APOLINÁRIO, Michael Ramos [1], CAMPOS, Marcus Vinícius de Almeida [2], MIGUEL, Henrique [3]
APOLINÁRIO, Michael Ramos, CAMPOS, Marcus Vinícius de Almeida, MIGUEL, Henrique. Nível de flexibilidade de escolares praticantes e não praticantes de capoeira. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 03, Ed. 08, Vol. 13, pp. 24-31, Agosto de 2018. ISSN:2448-0959
Resumo
A capoeira se popularizou na década de 70, no Brasil sendo que sua prática melhora as valências físicas do individuo, principalmente os níveis de flexibilidades. O presente trabalho tem por objetivo comparar o nível de flexibilidade entre escolares praticantes de capoeira e não praticantes de capoeira. Foram selecionados 40 alunos do sexo masculino em idade escolar de 12 a 13 anos, separados em dois grupos assim determinados: grupo controle e grupo capoeira. Como teste de flexibilidade foi utilizado o banco de Wells como orientação e sendo comparado aos valores proposto pelo Projeto Esporte Brasil-PROESP (2007). A análise dos dados foi realizada através da estatística (média e desvio de padrão) pelo teste “t” Student, com nível de significância p≤0,05. Os resultados encontrados permitem concluir que a relação entre a média do nível de flexibilidade dos escolares praticantes de capoeira e não praticantes não se encontraram abaixo da média nacional indicada pela PROESP (2007)., concluindo uma melhor flexibilidade para os escolares praticante de capoeira.
Palavras-chave: Capoeira, Luta, Escolares, Prática Esportiva, Flexibilidade
Introdução
A capoeira, que se originou como um ritual africano que marcava a passagem para a vida adulta, chamado de N’golo; onde o movimento de luta das zebras era imitado pelos jovens para fazer corte as mulheres, chegou ao Brasil por intermédio dos escravos (PRIORE, 2016).
No Brasil, os escravos descobriram que estes movimentos quando utilizados com rapidez, destreza e malicia poderiam ser efetivos no enfrentamento da violência ao qual eram submetidos, então, sempre que possível os escravos ensaiavam estes movimentos nas capoeiras dos canaviais em que eram obrigados a trabalhar, daí surge o nome da modalidade (PRIORE, 2016).
Utilizada nos confrontos corporais com os capitães do mato, a capoeira era extremamente eficaz, e assim como toda pratica advinda da cultura africana, era proibido, o que fez com que os escravos introduzissem a ginga e a musica, a fim de mascarar o caráter de luta; sendo o primeiro estilo de capoeira, a Capoeira Angola, sendo o nome em virtude dos escravos criadores da mesma terem vindo de Angola (OLIVEIRA, 1989).
Já na década de 30 do século passado, Manoel dos Reis Machado, o mestre Bimba, criou a Capoeira Regional, onde novos elementos foram incorporados, deixando o jogo da capoeira com um maior caráter de arte marcial, sendo ainda criada por Bimba uma sequencia de ensino da capoeira (BARBOSA, 2005).
Na década de 60, a capoeira se popularizou, sendo ela, em 1972, declarada esporte pelo Conselho Nacional de Desportos, sendo que sua prática pode levar a melhora de diversas valências físicas (FRIGERIO, 1989).
Teixeira, Osborne e Souza (2012), relatam que a pratica da capoeira está relacionada à atribuição de resistência, coordenação, velocidade, equilíbrio, força muscular e flexibilidade.
A flexibilidade, dessa forma, é definida como a capacidade que as estruturas físicas podem facilmente se adaptar a diferentes situações, principalmente no uso de membros superiores e inferiores. Para os escolares, a flexibilidade contribuirá em alguns fatores tais como fortalecimento individual do praticante em suas características corporais, como a correção de postura, alongamento, equilíbrio psicológico e expansão da massa muscular, citado por Reis (2011).
Sendo assim, o objetivo do presente estudo consiste em comparar os níveis de flexibilidade entre escolares do ensino fundamental 2, praticantes e não escolares praticantes de capoeira
Metodologia
Amostra
Foram avaliados 40 alunos, todos do sexo masculino, com idade entre 12 e 13 anos, matriculados em uma escola pública da rede estadual, localizada na cidade de São José do Rio Pardo/SP. Destes, 20 eram praticantes de capoeira e 20 tinham como prática de atividade física planejada, apenas as aulas de educação física escolar.
Delineamento Experimental
Inicialmente, identificaram-se na instituição de ensino quais os alunos de faixa etária 12 a 13 anos de idade praticavam somente capoeira, e há pelo menos 6 meses; além das aulas de educação física escolar, sendo os mesmos convidados a participar da pesquisa. Em seguida, foi escolhido aleatoriamente o mesmo número de estudante, porém que não praticasse nenhum treinamento, e estivessem matriculados nas aulas de educação física escolar.
Os indivíduos participantes, então, receberam um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que foi assinado pelos responsáveis por aquelas crianças, e, após a entrega dos termos devidamente assinados, foram subdivididos em 2 grupos com igual número de integrantes:
Grupo Capoeira – Alunos de 12 a 13 anos que realizavam aulas de capoeira há pelo menos 6 meses.
Grupo Controle – Alunos de 12 a 13 anos que realizavam apenas aula de educação física escolar como atividade física planejada.
Os alunos pertencentes aos dois grupos foram submetidos ao teste de flexibilidade, conforme descrito abaixo.
Teste De Flexibilidade
O nível de flexibilidade dos alunos envolvidos nesta pesquisa foi determinado por meio do teste “sentar e alcançar”, com o uso do banco de Wells.
Para a realização, eles foram orientados a ficar descalços, e, ao iniciar o teste, sentaram-se de frente para a base do banco, com as pernas estendidas e unidas, e com a planta dos pés totalmente em contato com o banco.
Após se posicionar corretamente, o aluno colocava uma mão sobre a outra, e elevava o braço para que o mesmo ficasse estendido e na posição vertical. Em seguida, inclinava o corpo para frente e alcançava com as pontas dos dedos a maior distancia possível sobre a régua graduada, sem flexionar os joelhos e sem utilizar movimentos de balanço (insistências).
Cada aluno realizou três tentativas, com um intervalo de 15 segundos; sendo os resultados anotados pelo avaliador, que se encontrava ao lado dos avaliado (os), a fim de certificar que os procedimentos fossem realizados adequadamente.
Considerou-se para efeito de classificação do nível de flexibilidade do aluno o melhor resultado obtido entre as três tentativas, sendo este comparado aos valores propostos pelo Projeto Esporte Brasil – PROESP (2007).
Tratamento Estatístico
Os resultados obtidos foram tabulados e descritos por analise estatística descritiva; utilizado o teste “t Student” para comparar os diferentes grupos, no qual se adotou o intervalo de significância de p≤0,05.
Resultados
Os alunos pertencentes ao Grupo Capoeira apresentaram um índice de flexibilidade médio de 40,5±6,1 cm, sendo a flexibilidade de todos os indivíduos, de acordo com os parâmetros do PROESP (2007), classificada em excelente ou muito bom. Já os indivíduos do grupo apresentaram um índice de flexibilidade médio de 31,3±4,5 cm; no qual eles apresentaram classificações variáveis de razoável a muito bom, conforme pode ser observado no quadro 1.
Quadro 1 – Flexibilidade de Praticantes de Capoeira e não praticantes
ALUNOS | GRUPO CONTROLE | GRUPO CAPOEIRA | |||
Flexibilidade (cm) | Classificação | Flexibilidade (cm) | Classificação | ||
ALUNO1 | 40 | Muito Bom | 43 | Excelente | |
ALUNO2 | 29 | Bom | 35 | Muito Bom | |
ALUNO3 | 39 | Muito Bom | 32 | Muito Bom | |
ALUNO4 | 26 | Razoável | 31 | Muito Bom | |
ALUNO5 | 36 | Muito Bom | 37 | Muito Bom | |
ALUNO6 | 29 | Bom | 36 | Muito Bom | |
ALUNO7 | 30 | Bom | 42 | Excelente | |
ALUNO8 | 41 | Muito Bom | 34 | Muito Bom | |
ALUNO9 | 26 | Razoável | 43 | Excelente | |
ALUNO10 | 26 | Razoável | 51 | Excelente | |
ALUNO11 | 29 | Bom | 42 | Excelente | |
ALUNO12 | 36 | Muito Bom | 48 | Excelente | |
ALUNO13 | 35 | Muito Bom | 49 | Excelente | |
ALUNO14 | 28 | Bom | 39 | Muito Bom | |
ALUNO15 | 29 | Bom | 45 | Excelente | |
ALUNO16 | 30 | Bom | 36 | Muito Bom | |
ALUNO17 | 29 | Bom | 42 | Excelente | |
ALUNO18 | 33 | Muito Bom | 50 | Excelente | |
ALUNO19 | 29 | Bom | 42 | Excelente | |
ALUNO20 | 35 | Muito Bom | 36 | Muito Bom | |
MÉDIA | 31,3±4,5 | Muito Bom | 40,5±6,1 | Muito Bom |
Como pode ser observado acima, em nenhum dos grupos havia alunos com níveis de flexibilidade abaixo do mínimo esperado pela idade, que é de 23 cm, e o valor médio de ambos é classificado como muito bom (entre 31 cm e 42 cm), sendo a flexibilidade do “grupo controle” mais próxima ao limite inferior e a do “grupo capoeira” mais próxima ao limite superior desta classificação.
Quando estes dados foram submetidos ao tratamento estatístico, observou-se que não existe diferença significativa entre os grupos, ou seja, o grupo que realiza aulas de capoeira não possui uma diferença de flexibilidade significativa quando comparado ao grupo controle.
Discussão
Os valores obtidos neste estudo diferem do observado por Camelo et al (2013), que ao avaliarem a flexibilidade de capoeiristas e não capoeiristas adultos, observaram uma flexibilidade significativamente superior nas capoeiras, quando comparados aos não capoeiristas.
Reis (2011), ao avaliarem a flexibilidade de 20 escolares de 7 a 14 anos, praticantes e não praticantes de capoeira, observaram uma flexibilidade muito superior dos praticantes ao serem comparados com não praticantes no teste do banco de Whells.
Entretanto, a literatura também apresenta trabalhos, que ao realizarem o mesmo protocolo de teste de flexibilidade realizado nesta pesquisa, encontraram resultados semelhantes ao nosso; onde aqui vale destacar os resultados de Manzine Filho et. al. (2013), que ao submeterem escolares a 14 semanas de aulas de capoeira, não observaram diferença estatística ao final das 14 semanas, indicando que a modalidade não foi capaz de modificar significativamente os níveis de flexibilidade dos escolares.
Farias et al (2010), também não verificou diferenças na flexibilidade de escolares de 10 a 15 anos, praticantes e não praticantes de atividades extracurriculares diversas; assim como Lima et al (2016) ao avaliarem escolares de 11 e 12 anos de idade, praticantes e não praticantes de voleibol.
MINATTO et. al. (2010) relatam que a flexibilidade é influenciada por diversos fatores como medidas antropométricas, fatores genéticos, idade, formato da articulação e elasticidade da pele e muscular. Assim, como referido por Dantas (1999), que destaca a forte influencia da individualidade biológica na flexibilidade, que tende a diminuir a partir dos 30 anos de idade e que de acordo com Barbanti (1997) passa a se diferenciar entre meninos e meninas a partir dos 7 anos de idade, em virtude de fatores hormonais, onde os meninos acabam por ter a flexibilidade diminuída frente as meninas.
Segundo Nunez (2018), a flexibilidade é imprescindível e facilita o aprendizado da Capoeira, para que o atleta consiga se adaptar de forma rápida às condições imediatas de direção, promovendo maior eficácia e precisão dos movimentos, levando, assim, ao menor consumo de energia durante todo o jogo; entretanto.
Entretanto, Godik e Popov (1999) salientam que a flexibilidade é uma capacidade bastante complexa, cujo auge é alcançado na infância e depois a mesma tende a declinar, sendo o seu desenvolvimento obtido com treinamento específico e com período adequado. Del Vecchio et. al. (2014) ao avaliarem atletas de ginastica rítmica, assim como Silva et. al. (2016), ressaltam também a necessidade de exercícios específicos para aumentos expressivos da flexibilidade.
Considerações finais
De acordo com o presente trabalho, é possível concluir que tanto os escolares praticantes, como os escolares não praticantes de capoeira encontram-se com bons índices de flexibilidade, com o grupo praticante apresentando flexibilidade ligeiramente superior. Entretanto, este índice ligeiramente superior não pode ser diretamente atribuído a pratica de capoeira, visto que múltiplos fatores estão envolvidos nos níveis de flexibilidade na idade estudada.
Cabe aqui ressaltar, que apesar de ganho exponencial de flexibilidade ser obtidos apenas a partir de treinos específicos, onde a literatura deixa claro que assim como a capoeira, treinamentos não específicos de flexibilidade em outras modalidades também não geram efeitos substanciais a flexibilidade na adolescência; a manutenção dos níveis ou a atenuação da perda pode ser obtida com a prática da capoeira, visto que existe uma tendência dos indivíduos praticantes possuírem uma flexibilidade mais elevada na vida adulta; entretanto, para confirmação desta hipótese se faz necessário acompanhar tais fatores longitudinalmente.
Sugere-se ainda a realização de novos estudos, para acompanhamento longitudinal da flexibilidade de capoeirista, bem como aferição de treinamentos específicos de flexibilidade.
Referencias Bibliográficas
Barbanti, V. J. Teoria e Prática do Treinamento Esportivo. 2º ed. São Paulo: Edgard Blucher, 1997.
BARBOSA, M. J. S. Capoeira: A gramática do corpo e a dança das palavras. Luso-Brazilian Review. University of Wisconsin System. 2005. p. 78-98.
CAMELO, P. R. P. et al. Associação entre a prática da Caporeira e a Flexibilidade. Universidade Federal do Ceará: UFC, Fortaleza, 2013.
DANTAS, E. H. M. Flexibilidade: alongamento e flexionamento. Rio de Janeiro: Shape, 1999.
DEL VECCHIO, F.B.; PRIMEIRA, M.; SILVA, H.C.; DALL’AGNOL, C.; GALLIANO, L.M. Nível de aptidão física de atletas de ginástica rítmica: Comparações entre categorias etárias. Revista Brasileira de Ciência e Movimento. V. 22(3), p. 5-13. 2014.
FARIAS, E.S. Efeito da atividade física programada sobre a aptidão física em escolares adolescentes. Revista Brasileira Cineantropom. 2010;12(2): 98-105.
FRIGERIO, A. Capoeira: de arte negra a esporte branco. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 4, n. 10, 1989.
GODIK, M. A.; POPOV, A. V. La Preparación del Futbolista. 2. ed. Barcelona: Paidotribo, 1999.
LIMA, K. M. et al. Comparação do nível de flexibilidade em adolescente praticantes e não praticantes de voleibol de uma escola pública. Revista Brasileira de Prescrição e Fisiologia do Exercício. São Paulo, v.10. n.60. p.519-523. Jul./Ago. 2016.
MANZINE, F. et al. O efeito do treinamento da capoeira na agilidade e flexibilidade em adolescentes do sexo masculino. Revista Brasileira de Prescrição e Fisiologia do Exercício. São Paulo, v.7, n. 42, p.459-466, Nov/Dez. 2013. ISSN 1981-9900.
MINATTO G. et al. Idade, maturação sexual, variáveis antropométricas e composição corporal: influências na flexibilidade. Revista Brasileira Cineantropometria Desempenho Humano. Santa Catarina. v.12 n.3: p.151-158, dez/2010.
NUNEZ, A. M. G. Algunas consideraciones acerca del entrenamiento de la flexibilidad en el taekwondo. E6FDeportes.com, Revista Digital – Buenos Aires – Ano 10 – N° 87 – Agosto de 2005. Disponível em: Acesso em 20 maio de 2018
OLIVEIRA, José L. A capoeira angola na Bahia. Salvador: EGBA; Fundação das Artes, Bahia, 1989.
OSBORNE, R. SOUZA, E. G. S. TEIXEIRA, F. F. A Prática Do Ensino Da Capoeira Nas Escolas: Perfil E Visão Do Capoeirista. Corpus et Scientia, Rio de Janeiro, v. 8, n. 2, p. 1-15, out. 2012.
PRIORE, M. D. Histórias da Gente Brasileira: Colônia (vol. 1). Editora Leya, 2016.
REIS, H. L. S. Estudo comparativo do nível de flexibilidade entre escolares Praticantes e não praticantes de capoeira. Brasília: UCB, 2011.
SILVA, J.M.; OLIVEIRA, D.V.; LEME, D.E.C.; NASCIMENTO JUNIOR, J.R.A.; ANVERSA, A.L.B. Influência do treinamento de flexibilidade e força muscular em atletas de ginástica rítmica. Revista Saúde e Pesquisa, v. 9, n. 2, p. 325-331, maio/ago. 2016.
Projeto Esporte Brasil (PROESP). Teste de Flexibilidade. Disponível em: <http//www.proesp.ufrgs.br/bat-teste-agilidade.php> Acesso em 27 de fevereiro de 2018.
[1] Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São José do Rio Pardo -FEUC
[2] Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São José do Rio Pardo -FEUC
[3] Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São José do Rio Pardo -FEUC-Centro Universitário de Espírito Santo do Pinhal- UNIPINHAL-Universidade José do rosário Vellano – UNIFENAS