexual, pela violência moral e pela violência patrimonial, sustentada em um pacto de silêncio estabelecido entre os envolvidos.

A partir dos subsídios pesquisados, verificamos que as mulheres historicamente sofrem variadas formas de violência e violação dos seus direitos. Sendo assim, percebemos a necessidade de se estudar a interconexão entre a psicologia, as políticas públicas e as normativas legais, de modo a ampliar os conhecimentos e oferecer menções para a atuação profissional na área da saúde, da assistência social e na área jurídica.

A Lei Maria da Penha emerge como fruto de amplas e históricas lutas dos movimentos feministas e de organismos internacionais e representou para as mulheres brasileiras um importante avanço no reconhecimento e na intervenção do fenômeno.

Afirmando conceitos e propostas de intervenção e responsabilização do autor da violência, essa Lei garante o reconhecimento da violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres como um problema a ser acompanhado pelo Estado, por meio de políticas públicas, bem como como um crime, negando qualquer suposta justificativa para sua manifestação.

Por isso, afirmam-se ações de intervenção nas situações constatadas e/ou denunciadas mediante o atendimento direto das vítimas e seus dependentes (quando necessário) pela implementação de Delegacias da Mulher, das Casas Abrigos e dos CRAMs.

É importante salientar que o medo, a vergonha ou até o desconhecimento por parte de algumas mulheres sobre a violência sofrida e sobre os seus direitos faz com que muitas se calem diante da violência, impossibilitando o reconhecimento real da problemática e a intervenção nela.

Devemos destacar, ainda, que importância de se trabalhar, também, com os autores da violência é evidenciada. A Lei Maria da Penha propõe o rompimento da ideia de mera punição, pautada na prisão do homem como primeira e única alternativa, e propõe a responsabilização do mesmo, prevendo a possibilidade de promover grupos de reabilitação nos Centros de Educação e de Reabilitação.

Vimos, contudo, que essa proposta não tem ganhado expressão no cenário nacional, haja vista limitações de investimento do Estado e as barreiras socioculturais que perpassam a discussão.

Por outro lado, pudemos constatar em nosso estudo a reafirmação da importância do trabalho de prevenção, que deve ser desenvolvido nas diversas instituições e instâncias sociais, mediante campanhas e discussões estabelecidas com os sujeitos em suas diversas fases da vida (seja na escola, em empresas, em grupos comunitários, entre outros).

Esse trabalho tem o potencial de desconstruir os conceitos patriarcais que sustentam a desigualdade de gênero e, muitas vezes, justificam a violência contra a mulher e, então construir uma nova cultura da não violência e de valorização dos direitos humanos.

Dispomos, então, de dispositivos legais que abrangem os direitos das mulheres e de políticas públicas voltadas a área, contudo o que percebemos é a necessidade do fortalecimento desses instrumentos de proteção dos direitos das mulheres em situação de violência no cotidiano.

É necessária a efetivação dos serviços especializados no atendimento a mulheres vítimas de violência e dos autores da violência, numa perspectiva intersetorial e em rede, envolvendo múltiplos serviços, de forma a se complementarem.

Outro importante passo na investigação da problemática acerca da violência doméstica/familiar contra as mulheres é realização de capacitação dos profissionais envolvidos no processo, desde os encarregados pela educação, os profissionais que atendem a situação de violência em loco, profissionais da saúde até os responsáveis por julgar.

É imprescindível, sobretudo que o problema da violência seja rebatido ainda na base familiar, na construção dos valores e formação psicossocial do indivíduo, sendo assim, o problema deve ser abordado ainda na educação.

O combate à violência doméstica/intrafamiliar contra as mulheres necessita, sobretudo de uma mudança de comportamentos e de costumes, o que envolve a participação do Estado, mas principalmente da família e da sociedade de forma mais ampla.

REFERÊNCIAS

BANDEIRA, Lourdes; ALMEIDA, Tânia Mara C. de; CAMPELO, Eliane. Introdução. Políticas públicas e violência contra as mulheres: metodologia de capacitação de agentes. 6. ed. Brasília: AGENDE, 2006, v.6. p. 256.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Atlas, 2004.

______. Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres. Brasília: MDS, 2011a.

______. Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência Contra a Mulher. Brasília: MDS, 2011b.

______. Texto-Base da Política Nacional de Abrigamento de Mulheres em situação de Violência. Brasília: MDS, 2011c.

______. Lei n. 11.340, de 07 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal e dá outras providências.  Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm> Acesso em: 18 jan. 2019.

______. Lei n. 13.104 (Lei do feminicídio), de 9 de março de 2015. Altera o art. 121 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1o da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, para incluir o feminicídio no rol dos crimes hediondos. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13104.htm > Acesso em: 19 jan. 2019.

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CORTIZO, María del Carmen; GOYENECHE, Priscila Larratea. Judiciarização do privado e violência contra a mulher. Rev. katálysis,  Florianópolis ,  v. 13, n. 1, p. 102-109,  jun.  2010 .  Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-49802010000100012&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em:  23  jan.  2019.

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TELES, Maria Amélia de Almeida; MELO, Mônica de. O que é violência contra a mulher. São Paulo: Brasiliense, 2002.

APÊNDICE – REFERÊNCIA DE NOTA DE RODAPÉ

3. A Lei foi assim denominada pelo reconhecimento da violência sofrida por Maria da Penha maia Fernandes, representando a violência sofrida por muitas mulheres. Maria da Penha, uma biofarmacêutica cearense, foi casada com o professor universitário Marco Antonio Herredia Viveros, que realizou diversos atos de violência contra ela. A primeira tentativa de assassinato contra Maria da Penha se deu com um tiro dado pelo seu parceiro, enquanto dormia. Ela ficou paraplégica e seu parceiro não foi responsabilizado, ocorrendo, meses depois a segunda tentativa de homicídio, quando Viveros empurrou Maria da Penha da cadeira de rodas e tentou eletrocuta-la no chuveiro (BRASIL, 2006).

4. Informações disponíveis em: < http://www.relogiosdaviolencia.com.br/#>, Acesso em: 25 fev. 2019.

5. Feminicídio é o Homicídio (simples ou qualificado) contra a mulher por razões da condição de sexo feminino.  Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve violência doméstica e familiar e/ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher. O crime está previsto na Lei nº 13.104, de 9 de março de 2015 que altera o art. 121 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1º da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, para incluir o feminicídio no rol dos crimes hediondos. (BRASIL, 2015).

[1] Cursando Mestrado em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná- UNIOESTE; Especialização em Gestão Pública com ênfase em Direitos Humanos e Cidadania, Planejamento e Avaliação de Políticas Sociais da UEPG – Universidade Estadual de Ponta Grossa; Bacharel em Psicologia pela Universidade do Oeste de Santa Catarina – UNOESC.

[2] Cursando Mestrado em Filosofia, pela Universidade Federal da Fronteira Sul- UFFS; Especialização em Gestão Pública com ênfase em Direitos Humanos e Cidadania; Planejamento e Avaliação de Políticas Sociais da UEPG – Universidade Estadual de Ponta Grossa; Licenciada em Educação Física pela Universidade do Contestado- UnC.

Enviado: Abril, 2020.

Aprovado: Março, 2020.

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Sandra Schons

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