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Panorama da rede da reciclagem no Brasil e breve reflexão sobre o cooperativismo

RC: 26229
160
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/geografia/reciclagem-no-brasil

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

CRUZ, Uilmer Rodrigues Xavier da [1]

CRUZ, Uilmer Rodrigues Xavier da. Panorama da rede da reciclagem no Brasil e breve reflexão sobre o cooperativismo. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 04, Ed. 02, Vol. 03, pp. 151-176. Fevereiro de 2019. ISSN: 2448-0959.

RESUMO

Este artigo apresenta um panorama das principais leis da rede da reciclagem brasileira, consolidação da profissão catador e os principais avanços da categoria, principalmente, com as políticas implementadas nos governos Lula e Dilma. O catador de material reciclável como demonstra o artigo passou a ser incluído no orçamento com parcerias públicos/privados de vários segmentos da economia. A catação passou a ser visto não somente como preservação ambiental, mas como fonte de trabalho e renda para trabalhadores subalternizados. A metodologia da pesquisa baseou-se em análises de dados secundários disponíveis em publicações e revistas técnicas. O artigo aborda questões sobre o surgimento do cooperativismo, as bases do cooperativismo surgiram com a crise da Revolução Industrial, ou seja, a economia precisava se reinventar, surgindo um modelo econômico mais colaborativo e participativo.

Palavras-chave: Rede, Reciclagem, Cooperativismo, Gestão Compartilhada.

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa nasce não só de um sonho de uma sociedade menos desigual, mas também do reconhecimento de que o Brasil para se tornar um país que trilhe a perspectiva do desenvolvimento sustentável, ainda que nos marcos de uma sociedade capitalista avançada, somente acontecerá quando se der o reconhecimento da atividade da catação como um fator estratégico para este processo. “Eu me interrogo sobre o que fabrico, pois o ‘sentido’ ali está, escondido no gesto, no ato de escrever. Por que escrever, senão a título de uma palavra impossível?” (CERTEAU, Michel de, 2017, p. 269).

DESENVOLVIMENTO

Esta atividade da catação emergiu à margem da sociedade, nos lixões e nas ruas e, dos centros urbanos que se formaram a partir dos anos 50 do século passado a partir do crescimento das metrópoles brasileiras e, ao mesmo tempo, dos migrantes vindos principalmente do Nordeste do Brasil em busca de trabalho. O trabalho de catação de natureza estruturalmente informal surgido como uma estratégia de sobrevivência da pobreza passa a ser um elemento importante do conceito de sustentabilidade que começa a surgir na década de 70 com a Conferência de Estocolmo e toma corpo em 1992 com Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento no Rio de Janeiro. Progressivamente a atividade de catação vai ocupando destaque com a “dinamização e a sustentabilidade da produção, a promoção do consumo consciente, e a constituição de novos modos de vida urbana, marcados pelo respeito ao meio ambiente” (PEREIRA; GOES, 2016, p. 12).

É posto de lado numa das áreas técnicas e secretas (hospitais, prisões, depósitos de lixo) que aliviam os vivos de tudo aquilo que poderia frear a cadeia da produção e do consumo e que, na sombra onde ninguém penetra, consertam e fazem a triagem daquilo que pode ser reenviado à superfície do progresso. Retido ali, torna-se um desconhecido para os seus. Não mora mais nas casas deles nem no seu falar. Talvez o exilado um dia regresse do país estranho cuja língua, na casa dele, ninguém conhece e que há de ser fatalmente esquecida. Se regressar, será o objeto longínquo, não significável, de um esforço e de um fracasso impossíveis de traçar no espaço e na linguagem familiar. (CERTEAU, Michel de, 2017, p. 266).

É uma longa batalha, que busca a inserção mais digna daqueles que compõe o cenário da catação nas margens de uma sociedade que insiste em negar a sua importância na nossa estrutura social. Cabe ressaltar, porém, que na primeira década deste século, principalmente a partir da eleição do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, avanços significativos foram alcançados. A criação do Comitê Interministerial de Inclusão Social e Econômica dos Catadores em 2013[2] coloca o tema dos catadores numa das prioridades governamentais, inclusive com a participação no Comitê da Secretária-geral da Presidência da República, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), da Fundação Banco do Brasil (FBB) entre outros, ora traduzidas em leis, ora em programas e projetos, um “trabalho de conscientização dos catadores sobre a importância da organização para a categoria” (PEREIRA; GOES, 2016, p. 13).

A partir do Comitê, começou-se a pensar de forma efetiva a valorização da função de catador, dando mais autonomia a toda uma categoria de trabalho. “A forma de agir do governante conseguiu, em um país de dimensões continentais e condições sociais tão desiguais, transformar, pessoas quase invisíveis em cidadãos” (PEREIRA; GOES, 2016, p. 14). Durante este período, muitos avanços foram alcançados, do qual a Lei nº 12.035[3], de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos:

LEI Nº 12.305, DE 2 DE AGOSTO DE 2010.

           Regulamento

Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos; altera a Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998; e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

TÍTULO I

DISPOSIÇÕES GERAIS

CAPÍTULO I

DO OBJETO E DO CAMPO DE APLICAÇÃO

Art. 1o Esta Lei institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, dispondo sobre seus princípios, objetivos e instrumentos, bem como sobre as diretrizes relativas à gestão integrada e ao gerenciamento de resíduos sólidos, incluídos os perigosos, às responsabilidades dos geradores e do poder público e aos instrumentos econômicos aplicáveis.

§ 1o Estão sujeitas à observância desta Lei as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos e as que desenvolvam ações relacionadas à gestão integrada ou ao gerenciamento de resíduos sólidos.

§ 2o Esta Lei não se aplica aos rejeitos radioativos, que são regulados por legislação específica.

Art. 2o  Aplicam-se aos resíduos sólidos, além do disposto nesta Lei, nas Leis nos 11.445, de 5 de janeiro de 2007, 9.974, de 6 de junho de 2000, e 9.966, de 28 de abril de 2000, as normas estabelecidas pelos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama), do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), do Sistema Unificado de Atenção à Sanidade Agropecuária (Suasa) e do Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Sinmetro) (BRASIL, 2010).

Esta mudança representou um divisor de águas para aqueles que trabalham nas ruas, ao menos no papel e no que seria o cenário ideal para o trabalho, que se arriscam, até hoje, sem nenhum tipo de segurança física ou moral, horário pré-determinado e que dão valor ao que o restante da sociedade descarta. Além disso, em seu capítulo II, seção III, que trata dos planos estaduais de resíduos sólidos, em seu Art. 17, inciso V – “metas para a eliminação e recuperação de lixões, associadas à inclusão social e à emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis” (BRASIL, 2010). Já na seção IV, que trata dos planos municipais de gestão integrada de resíduos sólidos, em seu Art. 18, inciso II – “implantarem a coleta seletiva com a participação de cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda” (BRASIL, 2010).

O documento da Lei reforça este interesse em seu Art. 19, inciso XI – “programas e ações para a participação dos grupos interessados, em especial das cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda, se houver” (BRASIL, 2010).  Mais uma vez, enfatiza no capítulo V, que trata dos instrumentos econômicos, em seu Art. 42, inciso III – “implantação de infraestrutura física e aquisição de equipamentos para cooperativas ou outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis formadas por pessoas físicas de baixa renda” (BRASIL, 210). Em seu capítulo III, que trata dos instrumentos, também traz luz a organização dos meios de produção dos catadores de materiais recicláveis: inciso IV – “o incentivo à criação e ao desenvolvimento de cooperativas ou de outras formas de associação de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis” (BRASIL, 2010).

Em seu capítulo II, que trata dos princípios e objetivos, Art. 6º, dos princípios da Política Nacional de Resíduos Sólidos: “o poluidor-pagador e o protetor-recebedor” (BRASIL, 2010). A questão do poluidor-pagador fundamenta-se na obrigatoriedade do poluidor de arcar com os custos da reparação do dano por ele causado ao meio ambiente, como um princípio normativo de caráter econômico, pois impõe ao poluidor os custos atrelados a uma atividade poluente. De acordo com o art. 3°, inciso IV, da Lei 6.938/81[4]: poluidor: “é a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável direta ou indiretamente por atividades causadoras de degradação ambiental.”. Também, no art. 225 da Constituição Federal, apresenta elementos para a identificação do sujeito passivo em uma demanda ambiental. Quando salienta que “é dever do Poder Público e da coletividade preservar e defender o meio ambiente”, define que tanto a coletividade quanto o poder público podem ser tidos como poluidores.

A  ISO 14001, de 2015, que é um conjunto de normas voltadas para a questão da responsabilidade ambiental como um pré-requisito para a sobrevivência das espécies da fauna, flora e o meio ambiente em geral. São mais de trinta normas que determinam um conjunto de ferramentas, como a avaliação do desempenho ambiental, quantificação e relato de emissões de gases do efeito estufa, avaliação do ciclo de vida, rotulagem ambiental, dentre outros. Segundo a ISO 14001, ao poluidor pagador: é recomendado que as organizações arquem com os custos da poluição causada por suas atividades, proporcional a extensão do impacto ambiental na sociedade e a ação corretiva exigida, ou de acordo com o nível da poluição exercida aceita pela legislação.

Como determina a Lei nº 12.035, de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, os fabricantes, importadores, distribuidores, consumidores e titulares dos serviços públicos de limpeza urbana e manuseio de resíduos sólidos são incumbidos da responsabilidade pelo ciclo de vida dos produtos, no sistema de logística reversa. Este sistema visa, através de um conjunto de ações, possibilidades do retorno e recuperação dos resíduos sólidos. Para o cumprimento da Política Nacional de Resíduos Sólidos, podem ser executados mediante dispositivos jurídicos, como os acordos setoriais e termos de ajustamento de conduta (TAC), que são regulamentos expedidos pelo Poder Público, como é o caso do Acordo Setorial Para Implementação de Sistema de Logística Reversa de Embalagens em Geral[5]:

O Acordo Setorial para Implementação do Sistema de Logística Reversa de Embalagens em Geral foi assinado pela União, representada pelo Ministério do Meio Ambiente – MMA, e por parte do setor empresarial (Coalizão), em 25 de novembro de 2015. A Coalizão, portanto, significa o conjunto das empresas relacionadas no Acordo que está realizando ações para viabilizar o retorno de embalagens que compõem a fração seca dos resíduos sólidos urbanos ou equiparáveis, para fins de destinação final ambientalmente adequada, ou seja, empresas que estão implementando, estruturando e operacionalizando a logística reversa (ACORDO SETORIAL, 2015).

Este acordo representou um marco importante, com a finalidade garantir a destinação final ambientalmente adequada das embalagens, como papel e papelão, plástico, alumínio, aço, vidro, ou ainda pela combinação destes materiais, como as embalagens cartonadas longa vida, por exemplo.

Já com relação aos catadores de materiais recicláveis, uma conquista importante enquanto classe trabalhadora foi o registro da atividade dos catadores no Código Brasileiro das Ocupações[6] (CBO), com o código 5192 – 05 – Catador de material reciclável, que ocorreu em 2002 e, a partir daí, os catadores passaram a ser reconhecidos formalmente enquanto profissionais. Vale ressalta que, a partir da criação do Comitê Interministerial de Inclusão dos Catadores de Lixo, em 2003, pelo presidente Lula, que foi a base legal para a construção de todo o resto, com o objetivo de pensar o “apoio a ser dado aos empreendimentos de catadores de materiais recicláveis” (BRASIL, 2010).

Segundo o próprio texto do CBO[7], o catador é o sujeito mais importante no ciclo da rede produtiva de reciclagem, é o sujeito que está na ponta do processo produtivo, fazendo cerca de 89% de todo o trabalho. Contudo, o catador é quem menos ganha, mesmo sendo responsável por cerca de 60% de todo os resíduos que são reciclados hoje no Brasil o catador vive na miséria, nas ruas e nos lixões por todo o Brasil. Segundo o MNCR[8], Um catador coleta em média 600 quilos de materiais recicláveis por dia, ou seja, a coleta seletiva que destina corretamente esses resíduos,  gerando uma renda mensal de cerca de   R$ 140,00 em média. As empreiteiras pagas pelos municípios Brasil afora recebem milhões por ano para fazer a coleta comum, pagando salários miseráveis e superlotando os aterros sanitários. Os catadores catam, selecionam e vendem materiais recicláveis como papel, papelão e vidro, bem como materiais ferrosos e não ferrosos e outros materiais reaproveitáveis, de acordo nos termos do artigo 429 da consolidação das Leis do Trabalho – CLT, excetos casos previstos no art. 10 do decreto 5.598[9], de 2005.

Este fenômeno vai generalizando por toda a parte, mesmo que os quadros o penalizem ou “fechem os olhos” para não vê-lo. Acusado de roubar, de recuperar material para o seu proveito próprio e utilizar as máquinas por conta própria, o trabalhador que “trabalha com sucata” subtrai à fábrica tempo (e não tanto bens, porque só se serve de restos) em vista de um trabalhador livre, criativo e precisamente não lucrativo (CERTEAU, Michel de, 2017, p. 82).

Em 2006 foi assinado o Decreto nº 5.940[10], que tornou obrigatória a coleta seletiva solidária, com catadores, em órgãos públicos federais. O decreto representou mais uma conquista, que aconteceu em meio a muita comoção, com centenas de catadores e catadoras ocuparam um grande salão do Palácio do Planalto pela primeira vez.

A Lei Nacional de Saneamento nº 11.445/2007[11] resultou em um grande salto nas conquistas feitas pelos catadores, pois ela alterou a Lei de Licitações, possibilitando que municípios contratassem cooperativas e associações de catadores para realizarem a coleta, o processamento e a comercialização de resíduos sólidos sem a necessidade de licitação. Porém, o grande marco de conquistas para todo o setor de resíduos sólidos foi a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) em 2010 – Lei nº 12.305. São estabelecidos conceitos, responsabilidades, metas e prazos. Ainda que de maneira lenta, tais parâmetros vêm modificando o cenário do país de maneira gradual, com a obrigatoriedade de entes públicos elaborarem planos de resíduos sólidos, fecharem lixões e implementarem a coleta seletiva; o conceito de gestão compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; e o estabelecimento da logística reversa. Os catadores de materiais recicláveis passaram a ser parte fundamental, tendo sido a palavra “catadores” citada doze vezes no texto que estabelece a lei e permanece em seus instrumentos, princípios e objetivos, obrigações dos estados, municípios e União. O Decreto nº 7.405/2010[12] regulamentou a PNRS e estabelece que os municípios devam priorizar a participação de cooperativas e associações de catadores de materiais recicláveis na coleta seletiva. Na Lei de Saneamento Básico a possibilidade surgiu, mas com a PNRS, a contratação de catadores deveria ser priorizada.

A partir daí, os catadores foram inseridos no sistema formal de limpeza pública, com a realização da coleta seletiva, que deveria ser pensada para que houvessem condições de trabalho dos catadores na realização do trabalho. Foi então que o Decreto no 7.405/2010 reedita o Comitê Interministerial criado em 2003, que passa a se chamar Comitê Interministerial para Inclusão Social e Econômica dos Catadores de Materiais Reutilizáveis e Recicláveis (CIISC), composto por 25 órgãos do governo federal. Além disso, o decreto também cria o Programa Pró-Catador, a fim de integrar e articular as ações do governo federal destinadas ao apoio e ao fomento à organização produtiva dos catadores de materiais recicláveis, à melhoria das condições de trabalho, à ampliação das oportunidades de inclusão social e econômica e à expansão da coleta seletiva de resíduos sólidos.

Ainda em 2010, o Decreto nº 7.405[13] articula as políticas setoriais e segue com a execução de ações destinadas à população de catadores e surge o Comitê Interministerial para Inclusão Social e Econômica dos Catadores de Materiais Reutilizáveis e Recicláveis (CIISC), que executa conjuntamente o Programa Pró-Catador. Com o objetivo de aumentar o desempenho do Pró-Catador como uma parte essencial do seu movimento, o CIISC encadeia o CATAFORTE – Negócios Sustentáveis em Redes Solidárias, constituído, em sua primeira fase, a partir de Convênio MTE/Senaes – Fundação Banco do Brasil Nº 003/2007. Depois teve segmento com parceiros como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a PETROBRÁS.

O Programa CATAFORTE teve como propósito organizar redes solidárias compostas por cooperativas e associações de catadores de materiais recicláveis a fim de viabilizar avanços na rede de valor e inserção no mercado da reciclagem de forma competitiva, fortificando-as, também, como prestadoras de serviços das políticas públicas de coleta seletiva de resíduos sólidos e da logística reversa.

Além disso, formação crescente de organizações populares também foi significativa para que os atores “invisíveis” da sociedade pudessem se articular e “um movimento que luta pelo reconhecimento, melhoria e avanços nas condições de trabalho dos catadores de materiais recicláveis” (PEREIRA; GOES, 2016, p. 23). Este é o caso do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR[14]), que surge como uma iniciativa que visa “contribuir para a construção de sociedades justas e sustentáveis a partir da organização social e produtiva dos catadores de materiais recicláveis e suas famílias, orientados pelos princípios que norteiam sua luta (autogestão, ação direta, independência de classe, solidariedade de classe, democracia direta e apoio mútuo), estejam eles em lixões á céu aberto, nas ruas ou em processo de organização ”[15].

A partir daí, começou-se a pensar as demandas dos catadores pelos próprios catadores, que “passaram a contar com uma organização nascida no seio da atividade de catação e que era organizada, gerida, planejada e formulada pelos próprios catadores” (PEREIRA; GOES, 2016, p. 23). Uma categoria, surge, seguindo a premissa do “orgulho que o catador tem de ser catador” (PEREIRA; GOES, 2016, p. 23), incorporando a cidadania, num movimento de luta pelo reconhecimento, melhoria e condições de trabalho dos catadores.

Para nós, os bons, as boas, são aqueles(as) que lutam contra as desigualdades e as injustiças, os(as) que dão novo significado a suas vidas e seus trabalhos e fazem de uma atividade um debate central e estratégico para o país. São aqueles(as) que propõem o repensar do modelo econômico produtivista de uma sociedade consumista a partir dos resíduos sólidos e dos impactos que estes têm sobre o meio ambiente e o trabalho. São os(as) que nos levam a refletir sobre o acúmulo de lixões em territórios habitados quase exclusivamente por negros(as) e não haver nenhum nos bairros nobres das metrópoles. Encantamo-nos com as batalhas cotidianas, ao mesmo tempo fortes e suaves, dos(as) catadores(as) de material reciclável, muitos(as) em um movimento nacional e, em algumas situações, apoiados(as) por incubadoras solidárias (PEREIRA; GOES, 2016, p. 15).

Estes catadores povoam os lixões que residem sempre no lado contrário dos bairros destinados as classes mais altas da sociedade, sempre povoados com o tipo de seres humanos excluídos das áreas mais nobres: pobres e negros. O trabalho dos catadores, embora não seja legitimado, oferece muitos benefícios para a sociedade, pois trabalham com os resíduos sólidos que, diferentemente do lixo comum, pode ser reaproveitado através do trabalho de reciclagem e reingressar no mercado como produto reciclado, trazendo, assim, inúmeros ganhos ambientais.

O Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) define a reciclagem como o “reprocessamento dos resíduos num processo de produção para o fim original ou para outros fins” (Portaria CONAMA 15/96, de 23 de janeiro de 1996). De acordo com a classificação NBR 10004:2004 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), os resíduos sólidos são classificados como:

a) Resíduos classe I – Perigosos: são aqueles que apresentam algum grau de perigo, como por exemplo: inflamabilidade, corrosividade, reatividade, toxicidade ou patogenicidade.

b) Resíduos classe II A – Não Inertes: algumas propriedades deste tipo de resíduo são: biodegradabilidade, combustibilidade ou solubilidade em água.

c) Resíduos classe II B – Inertes: estes resíduos não apresentam nenhum tipo de risco

para a saúde nem para o meio ambiente.

Estes resíduos são oriundos dos espaços domésticos ou residenciais, comerciais e públicos ou industriais, podendo ser reaproveitados na forma de organização solidária por meio de cooperativas e associações. Com este modelo de funcionamento, os catadores se articulam em cooperativas, tendo como premissa igualitária de trabalho e distribuição econômica da produção: “o impulso a essa atividade e os benefícios econômicos de sua ampliação devem ser repartidos de forma justa, proporcional ao trabalho realizado e de forma solidária” (PEREIRA; GOES, 2016, p. 24).

Certamente, esse é um desafio constante para o movimento, pois os incentivos para a atividade de reciclagem se realizam de outras formas ou as experiências malsucedidas de cooperativas de fachada, que afastam uma parte importante da base do movimento, são uma força constante a questionar o modelo cooperativo. No entanto, as experiências bem-sucedidas e a visão de organização econômica solidária têm permitido ao movimento defender o modelo cooperativo com entusiasmo (PEREIRA; GOES, 2016, p. 24).

Entre os avanços, os ranços também se fazem presentes quando pensamos sobre os atores principais que compõem o cenário da catação: os próprios catadores. A fim de saber quem são, onde estavam localizados e como se inserem na produção do lixo reciclável, um primeiro estudo foi feito pelo MNCR, em 2006, coordenado pelo professor João Damásio de Oliveira Filho, e com o apoio do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), Organização de Auxílio Fraterno (OAF) e Pangea – Centro de Estudos Socioambientais. Esta pesquisa encontrou 115 cooperativas de catadores de materiais recicláveis no Brasil e, aproximadamente, 25 mil cooperados, os graus de desenvolvimento dessas cooperativas e as fragilidades encontradas estimularam a formação dos primeiros programas do governo federal destinados aos catadores.

…pode-se imaginar uma cooperativa com poucos cooperados, mas com equipamento e instalações adequadas, que apresente um melhor desempenho do que uma cooperativa com muitos membros, porém desassistida de equipamentos e instalações minimamente funcionais É, por outro lado, evidente que o ideal seriam cooperativas de algum porte, com considerável nível de cooperados e capacidade de produção e estocagem elevadas, de forma a se beneficiarem das economias de escala e de poder de barganha frente aos intermediários que populam o mercado oligopsônico da comercialização de materiais recicláveis (OLIVEIRA Filho, 2006, p. 23).

Segundo o professor João Damásio, existem categorias diferentes de cooperativas em funcionamento. Dentre elas, as situações de condições de trabalho, infraestrutura, equipamento e produção podem variar muito, já que existem, para ele, diversas maneiras de se procurar medir a eficiência de um processo produtivo ou de uma organização: “uma das mais comuns é a utilização da relação (produto)/(trabalho) – tanto em termos físicos, como em termos de valoração (R$) – a fim de permitir que sejam avaliados eventuais diferenciais na produção per capita, ou seja, por trabalhador cooperado” (OLIVEIRA Filho, 2006, p. 23).

A eficiência física é medida em km/mês por cooperado. Já a eficiência econômica ou retorno bruto médio é calculado pelo valor comercializado da produção física per capita por cooperado em R$/mês. O autor nos aponta que, embora correlacionados, os dois critérios não são coincidentes, já que as condições da comercialização dos materiais recicláveis podem variar muito de acordo com a região, a cidade e o pode de barganha em que a produção é negociada. Além disso, há de se pensar, também, na eficiência de mercado, que representa a capacidade da cooperativa em colocar seus produtos recicláveis de forma vantajosa no mercado e representa a razão entre os índices de eficiência econômica e eficiência física. “Pouco adianta um volume per capita de coleta elevado, se não existe escala para fazer frente ao intermediário, ou se os canais de comercialização estão obstruídos por questões estruturais como logística e transporte” (OLIVEIRA Filho, 2006, p. 47). Sendo assim, as cooperativas de catadores de materiais recicláveis são muito distintas não pelo seu porte, número de cooperados ou localização, mas sim pela eficiência com que produzem.

As condições para esta produção são as mais adversas. Poucas cooperativas de materiais recicláveis possuem uma infraestrutura que seja adequada e que coopere para o seu pleno funcionamento e eficiência. Muitas operam a céu aberto ou sem espaço territorial próprio, independente do grupo e eficiência a que estejam alocadas.

Uma cooperativa que não disponha de espaço construído adequado para a triagem, processamento, enfardamento, estocagem – além de espaço vital social e fisiológico – perde em eficiência. Portanto, qualquer ganho em eficiência deve partir do princípio que a área construída per capita é um indicador fundamental e que os investimentos em infraestrutura edificada são incontornáveis como condição prévia ao bom funcionamento da atividade (OLIVEIRA Filho, 2006, p. 65).

Porém, isto não basta, o “investimento em equipamento diretamente ligado à atividade é essencial para o incremento de produtividade e aumento da eficiência geral” (DAMÁSIO, 2006, p. 68). Aqui, estamos nos referindo a carrinhos de plataforma, elevadores de carga, big-bags, caçambas estacionárias (caixas de armazenamento), containers metálicos, empilhadeiras, prensas hidráulicas compactadoras, esteiras de triagem, balanças industriais, caminhões roll on com julieta e latões. Outro fator deve ter uma atenção especial: os equipamentos de proteção individual do trabalhador (EPI), que deverá contar com luvas, uniformes, calçados, máscaras, avental, protetor auricular, óculos e capacetes. A falta de proteção do trabalhador representa fonte de doenças e a possibilidade de acidentes de trabalho: “… a erradicação de doenças epidêmicas e a contenção de doenças endêmicas” (OLIVEIRA Filho, 2006, p. 70). Segundo o autor, independente do grau de eficiência da cooperativa, todas ainda deixam a desejar nesse quesito. Além disso, tais condições representam exigências do Serviço de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT).

Existem diversos facilitadores do trabalho quando pensamos nos cotidianos dos catadores de materiais recicláveis e um deles está representado pela vantagem trazida pela presença de caminhões, veículos utilitários e caminhonetes nas cooperativas de alta e média eficiência. Na ausência destes recursos, existe a presença de carroças puxadas por cavalos. Já os carrinhos puxados por catadores são presença constante em todos os tipos de cooperativas, mesmo nas de alta performance. “Pouco adianta investir em instalações físicas e edificações se os catadores não têm carrinhos e caminhões para efetuar a coleta” (OLIVEIRA Filho, 2006, p. 76).

Sendo assim, existe a necessidade de investimento para que se tenha qualidade dos resultados: “a adição de novos investimentos em construção civil e em aquisição de novos equipamentos têm o impacto potencial imediato de não apenas gerar novos postos de trabalho, mas gerá-los com qualidade e eficiência” (OLIVEIRA Filho, 2006, p. 76). É preciso, então, pensar nestes investimentos, pois eles têm forte relação com a produção física e monetária, impactando diretamente no faturamento bruto das cooperativas de materiais recicláveis.

Para o professor João Damásio existem três tipos de cooperativas que têm níveis de produção, comercialização e, portanto, eficiências diferentes: as que apresentam alta eficiência, as que apresentam eficiência média e as que apresentam baixa eficiência. Para ele, tal classificação de desempenho está associado qualitativamente as seguintes situações:

Situação 1:

Grupo formalmente organizado em associação ou cooperativa com prensa, balança, carrinhos e galpão próprios, com capacidade de ampliar sua estrutura física e de equipamentos a fim de absorver novos catadores e criar condições para implantar unidades industriais de reciclagem. Nesta situação as cooperativas já estão prontas para a verticalização da produção de materiais recicláveis. As cooperativas nesta situação devem ser vistas como importantes vetores de inclusão social.

Situação 2:

Grupo formalmente organizado em associação ou cooperativa, contando com alguns equipamentos, porém precisando de apoio financeiro para a aquisição de outros equipamentos e/ou galpões. As cooperativas deste grupo estão numa fase intermediária – com falta de alguns equipamentos para poder expandir a produção – necessitando de reforço de infraestrutura para ampliar a coleta e assim formalmente incluir novos catadores de materiais recicláveis.

Situação 3:

Grupo em organização, contando com poucos equipamentos – alguns de sua propriedade – precisando de apoio financeiro para a aquisição de quase todos os equipamentos necessários, além de galpões próprios. O estabelecimento formal de sua cooperativa significará a inclusão de novos postos de trabalho para catadores de materiais recicláveis.

Situação 4:

Grupo desorganizado – em rua ou lixão – sem possuir quaisquer equipamentos, e frequentemente trabalhando em condições de extrema precariedade para atravessadores e deposeiros. É necessário apoio financeiro para a montagem completa da infraestrutura de edificações e de equipamentos. O estabelecimento formal de sua cooperativa significará a inclusão de novos postos de trabalho para catadores de materiais recicláveis (OLIVEIRA Filho, 2006, p. 79).

Dessa maneira, os dados fornecidos pelo MNCR viabilizaram a segmentação tipológica do universo de cooperados em quatro situações, mas que não são suficientes para atestar a eficiência de produção de uma cooperativa, embora a eficiência tenha haver sim com o nível estrutural de organização e as condições de materiais e localizações das cooperativas. “Porém ocorre que existem cooperativas grandes, com menor nível de organização e menor eficiência; assim como existem cooperativas pequenas, com razoável nível de organização (porém bem equipadas) e com alto nível de eficiência” (OLIVEIRA Filho, 2006, p. 80).

A implantação de uma cooperativa de alta eficiência com coleta, triagem, processamento, estocagem e comercialização requer um conjunto de fatores e condições mínimas de trabalho não só para uma boa produção, mas para a eficiência em sua atividade. Entretanto, “… de nada adianta proporcionar a criação de novos postos de trabalho, se esses trabalhadores forem inseridos em uma posição subalterna e subordinada…” (OLIVEIRA Filho, 2006, p. 89). Afinal, há de se pensar nos principais produtores dos materiais recicláveis tanto no chão das cooperativas quanto nas ruas:

… nesta categoria, os cooperados estão trabalhando nas mais extremas condições possíveis, atuando diretamente nos lixões a céu aberto e nas ruas. Muitas vezes são obrigados a disputar com outros catadores os materiais recicláveis ali descartados, sem condições mínimas de higiene e convivem com animais transmissores de doenças (OLIVEIRA Filho, 2006, p. 99).

Não se trata, apenas, de regulamentar uma força de trabalho, mas sim de pensarmos a inclusão social de toda uma categoria que precisa ter condições mínimas de trabalho não só para a eficiência e produtividade, mas também para a sua segurança. Isso significa, também, garantir postos de trabalho e renda para uma parcela da população que não é absorvida pelo setor formal de trabalho, ainda que represente um imenso impacto econômico e ambiental para a sociedade: “realizar o pagamento de serviços ambientais urbanos aos catadores era um ato de justiça, uma vez que boa parte do que é recuperado atualmente se deve ao trabalho desse público”. (PEREIRA; GOES, 2016, p. 26).

BREVE REFLEXÃO SOBRE O COOPERATIVISMO.

A fim de pensarmos as cooperativas para a eficiência econômica e eficácia social, precisamos, antes, compreender que a cooperação sempre esteve presente da história da humanidade, em que os homens se uniam para alcança determinados objetivos, como o de conseguir alimentos, por exemplo. Segundo o Dicionário Michaelis[16], cooperar significa ato ou efeito de cooperar; prestação de auxílio para um fim comum; colaboração, solidariedade. Porém, desde a evolução dos homens, este sentimento de cooperação deu lugar ao desejo de acumular poder, explorar o trabalho alheio, dentre outros.

Segundo Waldirio Bulgarelli, ainda sofrendo com a crise provocada pela Revolução Industrial, em 28 de outubro de 1844, surgiu o primeiro modelo cooperativista, no mesmo modelo cooperativista como conhecemos na atualidade. Movidos pelo desejo de cooperação e superação da crise em que se encontravam, 28 tecelões de Rochdale construíram a primeira cooperativa organizada formalmente. Dentre os principais objetivos, estavam o de “suprir necessidades deixadas pelo desemprego, possuir neutralidade política e religiosa, controlar a diretoria eleita pelos membros, efetuar negócios em dinheiro, restituir os dividendos de acordo com o capital rendido” (BULGARELLI, Waldirio, 1965, p. 26). Os 28 tecelões representaram um marco do cooperativismo e, a partir desse desejo de igualdade e justiça, outras cooperativas nasceram e ganharam força pelo mundo.

Dentre as intenções e aspirações estava o desejo de um sistema de trabalho democrático, em que houvesse uma sociedade mais justa e igualitária em seus direitos e deveres, em que os associados são, também, seus dirigentes eleitos. Devem manter a neutralidade política e visam, acima de tudo, comprometimento e humanidade em suas práticas produtivas: visam o capital como mero instrumento e não como fator determinante, não perseguem lucros e acima de tudo visam o desenvolvimento e aperfeiçoamento do ser humano” (BULGARELLI, Waldirio, 2000, p. 12).

Para Paul Singer, o trabalho deve ser pensado a partir da economia solidária, que se alicerça num pensamento igualitário tanto de direitos quanto de produção e posse dos meios de produção:

Nós costumamos definir economia solidária como um modo de produção que se caracteriza pela igualdade. Pela igualdade de direitos, os meios de produção são de posse coletiva dos que trabalham com eles – essa é a característica central. E a autogestão, ou seja, os empreendimentos de economia solidária são geridos pelos próprios trabalhadores coletivamente de forma inteiramente democrática, quer dizer, cada sócio, cada membro do empreendimento tem direito a um voto. Se são pequenas cooperativas, não há nenhuma distinção importante de funções, todo o mundo faz o que precisa. Agora, quando são maiores, aí há necessidade que haja um presidente, um tesoureiro, enfim, algumas funções especializadas, e isso é importante sobretudo quando elas são bem grandes, porque aí uma grande parte das decisões tem que ser tomada pelas pessoas responsáveis pelos diferentes setores. Eles têm que estritamente cumprir aquilo que são as diretrizes do coletivo, e, se não o fizerem a contento, o coletivo os substitui. É o inverso da relação que prevalece em empreendimentos heterogestionários, em que os que desempenham funções responsáveis têm autoridade sobre os outros.

Segundo os princípios aprovados no Congresso de Manchester, em 1995, pela Aliança Cooperativa Internacional (ACI), representam um norte para as cooperativas, capazes de trazer para a práticas todas as suas intenções e aspirações:

1) Princípio – Adesão livre e voluntária: baseada na concepção da ACI “as cooperativas são organizações voluntárias, abertas a todas as pessoas aptas a utilizar os seus serviços e assumir as responsabilidades como membros, sem discriminação de sexo ou gênero, social, racial, política e religiosa” (MEINEN; PORT, 2012, p. 32).

Ou seja, neste princípio estão associados valores de igualdade e liberdade. Igualdade porque qualquer cidadão pode fazer parte como associado, desde que esteja disposto a trabalhar e dividir as responsabilidades inerentes ao cooperativismo. Não deve haver distinção de nenhuma espécie, seja ela por sexo, raça, política ou credo. A participação é livre e voluntária, assim como a sua saída deve ser livre. Ou seja, o associado deve ser olhado com igualdade e tratado com liberdade para permanecer ou sair dela quando lhe for conveniente.

2) Princípio – Gestão democrática e livre: as cooperativas são organizações democráticas, controladas pelos seus membros, que participam ativamente na formulação das suas políticas e na tomada de decisões. A Diretoria eleita agirá por delegação e com responsabilidade para com os associados. Os membros têm igual direito de voto (um membro, um voto); nas cooperativas de grau superior pode ser instituída a proporcionalidade de votos, desde que se mantenha a forma democrática da organização.

Segundo Bulgarelli, 2000. p. 12, o direito ao voto é igual para todos, podendo votar e ser votado ou participando da gestão da cooperativa. Esta prática envolve direitos e deveres dos associados, que expressam suas decisões através dos votos nas assembleias.

3) Princípio – Participação econômica dos cooperados – Os membros contribuem equitativamente para o capital das suas cooperativas e controlam-no democraticamente. Parte desse capital é, normalmente, propriedade comum da cooperativa. Os membros podem receber, habitualmente, havendo condições econômico-financeiras para tanto, uma remuneração sobre o capital integralizado, como condição de sua adesão. Os membros destinam os excedentes a uma ou mais das seguintes finalidades: desenvolvimento da cooperativa, possibilitando a formação de reservas, em parte indivisíveis; retorno aos sócios na proporção de suas transações com as cooperativas e apoio a outras atividades que forem aprovadas pelos associados (MEINEN; PORT, 2012, p. 34-35, OCB, 2004, p. 23-24).

Este princípio trata do modo como a cooperativa funciona economicamente, em que seus associados devem contribuir de modo justo para o capital social das cooperativas. Assim, a cooperativa mantém o seu funcionamento, em que o associado contribui visando o patrimônio da cooperativa, na mesma proporção em que recebe dela seus benefícios “de um lado integralizando quotas-partes (no ingresso e durante sua permanência na cooperativa), e, de outro, decidindo pela transformação em reservas de parte dos excedentes de cada exercício financeiro-contábil” (MEINEN; PORT, 2012, p. 35). Neste princípio estão contidos os valores de solidariedade e responsabilidade.

4) Princípio – Autonomia e independência – As cooperativas são organizações autônomas, de ajuda mútua, controladas pelos cooperados. Em caso de firmarem acordos com outras organizações – incluindo instituições públicas – ou recorrerem a capital externo, devem fazê-lo em condições que assegurem o controle democrático pelos cooperados e mantenham a autonomia da sociedade (OCB, 2004, p. 23). A Constituição Brasileira promulgada em 1988, em seu Art. 5º, Inc. XVIII reforça este princípio básico do cooperativismo ao disciplinar: “a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, vedada a interferência estatal em seu funcionamento”.

Segundo Meinem e Port, este princípio contém referências de outros princípios, já que trata da questão da democracia e independência dos seus associados, podendo realizar negociações, também com instituições públicas, sem qualquer interferência de entidades ou órgãos externos que possam comprometer essa autonomia dos associados. Sendo assim, o funcionamento das cooperativas baseia-se nos valores da democracia, na transparência e na honestidade.

5) Princípio – Educação, formação e informação – As cooperativas promovem a educação e a formação dos seus membros, dos representantes eleitos e dos trabalhadores, de forma que estes possam contribuir, eficazmente, para o desenvolvimento das suas cooperativas. Informam o público em geral, particularmente os jovens e os líderes de opinião, sobre a natureza e as vantagens da cooperação (OCB, 2004, p. 24).

Este discute as intenções que as cooperativas devem ter em contribuir para a construção do conhecimento e a formação dos seus associados, uma vez que a educação fortalece tanto para o desenvolvimento das cooperativas quanto para a sua existência. Para isso, deve-se pensar em propostas pedagógicas específicas para seus associados e que privilegiem a educação como ferramenta principal para o desenvolvimento das cooperativas. Esse princípio trata dos valores da transparência e da responsabilidade.

6) Princípio – Intercooperação – Para as cooperativas prestarem melhores serviços a seus cooperados e agregarem força ao movimento cooperativo, devem trabalhar em conjunto com as estruturas locais, regionais, nacionais e internacionais.

Este princípio demonstra o interesse de que as cooperativas estabeleçam relações para além dos seus associados, sejam eles locais, regionais, municipais, estaduais, nacionais ou internacionais, saindo do micro para o macro social. Através do valor de cooperação, ou seja, do trabalho em conjunto, buscam alcançar um patamar de eficiência que privilegie seus associados, alicerçados na eficácia e na solidez. “As cooperativas servem de forma mais eficaz aos seus membros e dão mais força ao movimento cooperativo, trabalhando em conjunto, através das estruturas locais, regionais, nacionais e internacionais” (MEINEN; PORT, 2012, p. 40). Ou seja, numa sociedade capitalista e cada vez mais competitiva, é questão de sobrevivência para as cooperativas estabelecerem relações econômicas externas. O valor tratado neste princípio é o de solidariedade, pois almeja o trabalho em conjunto não apenas entre seus associados, mas também de forma macro social.

7) Princípio – Interesse pela comunidade – As cooperativas trabalham para o desenvolvimento sustentado das suas comunidades através de políticas aprovadas pelos cooperados. Este sétimo princípio foi especialmente instituído pelo Congresso da Aliança Cooperativa Internacional em setembro de 1995 OCB (2004, p. 24).

Este princípio busca reforçar o princípio da gestão democrática, uma vez que os associados, por meio do voto, decidem onde e de que maneira serão aplicados os recursos financeiros das cooperativas, ou seja, as políticas de desenvolvimento. Deve haver, portanto, o interesse dos associados pelo entorno da cooperativa, o que trata do valor da responsabilidade social.

Vale ressaltar que estes princípios norteiam as cooperativas pelo mundo inteiro, independente do seu regime econômico e político no que tange o ideal solidário para a solução de impasses que atingem as pessoas que integram o mesmo espaço. Os princípios do cooperativismo são alicerces que norteiam e, ao mesmo tempo, criam normas de convívio que visam o desempenho da cooperativa. Já no Brasil, poucos autores se lançam no campo do cooperativismo, tornando a sua conceituação, como nos aponta. Waldirio Bulgarelli:

As dificuldades iniciais dessa conceituação decorrem, em grande parte, de terem sido as definições formuladas por economistas e com o sentido de realçar a supressão do intermediário e o aspecto não lucrativo da atividade cooperativa, elementos que por si só não eram capazes de conferir originalidade à cooperativa, deixando margem de confusão com outras sociedades. […] Por outro lado, essas dificuldades eram agravadas pelo fato de as cooperativas, atuando nos mais variados setores da atividade humana, se dividirem e subdividirem em inúmeros tipos e categorias (BULGARELLI, Waldirio, 1967. p. 30).

Já a maneira de operar das cooperativas está sujeita a legislação em vigor de cada país. O regime jurídico do Brasil é sancionado pela Lei 5764[17], de 16 de dezembro de 1971, que constitui origem jurídica com a finalidade de prestação de serviços aos seus associados. Para Paul Singer, as cooperativas devem funcionar de maneira solidária, visando a igualdade e a democracia:

A empresa solidária se administra democraticamente, ou seja, pratica a autogestão. Quando ela é pequena, todas as decisões são tomadas em assembleias, que podem ocorrer em curtos intervalos, quando há necessidade. Quando ela é grande, assembleias-gerais são mais raras porque é muito difícil organizar uma discussão significativa com um grande número de pessoas. Então os sócios elegem delegados por seção ou departamento, que se reúnem para deliberar em nome de todos. Decisões de rotina são de responsabilidade de encarregados e gerentes, escolhidos pelos sócios ou por uma diretoria eleita pelos sócios ( SINGER, Paul, 2002, p. 18).

Mesmo com a dificuldade de conceituar o cooperativismo no Brasil, seus objetivos são claros, pois, acima de tudo, está o desejo de ofertar vantagens econômicas aos seus associados, o poder de barganha que as cooperativas alcançam e a eliminação de intermediários. De acordo com a Lei 5764 de 1971, Art. 4°, as características expressas das cooperativas são:

a) adesão voluntária, com número ilimitado de associados, salvo impossibilidade técnica de prestação de serviços; b) variabilidade do capital social representado por quotas-partes; c) limitação do número de quotas-partes do capital para cada associado, facultado, porém, o estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se assim for mais adequado para o cumprimento dos objetivos sociais; d) inacessibilidade das quotas-partes do capital a terceiros, estranhos à sociedade; e) singularidade de voto, podendo as cooperativas centrais, federações e confederações de cooperativas, com exceção das que exerçam atividade de crédito, optar pelo critério da proporcionalidade; f) quorum para o funcionamento e deliberação da Assembléia Geral baseado no número de associados e não no capital; g) retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações realizadas pelo associado, salvo deliberação em contrário da Assembléia Geral; h) indivisibilidade dos fundos de Reserva e de Assistência Técnica Educacional e Social; i) neutralidade política e indiscriminação religiosa, racial e social; j) prestação de assistência aos associados, e, quando previsto nos estatutos, aos empregados da cooperativa; k) área de admissão de associados limitada às possibilidades de reunião, controle, operações e prestação de serviços (BRASIL, 1971).

A Lei 5.764/71, define a Política Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades cooperativas e dá outras providências. Percebe-se que as características principais da legislação brasileira remetem as normas fixadas pelos pioneiros de Rochdale.

As sociedades cooperativas são classificadas como:

a) Cooperativas singulares, ou de 1° grau: destinadas a prestar serviços diretamente aos associados;

b) Cooperativas centrais e federações de cooperativas, ou de 2°grau: constituídas por cooperativas singulares e que objetivam organizar, em comum e em maior escala, os serviços econômicos e assistenciais de interesse das filiadas, integrando e orientando suas atividades, bem como facilitando a utilização recíproca dos serviços;

c) Confederação de cooperativas, ou de 3° grau: constituídas por centrais e federações de cooperativas e que têm por objetivo orientar e coordenar as atividades das filiadas, nos casos em que o vulto dos empreendimentos transcenderem o âmbito de capacidade ou conveniência de atuação das centrais ou federações.

Apesar de serem vistas como sociedades simples, as cooperativas possuem uma forma própria, segundo o art. 4° da Lei 5764/71. A Lei 5764/71, em seu art. 3°, também expressa que “celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro”. Dessa maneira, a Lei deixa claro que a cooperativa se trata de uma sociedade e não de uma associação, pois menciona “contrato de sociedade cooperativa” com o objetivo é o “exercício de atividade econômica”. É o que nos contribui Paul Singer:

A economia solidária é outro modo de produção, cujos princípios básicos são a propriedade coletiva ou associada do capital e o direito à liberdade individual. A aplicação desses princípios une todos os que produzem uma única classe de trabalhadores que são possuidores de capital por igual em cada cooperativa ou sociedade econômica. O resultado natural é a solidariedade e a igualdade, cuja reprodução, no entanto, exige mecanismos estatais de redistribuição solidária de renda (SINGER, Paul, 2002, p. 10).

Além disso, por se tratar de sociedades não-empresárias, não estão sujeitas a falência, como determina o Art. 4°da Lei 5764/71 e art. 94 da Lei de Falências[18]. Em outras palavras, as cooperativas são sociedades que exercem atividades econômicas sem serem empresariais, mas não visam lucro, porém estão registradas nas juntas comerciais. Ou seja, possuem um modo de operar próprio e um direito que lhes é peculiar, como nos contribui Waldirio Bulgarelli:

Baseados na idéia de que o cooperativismo, como um sistema econômico característico, com filosofia e técnica própria, criou seu próprio direito, passaram os autores cooperativistas a não se conformarem com o enquadramento das cooperativas ao Direito Civil ou ao Direito Comercial, ou a ambos, apontando as falhas desse falso enquadramento e as conseqüências danosas, na ordem prática que ele implica. Da mesma forma como outros ramos do Direito vêm aspirando a dignidade de ciência autônoma, tais como o direito social, o Direito Agrário, o Direito Tributário, – o Direito Cooperativo quer encontrar e ver reconhecida a sua verdadeira posição no quadro da ciência do direito. As alegações fundamentais que levaram aos autores a pretender a autonomia do Direito Cooperativo podem ser assim resumidas: – não se enquadra no sistema do Direito Civil nem no sistema do Direito Comercial; possui princípios, extensão e métodos próprios; – já ter sido reconhecido por quase todos os direitos positivos, (com leis distintas do Direito Civil e do Direito Comercial); pela necessidade de ser dotado de regime jurídico apto a propiciar-lhe o desenvolvimento de acordo com as suas verdadeiras características (BULGARELLI, 2000. p. 105).

O cooperativismo no Brasil é mencionado, também, na Constituição Federal de 1988, de forma a incentivar as atividades econômicas, na ordem que segue:

Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [. . .]

XVIII – a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento (BRASIL, 1998).

Fica evidente o incentivo a sua livre organização, criação e funcionamento sem a interferência de órgãos governamentais, podendo estes atuarem apenas como agentes normativos e reguladores, como nos mostra o texto da Constituição Federal de 1988:

Art. 174 – Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. [. . .]

§ 2° – A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo;

§ 3° – O Estado favorecerá a organização da atividade garimpeira em cooperativas, levando em conta a proteção do meio ambiente e a promoção econômico-social dos garimpeiros;

§ 4° As cooperativas a que se refere o parágrafo anterior terão prioridade na autorização ou concessão para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpais. [. . .]

Art. 187 – A política agrícola será planejada e executada, na forma da lei, com a participação efetiva do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais, bem como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transporte, levando em conta, especialmente: [. . .] VI – o cooperativismo. [. . .]

Art. 192 – O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir os interesses da coletividade, será regulado em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre: [. . .]

VIII – o funcionamento das cooperativas e os requisitos para que possam ter condições de operacionalidade e estruturação próprias das instituições financeiras (BRASIL, 1988).

A Constituição Federal de 1988 reforça e introduz valores tratados na Lei 5764/71, já que possui uma visão democrática, pluralista e solidária, em seus Arts 1º, 3º e 170, IV da Lei Suprema. A República Federativa do Brasil, com a noção democrática, pluralista e solidária (arts 1º, 3º e 170, IV da Lei Suprema), baseia-se em fundamentos como cidadania, dignidade da pessoa humana, valor social do trabalho, livre iniciativa e pluralismo político, bem assim objetivos como liberdade, justiça social, solidariedade, desenvolvimento, redução de desigualdades, promoção do bem comum ou coletivo e não discriminação. Tais postulados compõe exatamente o rol de valores e princípios do cooperativismo, assim secularmente consagrados.

No Brasil o cooperativismo tem forte representação em diversos setores, instituídos pela Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), com os ramos do cooperativismo:

Agropecuário O Ramo Agropecuário reúne cooperativas de produtores rurais, agropastoris e de pesca. O papel da cooperativa é receber, comercializar, armazenar e industrializar a produção dos cooperados. Além, é claro, de oferecer assistência técnica, educacional e social. Hoje, segundo o IBGE, 48% de tudo que é produzido no campo brasileiro passa, de alguma forma, por uma cooperativa.
Consumo Focado na compra em comum de artigos de consumo para seus cooperados. Podem ser fechadas ou abertas. As primeiras admitem como cooperados somente pessoas ligadas a uma mesma cooperativa, sindicato ou profissão. As segundas estão abertas a qualquer pessoa que queira se associar.
Crédito O negócio, aqui, é promover a poupança e oferecer soluções financeiras adequadas às necessidades de cada cooperado. Sempre a preço justo e em condições vantajosas para os associados. Afinal, o foco do cooperativismo de crédito são as pessoas, não o lucro.
Educacional Prover educação de qualidade para a formação de cidadãos mais éticos e cooperativos e garantir um modelo de trabalho empreendedor para professores. Esses são alguns dos objetivos das cooperativas educacionais, que reúnem professores, alunos, pais de alunos e pessoas apaixonadas por educação.
Especial A igualdade é um dos pilares do cooperativismo. Para nós, qualquer tipo de discriminação é inaceitável. Justamente por isso, contamos com um ramo específico para oferecer a pessoas com necessidades especiais, ou que precisam ser tuteladas, uma oportunidade de trabalho e renda.
Infraestrutura São cooperativas que fornecem serviços essenciais para seus associados, como energia e telefonia por exemplo. Seja repassando a energia de concessionárias ou gerando a sua própria, esses empreendimentos garantem o acesso dos cooperados a condições fundamentais para seu desenvolvimento.
Habitacional Construir e administrar conjuntos habitacionais para os cooperados, essa é a missão das cooperativas habitacionais. Em um país onde a carência por moradia é grande, poder contar com grupos de pessoas que se reúnem para esse fim é ter um grande aliado no desenvolvimento social e econômico dos cooperados e das comunidades.
Produção Cooperativas dedicadas à produção de um ou mais tipos de bens e produtos. As cooperativas detêm os meios de produção e os cooperados contribuem com trabalho conjunto. O ramo congrega desde cooperativas de artesãos, até cooperativas metalúrgicas.
Mineral Pesquisar, extrair, lavrar, industrializar, comercializar, importar e exportar produtos minerais. As cooperativas deste ramo são responsáveis por todos os processos da atividade mineradora, além de se comprometerem a cuidar da saúde e educação de seus associados.
Trabalho Reúne profissionais de uma mesma categoria em torno de uma cooperativa para melhorar a remuneração e as condições de trabalho do grupo de associados, ampliando sua força no mercado. É um ramo bastante abrangente já que as cooperativas podem atuar em todos os segmentos de atividades econômicas.
Saúde O Brasil é referência no ramo. Além de sermos pioneiros no setor, somos o país com maior número de cooperativas dedicadas à preservação e à promoção da saúde humana. Reúne cooperativas que podem ser formadas por médicos, dentistas, outros profissionais da saúde e até pelos próprios usuários. O segmento surgiu no Brasil e se expandiu para outros países.
Turismo e Lazer Qualidade de vida também está relacionado a turismo e lazer. Este ramo reúne as cooperativas que prestam serviços de entretenimento para seus associados. De viagens a eventos artísticos e esportivos, esses empreendimentos oferecem opções mais baratas e educativas, além de contribuírem para que as comunidades explorem todo o seu potencial turístico.
Transporte Cooperativas que atuam na prestação de serviços de transporte de cargas e passageiros. Essas cooperativas têm gestões específicas para cada uma de suas modalidades: transporte individual (táxi e moto táxi), transporte coletivo (vans, micro-ônibus e ônibus), transporte de cargas ou moto frete e transporte escolar.

Fonte: Adaptado de OCB (2004, p. 91-101), Brasil (2008).

A partir da compreensão dos ramos que dividem o cooperativismo há de se pensar, também, em outra normatização, que é específica, denominada como Estatuto Social, que é um instrumento de contrato. Este estatuto reúne preceitos capazes de estruturar de forma administrativa uma cooperativa e nortear a maneira como ela funciona. De acordo com artigo 21 da Lei do Cooperativismo nº 5.764/71, o Estatuto Social deve recomendar:

I – a denominação, sede, prazo de duração, área de ação, objeto da sociedade, fixação do exercício social e da data do levantamento do balanço geral;

II – os direitos e deveres dos associados, natureza de suas responsabilidades e as condições de admissão, demissão, eliminação e exclusão e as normas para sua representação nas assembléias gerais;

III – o capital mínimo, o valor da quota-parte, o mínimo de quotas-partes a ser subscrito pelo associado, o modo de integralização das quotaspartes, bem como as condições de sua retirada nos casos de demissão, eliminação ou de exclusão do associado;

IV – a forma de devolução das sobras registradas aos associados, ou do rateio das perdas apuradas por insuficiência de contribuição para cobertura das despesas da sociedade;

V – o modo de administração e fiscalização, estabelecendo os respectivos órgãos, com definição de suas atribuições, poderes e funcionamento, a representação ativa e passiva da sociedade em juízo ou fora dele, o prazo do mandato, bem como o processo de substituição dos administradores e conselheiros fiscais;

VI – as formalidades de convocação das assembléias gerais e a maioria requerida para a 112 sua instalação e validade de suas deliberações, vedado o direito de voto aos que nelas tiverem interesse particular sem privá-los da participação nos debates;

VII – os casos de dissolução voluntária da sociedade; VIII – o modo e o processo de alienação ou oneração de bens imóveis da sociedade;

IX – o modo de reformar o estatuto;

X – o número mínimo de associados.

Porém, para que se tenha este patamar de organização das cooperativas, o trabalho dos catadores é fundamental. São eles que são os responsáveis por recolher, selecionar os materiais considerados desejáveis e descartar os indesejáveis, fazem a triagem, em que separam os diversos tipos de materiais e termina quando conseguem obter novas mercadorias, que são matérias primas capazes de gerar outros produtos para o mercado. Em meio a este processo há de se considerar, também, o armazenamento, a comercialização, o transporte e o beneficiamento. Pensando nisso, procura-se pensar todo este processo de produção como rede de valor, que considera todas as etapas de produção e distribuição que agregam valor aos produtos e serviços até chegar ao consumidor final.

CONCLUSÃO

A rede da reciclagem vem galgando seu espaço, de forma que ganha destaque nos últimos anos, especialmente por sua divulgação e por seu impacto socioambiental. O Brasil precisa avançar tanto nas discussões teóricas do destino do que é “descartado” quanto das suas práticas. Não se trata, apenas, do que fazemos hoje e do rumo que podemos tomar amanhã com o lixo acumulado nas cidades. Se trata, também, de uma discussão política e social acerca de toda uma classe de trabalhadores, que são os maiores responsáveis pelo trabalho que vem sendo realizado de forma subalterna, invisível e não reconhecida.

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MNCR – MOVIMENTO NACIONAL DE CATADORES (AS) DE MATERIAL RECICLÁVEL. Carta de Caxias do Sul, 2003. Disponível em: www.mncr.org.br>. Acesso em: 02 jan. 2018.

______. Relatório do Encontro dos 700, 2006. Disponível em: www.mncr.org.br>. Acesso em: 02 jan. 2018.

______. Carta de Bogotá, 2008. Disponível em: www.mncr.org.br>. Acesso em: 02 jan. 2018.

PEREIRA, Bruna Cristina Jaquetto. GOES, Fernanda Lira (Org). Catadores de materiais recicláveis: um encontro nacional. Rio de Janeiro : Ipea, 2016.

OLIVEIRA FILHO, J. D. (Coord.). Análise do custo de geração de postos de trabalho na economia urbana para o segmento de catadores de materiais recicláveis: relatório técnico final. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, 2006.

SINGER, Paul. Introdução à economia solidária. São Paulo: Perseu Abramo, 2002.

ANEXO

Palavras iniciais, um panorama rede da reciclagem.

O presente artigo faz parte da pesquisa “Desigualdades sociais, econômicas e espaciais na rede da reciclagem no Estado do Rio de Janeiro os desafios dos catadores de materiais recicláveis e de sua rede de comercialização” em andamento no curso de Mestrado em Geografia – Programa de Mestrado em Geografia, da Faculdade de Formação de Professores da UERJ, na linha de pesquisa – Geografia e Relações de Poder.

2. Acesso em 22 de janeiro de 2018: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7405.htm

3. Acesso em 09 de janeiro de 2018: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-010/2010/lei/l12305.htm

4. Acesso em 09 de janeiro de 2018: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938.htm

5. Acessado em 22 de janeiro de 2018: http://www.sinir.gov.br/web/guest/acordo-setorial-para-implementacao-de-sistema-de-logistica-reversa-de-embalagens-em-geral

6. A CBO é o documento que reconhece, nomeia e codifica os títulos e descreve as características das ocupações do mercado de trabalho brasileiro. Sua atualização e modernização se devem às profundas mudanças ocorridas no cenário cultural, econômico e social do País nos últimos anos, implicando alterações estruturais no mercado de trabalho.

7. Acesso em 09 de janeiro de 2018: http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/home.jsf

8. Acesso em 22 de janeiro de 2018: http://www.mncr.org.br/biblioteca/legislacao/classificacao-brasileira-de-ocupacoes-cbo

9. Acesso em 09 de janeiro de 2018: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5598.htm

10. Acesso em 09 de janeiro de 2018: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/d5940.htm

11. Acesso em 10 de janeiro de 2018: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11445.htm

12. Acessado em 10 de janeiro de 2018: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7405.htm

13. Acessado em 22 de janeiro de 2018: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7405.htm

14. Passaremos a tratar, a partir daqui, por MNCR.

15. Acessado em: 9 de janeiro de 2018: http://www.mncr.org.br/mncr/sobre-o-mncr/o-que-e-o-movimento

16. Acessado em 16 de janeiro de 2018: http://michaelis.uol.com.br/busca?id=a3ke

17. Acessado em 17 de janeiro de 2018: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5764.htm

18. Lei n.°11.101 de 09 de fevereiro de 2005, que rege a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária.

[1]Mestrando em Geografia, Licenciado em Geografia, Discente de Mestrado.

Enviado: Outubro, 2018.

Aprovado: Fevereiro, 2019.

 

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Uilmer Rodrigues Xavier da Cruz

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