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Candomblé: manutenção religiosa da ancestralidade angolana no brasil

RC: 20382
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CONTEÚDO

MUSSAQUE, Antónia João [1]

MUSSAQUE, Antónia João. Candomblé: manutenção religiosa da ancestralidade angolana no brasil. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 03, Ed. 09, Vol. 06, pp. 48-56 setembro de 2018. ISSN:2448-0959

RESUMO

Este artigo tem por objetivo descrever o candomblé, uma prática religiosa cujos elementos de cultos são originários de vários pontos do Continente africano e de Angola com particular destaque, práticas diversas que chegaram fazendo parte da bagagem imaterial de escravos e escravas trazidas ao Brasil durante os tenebrosos séculos de tráfico e trafego da população nativa africana. Este artigo pretende também destacar a relevância da institucionalização religiosa do candomblé no Brasil, uma forma de manutenção, preservação, e continuidade religiosa da ancestralidade africana de forma geral e angolana com particular destaque. Esta será uma pesquisa bibliográfica com descrição antropológica e histórica dos fatos recolhidos.

Palavras-chave: Brasil, candomblé, ancestralidade africana, Angola, religião, candomblé, africanos, angola.

CULTOS AFROS

A colonização portuguesa imposta aos territórios africanos trouxe para o Brasil uma grande população de homens e mulheres negras oriundos de várias partes de África para servirem aos senhores das terras brasileiras e suas respectivas fazendas e engenhos. Essa grande população de povos africanos trouxe consigo sua própria cultura, seus hábitos, costumes e suas expressões religiosas, uma forma de culto e invocação transcendental caraterísticas dos povos africanos.

Quando negros e negras escravas chegaram a seus assentamentos aqui no Brasil, estabeleceram para si as formas de adoração africana como forma de resgate histórico dos valores ancestrais e familiares deixados para traz durante a difícil travessia do atlântico. a aculturação, tinham suas próprias formas de adoração e invocação, uma religião que segundo o catolicismo romano, a religião oficial da colônia, foi classificada de idolatria, fetichismo e outros termos de classificação pejorativa.

A junção de práticas religiosas provenientes de vários reinos e tribos africanas bem como a manipulação dos elementos que constituem o culto as entidades transcendentais africanas, constituem o culto afro brasileiro do qual o candomblé é parte significante. A continuidade e rupturas da prática por nações (agrupamentos segundo as nações africanas de origem das entidades) estão na base do surgimento do candomblé e suas divisões, a umbanda, a quimbanda e o espiritismo, todas misturadas ao sincretismo como o uso de velas, rezas, terços etc., práticas do catolicismo.

Desse modo, fica definido como sendo cultos afro os conjuntos de práticas religiosas caraterizadas por invocação e adoração a entidades de origem africana.

2. ORIGENS DO CANDOMBLÉ

Tecnicamente falando, o que foi trazido para o Brasil juntamente com os escravos africanos trazidos de vários países do Continente negro, não oi precisamente o candomblé como o conhecemos atualmente. A prática de invocação tradicional e ancestral africana usada na adoração e manipulação de elementos transcendentais, seria difícil classifica-la ou nomeá-la por candomblé, visto que os africanos escravos trazidos para o Brasil no decorrer dos séculos de trafego e escravidão, eram provenientes de pontos diferentes de África, falavam diferentes línguas, tinham hábitos, costumes, culturas e religiões diferenciadas. De ressaltar que, até mesmo em países cujos povos são originários do mesmo tronco ancestral, como é o caso de Angola, cada grupo etnolinguistico tem um nome próprio para os deuses invocados e consequentemente uma religião e religiosidade diferente.

Assim, podemos dizer que, os africanos que foram trazidos para o Brasil para serem escravos, trouxeram consigo também seus dialetos, costumes, tradições e práticas religiosas africanas e, na junção de etnias e grupos linguísticos sob o mesmo senhorio, na convivência da mesma senzala, foi forjada uma forma peculiar e distinta de invocação e adoração que uma vez consolidada e legitimada convencionou-se chamar-se candomblé, a invocação de entidades africanas enquanto prática religiosa brasileira.

Desta forma, o candomblé como a conhecemos hoje, é uma manifestação religiosa de origem puramente brasileira, gestada e nascida no Brasil. Em vários países africanos existe e sempre existiu a invocação aos ancestrais, uma prática presente em todos os cerimoniais como de nascimento, festas de puberdade masculina e feminina, casamentos, funerais, semeaduras, colheitas, caças e em outras vertentes do fazer comunitário onde vivos e mortos fazem parte da mesma vivência. Porém, nota-se nestes países a ausência de uma religião denominada candomblé.

Várias são as razões da inexistência em África e em Angola de uma prática religiosa tradicional institucionalizada como é o candomblé no Brasil. As mais apontadas são: a imposição e a universalização do cristianismo tida como a única regra religiosa plausível, a única que salva e liberta; a imposição da cultura religiosa europeia sobre os sistemas religiosos africanos; a desclassificação das culturas religiosas africanas práticas pejorativamente chamadas de fetichistas e satânicas pelos ocidentais colonizadores dos territórios africanos e por fim a adoção espontânea ou imposta da cultura e educação dos colonizadores dos territórios pelos Estados africanos mesmo após a independência politica e econômica destes.

Aqui reside a importância da relevância da institucionalização do candomblé como uma religião e não apenas como prática cultural no Brasil. O candomblé é assim uma forma de manutenção e preservação da cultura religiosa dos ancestrais africanos, o viés pelo qual hábitos , costumes e educação tradicional africana são preservados e ensinados a gerações de afro descendentes e daqueles que se identificam com as formas de ser e de estar daqueles que antes de serem escravos eram pessoas livres e soberanas em seus próprios territórios, vivendo segundo as mais diversas formas de organização social, econômica e religiosa, conforme seus grupos etnolinguistico.

Como expressão religiosa de grande destaque no Brasil, o candomblé é a expressão da resistência contra a imposição da assimilação dos pressupostos religiosos estabelecidos pelos colonizadores, é uma forma de conquista de espaço no campo religioso dominado pelo catolicismo romano, a religião oficial da colônia, que de forma pejorativa classificou as práticas africanas de idolatria, fetichismo, alienação e outros termos que atualmente ainda são usados por pessoas poucos esclarecidas que expressam e destilam ódio quando se referem ao candomblé.

2.1 CRENÇAS E LUGARES DE CULTO

O candomblé é caraterizado como a prática religiosa que nas suas invocações e cerimonias usa instrumentos percussivos, o som de batuques nas cerimonias de cura, magia, adivinhação, adoração, invocação e oferenda aos orixás, Exu e Oxalá, entidades africanas que tem poder e podem ser bons ou maus na medida em que no candomblé, o bem e o mal não existem isolados. Cada um exerce sua função na interação com os seres humanos. O candomblé é uma religião sincrética que mistura religiosidade africana com práticas do catolicismo.

As entidades invocadas no candomblé são genericamente chamadas de Orixás, os deuses supremos. Estes possuem personalidade e habilidades que se distinguem segundo suas manifestações ou preferencias de rituais. Possuem também caraterísticas humanas como a vaidade, podem ser maternais ou briguentas, temperamentais ou ciumentas. Os orixás, apesar de serem deuses supremos, são diferentes do Deus dos cristãos, pai de Jesus.

Inicialmente, o candomblé como religião era frequentada somente pela população negra das senzalas, quilombos e terreiros, morada dos escravos. Com a abolição da escravatura, a proclamação da república em 1889 e o crescimento dos centros urbanos, foi criado um ambiente propicio para que vários negros se reunissem e organizassem experiências religiosas mais estáveis e regulares com a participação de indivíduos de todos os extratos sociais.

2.2 TIPOS DE CANDOMBLÉ

O candomblé não é uma religião uniforme. Suas práticas não seguem o mesmo ritmo ou a mesma liturgia em todos os terreiros. A apresentação de cada cerimonia depende da nação a que pertencem seus líderes (guias espirituais). As principais diferenças entre os vários tipos de candomblé é a origem étnica africana das entidades invocadas. No Brasil existem quatro principais tipos ou nações de candomblé:

1:O Queto- praticado majoritariamente na Bahia, da nação Nagô com o uso da língua ioruba (falada no Sudão, Nigéria e Benin)

2: O candomblé de Angola- localizado na Bahia e São Paulo. São a nação que representa os povos bantu de Angola, Moçambique e Congo, entidades representadas por caboclos, às entidades da mata.

3:O batuque- do Rio Grande do Sul e o

4:O Xangô de Pernambuco.

As etnias africanas mais destacadas no candomblé são: Os ioruba-grupos étnicos oriundos da Nigéria e Sudão, falantes da língua ioruba; os Ewe- também conhecido por Jeje, um grupo proveniente do Gana, Benin e Togo. Estes falam a língua ewe e os Fon- composta de população oriunda do sul de Benin, Togo e reino Daomé. São falantes da língua fon.

2.3 HIERARQUIA/SACERDÓCIO E OS PARTICIPANTES AO CULTO

Para organização e melhor execução, no candomblé existem os sacerdotes, os instrumentistas e outras funções geralmente associadas a organização social. Os sacerdotes, os lideres das cerimonias são chamados de babalorixá (masculino) e iyalorixá (feminino).

Todos podem participar do culto que envolve louvores aos orixás. Estes quando satisfeitos, incorporam nos fiéis para fortalecer o axé (a energia vital), que serve de proteção tanto dos fiéis como do lugar de culto. Porém, da condução da cerimonia, só participam os iniciados, aqueles que passaram pela observância ritualística que envolve sacrifícios de animais e vegetais, o uso de vestimentas especiais e obediência às rígidas regras e preceitos. Os cultos são sempre baseados na comunicação do homem com a natureza através das entidades, sendo por isso uma religião panteísta (em tudo há um único Deus) e também politeísta (vários deuses representando diversos elementos da natureza).

2.4 ESTATÍSTICAS

Segundo dados do Centro de estudos Afro-Orientais da UFBA, na cidade de salvador, Bahia, existem aproximadamente 2.300 terreiros registrados na Federação Baiana de Cultos Afro-Brasileiros. Dados mais recentes do IBGE dizem que mais de 3 milhões de brasileiros (1,5%da população total) declararam o candomblé como sua religião, tendo o Estado do Rio Grande do Sul (Porto Alegre) o maior número de terreiros de todo o Brasil (1.342 casas).

O candomblé não é praticado somente no Brasil. Existem outros países como a Espanha, Portugal, Itália, Alemanha, México, panamá, Argentina e outros países que adotaram o candomblé como pratica religiosa.

O candomblé, uma prática religiosa que sofreu forte repressão europeia, estigmatizada pelo cristianismo, passou da oralidade para a escrita através de seus primeiros escritores que com grande esmero, disponibilizam na modernidade informações digitalizadas que apresentam não só uma prática ancestral, mas também uma visão moderna que busca adaptar a religião a vida social de seus fiéis e adeptos.

Hoje, o candomblé é a religião afro brasileira mais influente no brasil, a observar pela estatística dos censos e das multidões que comparece as praias no final de ano para homenagear a Iemanjá (a orixá dos mares), pela popularização dos alimentos servidos em suas cerimonias, os trajes, a caraterística e conhecida saudação do candomblé-Axé e outros elementos simbólicos que foram incluídos na cultura brasileira.

2.5 CANDOMBLÉ EM ANGOLA

Infelizmente em Angola, um contexto africano de onde partiram muitos escravos e escravas que uma vez no Brasil foram determinantes para o estabelecimento e legitimação do candomblé como prática religiosa, não há muitas evidências da existência do cerimonial do candomblé, mesmo havendo similaridades nas praticas tradicionais. O que realmente em a existe e sempre existiu em Angola é o culto á entidades tradicionais, aos antepassados, a invocação aos espíritos das florestas como é o caso dos caçadores que são orientados por estas entidades, aos espíritos do mar, como é o caso do culto a “kianda” deusa do mar, orientadora dos marinheiros e navegantes, as entidades detentoras de poderes curativos, as casas de cura, a invocação a entidades responsáveis pela chuva, pela fertilidade tanto de humanos quanto de animais e de prosperidade no cultivo da terra e na criação de animais, e outras práticas praticas similares as realizadas no candomblé.

De ressaltar, porém que, estas práticas realizadas em Angola, não foram institucionalizadas a semelhança do candomblé do Brasil e das igrejas cristãs. São, porém, cerimoniais executados em festividades, quando se busca cura, proteção e outras ocasiões, por pessoas que professam a religião cristã praticando deste modo o sincretismo que também se verifica no candomblé e nas outras práticas religiosas.

Em Angola assim como em outras partes de África, exercer a religião tradicional africana é ainda conotado com feitiçaria e ocultismo. Esta condição é resultante dos longos séculos de colonização e suas consequências e com a disseminação do cristianismo este que classificou a prática religiosa tradicional africana de idolatria e pratica satânica.

Por estas e outras razoes, em Angola e noutros países africanos, as religiões africanas não resistiram à invasão do cristianismo e da cultura ocidental. Apesar de ser praticada a revelia e em oculto, como forma de resistência e oposição aos colonizadores, à repressão confinou a prática a esfera doméstica e familiar. Uma pequena minoria teve que adotar o sincretismo para de forma camuflada exercer os pressupostos da religião tradicional africana, como é o caso das igrejas angolanas hoje conhecidas como igrejas cristãs africanas.

CONCLUSÃO

Deste relato, podemos facilmente auferir que, a prática religiosa tradicional e de invocação aos ancestrais e antepassados, a confiança nas entidades com poderes transcendentais é uma prática presente em África e em Angola com especial destaque, ainda que, com o decorrer dos séculos não chegou a se institucionalizar a semelhança do que aconteceu no Brasil.

Em linhas gerais, a institucionalização do candomblé no Brasil, resultou numa mais valia para a preservação e continuidade da prática religiosa ancestral africana, o que significa a valorização dos esforços empreendidos por homens e mulheres trazidos para o Brasil presos por aguilhões cujas correntes não foram capazes de prender seus espíritos que vagavam livremente pelas florestas, rios e mares de suas terras de origem, ao ponto de trazer do lado de cá do oceano as práticas religiosas que, realizadas lá em liberdade ou aqui na condição de escravos, os identifica e os qualifica como um povo livre, soberano com direitos de escolher e praticar sua religiosidade assim como faziam seus ancestrais.

BIBLIOGRAFIA

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SOUSA, Rainer Gonçalves. “Os ritos do Candomblé”; Brasil Escola. Disponível em <http://brasilescola.uol.com.br/religiao/os-ritos-candomble.htm>. Acesso em 29 de julho de 2018.

https://pt.wikipedia.org/wiki/candomblé.

O censo demográfico brasileiro 2010 e os umbandistas (parte 02)

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BASTIDE, Roger: As Religiões Africanas no Brasil – São Paulo: Editora Pioneira, 1971.

KLOPPENBURG, Boaventura. Espiritismo: orientação para os católicos – São Paulo: Edições Loyola, 1991.

MARTINS, Giovani. Tenda Espírita Caboclo Cobra Verde. Joinville – Clube de Autores, 2007.

NEGRÃO, Lísias: Entre a Cruz e a Encruzilhada: Formação do Campo Umbandista em São Paulo – São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1996.

PEIXOTO, Francisco Allison. Introdução De Umbanda. Joinville – Clube de Autores, 2008.

DIAS, Renato Henrique Guimarães. Registros de Umbanda – Rio de Janeiro: Edição do Autor, 2013.

[1] Mestranda da Universidade Presbiteriana Mackenzie, curso Ciências da Religião, 2° Semestre sob orientação da Professora Doutora Suzana Ramos Coutinho.

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Antónia João Mussaque

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