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Influência dos níveis da serotonina no transtorno do espectro autista

RC: 38318
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CONTEÚDO

ARTIGO DE REVISÃO

RODRIGUES, Vivian dos Santos [1], CASTRO, Thayná Nicola [2], MARINS, Fernanda Ribeiro [3], FILHO, Marcelo Limborço [4]

RODRIGUES, Vivian dos Santos. Et al. Influência dos níveis da serotonina no transtorno do espectro autista. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 04, Ed. 10, Vol. 09, pp. 05-16. Outubro de 2019. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/niveis-da-serotonina

RESUMO

O transtorno do espectro autista é um distúrbio generalizado do desenvolvimento que afeta variadas áreas comportamentais ainda sem total elucidação de seu processo patofisiológico. Estudos indicam que cerca de 30% dos autistas tem um aumento na concentração plasmática do neurotransmissor serotonina. Na busca por mais explicações acerca desse aumento a nível plasmático, exames evidenciaram importantes alterações histológicas que corroboram para uma baixa concentração de serotonina no cérebro, descoberta que surge como causa de alguns comportamentos estereotipados relacionados ao autismo. O tratamento realizado, além da terapia medicamentosa, inclui-se terapias ocupacionais para estimular a atenção, o aprendizado e até mesmo a fala. Medicamentos que atuam na inibição seletiva e não-seletiva de receptores de serotonina, de transportadores e também da receptação da serotonina no neurônio são o principal alvo terapêutico. Devido aos elevados efeitos colaterais nas novas terapias o uso dos medicamentos em crianças e adultos acometidos pelo autismo acaba impossibilitado. Novas pesquisas na busca de encontrar medicamentos que tenham um bom desempenho nos autistas são necessárias, pois cada pessoa acometida pelo transtorno evidencia comportamentos diferentes, necessitando assim de tratamentos individualizados tanto na área medicamentosa quanto na área ocupacional.

Palavras-Chave: autismo, hiperserotonemia, transtorno do espectro autista, serotonina.

1. INTRODUÇÃO

Em 1943, o psiquiatra Léo Kanner descreveu os sintomas do Transtorno do Espectro Autista (TEA) pela primeira vez. Trata-se de um distúrbio de variadas etapas do desenvolvimento podendo afetar a comunicação, linguagem, interesses restritos, comportamentos repetitivos e interação social limitada, com início na primeira infância1; 2. Estas dificuldades de interação tendem a melhorar com o passar dos anos. Entretanto, adolescentes e adultos autistas, mesmo com as habilidades cognitivas normais, tendem a se isolar, pois interpretam erroneamente como as pessoas os observam2.

Segundo informações da ONU, no mundo 1 a cada 68 crianças tem algum transtorno do espectro autista, correspondendo a cerca de 1,5 % da população dessa faixa etária3. Foram realizadas muitas descobertas em relação à causa do autismo, mas seu processo patofisiológico ainda não foi completamente desvendado, pois cada uma das pessoas acometidas pelo autismo se enquadra em uma das causas prováveis1.

Não se tem conhecimento de nenhum exame laboratorial que realize o diagnóstico do autismo, sendo o mesmo realizado somente através de sinais e sintomas clínicos que devem ser analisados pelo pediatra e especialistas como psicólogos, psiquiatras ou psicoterapeutas4. O autismo é considerado uma síndrome multifatorial, pois advém de diversos fatores. Desta forma, não há apenas um único tratamento conhecido, e sim vários medicamentos e terapias que auxiliam a melhorar sua qualidade de vida, escolhidos conforme a necessidade do paciente5.

A utilização dos medicamentos no autismo ainda é incipiente. Em relação aos distúrbios comportamentais, faz-se uso de neurolépticos, devido aos efeitos colaterais acabam por limitar sua prescrição2. Os antipsicóticos ativos têm demonstrado sucesso em controlar a hiperatividade, agressividade e irritabilidade, mas também apresentam efeitos colaterais, sendo necessário o acompanhamento dos usuários5. Inibidores seletivos da recaptação de serotonina têm sido eficazes em diminuir os comportamentos estereotipados, ritualísticos e obsessivos, sendo que os efeitos colaterais ainda estão em observação1.

Com o avanço das pesquisas, constatou-se que cerca de 30% dos autistas têm sido diagnosticados com hiperserotonemia (aumento da concentração plasmática de serotonina), sendo que em alguns pacientes essa alteração pode estar ligada com o aumento na capacidade de transporte da serotonina, ou devido à diminuição da ligação da serotonina aos receptores 5-HT2A1. Exames histológicos realizados post-mortem identificaram alterações importantes no cérebro de autistas, o que levou aos pesquisadores a acreditarem que além da hiperserotonemia periférica, exista em contrapartida uma hiposerotonemia cerebral6.

O número de autistas vem aumentando a cada ano e os pesquisadores acreditam que ainda existam muitos casos não diagnosticados. Pouco se sabe também sobre a hiperserotonemia e a hiposerotonemia nos autistas aqui no Brasil, sendo uma alteração importante no TEA e uma das possíveis causas da hiperatividade e agressividade demonstradas.

Examinar e revisar informações sobre as alterações dos níveis de serotonina no Transtorno do Espectro Autista é o objetivo deste trabalho. Desta forma, pretendemos delimitar sua atividade e suas consequências comportamentais devido aos níveis alterados, reunindo maiores informações acerca do tema proposto, como as formas de tratamentos disponíveis e como elas vêm sendo utilizadas pela população.

2. METODOLOGIA

A metodologia aplicada é a revisão bibliográfica partindo dos estudos realizados e artigos publicados em revistas científicas acessados através das plataformas de busca Google Acadêmico, PubMed, Periódico Capes e Scielo, limitada a partir do ano 1995 até a presente data. Foram utilizadas para busca as palavras-chave serotonina, hiperserotonemia, autismo e transtorno do espectro autista. Após analisar os artigos encontrados, excluímos os artigos que não foram publicados em revistas indexadas e limitamos os artigos escritos em português, inglês ou espanhol.

3. DESENVOLVIMENTO E RESULTADOS

Variados fatores como predisposição genética, fatores ambientais e etiologia são listados como causas a serem estudadas e esclarecidas a respeito da fisiopatologia do autismo. Muito têm sido estudado, algumas teorias são complementares e outras são divergentes, mas nenhuma teoria tem aceitação unânime1; 2.

Mesmo se tratando de um fenótipo heterogêneo, o autismo apresenta uma influência genética, levando a diversos estudos para identificação de alterações em irmãos de crianças com diagnóstico de autismo7. Estudos realizados na Dinamarca mostraram que a taxa de recorrência de autismo em irmãos mais novos é de 6,9%, baseado em 1,5 milhões de crianças nascidas em 1980 e 20048. Vale ressaltar que ainda não se sabe quais genes são os causadores, se interagem entre si, nem como eles atuam nos fenótipos característicos do autismo9.

Muito se fala da interação da vacina tríplice viral com o autismo, o que foi desmentido em inúmeros estudos realizados em diversos países (Estados Unidos, Japão, Dinamarca, Canadá, entre outros). Ainda sim, existem muitos pais e profissionais que são contra a vacina por crerem na interação vacina x transtorno10. Como precaução, foi formalmente requerido nos Estados Unidos desde 1999, que os fabricantes de vacinas atenuem ou eliminem o uso do Timerosol (conservante utilizado nas vacinas a base de mercúrio), mas mesmo assim o número de casos confirmados de crianças com autismo continua aumentando11.

As causas neuroquímicas do autismo têm sido muito estudadas, sendo um grande achado a elevação dos níveis de serotonina, tanto em plaquetas quanto no soro dos pacientes1. Pesquisadores buscam correlacionar a hiperserotonemia com o comportamento do autista e alterações fisiológicas no cérebro, utilizando como ferramentas de estudo o auxílio dos fármacos e da neuroimagem na identificação de crianças mais propensas ao desenvolvimento do autismo12.

Mediante o fato de que o transtorno do espectro autista ainda não pode ser comprovado através de exames laboratoriais, a confirmação ocorre através da análise e observação dos sinais e sintomas clínicos demonstrados pela criançasendoavaliadas em três aspectos: capacidade de interação social, comunicação e interesses restritos e estereotipados de comportamento4; 7.

Na interação social, os alertas são quando a criança não demonstra habilidade em partilhar sentimentos como alegria e tristeza, falta de comunicação não verbal (gestos, olhares, expressão facial)13, podendo acarretar ao isolamento da criança, uma vez que ela não consegue participar de atividades em grupo, além de demonstrar menor contato visual que o apresentado em outras crianças da mesma idade2.

Na comunicação, deve-se atentar para falta de linguagem verbal ou linguagem atrasada, podendo ainda haver uma linguagem verbal, mas com faltade interesse em iniciar e manter um diálogo13. A utilização de jogos para auxiliar na interação dos pais e irmãos de autistas tem se demonstrado de grande potencial para diminuir dificuldades de comunicação no âmbito familiar, e vem sendo uma forma muito eficaz de auxiliar o autista a se expressar14.

Interesses restritos são demonstrados quando a criança não realiza brincadeiras imaginárias ou tem um atraso nelas, assim como demonstrar padrões repetitivos, como balançar as mãos, repetir palavras, correr de um lado a outro, aderir a rotinas2; 13.

Requerendo uma atenção multidisciplinar, o tratamento pode incluir psicólogos e educadores bem treinados em análise comportamental, sendo fundamentais na tentativa de mudança de comportamento2. Fonoaudiólogos também se fazem necessários quando o autista apresenta distúrbios na linguagem, realizando também atividades que auxiliam o desenvolvimento da criança. A abordagem terapêutica do fonoaudiólogo não deve ser única, e sim diferenciada, pois cada autista apresenta facilidades e dificuldades em determinadas funções, determinando ao profissional analisar cada caso e elaborar uma abordagem mais específica para seu paciente15.

Já nos tratamentos farmacológicos, muito se tem utilizado os medicamentos inibidores de recaptação da serotonina (IRSs), que atuam inibindo a recaptação do neurotransmissor no sítio de ligação do transportador pré-sináptico13. A serotonina é um neurotransmissor implicado em muitas funções cerebrais como ansiedade, sono, agressividade e comportamento, além de regular a afetividade1.

Embora seja muito conhecida como um neurotransmissor, a maior concentração da serotonina não é encontrada no sistema nervoso central (SNC), e sim na periferia, tendo sua origem no intestino. Sua principal fonte de produção são as células enterocromafins, presentes no endotélio do trato gastrointestinal, sendo que uma fração é liberada na corrente sanguínea, onde as plaquetas absorvem e armazenam a serotonina, e a outra parte atua no sistema entérico12; 16.

É pouco provável que a serotonina plasmática chegue ao cérebro, pois a barreira hematoenfálica é praticamente impermeável a ela, sendo assim, toda serotonina presente no SNC é produzida localmente pelos neurônios serotonérgicos, estes distribuídos em pequenos grupos localizados no mesencéfalo e conhecidos como os núcleos da rafe12; 17. Apesar de seu pequeno número, os neurônios serotonérgicos estimulam muitas regiões do cérebro, modulando variadas regiões do cérebro relacionadas ao sistema límbico, coordenando uma série de comportamentos12. A concentração e a produção de serotonina no cérebro dependem do nível de triptofano, um aminoácido essencial e seu precursor químico, que em autistas encontra-se em níveis reduzidos18.

A serotonina, sendo um hormônio monoaminérgico e um neurotransmissor, realiza variadas funções, atuando em diferentes receptores, transportadores e mecanismos de sinalização intracelular, atuando também na região do córtex pré-frontal, mais especificamente no córtex órbitofrontal e o córtex cingular anterior regulando os receptores do tipo 5-HT2, queestão ligados diretamente com alterações na impulsividade e na agressividade atuando de forma complementar, uma vez que a ativação do o receptor 5-HT 2A aumenta a agressividade e impulsividade, enquanto que 5-HT 2C diminui tal comportamento6; 19.

A hiperserotonemia periférica foi descrita primeiramente por Shain e Freedman, em 19611. Estudos recentes revelam que há um aumento na síntese de serotonina em até 1,5 vezes em crianças autistas de 2 a 15 anos quando comparados aos níveis em adultos sadios2. Este aumento observado nos níveis plasmáticos de serotonina pode ser causado tanto pela redução da liberação de serotonina pelas plaquetas quanto pelo crescimento do transporte da serotonina nas plaquetas1.

A hiperatividade observada em muitos dos pacientes está relacionada com as disfunções no sistema serotoninérgico, desenvolvendo dificuldade de concentração, principalmente em realizar atividades mais elaboradas. Essa condição se fundamenta principalmente na melhoria do quadro clínico quando em tratamento com medicamentos que atuam neste sistema5. A agressividade também foi listada como resultado das disfunções serotoninérgicas devido a um grande número de estudos utilizando técnicas tanto clínicas quanto pré-clínicas, que indicaram uma ligação entre a alteração dos níveis da serotonina e o comportamento estereotipado, confirmando que a serotonina regula a resposta ao estímulo agressivo, assim como os níveis de agressividade a si próprio ou ao próximo durante surtos de raiva19.

Recentemente, foram realizados exames laboratoriais em crianças com autismo avaliando o LCR (líquido cefalorraquidiano), sendo observada uma diminuição nos níveis do metabólito da serotonina, em consonância com exames post-mortem,que revelaram uma desorganização cortical nos neurônios localizados nas camadas 4 e 5 do córtex pré-frontal e temporal, assim como manchas focais na cito-arquitetura laminar, achados que indicam uma baixa concentração de serotonina no SNC 6.

A serotonina tem um grande papel na diferenciação dos neurônios durante o desenvolvimento, fortalecendo estudos que indicam que a depleção de serotonina possa ser capaz de diminuir as células dentríticas no hipocampo e as células de Purkinje no cerebelo1. Além disso, importantes alterações histológicas foram relatadas em exames de neuroimagem de autistas1. Com o auxílio de imagens obtidas por ressonância magnética e registros de EEG, estudos vêm sendo realizados em crianças com alto risco e crianças sem risco familiar de autismo com idade entre 2 e 4 anos. Os resultados preliminares evidenciam que em crianças com autismo, há um aumento cortical generalizado e um aumento desproporcional de substância branca advinda do lobo temporal 8.

O estudo de Adamsen e colabodores6 afirma que, como a barreira hematoencefálica não está totalmente formada na gestação, ela permite que altos níveis de serotonina presentes no sangue materno cheguem ao SNC do feto, gerando um feedback negativo, que resultaria em uma perda de neurônios responsáveis pela produção de serotonina. Já Sacrey e colaboradores8 discorrem sobre os efeitos da exposição ambiental ao longo do desenvolvimento (incluindo a exposição da mãe a antidepressivos do tipo inibidores seletivos de receptação de serotonina), efeito dos riscos genéticos e as possíveis interações destes fatores com uma população com fenótipos pré-dispostos.

Depois que a serotonina é liberada na fenda sináptica, a metabolização é realizada pela ação de proteínas transportadoras de membrana como a SERT (do inglês, transportador de serotonina) e PMAT (do inglês, transportador de membrana plasmática de monoaminas). A SERT tem alta afinidade e baixa capacidade, sendo responsável pela recaptaçãoda serotonina, transportando-a de volta para o citoplasma de seu neurônio serotoninérgico pré-sináptico. Em contraposição o PMAT está localizado em volta das sinapses serotoninérgicas nos neurônios não serotoninérgicos, sendo de alta capacidade e baixa afinidade6.

Em sinapses que não dispõem da ação da SERT ou da PMAT, presumimos que a degradação da serotonina esteja comprometida, gerando então uma maior concentração de monoaminas dentro da fenda sináptica, exercendo, assim, um feedback positivo local, aumentando então a quantidade de serotonina disponível na fenda6. A SERT atua no SNC e nas plaquetas, sendo que uma alteração neste transportador pode alterar o desenvolvimento do cérebro e também elevar os níveis de serotonina nas plaquetas 17.

Um estudo realizado no Japão baseado na restrição de triptofano na dieta dos ratos concluiu que os fenótipos característicos do autismo podem estar relacionados auma alteração do transportador SERT21. Diante das descobertas de hiperserotonemia plasmática e hiposerotonemia no SNC, alterações no SERT seriam um grande alvo para a causa do TEA, aumentando assim as possibilidades de tratamentos novos e mais eficazes 6; 22. Os tratamentos farmacológicos têm sido utilizados para auxiliar na hiperatividade, agressividade, disfunções do sono, falta de concentração 23.

O estudo de Chugani 20 concentra-se na possibilidade de um polimorfismo do transportador da serotonina ser a causa das disfunções serotoninérgicas, pois problemas neste transportador tem relação importante com as regiões do cerebro que sofrem anormalidades e que resultam em uma alteração na modulação do neurotransmissor na região tálamo-cortical, interpretando, assim, as alterações sensoriais relatadas por autistas. Tratamentos realizados com base na administração diária do precursor da serotonina gerou a normalização dos níveis no LCR e na urina, evidenciando que os níveis cerebrais de serotonina foram normalizados 6.

Muito antidepressivos normalmente prescritos, atuam antagonizando a proteína transportadora de membrana de alta afinidade (SERT). No sangue, realiza o transporte da serotonina para dentro das plaquetas, pois elas não sintetizam essa monoamina, apenas realizam o armazenamento22. Existem somente dois medicamentos aprovados pelo órgão norte-americano de regulação de medicamentos para o tratamento de TEA, o aripripazol e o risperidona 22. A risperidona atua como antagonista, um fármaco que inibe os receptores do tipo D2 (receptor dopaminérgico)e 5-HT2A (receptor serotonérgico), tendo sido demonstrados diversos efeitos benéficos no combate aos sintomas típicos do autismo em inúmeros estudos 1. O aripripazol se liga aos receptores pré-sinápticos D2 e D3 e com a serotonina, atuando como um agonista da dopamina e um antagonista da serotonina, um estudo com cinco pacientes entre 5 e 18 anos resultou em uma melhora significativa no comportamento associado à TEA 13.

Baseado nas informações acerca da taxa de serotonina plasmática seria plausível que o tratamento se baseasse na inibição da recaptação deste neurotransmissor, sendo indicados os medicamentos inibidores seletivos da receptação da serotonina (ISRS), pois têm a capacidade de agir no sítio do transportador pré-sináptico, inibindo de maneira eficaz a recaptação da serotonina13. Alguns estudos indicam melhorias a partir da administração desta classe de medicamentos, porém ainda são poucos os estudos que relatam esta forma de tratamento, uma vez que em um deles foi relatado o surgimento de efeitos secundários graves, como retenção urinária e convulsões. Existem ainda estudos com os ISRS realizados com crianças que não indicam nenhum tipo de melhoria. No que diz respeito à administração dessas drogas, é sabido que são indicados para desordens associadas a transtornos obsessivos compulsivos (TOC) ou depressão, e não especificamente para o autismo23. Especificamente, o uso de ISRS tais como fluoxetina, fluvoxamina, paroxetina, sertralina e citalopram, tem sido administrados na tentativa de amenizar os sinais estereotipados de comportamento e tem se mostrado eficaz e sem causar intolerância 2.

Os antipsicóticos atípicos (AAP) fazem parte de um grupo de farmacoterápicos inicialmente desenvolvidos para o tratamento de psicose, mas que se tornaram uma alternativa mais segura quando comparados aos antipsicóticos típicos ou tradicionais, pois apresentam menos riscos de induzir efeitos colaterais neurológicos de curto prazo e discinesia tardia a longo prazo. Dentro desta classe farmacológica, existea clozapina, inibidor inespecífico de receptores dopaminérgicos e serotoninérgicos que demonstrou importantes resultados em amenizar o comportamento agressivo dos pacientes e uma melhora nos sintomas negativos da esquizofrenia e nos tiques comportamentais13.

Buspirona e clonidina, agonistas parciais dos receptores de serotonina e noradrenalina, respectivamente, demonstraram ser uma alternativa para amenizar o comportamento de hiperatividade dos autistas, necessitando ainda de estudos de curva de dosagem visando minimizar os efeitos colaterais observados. Em contrapartida, a naltrexona, um antagonista opióide, é comumente utilizado no controle da auto agressividade, indicando uma melhora também da hiperatividade, sendo seu uso restrito devido aos riscos de dependência, dentre outros efeitos 5.

Pequenos estudos feitos a partir da administração de olanzepina, quetiapina e ziprazidona indicaram que esses fármacos podem agir de forma semelhante à risperidona quanto ao surgimento de efeitos colaterais. A clomipramina,um antidepressivo tricíclico bloqueador não seletivo da recaptação da serotonina, demonstrou eficácia ao reduzir os sintomas e comportamentos obsessivos compulsivos no autismo induzindo, porém ao risco de surgimento dearritmias cardíacas2.

Os avanços na área da psicofarmacologia mostram uma incessante busca pelo conhecimento e uma grande quantidade de estudos ainda sendo realizados. A partir disso, é possível que se faça um controle dos sintomas e sinais do autismo, cada qual à sua necessidade, proporcionando aos pacientes e seus familiares uma melhor qualidade de vida, visto que as possibilidades de modificações essenciais e o surgimento de uma cura ou tratamentos eficazes ainda encontram-se longe da nossa realidade 5.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Vários estudos confirmam que existe uma interação dos níveis alterados da serotonina com os sintomas clínicos do transtorno do espectro autista, uma vez que este neurotransmissor regula comportamentos de ansiedade, agressividade e sono através do sistema serotonérgico, fazendo assim uma correlação de que alterações nestas vias centrais seriam responsáveis pelo desenvolvimento do comportamento característico do autista. Apesar de todos os estudos acerca do TEA e serotonina, não se pode afirmar qual a origem da alteração dos níveis deste neurotransmissor, tanto na hiperserotonemia plasmática quanto na hiposerotonemia cerebral, até mesmo sem haver uma explicação factual sobre uma possível relação entre as duas condições.

É importante ressaltar que novos estudos se fazem necessários diante do crescente número de crianças autistas, para que seja possível o surgimento de tratamentos mais eficazes e com menos efeitos colaterais, para que os pacientes autistas possam ter uma qualidade de vida melhor e uma melhor participação na sociedade em que vivem.

5. REFERÊNCIAS

1 MORANT, A.; MULAS, F.; HERNÁNDEZ, S. Bases neurobiológicas del autismo. Rev Neurol Clin, v. 2, n. 1, p. 163-71, 2001.

2 GADIA, C. A.; TUCHMAN, R.; ROTTA, N. T. Autismo e doenças invasivas de desenvolvimento. Jornal de pediatria, v. 80, n. 2, p. 83-94, 2004.

3 ONUBR. Organização das Nações Unidas. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/rejeitar-pessoas-com-autismo-e-um-desperdicio-de-potencial- humano-destacam-representantes-da-onu>. 2016.

4 ASSUMPÇÃO JR, F. B.; PIMENTEL, A. C. M. Autismo infantil. Brazilian Journal of Psychiatry, v. 22, p. 37-39, 2000. ISSN 1516-4446.

5 MERCADANTE, M. T. Farmacoterapia do distúrbio autista. Assumpção Jr FB. Transtornos Invasivos do desenvolvimento Infantil. São Paulo. Lemos Editorial & Gráficos LTDA, 1997.

6 ADAMSEN, D. et al. Autism spectrum disorder associated with low serotonin in CSF and mutations in the SLC29A4 plasma membrane monoamine transporter (PMAT) gene. Molecular autism, v. 5, n. 1, p. 43, 2014. ISSN 2040-2392.

7 MECCA, T. P. et al. Rastreamento de sinais e sintomas de transtornos do espectro do autismo em irmãos. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, v. 33, n. 2, p. 116-120, 2011.

8 SACREY, L.-A. R.; BENNETT, J. A.; ZWAIGENBAUM, L. Early infant development and intervention for autism spectrum disorder. Journal of child neurology, v. 30, n. 14, p. 1921-1929, 2015. ISSN 0883-0738.

9 SILVA, M.; MULICK, J. A. Diagnosticando o transtorno autista: aspectos fundamentais e considerações práticas. Psicologia: ciência e profissão, v. 29, n. 1, p. 116-131, 2009. ISSN 1414-9893.

10 MACHADO, R. M. G.; FREIRE, V. H.; SILVA, P. C. Alternativas Tecnológicas para o Controle Ambiental em Pequenas e Médias Indústrias de Laticínios. Belo Horizonte: 1 – 10 p.

11 VASCONCELLOS-SILVA, P. R.; CASTIEL, L. D.; GRIEP, R. H. A sociedade de risco midiatizada, o movimento antivacinação e o risco do autismo. Ciência & Saúde Coletiva, v. 20, p. 607-616, 2015. ISSN 1413-8123.

12 MULLER, C. L.; ANACKER, A. M.; VEENSTRA-VANDERWEELE, J. The serotonin system in autism spectrum disorder: from biomarker to animal models. Neuroscience, v. 321, p. 24-41, 2016. ISSN 0306-4522.

13 NIKOLOV, R.; JONKER, J.; SCAHILL, L. Autismo: tratamentos psicofarmacológicos e áreas de interesse para desenvolvimentos futuros Autistic disorder: current psychopharmacological treatments and areas of interest for future developments. Rev Bras Psiquiatr, v. 28, n. Supl I, p. S39-46, 2006.

14 FÁVERO, M. A.; SANTOS, M. D. Autismo infantil e estresse familiar: uma revisão sistemática da literatura. Psicologia: reflexão e crítica, v. 18, n. 3, p. 358-369, 2005.

15 FERNANDES, F. D. et al. Fonoaudiologia e autismo: resultado de três diferentes modelos de terapia de linguagem. Pró-Fono, v. 20, n. 4, p. 267-72, 2008.

16 GERSHON, M. serotonin receptors and transporters—roles in normal and abnormal gastrointestinal motility. Alimentary pharmacology & therapeutics, v. 20, p. 3-14, 2004. ISSN 0269-2813.

17 JANUŠONIS, S. Origin of the blood hyperserotonemia of autism. Theoretical Biology and Medical Modelling, v. 5, n. 1, p. 10, 2008. ISSN 1742-4682.

18 DALY, E. et al. Response inhibition and serotonin in autism: a functional MRI study using acute tryptophan depletion. Brain, v. 137, n. 9, p. 2600-2610, 2014. ISSN 1460-2156.

19 DO PRADO-LIMA, P. A. S. Tratamento farmacológico da impulsividade e do comportamento agressivo. Rev. Bras. Psiquiatr., v. 31, p. S58-S65, 2009.

20 CHUGANI, D. Role of altered brain serotonin mechanisms in autism. Molecular psychiatry, v. 7, n. S2, p. S16, 2002. ISSN 1476-5578.

21 TANAKA, M. et al. Brain hyperserotonemia causes autism-relevant social deficits in mice. Molecular autism, v. 9, n. 1, p. 60, 2018. ISSN 2040-2392.

22 ROBSON, M. J. et al. p38α MAPK signaling drives pharmacologically reversible brain and gastrointestinal phenotypes in the SERT Ala56 mouse. Proceedings of the National Academy of Sciences, v. 115, n. 43, p. E10245-E10254, 2018. ISSN 0027-8424.

23 WILLIAMS, K. et al. Selective serotonin reuptake inhibitors (SSRIs) for autism spectrum disorders (ASD). Cochrane Database of Systematic Reviews, n. 8, 2013. ISSN 1465-1858.

[1] Graduanda em Biomedicina na Faculdade de São Lourenço – UNISEPE.

[2] Graduanda em Biomedicina na Faculdade de São Lourenço – UNISEPE.

[3] Fisioterapeuta, mestre e doutora em Fisiologia e Farmacologia UFMG, Professora da Faculdade de São Lourenço – UNISEPE.

[4] Biólogo, mestre e doutor em Fisiologia e Farmacologia UFMG, Professor da Faculdade de São Lourenço – UNISEPE.

Enviado: Agosto, 2019.

Aprovado: Outubro, 2019.

5/5 - (1 vote)
Marcelo Limborço Filho

2 respostas

  1. Olá Dr, li seu artigo e gostaria de pedir sua opinião. Tenho um filho autista de 5 anos. Não verbal. Sem agressividade. Dorme bem a noite, entre 8 a 9 horas. Porém o sono da tarde ainda persiste. Mesmo estando num parque de diversões chega um miomento q ele cansa, simplesmente deita no Chao, se não tiver ligar apropriado, e cai num sono profundo. Pode estar associado a falta se seratonina ? Algum exame especifico poderiamos fazer para averiguar isso ? Quais medicamentos podem ser usados para que ele tenha mais concentração, disposição?

  2. Olá Aline, a falta de serotonina que abordamos no artigo é cerebral, então não temos um exame para verificar, somente a serotonina disponivel no sangue é passível de ser dosada.
    Existem sim alguns medicamentos que disponibilizam a serotonina por mais tempo no cerebro, aumentando assim os níveis da mesma. O médico que acompanha seu filho deve avaliar esses sintomas e prescrever um que seja compatível com a clínica.

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