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Relações éticas entre psicanálise e linguagem

RC: 52455
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/psicologia/psicanalise-e-linguagem

CONTEÚDO

ENSAIO TEÓRICO

CASTILHO, Daniel de Souza [1]

CASTILHO, Daniel de Souza. Relações éticas entre psicanálise e linguagem. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 06, Vol. 06, pp. 26-31. Junho de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso:  https://www.nucleodoconhecimento.com.br/psicologia/psicanalise-e-linguagem, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/psicologia/psicanalise-e-linguagem

RESUMO

Este trabalho tem por finalidade criar reflexões sobre possíveis relações éticas entre psicanálise e linguagem. Para isso, revisam-se os referidos conceitos, em busca de possíveis relações em sua aplicação no real. No uso da linguagem, passa-se pela formação discursiva ideológica do sujeito enquanto reprodutor e produto de seu tempo. E na psicanálise, a constitutividade angustiante do sujeito atravessado pelos modos inconscientes de ser que o impulsiona para o movimento psíquico. Ao final, conjectura-se que a consciência é consequência das inúmeras experiências acumuladas no inconsciente ao longo do tempo e que a linguagem é sua forma mais objetiva de manifestação, sendo impreciso pretender uma postura ética propriamente dita, tendo em vista os inúmeros determinantes que afetam o sujeito.

Palavras-chave: Psicanálise, linguagem, inconsciente, ética, sujeito.

1. INTRODUÇÃO

Para trabalhar as referidas áreas de conhecimento, vale ressaltar, para fins de esclarecimento, o que Freud denominou de terceiro corte narcísico (primeiro corte, heliocentrismo, segundo corte, evolucionismo) da ideia sobre o homem moderno naquele período histórico, ou seja, um homem enquanto suposto senhor de si e de suas ações. Assim, Chaves citando Freud (2008) afirmará que se trata de um novo corte na ilusão como forma de substituir a racionalidade, uma cisão no narcisismo do ser humano exaltado, em referência a sua destrutividade e ao seu sofrimento constante.

A psicanálise é como o próprio nome diz, a análise da mente, um método de investigação a fim de evidenciar o significado inconsciente das ações, palavras e produções imagéticas de um sujeito. (LAPLANCHE e PONTALIS, 1992).

Na medida em que Freud compreende e aprofunda seu conhecimento sobre o funcionamento psíquico do ser humano, percebe que havia uma instância constitutiva neste que era inacessível sem que um trabalho analítico interpretativo fosse desenvolvido, o inconsciente. Vislumbrou a magnitude deste e sua força determinante na vida do sujeito.

Dito isto, entende-se a psicanálise como uma forma criativa de análise da mente que se utiliza dos sentidos discursivos de seus analisandos para buscar o alívio da sintomatologia que este possui.

Na medida em que o ser humano é inserido na lógica social e suas significações, compulsivamente introjeta os inúmeros modos de ser, vinculando-se a papéis social e historicamente construídos no decorrer do tempo. Deste modo, como depreende-se a relação entre psicanálise e linguagem como forma de constituição e reprodutividade do sujeito?

Os papéis sociais, ou melhor, as formações discursivas reproduzidas pelo sujeito estão vinculadas a modos ideológicos definidos como práticas sociais produtoras e reprodutoras de sentido. Esses discursos são formas de o sujeito existir através de um contexto ou um lugar social e historicamente determinado, como indica Pêcheux citado por Silva e Rodrigues (2017).

A linguagem analisa os inúmeros sentidos dos discursos socialmente construídos e a psicanálise mantem como prioridade a dimensão angustiante deste sentido. O problema da angústia centralizou a atenção de Freud, desde seus primeiros escritos psicanalíticos, até às reformulações feitas em 1926 no livro Inibição, Sintoma e Angústia […].” (ROCHA, 2016, p. 141).

Nesses termos, a ciência da linguagem constitui-se como a ciência que estuda a expressão dos sentidos, a maneira pela qual se processam os inúmeros meios de comunicação. Sendo os fenômenos da dimensão do discurso desencadeados na expressão dos sentidos o próprio objeto da análise freudiana relaciona-se com a produção discursiva na linguagem?

2. IDEOLOGIA, DISCURSO E ÉTICA

A ideologia é uma relação imaginária que os homens mantêm com suas condições reais de existência, e o discurso é uma produção socialmente determinada, como afirma Mussalim citando Pêcheux (2018), assim, reitera-se a existência de aspectos éticos deste fenômeno que é a linguagem. Uma ética relacionada à linguagem perpassa pelo conhecimento psicanalítico.

Sendo a psicanálise utilizada como ferramenta de reelaboração deste discurso produzido e reproduzido pelo sujeito, até que ponto um comportamento ético poderia estar atrelado a um conhecimento profundo desse atravessamento pela linguagem que não lhe pertence, mas lhe corta a existência sem que este tenha tempo suficiente para aperceber-se em seu assujeitamento? Ao saber-se enquanto ser cognoscível o sujeito entende-se inserido em um lugar no qual se constitui como produto e produtor da realidade social e psíquica.

Parece difícil vincular uma ética no sentido congruente das ações, na medida em que essas ações respondem a uma lógica social. Mas Abbagnano (2007) expõe uma definição de ética como ciência da conduta, constatando que na antiguidade havia duas concepções fundamentais: i) que entende a ética como a ciência do fim cujas ações ou condutas do homem devem ser orientadas, e a dos meios para atingir tal fim, de modo a vincular esta conduta à natureza do ser humano; ii) que considera a ética como a ciência do móvel ou movimento da conduta humana, e que determina tal movimento com a finalidade de disciplinar sua conduta no mundo.

Pode-se ainda, frente à definição de ética anterior, fazer outras indagações: se o sujeito não percebe seu próprio assujeitamento, seria possível uma ética da linguagem? Não seria irrelevante ter desenvolvido a tomada de consciência se a dimensão do sem sentido foge da capacidade limitada de apreender o real?

Por mais que o ser humano se esforce, não há como exercer um comportamento legitimamente ético no sentido forte do termo, de sorte que a linguagem comunica aquilo que subjaz a realidade, sendo assim, sempre impossível atingir o real.

Para Lacan citado por Chaves (2006) o real é aquilo ou o que escapa à simbolização na relação do sujeito com algo que tenta mas não consegue se manifestar. Este sendo inalcançável há apenas a aparência daquilo que se diz verdadeiro.

Sem a verdade legítima das ações éticas por excelência, não há ética, mas sim, uma vinculação acumulada de sentidos historicamente construídos ao longo do tempo que se reproduzem em conexões existenciais, de modo que nunca cessarão de não serem expressos em sua plenitude.

No entanto, é possível que uma ética se exerça por mais determinado que um sujeito possa ser em relação ao seu contexto sócio-histórico-cultural; um exercício mínimo de autonomia frente aos seus condicionantes associados à realidade. É verdadeiro afirmar que desejar não querer é o mesmo que não querer. Entender a origem das causas mais próximas das ações e interpelar-se forçosamente um comportamento contrário poderia viabilizar um exercício autônomo, como afirma Espinosa (1983).

No entanto, o ímpeto pela ação continuaria sendo a ação oposta, logo, o dilema ético estabelecido na relação entre fazer o que se deseja, e não fazer o que se deseja, continuaria existindo no interior desta mente reprodutora. A verdade ética das ações se expressaria apenas no plano da realidade, mas não na dimensão cognitiva.

Na dimensão individual, parece coerente buscar o que se deseja. Nietzsche afirmaria: “a tua virtude é a saúde da tua alma” (2006, p. 135). No entanto, é possível negar a existência do indivíduo no sentido mais preciso do termo, de sorte que este é produto de um atravessamento de formações discursivas.

O sujeito é um emaranhado de significações que ao serem expressas, alocam sua existência a um grupo com quem este se identifica ideologicamente. É como se não houvesse indivíduo e individuação, mas um processo de reprodução equiparado de formas de existir equivalentes e condizentes umas às outras sem que se possa destacar um ser único, uma unidade isolada e que subsista à dimensão material/contextual.

3. A TAREFA DA PSICANÁLISE E DA LINGUAGEM

Parece que restou à psicanálise ordenar o discurso procurando seu significado para o sujeito analisado. O discurso que não busca um espelhamento com o real tendo a verdade como objetivo é pura retórica. Se há uma dimensão ética na linguagem esta precisa ser expressa pela análise do sujeito já que a ela vincula-se um sentido atrelado ao ser humano, e não apenas a um sentido histórico-social (contudo, não menos importante).

A dimensão inconsciente que completa e justifica a constituição do ser não é apenas a história contextual, mas os inconscientes que lhe fora passado, não no sentido genético, mas um inconsciente histórico (filogenético) que passa a experiência subjetiva daquilo que não pode ser significado para o outro, e assim sucessivamente, na medida em que o sujeito vincula-se a linguagem.

Possivelmente equivalente ao inconsciente coletivo junguiano (2000), no entanto, de origem mais profunda, uma vez que este não corresponderia aos arquétipos e dentre outros atributos atrelados a esta teoria. Conjectura-se que sejam registros mnêmicos ou reminiscências, mas imprecisas e desvinculadas de qualquer possibilidade real de expressão.

Sendo o inconsciente aquilo que não pode ser de forma legítima e eticamente em sua finalidade expressado, a linguagem configura-se com uma das melhores ferramentas para abarcar essa dimensão do sujeito. E assim, entende-se que a linguagem nasce como forma de tentar dar sentido e expressar a história da existência humana armazenada com o tempo, e assim, criando a dimensão do inconsciente no ser humano.

Seria o inconsciente a história do acúmulo de eras de existência humana onde a linguagem não possuía a complexidade que possui atualmente, logo, não havendo vazão; e assim, não havia capacidade de significação.

O inconsciente pode ser a mais pura e imanente pulsão das experiências de vida que não cessa porquê não possui este atributo, e por isso não é passível de significação mais sim de ab-reação, como justifica a teoria psicanalítica em Freud (1996).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Deste modo, entende-se que a consciência é fruto da tomada do inconsciente e que a existência deste pressupõe a existência daquele. É possível que somente haja consciência porquê o inconsciente foi armazenado no decorrer do tempo por conteúdos e experiências que não tinham possibilidade de significação, sendo assim, reproduzidos em relações transferenciais e atualizações nos outros seres humanos, criando um terreno para o surgimento da consciência humana que se manteve, por um tempo impreciso, pulsante e latente.

Na impossibilidade de manter essa latência integral, o inconsciente impulsionou o ser humano para a consciência, mapeando e recortando a realidade através da linguagem, que agora passa a ser ferramenta indispensável na manutenção da existência.

Aparentemente, o que foi vivido em toda a história da humanidade não cabe na dimensão consciente, logo, não é passível de significação, mas atinge uma aproximação que é suficiente para o surgimento de outras formas de expressão como as artes, a estética, a sublimação, dentre outras.

A ética entre a linguagem e a psicanálise é uma possibilidade pequena de refazer a origem das causas das ações do sujeito e imputar-lhe um ínfimo exercício de autonomia frente às inúmeras determinações sócio-histórico-culturais pelas quais assujeita-se o ser humano.

A linguagem é uma das principais causas do ser, a sua grande conquista enquanto capacidade de compreensão e dominação da realidade, e equivalentemente, é a prova da sua maior dificuldade frente à história do sujeito que não cansa de tentar dar sentido ao sem sentido, nunca galgando pleno êxito.

5. REFERÊNCIAS

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. Tradução coordenada e revista por Alfredo Bosi. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

CHAVES, Messias Eustáquio. Cortes e efeitos: a psicanálise é o efeito de um corte. Reverso, Belo Horizonte, v. 30, n. 55, p. 65-72, jun. 2008. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102- 73952008000100007&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 26 nov. 2019.

CHAVES, Wilson Camilo. O estatuto do real em Lacan: dos primeiros escritos ao seminário VII, a ética da psicanálise. Paidéia (Ribeirão Preto), Ribeirão Preto, v. 16, n. 34, p.    161-168,               Aug.                   2006.                      Disponível            em:<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103- 863X2006000200004&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 26 nov. 2019.

ESPINOSA, B. Os pensadores. São Paulo: Abril, 1979.

FREUD. (1905) Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, vol. VII. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

JUNG, Carl Gustav. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Tradução Maria Luíza Appy, Dora Mariana R. Ferreira da Silva. Perrópolis: Vozes, 2000.

LAPLANCHE, J; PONTALIS, J. B. Vocabulário da psicanálise. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

MUSSALIM, Fernanda. Linguística: análise do discurso. 2018. (25m43s). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=FXi9oc2lgso&t=343s>. Acesso em: 26 nov. 2019.

NIETZSCHE, Friedrich. A gaia ciência. Trad. Antônio Carlos Braga. São Paulo: Editora Escala, 2006.

SILVA, Valter Souza da et RODRIGUES, Marlon Leal. Análise do discurso: a caminhada de Pêcheux, e conceitos basilares da teoria. INTERLETRAS, ISSN Nº 1807-1597. V. 6, Edição número 25, Abril/Setembro 2017.

[1] Aluno Especial da Disciplina Linguagem e Psicanálise do Programa de Pós-Graduação-PPGL, do curso de Mestrado em Letras da Universidade Federal do Amazonas-UFAM. Especialista em Dependência Química pela Faculdade Venda Nova do Imigrante e em Didática do Ensino Superior pela Universidade Nilton Lins. Graduado em Psicologia pela Universidade Nilton Lins e Filosofia pela Universidade Federal do Amazonas-UFAM.

Enviado: Novembro, 2019.

Aprovado: Junho, 2020.

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Daniel de Souza Castilho

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