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A inclusão das crianças com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade nas escolas municipais de uma cidade no norte do Rio Grande do Sul

RC: 79188
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/transtorno-de-deficit

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

ROCHA, Bruna Eduarda [1], FAVERO, Suelen [2], SOUZA, Wylana Cristina Alves De [3]

ROCHA, Bruna Eduarda. FAVERO, Suelen. SOUZA, Wylana Cristina Alves De. A inclusão das crianças com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade nas escolas municipais de uma cidade no norte do Rio Grande do Sul. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 06, Ed. 03, Vol. 09, pp. 05-27. Março de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/educacao/transtorno-de-deficit, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/transtorno-de-deficit

RESUMO

O presente artigo traz os resultados de uma investigação de caráter quantitativo que buscou identificar como está sendo feita a inclusão das crianças com TDAH na educação básica. Para fundamentar a pesquisa apresenta-se um estudo sobre o TDAH e as suas características e uma contextualização das leis que orientam as propostas educacionais para estudantes que apresentam o transtorno. Os dados foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas junto a um grupo de seis profissionais da educação que trabalham na rede municipal de educação de um município do interior do Rio Grande de Sul (RS). A análise dos dados se deu a partir dos pressupostos da Analise Textual do Discurso e indicou que nas escolas, em muitos momentos, não está havendo um acompanhamento especial para esses alunos. Os autores Barkley (2020), Ferreira (2005), Silva (2014) e Reis (2011) abordam o tema do TDAH, e trazem que escolas devem ofertar ao aluno com TDAH um atendimento especial, individualizado, proporcionando recursos e métodos diferenciados para que esses alunos com TDAH tenham acesso a uma educação de qualidade, que faça com que ele seja capaz de aprender.

Palavras-chave: Inclusão, Políticas Educacionais, TDAH.

1. INTRODUÇÃO

A educação especial é uma tendência mundial e o tema vem sendo amplamente discutido, dado ao avanço crescente de crianças portadoras do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) entre outros transtornos que necessitam de uma atenção especial.  A declaração de Salamanca abrange esse tema desde a sua criação em junho de 1994, através da Estrutura de Ação em Educação Especial, adotada pela conferência Mundial em Educação Especial organizada pelo governo da Espanha em cooperação com a UNESCO (1994), portanto, não é um tema recente.

Faz-se necessário então, pensarmos as ações educativas, bem como uma sociedade diante de uma  educação com os  seus pilares mais fortalecidos, onde prevaleça o  compromisso com princípios de justiça e de igualdade de oportunidades para todos, possibilitando de fato, o espaço para que todos possam  desenvolver suas  habilidades e tenham as mesmas oportunidades de aprendizagem, mas o que presenciamos não vem de encontro ao que “deveria ser”, principalmente quando nos deparamos com grupos de estudantes que carecem de atenção diferenciada.

Aqui, chamamos atenção para as crianças portadoras do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) que apresentam deficiência de um neurotransmissor da dopamina, apresentando disfunções de atenção e de memória que interferem no seu processo de ensino e aprendizagem e consequentemente necessitam de atenção especial, dentro e fora da sala de aula para que a aprendizagem seja efetivada.

De acordo com a Constituição Federal (1988) a educação é um direito de todos e o atendimento educacional especializado também vem amparado por lei, no entanto, no Brasil, tratando-se de estudantes com TDAH, ainda não existe legislação específica que os ampare. Todavia, no Rio Grande do Sul, a legislação estadual, através da lei ordinária nº 15.212 de 25 de julho de 2018, institui a campanha estadual de informação sobre o TDAH e a dislexia na Educação Básica, salientando em seu artigo 3º que, as escolas de educação básica devem prover meio para que, progressivamente, seja oferecido às crianças e adolescentes com dislexia o acesso aos recursos didáticos adequados ao desenvolvimento da sua aprendizagem.

A lei Ordinária nº 15.212 é uma lei estadual, mas com base nela faz-se necessário alavancar alguns apontamentos há âmbito municipal, pois, o município está diretamente ligado ao estado, e com isso pode-se e deve-se usufruir de leis estaduais que possam beneficiar esses alunos que apresentam o transtorno do TDAH. De outra forma, também se buscou um embasamento nesta lei, pois muitos dos professores da rede municipal também trabalham na rede estadual, onde desenvolvem os mesmos papéis, porém em escolas diferentes. Portanto, o uso desta lei no município influência em muitos aspectos educacionais na conduta que os professores podem tomar perante essa dificuldade do aluno portador de TDAH.

Neste contexto surge a seguinte indagação que se constitui a pergunta de pesquisa deste trabalho:  O processo de inclusão educacional na rede municipal de ensino de uma cidade localizada no norte do RS, atende as necessidades do aluno com TDAH?

Visando responder está indagação, o presente trabalho pretende identificar como a Inclusão do aluno com TDAH vem sendo implementada no espaço escolar da Educação Básica. De modo mais específico almeja-se compreender o TDAH; as legislações vigentes que abordam e amparam os estudantes portadores do transtorno, e ainda, perceber as concepções de professores da Educação Básica sobre o atendimento desses alunos.

O presente artigo está estruturado em quatro (4) seções, a primeira apresenta uma breve abordagem sobre o TDAH, pontuando as principais características e algumas dificuldades de aprendizagem acarretadas pelo transtorno. Na segunda seção, discute-se acerca dos elementos referentes ao atendimento especializado educacional com o intuito de buscar na legislação aspectos relacionados à inclusão educacional. Na terceira seção, encontra-se a metodologia de pesquisa adotada para esta investigação e serviu de base e apoio para as análises e discussões aqui apresentadas. Por fim, será exposto e discutido os resultados observados e obtidos durante a pesquisa aqui discutida.

2. ASPECTOS TEÓRICOS DA INVESTIGAÇÃO

2.1 BREVE CARACTERIZAÇÃO DO TDAH

Conforme a American Psychiatric Association (APA, 1994), o TDAH é um transtorno de origem mental, que apresenta características de padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade e impulsividade. O transtorno é reconhecido pela medicina sendo de ordem neurobiológica e de origem genética, afetando ambos os sexos, mas apresenta predominância no sexo masculino. Para Barkley (2020) aponta que se trata de um transtorno no desenvolvimento do autocontrole. Consiste em problemas óbvios no tempo em que a pessoa consegue sustentar a atenção e no controle dos impulsos e do nível de atividade.

Silva (2014) pontua ainda, que o TDAH se caracteriza por três sintomas básicos: desatenção, impulsividade e hiperatividade física e mental e costuma manifestar -se ainda na infância e, cerca de 70% dos casos, o transtorno continua na vida adulta, e ainda, podendo desenvolver-se de várias formas, onde em alguns casos predomina somente a hiperatividade e a impulsividade, em outros, os demais os sintomas que aparecem de maneira simultânea.  Dado a diversidade de sintomas, o TDAH representa um grande desafio para a educação e consequentemente para a efetivação da aprendizagem desses alunos, configurando um trabalho desafiador tanto para os pais, quanto para a escola, exigindo destes um comprometimento e envolvimento maior para que o aluno consiga alcançar os objetivos traçados e propostos para a fase em que se encontra. Podemos compreender isso quando Cavalcante (1998) afirma que a colaboração entre pais e escola melhora o ambiente escolar e transforma a experiência educacional dos alunos numa vivência mais significativa.

O diagnóstico do TDAH acontece por meio do processo clínico, por isso, sendo classificados no CID – 10 (OMS, 1993) e ainda, de acordo com o Sistema de diagnóstico e estatístico de classificação dos transtornos mentais (DSM IV) (1994), não existem características físicas específicas, que estejam associadas ao TDAH, embora muitos ainda persistem em considerar o TDAH como uma deficiência.  Barkley (2020) de fato, crianças com TDAH parecem saudáveis, mas pesquisas mostram que há uma imperfeição no cérebro que causa a movimentação constante, o escasso controle dos impulsos, a dispersão e outros comportamentos que as pessoas julgam muito intoleráveis na criança com TDAH. Nessa mesma direção Barkley (2020) salienta que o TDAH é de fato um transtorno do desenvolvimento e implica no comprometimento da capacidade de inibir o comportamento e de levar em conta as consequências das próprias ações.

Porém, quando esses comportamentos são muito anormais em crianças menores, e quando limitam a socialização e o aprendizado, eles devem ser revistos e estudados para saber quais são os fatores que trazem esse tipo de comportamento nas crianças com TDAH. Fatores que podem ser de natureza diversas, podendo ser, como afirmando ainda por Barkley (2020), ambientais, como dinâmica familiar, diagnóstico diferencial e comorbidade com condições como transtorno desafiador opositivo, transtorno de conduta e do humor (como depressão) devem ser considerados.

As manifestações dos sintomas preocupam os pais tão logo começam a serem percebidas, dado a este fato, a Academia Americana de Pediatria recomenda que, para a determinação mais segura do diagnóstico, os sintomas devem estar presentes já antes dos 7 anos de idade e de fato, uns números significativos de pais começam a preocupar-se com o déficit de atenção, hiperatividade e impulsividade já entre 3 e 4 anos. 

Quanto ao quadro neurológico, este está ligado às disfunções neuroquímicas (neurotransmissores) que ocorrem principalmente na Substância Reticular (no tronco cerebral) e gânglios da base. Assim, até 50% dos casos podem-se beneficiar com medicamentos estimulantes ou antidepressivos, e, por se tratar de um tratamento medicamentoso, necessita ser acompanhado e somado a mudanças de conduta da família, escola e de outras pessoas do ambiente da criança.  Sendo que, o apoio psicopedagógico e outras terapias (Psicoterapia, Fonoaudiologia) devem ser indicadas quando necessárias, e ainda, a maioria das crianças com este transtorno não necessitam ser encaminhadas à educação especial, só em casos grave, como destaca Almeida (2002).

Para Silva (2014) em primeiro lugar, para o tratamento medicamentoso, utilizam-se estimulantes, entre eles: ritalina, concerta, dexedrine, adderall e venvanse. Vários estudos têm estabelecido a segurança e a eficácia de tais substâncias para aliviar os sintomas.  A autora também nos traz que a medicação produz aumento da concentração, diminui a impulsividade e a hiperatividade, além de atuar na redução da ansiedade e na melhoria dos estados depressivos. Portanto, para o diagnóstico, deve-se considerar, seis ou mais sintomas de hiperatividade e impulsividade. O TDAH é um transtorno real, um problema real e, com frequência, um obstáculo real. Pode ser doloroso e se tornar um teste para os nervos dos pais se não for tratado adequadamente. (BARKLEY, 2020)

A busca por entender e compreender o TDAH é constante nas escolas e o interesse pelo tema ocorre por tratar-se de um problema comum na infância e que se tornou de ordem médico-social, necessitando de atenção especial, principalmente por ser difícil de ser identificado, e não apresentar um diagnóstico rápido. Sendo amplamente significativo uma visão mais ampliada por parte de pais e educadores para esse problema, a fim de sanar o quanto antes essas dificuldades. E, para que isso aconteça de maneira segura nas escolas, é essencial termos uma política educacional que apoie esses alunos dentro do contexto escolar

Dentre as inúmeras ações que podem ser adotadas, uma delas é a manutenção de profissionais de psicopedagogia e de psicologia no ambiente escolar que poderão atuar diretamente com as crianças realizando intervenções, e ainda o acompanhamento e orientações que se estenderão para a família e escola, a fim de que possam realizar ações em conjunto e assim, auxiliar corretamente a criança. O psicopedagogo é o profissional conhecedor do TDAH, e deve estar atento ao contexto social da criança, para orientar de forma adequada a família, a escola e outros profissionais em relação ao aluno, para que todos consigam resultados mais efetivos. (SILVA et al., 2016)

Dessa forma, é possível efetivar uma proposta consistente e que atenda os interesses das crianças, possibilitando o seu pleno desenvolvimento. A Declaração de Salamanca aborda a efetivação da educação especial, reforçando que “deveria ser adaptado às necessidades das crianças, e não vice-versa. Sendo assim, as escolas deveriam prover oportunidades curriculares que sejam apropriadas à criança com habilidades e interesses diferentes”, não é a criança que necessita adaptar-se, mas a escola e, por isso, é imprescindível lançar mão de todos os recursos possíveis para que isso ocorra. É oferecer à criança com TDAH a possibilidade de conviver com as demais e, é função da escola acolher todas as crianças, independentemente, das condições emocionais, sociais, intelectuais, físicas, linguísticas entre outras.

Pontua-se ainda a necessidade do envolvimento maior entre estudante e educador. Este precisa buscar novas estratégias para trabalhar com essa demanda, com o objetivo de melhorar a qualidade do processo ensino aprendizagem (SILVA, 2016), mas tendo o cuidado para não confundir o TDAH com outros comportamentos. E para que isso aconteça, torna-se necessário trabalhar com a formação desse profissional para que esteja preparado para atuar com essas crianças que, necessitam de acompanhamento, cuidado e atenção. Para o professor torna-se imprescindível ter um plano individualizado de acompanhamento da criança, ou seja, um planejamento adaptado à criança para que ela possa ser acolhida no espaço escolar e poder acompanhar o processo de aprender e apreender, e, para isso, é imprescindível atender a criança em sua individualidade com intervenções que, de fato, contribuam para o seu desenvolvimento, contemplando o aperfeiçoamento de habilidades cognitivo-emocionais para saber conviver com o TDAH.

Algumas estratégias adotadas por educadores facilitam o processo de ensinar e de aprender para as crianças com TDAH. Dentre elas podemos citar a manutenção de um ambiente estruturado, com rotinas estabelecidas, a segmentação de atividades longas e/ou árduas, instruir os alunos com técnicas de estudo e organização, fornecer instruções claras, concisas e curtas, e, sempre contando com o acompanhamento do professor (SÁNCHEZ-PÉREZ; GONZÁLEZ-SALINAS, 2013, p. 540).

As crianças com TDAH necessitam de ações que auxiliem a estimular funções executivas, garantindo atendimento educacional especializado, observando as necessidades individuais de cada criança. Ações como técnicas multissensoriais que utilizem várias modalidades sensoriais, como visuais, auditivas, táteis, e cinestésicas que contribuem para o desenvolvimento psicomotor, e ainda, implementar sistema de tutoriais para controlar o foco da atenção, permitindo que a criança perceba que é possível e que consegue realizá-las.

Por sua vez, a Agência Europeia para o Desenvolvimento da Educação Especial aponta o percurso educativo do aluno, propondo algumas ações que ampliem resultados quanto à educação especial. De acordo com esses princípios, a referida Agência, aborda que para elaborar políticas públicas educativas é necessário entender a aprendizagem como um processo que não se baseia somente em conteúdos, mas tenha como objetivo principal, para todos os alunos, o desenvolvimento das competências de aprender a aprender e não somente visando o conhecimento (DINAMARCA, 2009).

Assim, a educação não deve ser um fim em si mesma, mas um processo contínuo e individualizado a fim de contribuir para a formação da criança, principalmente quando há a presença de uma necessidade educativa diferenciada, como é o caso do portador de TDAH, oferecendo oportunidades educacionais equitativas, tendo em mente que o desenvolvimento de cada pessoa é diferente. À vista disso, um processo com intervenções multidisciplinares contribui para que a criança com TDAH interaja e construa seu próprio conhecimento e, esse trabalho não deve acontecer de maneira isolada e sim, envolvendo a escola, a família e os profissionais. As crianças com TDAH são diferentes, mas não significa que são incapazes, portanto, um trabalho individualizado que atenda suas necessidades pode contribuir para o seu pleno desenvolvimento.

2.2 A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA E O TDAH

A política de Educação Especial afirma a Educação Inclusiva dentro da escola regular, busca tornar a escola um espaço para todos, onde todas as crianças podem participar do processo de ensinar e de aprender requerendo ações específicas por meio de recursos e apoio especializado, mas não podemos negar que o grande desafio do processo histórico da inclusão educacional é passar do plano de princípios ou das declarações para a implementação de uma prática no plano de ação (COELHO, 2010).

Essa discussão iniciou na década de 1990, podendo ser considerada ainda muito recente e que requer da escola uma imediata adaptação visando o atendimento igualitário a todos, até então, a mesma regia-se pela seletividade e a exclusão. Até pouco tempo atrás buscava-se uma escola e pessoas homogêneas, o diferente era excluído ou deixado de lado.

A Constituição Federal de 1988, abriu um espaço significativo para a efetivação da educação inclusiva nas escolas e, no seu art. 208, inciso III, estabelece que o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia do Atendimento Educacional Especializado (AEE) aos indivíduos com Necessidades Educacionais Especiais (NEE), preferencialmente na rede regular de ensino (BRASIL, 1988). Desta forma, busca-se garantir o direito de todos de frequentarem escolas regulares e nelas e permanecerem para que o pleno desenvolvimento da criança aconteça, permitindo o respeito aos direitos fundamentais, bem como, o exercício da cidadania através do AEE.

A educação especial tem o objetivo de direcionar as ações para atender de maneira individualizada o aluno no processo educacional, sendo assim, é importante que no âmbito de uma atuação mais ampla na escola, aconteça a orientação a organização de redes de apoio, bem como a formação continuada, a identificação de recursos, serviços e o desenvolvimento de práticas colaborativas (BRASIL, 2008)

Neste sentido, o atendimento educacional especializado visa identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena participação dos estudantes, considerando as suas necessidades específicas (BRASIL, 2008, p. 1) relevante ressaltar que, atividades desenvolvidas diferenciam-se daquelas realizadas na sala de aula comum, não sendo substitutivas à escolarização. Esse atendimento complementa e/ou suplementa a formação dos estudantes com vistas à autonomia e independência na escola e fora dela. (BRASIL, 2008).

Podemos notar que a Política Nacional de Educação Especial é muito bem elaborada, mas falha no sentido de oferecer atendimento a todas as crianças com necessidades educacionais especiais, principalmente aos portadores de TDAH, que muitas vezes embora precisem, não enquadram nas diretrizes que norteiam o atendimento.  De acordo com (Brasil, 2009, p. 15). “à educação especial passa a constituir a proposta pedagógica da escola, definindo como o seu público-alvo os alunos com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação”. Sendo assim, consideram-se que,

alunos com deficiência são aqueles que têm impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, que em interação com diversas barreiras podem ter restringida sua participação plena e efetiva na escola e na sociedade. Os alunos com transtornos globais do desenvolvimento são aqueles que apresentam alterações qualitativas das interações sociais recíprocas e na comunicação, um repertório de interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. Incluem-se nesse grupo alunos com autismo, síndromes do espectro do autismo e psicose infantil. Alunos com altas habilidades/superdotação demonstram potencial elevado em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas (BRASIL, 2009, p. 15).

Tal política visa atingir também os portadores de TDAH e incluí-los no processo de inclusão escolar, integrando os conhecimentos/conteúdos e reelaborando estratégias de ensino permitindo que possam ter acesso à escolarização que vai além do saber ler e escrever. É preciso considerar também que, para os alunos com TDAH não se aplica a concepção de deficientes, por isso, não possuem direito de acesso e de garantias contempladas pela Política Nacional de Educação Especial. Ainda, vale salientar que também há reconhecido o direito de receber tratamento diferenciado. Talvez, uma das soluções para enfrentar as barreiras seja a elaboração de uma legislação específica para esse grupo visto que não são deficientes, mas apresentam dificuldades não somente educativas e que não se incluem nos Transtornos Globais do Desenvolvimento.

No Brasil, percebe-se iniciativas no campo do legislativo de proporcionar a inclusão, como o Projeto de Lei nº 7.081/2010, que dispõe sobre o acompanhamento integral para educandos com dislexia ou TDAH, que propõe que

o poder público mantenha programa de diagnóstico e tratamento de estudantes da educação básica com dislexia e Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), por meio de equipe multidisciplinar composta, entre outros, por educadores, psicólogos, psicopedagogos, médicos e fonoaudiólogos. A proposição estabelece que as escolas de educação básica devem assegurar às crianças e aos adolescentes com dislexia e TDAH o acesso aos recursos didáticos adequados ao desenvolvimento de sua aprendizagem e também indica que os sistemas de ensino devem garantir aos professores da educação básica cursos sobre o diagnóstico e o tratamento da dislexia e do TDAH. (BRASIL, 2010, p.12)

O projeto visa um olhar diferenciado para as disfunções das crianças, procurando atender às suas necessidades, objetivando exigir que o poder público desenvolva e mantenha programa de acompanhamento integral para educandos com dislexia, TDAH ou qualquer outro transtorno de aprendizagem, evidencia a necessidade de olhar separadamente a educação e a saúde ao enfatizar que o  atendimento educacional específico voltado para as dificuldades do educando não se confunde com a intervenção terapêutica ou o diagnóstico clínico. Nesta linha, faz constar expressamente que não é solução para os problemas educacionais a medicalização pura e simples, reforça-se assim, o acompanhamento específico para com a criança com TDAH, permitindo a igualdade de direito e permanência, bem como, de aprendizagem.

Como já mencionado acima, existe em diversos estados do Brasil, leis que amparam alunos com TDAH, mas destacamos aqui a lei estadual pertencente ao estado do Estado do Rio Grande do Sul – RS, que apresenta subsídios relevantes para os alunos com TDAH e dislexia, visando promover campanhas que podem ser realizadas pelas secretarias estaduais de saúde,  contemplando várias atividades que envolvam o tema para um melhor conhecimento dos assuntos por parte dos docentes que terão nas suas salas de aulas alunos com esse transtorno.

É imprescindível a inclusão dos alunos portadores de TDAH nas políticas educacionais, pois só assim eles terão acesso a um atendimento educacional especializado. Estes precisam ser vistos como alunos que necessitam de ajuda e apoio no ambiente escolar, sendo que apresentam inúmeras dificuldades de aprendizagem, e quando incluídos no atendimento educacional especializado, terão a possibilidade de melhorar a capacidade de concentração, e com isso, aprimorar a aprendizagem. Assim, eliminando as barreiras que ainda existem na escolarização das crianças portadoras de TDAH.

3. ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

A pesquisa proposta neste trabalho é de caráter qualitativo, onde buscou-se valorizar os conhecimentos dos profissionais entrevistados bem como as suas vivências com alunos portadores de TDAH no ambiente escolar. Segundo Denzin e Lincoln (2006), “a abordagem qualitativa destaca-se na qualidade científica a partir da relevância e o uso adequado de todos os dados, não se preocupa com quantidades numéricas, mas sim na compreensão da sociedade ou de grupos sociais”.

Participaram desta investigação cinco professoras e uma psicopedagoga, atuantes da rede pública municipal de um município da região norte do Rio Grande do Sul. Uma das professoras atua na educação infantil há nove anos e possui formação em Pedagogia e pós-graduação em Psicopedagogia Clínica e Institucional. A segunda docente participante desta pesquisa também é graduada em Pedagogia e possui pós-graduação em Psicopedagogia. Atua na área da educação há trinta e um anos e hoje leciona para turma do quinto ano do ensino fundamental. A terceira professora entrevistada, trabalha com alunos com dificuldades especiais, denominada como professora de Atendimento Especializado –  AE. Possui trinta anos de atuação na área de Educação e treze anos na educação especial. Sua formação é em Pedagogia com pós-graduação em Metodologias inovadoras aplicadas à educação. A quarta professora possui licenciatura em letras e formação em Pedagogia há três anos. A quinta docente atende alunos de AE e possui formação em fonoaudiologia com especialização em educação infantil, libras e metodologia de educação a distância, concluindo um total de quarenta anos de formação. As cinco professoras possuem nas suas turmas estudantes diagnosticados com TDAH. Além delas, participou da pesquisa uma psicopedagoga clínica institucional, que atua há nove anos e leva no seu currículo a graduação de Psicologia. Para assegurar anonimato, ao longo da apresentação dos resultados, cada entrevistado será identificado como P1, P2, P3, P4, P5 e P6, correspondendo a letra P ao participante e a numeração à quantidade de sujeitos entrevistados.

Os dados buscados para os objetivos almejados foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas, onde foram feitas perguntas sobre o aluno com TDAH no ambiente escolar e também sobre as políticas públicas envolvendo esses alunos.

As entrevistas feitas com os profissionais da área de educação foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas. Essas entrevistas partiram de um conjunto de 5 perguntas sobre o TDAH. No entanto, sempre que necessário, outras questões foram inseridas nos diálogos buscando obter mais informações e esclarecimentos sobre o cotidiano dos estudantes com TDAH no ambiente escolar. O quadro 01 apresenta o conjunto de questões básicas que nortearam as entrevistas semiestruturadas.

Quadro 01 – Questões básicas que orientaram as entrevistas semiestruturadas.

· Qual a sua percepção quanto professor/ psicopedagogo sobre o comportamento do aluno com TDAH?

· Você como professor/ psicopedagogo, acha viável uma adequação das políticas educacionais voltadas às crianças com TDAH?

· De que forma essa adequação na legislação dará mais oportunidades para os alunos com TDAH?

· Você conhece a lei estadual 15.212 que institui a campanha estadual de informação sobre o TDAH e a dislexia na educação básica?  Essa lei está sendo implementada nas escolas de educação básica?

· O que você acha que as escolas podem fazer para implementar essas políticas públicas?

Fonte: dados da pesquisa, 2020. Elaboração das autoras

Após os dados coletados, os resultados se darão a partir de uma análise Textual Discursiva (ATD). Para Moraes e Galiazzi,

[…] a análise textual discursiva corresponde a uma metodologia de análise de dados e informações de natureza qualitativa com a finalidade de promover novas compreensões de conteúdo tradicional e a análise de discurso, representado um movimento interpretativo de caráter hermenêutico. (MORAES E GALIAZZI, 2011, p.7).

Assim, iniciou-se pela leitura das entrevistas (discurso) de cada um dos participantes. A seguir, procedeu-se à desconstrução dos relatos. Na sequência, num movimento convergente, os fragmentos dos dados obtidos foram agrupados através do processo de unitarização, ou seja, procurou-se verificar as semelhanças entre eles e agrupá-los. A desconstrução e a unitarização do “corpus” consiste num processo de desmontagem ou desintegração dos textos, destacando os seus elementos constituintes. Significa colocar o foco nos detalhes e nas partes componentes dos textos, um processo de decomposição que toda a análise requer. Na sequência, passou-se à categorização, que, de acordo com Creswell (2014), consiste num processo de comparação constante entre as diferentes bases do texto definidas no momento inicial da análise, buscando evidências dos elementos semelhantes existentes.

Seguindo a descrição acima, a pesquisa aqui apresentada desenvolveu-se mediante a leitura, a desconstrução e a unitarização dos dados proporcionando as interpretações e as conclusões apresentadas no próximo item.

4. RESULTADOS

Os resultados foram evidenciados a partir das análises dos dados coletados por meio das entrevistas semiestruturadas junto aos participantes. Tal análise permitiu agrupar os dados em três categorias emergentes que foram denominadas como Conhecimento da Lei nº 15.212; Implementação e o que as escolas podem fazer.

4.1 CONHECIMENTO DA LEI Nº 15.212

A lei nº 15.212 de âmbito estadual foi criada para ajudar as crianças com TDAH a ter uma melhor aprendizagem na educação básica, também indica recursos didáticos para o pleno desenvolvimento do aluno em sala de aula e apresenta subsídios para os professores, por meio de atividades que envolvam palestras e dinâmicas sobre o assunto para um melhor entendimento do transtorno. Nesse sentido, esta categoria visa identificar o conhecimento dos participantes sobre a referida lei.

Por meio das entrevistas, evidenciou-se que a maioria das participantes conhecia a lei. Nas palavras de P5:

Eu tenho sim conhecimento da lei sobre o TDAH, ela foi instituída em 25 de julho de 2018, como se fosse um meio de promover todas as crianças com déficit de atenção e dislexia e oferecer melhores recursos adequados a cada processo de desenvolvimento, pois a criança com TDAH temas suas limitações e precisa de um acompanhamento mais centralizado diante da sua dificuldade.

Na mesma direção, P1 relata que conhece a lei nº 15.212, afirma que, a lei existe, e tem conhecimento da mesma, pois ela trata de assuntos que envolvam um acompanhamento de crianças com TDAH e dislexia, onde oferece apoio aos profissionais de educação.

No entanto, a participante P2 afirma que, “embora trabalhe com estudantes que apresentam o transtorno, não conheço a lei”. Segundo o seu relato, em suas aulas ela usa vários recursos e atividades diferenciadas com esses alunos, sabe que precisam de uma atenção diferenciada dos outros, pois possuem além da dificuldade de aprendizagem, uma falta de atenção e com isso não conseguem acompanhar as atividades propostas.

Mesmo para as participantes que afirmaram conhecer o que é exposto na lei estadual 15.212 o domínio sobre ela é pequeno e superficial. De acordo com P3:

Eu tive conhecimento da lei quando tive alunos com TDAH, onde eu busquei informações referentes a legislação, mas, no entanto, não tenho muito conhecimento sobre a mesma, sei que existe, mas como ela é aplicada nas escolas estaduais não sei informar, pois, trabalho na rede municipal onde não é implantada a lei.

Outro trecho que demonstra que os participantes conhecem pouco do que a lei 15.212 propõem é percebido na fala de P6, onde também saber da existência da lei 15.212, porém, como trabalha na rede municipal não teria muito contato com a lei, pois a mesma pertence à esfera estadual, e as escolas municipais não trazem a referida lei como como parâmetro.

Por sua vez, salienta que é necessário um melhor entendimento dos assuntos por parte dos educadores e a necessidade de disponibilizar recursos didáticos e pedagógicos para que essa lei seja aplicada de maneira a beneficiar os alunos com TDAH.

Conhecer a legislação que orienta o processo educativo possibilita aos educadores uma estrutura capaz de proporcionar situações que promovam a aprendizagem dos seus alunos. Sobre isso, Reis (2001) indica que, na tentativa de conduzir os estudantes que apresentam TDAH a uma aprendizagem capaz de atender às exigências do mundo contemporâneo, o professor deve ser capacitado sobre como desenvolver as suas atividades pedagógicas dentro de um contexto em que se encontram estudantes com necessidades diferenciadas.

No entanto, os resultados contidos nesta categoria apontaram que a maioria dos participantes conhecem a lei estadual 15.212. Porém, evidenciou que este conhecimento é superficial. Tal indicativo sugere a necessidade da formação de um espaço de estudo por parte dos professores da Educação Básica na tentativa de ampliar o conhecimento dos propósitos da Lei 15.212.

4.2 IMPLEMENTAÇÃO DA LEI 15.212

Como mencionado anteriormente, a lei foi criada com o propósito de auxiliar os professores com recursos didáticos para trabalhar com alunos que apresentam sintomas de TDAH e dislexia e também para auxiliar na promoção de um melhor aprendizado desses discentes que necessitam de um atendimento diferenciado. A partir desta concepção, esta categoria buscou perceber se a lei 15.212 está sendo implementada nas escolas de educação básica.

Os resultados demonstram que as seis participantes têm a mesma visão sobre a implantação da lei nas instituições de educação básica.  Nas palavras de P5:

Essa campanha, essa conscientização sobre o TDAH ela já existe na nossa escola, por vezes a gente lê alguns textos, mas constância em todas as escolas eu acho que não há ainda. Eu acho que a lei existe, mas que tudo é implantado como a lei determina não. As escolas têm conhecimento das coisas, onde buscam fazer o melhor dentro das condições dentro de uma escola pública, mas essa conscientização vem dos próprios profissionais que se empenham em buscar mais informações sobre o assunto.

Na mesma linha, P1 relata que “essa lei é implantada em partes nas escolas, por alguns profissionais que buscam um aperfeiçoamento sobre o assunto, para ter subsídios de como ajudar essas crianças que precisam de apoio para superar as suas dificuldades”.

Todavia, a participante P2 relata que

pelo fato de não conhecer a lei, não pode nos dar maiores informações da sua implementação nas escolas, porém, afirma que ela própria busca recursos e informações para trabalhar as dificuldades nos alunos com TDAH, pois não tem acesso a informações de outras fontes.

Evidenciou-se também na argumentação de P3 que “a legislação é a principal guia para as práticas escolares, infelizmente muitos professores só buscam informações e modificam as suas práticas pela força da lei”.

Outro trecho que demonstra conhecimento sobre a implantação da lei, está no relato de P6, que afirma que “As escolas deveriam oferecer mais palestras e informativos sobre esse transtorno, para que nós profissionais viéssemos a conhecer mais com que alunos estamos trabalhando e de que forma ajuda-los”.

Pelo exposto, constata-se, que a lei 15.212 existe, mas de alguma maneira não está sendo devidamente implantada na educação básica. Pelos relatos das professoras entrevistadas pode-se perceber que por vezes ocorrem palestras e leituras de textos informativos nas escolas para os profissionais de educação, mas isso ainda não é suficiente, diante do grande desafio que é lidar com o estudante portador do transtorno de TDAH, bem como a prática inadequada pode acarretar para a vida e aprendizagem deste educando.

Evidencia-se, portanto, a necessidade de implantação de uma lei mais abrangente, de âmbito federal, para que esses alunos sejam oportunizados experienciar um melhor acompanhamento e consequentemente um melhor e especializado atendimento, coordenado por profissionais com formação adequada para desenvolver um trabalho efetivo com alunos com TDAH. Sabe-se que se encontra em andamento no senado federal um projeto de lei, mas que tramita há mais de oito anos e até o presente não foi sancionado, o que representa um descaso por parte das autoridades para com esses alunos que sofrem do transtorno do TDAH. A professora P4, também menciona na sua fala que:

Seria importante dar a esses alunos um parecer de educação especial para que eles possam ter acesso a um atendimento educacional especializado. A educação inclusiva, mas no sentido de agregar conteúdo pedagógico e estratégias de ensino de maneira a eliminar os bloqueios que impedem a escolarização, entendida para além do saber ler e escrever.

Retomando a lei 15.212, está nos traz em seu artigo 1º que, “a campanha estadual de informação e conscientização sobre o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade- TDAH- e a Dislexia, a ser realizada anualmente no primeiro semestre de cada ano, de acordo com o calendário escolar da rede estadual de ensino”. Seguindo o exposto, é inviável uma educação de qualidade sem o merecido olhar e conhecimento mais aprofundado do tema, pois apenas informações superficiais e conscientização não irão subsidiar caminhos para o aprendizado dos alunos com TDAH. É necessário um acompanhamento diário com profissionais capacitados, onde o professor também seria capacitado a trabalhar com esses alunos, sendo este – professor- peça chave no bom desenvolvimento em sala de aula, assim como pondera Soares (2003), o trabalho do professor é ajudar a promover mudanças, intervindo diante das dificuldades que se apresentam durante o processo de aprendizagem, trabalhando com os desequilíbrios e facilitando o aluno a aprender a aprender. Somente assim, seria possível possibilitar uma aprendizagem significativa e estes – alunos- por vezes, não se sentiriam “excluídos” em sala de aula.

4.3 O QUE AS ESCOLAS PODEM FAZER?

As entrevistas realizadas evidenciaram que é preciso a construção de uma lei que ampare os alunos com TDAH, somada à  reformulação da lei já existente (lembramos que aqui falamos sobre a lei estadual 15.212), somente com leis específicas que atendam às necessidades dos alunos com TDAH, as escolas e os profissionais que nela se encontram, terão os recursos apropriados para lidar com as dificuldades de aprendizagens apresentadas por essas crianças e caminharem na busca por sanar tais dificuldades, possibilitando o desenvolvimento da aprendizagem dentro de suas limitações do aluno, mas de maneira adequada, com todos os recursos de que precisa.

É preciso ir além do que é praticado hoje, é necessário que as escolas reconheçam a precisão de mudança de postura e atitudes no que tange o processo de ensino e aprendizagem desses alunos aqui referidos (alunos com TDAH), tome a iniciativa de mudança não como uma ajuda a eles, mas como um direito, o direito de aprender que é resguardado a todos, criando possibilidades diferenciadas de aprendizagens, fato este, que foi comentado pela professora P4, ao declarar que:

as escolas devem dispor de diferentes recursos pedagógicos, proporcionar estudo em reuniões pedagógicas com pessoas aptas para passar um embasamento sobe o que é o TDAH e a dislexia e ter nas escolas uma equipe multidisciplinar com educador de AEE (educação especial), psicopedagogas, psicólogos e fonoaudiólogos para ajudar nesse processo de aprendizagem dos alunos com TDAH.

Colaborando com a fala anterior, destacamos os relatos das professoras P1e P2, que se posicionaram ainda acerca da necessidade da capacitação dos profissionais que atuaram diretamente com os alunos. Fala de P1:

A escola deveria além de dar capacitação através de formações específicas para os professores, também deveriam reduzir o número de alunos por turma onde há alunos com TDAH, para um melhor atendimento da professora em sala de aula, buscar parcerias com ESF (estratégia saúde da família) das comunidades, secretaria da saúde, Cras (Centro de referência de assistência social) dos municípios, escolas e entidades que atuem na área.

Fala de P2:

As escolas devem promover grupo de estudos para qualificar e ampliar o olhar sobre o TDAH, não ficar esperando o aluno chegar na escola para buscar aprender algo sobre o transtorno, pois cada dia mais encontramos crianças que apresentam esse transtorno e devemos estar preparados para recebê-los da mesma forma que os outros.

Os relatos aqui transcritos, deixam explicitam que os participantes consideram ser necessário um maior conhecimento sobre o transtorno para que o professor possa atender de maneira adequada esses alunos em sala de aula. Ainda, para os participantes, o professor deve ter um conhecimento do assunto para ajudar nas dificuldades encontradas pelas crianças no decorrer de sua aprendizagem. P3 indica “que priorizar a formação sobre esse tema ou oferecer apoio pedagógico para estas crianças pode sim dar novas oportunidades para estes alunos”. P6, por sua vez, salienta que o professor é o ponto principal desse processo, para ela “a atenção especial do professor sobre as situações que se apresentam no decorrer da aula é mais importante do que em leis que tentam prever situações pessoais e orientações pontuais”. Concepção que caminham na direção do proposto por Ferreira (2005, p. 46) que sugere,

a reflexão individual sobre a prática em sala de aula deve se somar ao conhecimento científico já existente sobre estratégias de ensino mais dinâmicas e inovadoras. […] O conteúdo curricular pode se tornar mais acessível a todas as crianças. Jovens e adultos em escolarização, se for trabalhado por meio de estratégias de ensino participativas e inovadoras que possibilitam ao educando aprender a aprender autônoma e colaborativamente.

Percebe-se que todas concordam com a importância de conhecer o aluno e suas especificidades. Para deixar isso ainda mais evidente, transcreve-se a fala de P5.

Na minha percepção é de extrema importância, principalmente se a criança estiver em idade escolar, haver um olhar apurado da professora, dos pais no acompanhamento diário, da coordenação escolar, da psicopedagoga escolar, pois o direcionamento dado a essa criança fará toda a diferença, visto que o sofrimento desses pequenos é visível, eles não entendem, não sabem o que está acontecendo com eles, não sabem porque são tão elétricos, por que não conseguem prestar atenção entre outras situações vividas,  por isso é muito importante o papel da escola, para assim ajudá-los a entender melhor essas dificuldades. A escola não deve apenas debater sobre os temas, mas sim buscar caminhos e soluções para a complexidade desse transtorno.

Observamos ainda que família e escola precisam caminhar juntas para desenvolver as habilidades e auxiliar o aluno a concretizar a aprendizagem, os pais devem ser parceiros deste processo, sendo importante evitar contatar os pais somente nos momentos de crise. (ROHDE e BENCZIK, 2008).  O autor lembra ainda que o sucesso de qualquer estratégia de manejo destas crianças e adolescentes depende de uma boa relação e comunicação entre a escola e os pais.  A família, por sua vez, deve amparar a criança, entender e aceitar que existe o transtorno e aprender a lidar com ele e com o processo. Agindo com serenidade, a família irá ajudar a criança a superar o transtorno no seu dia a dia e sala de aula.

A escola, deve proporcionar momentos de apoio e lazer para esses alunos que necessitam de um olhar diferenciado, bem como salas de aula interativas, com equipamentos próprios, e uma flexibilização da forma de transmitir os conteúdos a serem aprendidos, para assim, conseguir ajudar ainda mais no processo de ensinar e aprender. Lembrando sempre da necessidade constante de um olhar especial para a capacitação dos professores que lidarão diretamente com o aluno com, pois como acrescenta Rohde (20013), o aluno com TDAH impulsiona o professor a uma constante reflexão sobre sua atuação pedagógica, obrigando-o a uma flexibilidade constante para adaptar seu ensino ao estilo de aprendizagem do aluno. Somente através da capacitação, do diálogo e da vivência diária que juntos – escola e família- encontrarão a melhor forma de atuar, ensinar e ajudar ao aluno com TDAH a superar as barreiras e desenvolver realmente suas habilidades e capacidades.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o aumento crescente do número de crianças com TDAH inseridas na educação básica, faz-se necessário ampliar o olhar dos profissionais da educação, que por vezes não conseguem entender o que acontece com algumas crianças em sala de aula,  não obtendo um bom rendimento escolar devido às possíveis dificuldades intelectuais que os alunos com TDAH apresentar, fator que acarretará severas barreiras no processo de ensinar e de aprender, tanto para a criança, quanto para os professores, que vezes não sabem lidar com as situações que esses alunos com TDAH provocam.

O presente artigo apresentou uma reflexão sobre a Lei 15.212, de âmbito estadual, no qual um dado município do norte do RS se encontra. Trata-se, portanto, de uma campanha de informação sobre o TDAH e a dislexia na educação básica, visto que ainda não existe uma lei Federal que possa amparar essas crianças. Buscou-se, neste trabalho, perceber se um grupo de profissionais conhecem e reconhecem a lei percebendo a implementação da mesma na educação básica. Procurou-se ainda, evidenciar as diferentes ações que podem ser tomadas para a melhoria na qualidade da aprendizagem desses alunos. Para tal, realizou-se uma pesquisa qualitativa onde a coleta de dados se deu através de uma entrevista semiestruturada para elencar as características desses alunos e confrontá-las com a literatura existente.

Através das leituras realizadas sobre as leis de inclusão, observou-se que essas crianças com TDAH ainda não estão incluídas como alunos especiais, mesmo tendo todas as características necessárias para que isso possa acontecer. Isso se dá pelo fato de no Brasil não termos uma lei mais abrangente e específica para esse transtorno, pois como mencionado no decorrer deste trabalho, temos até o momento, somente um projeto de lei que consta em tramitação, portanto, não pode ser aplicado nas escolas, já que não foi ainda aprovado.

Existe atualmente, a lei estadual 15.212 que oferece para crianças portadores de TDAH e dislexia o acesso a recursos didáticos adequados para o desenvolvimento de sua aprendizagem, bem como conta com atividades que incluem palestras, exposição de painéis e estudos de pesquisa sobre o tema para profissionais que atuam na área de educação, lei este, de âmbito estadual, mas que em muitos momentos a não é aplicada na rede municipal de ensino, por  ainda não existir uma legislação própria para esses casos. Neste sentido, seria importante que o próprio município criasse uma lei própria pelo seu legislativo, onde pudessem fornecer a esses alunos que apresentam o transtorno um atendimento diferenciado, feito por profissionais capacitados e aptos para trabalhar com o TDAH.

Por meio das entrevistas realizadas, os professores demonstraram que a educação inclusiva falha com esses alunos, pois eles necessitam de um atendimento especializado, devido às dificuldades que possuem e precisam ser vistos com um olhar diferenciado. As crianças portadoras de TDAH possuem um ritmo próprio de aprendizagem e o professor deve saber respeitar esse ritmo, mas para tanto, precisa ser capacitado e trinado para lidar com este fator diferente.

Foi possível perceber ainda, que as escolas oportunizam um conhecimento sobre esse tema, como sugere a lei 15.212. As escolas, como citadas nas entrevistas, proporcionam algumas palestras e leituras sobre o assunto e os professores que têm em suas salas de aula alunos com TDAH buscam informações e um conhecimento sobre a doença para poder trabalhar com os alunos de maneira que possibilite um aprendizado de valia para eles, mas que nem sempre é o suficiente para lidar corretamente com as diversas situações que o TDAH acarreta.

Os profissionais de educação estão ampliando seus olhares para os alunos com TDAH, buscando informações primeiramente com as famílias e após com profissionais que atuam em outras áreas, e também criam técnicas diferenciadas de como trabalhar com esses alunos em sala de aula para que o mesmo não se sinta “excluído”. Basta agora, um olhar especial das autoridades, para que possam incluir esses alunos na educação especial, pois eles precisam estarem amparados legalmente para que o atendimento possa acontecer em todas as escolas e assim seja garantindo os mesmos direitos e oportunidades que os outros alunos de aprender e crescer como seres humanos capazes de realizar seus sonhos e concretizar seus objetivos.

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[1] Bacharel em Administração – IMED; Licenciatura em Pedagogia – FABE; Especialização em Linguagens e Tecnologias na Educação – IFSUL, Mestranda Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Passo Fundo.

[2] Licenciada em Pedagogia – FABE, pós-graduada em gestão e organização escolar e mestranda Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Passo Fundo.

[3] Licenciada em Letras e em Pedagogia e mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Passo Fundo.

Enviado: Dezembro, 2020.

Aprovado: Março, 2021.

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Bruna Eduarda Rocha

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