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A estimulação precoce como intervenção no tratamento da criança autista

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CONTEÚDO

ARTIGO DE REVISÃO

NUNES, Mardeli dos Santos [1], KESSLER, Élide Ávila [2]

NUNES, Mardeli dos Santos. KESSLER, Élide Ávila. A estimulação precoce como intervenção no tratamento da criança autista. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 02, Vol. 01, pp. 05-21. Fevereiro de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/psicologia/estimulacao-precoce

RESUMO

 Este artigo descreve estudos sobre autismo e estimulação precoce. O autismo é considerado síndrome sem fator único determinante, composto por fatores genéticos, orgânicos e função materna. A estimulação precoce consiste na prática clínica interdisciplinar que intervém com crianças de zero a três anos com risco para o desenvolvimento psíquico e sinais de autismo. Objetivos: Verificar a contribuição da estimulação precoce como intervenção no tratamento da criança autista; Discutir sobre os achados bibliográficos da estimulação precoce no tratamento do autismo. Método: Revisão de literatura narrativa com viés psicanalítico. Foram utilizadas obras clássicas e base de dados PePSIC, CAPES, revistas APPOA, Site do Centro Lydia Coriat e Site do Ministério da Saúde. Resultados: Constatou-se que a estimulação precoce poderá contribuir no tratamento da criança que apresenta sinais de riscos para autismo em idade de 0 a 3 anos, possibilitando a constituição do sujeito psíquico sem desconsiderar os aspectos estruturais e instrumentais nessa fase do desenvolvimento infantil. Conclusão: A estimulação precoce poderá contribuir no tratamento da criança autista, evitando ou diminuindo déficit cognitivo, sensorial, motor, social e linguístico, pois considera o tempo de maturação das estruturas orgânicas e psíquicas que favorecem a constituição do sujeito, proporcionando melhor qualidade de vida à criança e aos familiares.

Palavras-chave: Autismo, estimulação precoce, intervenção.

INTRODUÇÃO

A pessoa com autismo poderá ter sérios comprometimentos na área da linguagem e interação social, apresentando movimentos motores estereotipados, atípicos e repetitivos; rotina ritualizada e rígida; insistência de hábitos sensorial, deficiência nos aspectos emocionais e fala segundo o Ministério da Saúde, Brasil (2014). As primeiras descrições do Autismo Infantil Precoce (AIP) foram feitas pelo psiquiatra Léo Kanner na década de 40 após observar algumas características comuns como isolamento extremo, comportamentos atípicos e distúrbios de linguagem aparente nos primeiros anos de idade da criança conforme Jerusalinsky (2012). Ressaltando que tais distúrbios afetam a função primordial de reconhecimento recíproco, causando a exclusão do outro. Seguindo esta linha, a estimulação precoce é uma prática clínica interdisciplinar, que intervêm com crianças de zero a três anos de idade, que apresentam algum problema em seu desenvolvimento orgânico e psíquico, fornecendo-lhe condições de constituir-se como sujeito (JERUSALINSKY, 2002).

Diante da singularidade do autismo, entende-se como um verdadeiro desafio aos profissionais que atendem crianças autistas. Sendo assim, a relevância desse estudo se dá em aprofundar o conhecimento sobre EP (Estimulação Precoce) no autismo infantil, na qual se utiliza abordagem psicanalítica, que prioriza um período fundamental na constituição do sujeito psíquico. A questão central dessa pesquisa consiste em, como a estimulação precoce poderá contribuir no tratamento do autismo. Tendo como objetivos verificar a contribuição da EP no tratamento da criança autista e discutir os achados bibliográficos sobre EP no tratamento do autismo.

Essa é uma pesquisa de revisão seletiva e não sistemática da literatura, que utilizou- se autores clássicos contemporâneos como Alfredo Jerusalinsky e Julieta Jerusalinsky, além de outros autores que discorrem na pesquisa, artigos e revistas nos portais PePSIC, CAPES, APPOA, Site do Centro Lydia Coriat e Site do Ministério da Saúde. Para realizar a busca nos portais online, utilizaram-se as palavras chaves: autismo, estimulação precoce, delimitando publicações a partir de 2014, em português. Após leitura seletiva, foram escolhidos apenas os que vinham ao encontro do tema da presente pesquisa e escritos através do viés psicanalítico.

Nesse estudo é abordado primeiramente o autismo, diagnóstico, etiologia e tratamento; a estimulação precoce, o bebê, o terapeuta em EP e, na sequência, uma discussão à luz dos objetivos dessa pesquisa, concluindo-a.

AUTISMO

O tema autismo, desde sua origem há mais de 70 anos, tem sido pauta de interesse por várias especialidades devido à sua grande complexidade diagnóstica. Sibemberg (1998) e Jerusalinsky (2012) citam o trabalho do psiquiatra Léo Kanner, que em 1943 utilizou o termo distúrbios autísticos do contato afetivo para descrever comportamentos que observou em um grupo de crianças que apresentavam isolamento extremo, dificuldades nas relações interpessoais, estereotipias gestuais, distúrbios de linguagem, entre outros, sendo que tais distúrbios aconteciam precocemente nos primeiros anos de idade. “Desde então, muito se tem debatido em torno da etiologia, dos critérios diagnósticos e do tratamento do autismo infantil”. Sibemberg (1998, p. 60). O autismo também pode ser definido como primário e secundário, conforme descreve Jerusalinsky (2012, p. 65) “inicialmente distinguiu-se autismo inato – que se chamou de ‘primário’- e autismo adquirido – que se denominou ‘secundário”. O autor explica que o primário são os inatos (nascem com ele), de origem genética ou de uma estrutura neurológica falha, já os secundários são os adquiridos por consequências de alguma doença.

Na obra, Psicanálise do Autismo de Jerusalinsky (2012), o autor relata que Léo Kanner foi o primeiro a denominar o autismo como uma síndrome, gerando discussões em torno do diagnóstico, causalidades e intervenções até então. Também ressalta que a partir da publicação dos estudos do psiquiatra, as mães passaram a serem vistas como culpadas por seus filhos serem autistas, levando-o mais tarde a se retratar em seu livro em defesa das mães. No entanto, para a psicanálise é considerada a função do agente materno e não da mãe na relação mãe – filho. O psicanalista explica que a função materna não corresponde obrigatoriamente à mãe biológica, mas “a que sustenta para a criança a possibilidade de seu reconhecimento apesar das variações semânticas que o pequeno bebê é incluído” (JERUSALINSKY, 1998, p.40 e JERUSALINSKY et al, 1999, p.186).

Segundo Adurens e Melo (2017), nos dias atuais existem várias abordagens com diferentes enfoques em relação ao diagnóstico de autismo, gerando uma certa polêmica em torno desse assunto. Alguns autores referem-se a uma epidemia diagnóstica do autismo infantil precoce (AIP), no qual consideram que uma das causas seja a nova classificação do Transtorno do Espectro Autista (TEA), que contribuiu para o aumento de pessoas com esse diagnóstico. Jerusalinsky (2017), afirma que vem aumentando consideravelmente o número de crianças de um a três anos de idade diagnosticadas com suspeita de TEA. A autora considera que grande parte é consequência da expansão das categorias diagnósticas do DSM- V, que passou a englobar quadros distintos entre si, fazendo do TEA um grande guarda-chuva. No entanto enfatiza, “ é preciso sim detectar dificuldades para intervir a tempo favorecendo a constituição, […] o melhor diagnóstico para encaminhar a uma intervenção precoce é, ‘não está bem’ e ponto”. (JERUSALINSKY, 2017, p. 33).

De acordo com o Ministério da Saúde, Brasil (2016), a pessoa com TEA exibe características de comprometimento global em diversas áreas, especialmente na comunicação e interação social, apresentando estereotipias e interesses restritos. Essas características geralmente são percebidas antes dos três anos de idade, sendo mais comuns em meninos. Atualmente no DSM- V, o TEA abrange condições únicas que antes eram diferenciadas como autismo e síndrome de Asperger, utilizando-se de categorias descritivas e não etiológicas, sendo também considerados como transtornos mentais.

O Ministério da Saúde, conforme Brasil (2016), evidência estudos que quantificam tais critérios diagnósticos, conforme a seguinte citação:

 […] estudos recentes sugerem que aproximadamente 70% desses indivíduos também preencham critério diagnóstico para pelo menos um outro transtorno mental ou de comportamento (frequentemente não reconhecido) e 40% preencham critério diagnóstico de pelo menos outros dois transtornos mentais, principalmente ansiedade, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e transtorno desafiador de oposição […]. (BRASIL, 2016, p.02).

Considerando tal complexidade diagnóstica do TEA, faz se necessário uma equipe multidisciplinar com experiência clínica, além de testes e exames, respeitando diagnósticos diferenciados devido à grande variação dos sintomas, no qual requer informações detalhadas de comportamentos em diferentes ambientes, como familiar e escolar. (BRASIL, 2016).

No Brasil, foi sancionada a lei 13.438 que altera o estatuto da criança e do adolescente (ECA). Essa lei tem como objetivo tornar obrigatório, na atenção básica do sistema único de saúde (SUS), a implantação de um protocolo que, segundo o Ministério da Saúde, Brasil (2017, s/p.), “estabeleça padrões na avaliação de riscos para o desenvolvimento psíquico infantil”. Proporcionando a identificação precoce, logo nos primeiros meses de idade, se há riscos para o desenvolvimento da criança, possibilita o diagnóstico e o tratamento precoce. A caderneta da criança também é vista pelo Ministério da Saúde como instrumento de orientação, sendo que “em toda consulta o profissional de saúde deve avaliar e orientar sobre diversos elementos do desenvolvimento, inclusive psíquico, contendo sessão específica voltada para triagem de sinais de autismo”. (BRASIL, 2017, s/p.).

O centro Lydia Coriat[3], em julho de 2017, publicou uma carta de apoio a lei 13.438 aprovada, citando um trecho da mesma, conforme segue:

 5º. É obrigatória a aplicação a todas as crianças, nos seus primeiros dezoito meses de vida, de protocolo ou outro instrumento construído com a finalidade de facilitar a detecção, em consulta pediátrica de acompanhamento da criança, de risco para o seu desenvolvimento psíquico. (CENTRO LYDIA CORIAT, 2017, s/ p.).

Tendo em vista a importância de constatar precocemente algumas dificuldades psíquicas no bebê sem transformar em patologia, com o IRDI (Indicadores Clínicos de Risco para o Desenvolvimento Infantil) isso será possível. Também cabe ressaltar a participação do psicanalista Dr. Alfredo Jerusalinsky e da Prof. Dra. Maria Cristina Kupfer nas pesquisas que possibilitaram a “construção e validação do IRDI e que contou com apoio e aprovação do CNPQ[4], do Ministério de Saúde e da FAPUS[5] (CENTRO LYDIA CORIAT, 2017, s/ p.). O IRDI é um questionário que aponta sensibilidade para indicar sinais do “transtorno do espectro autista, sendo recomendado, no entanto, a utilização de mais de um instrumento para a segurança e melhor assertividade nos encaminhamentos” Adurens e Melo, (2017, p.160). Com a utilização do IRDI na identificação precoce dos sinais de risco que venham interferir na constituição do sujeito, é possível encaminhar à intervenção precoce o mais cedo possível, antes que se instale uma patologia. (ADURENS; MELO, 2017; CENTRO LYDIA CORIAT, 2017).

ETIOLOGIA

No que diz respeito à etiologia, segundo Jerusalinsky (2013), não há nenhum fator único determinante do autismo, as causas diferem de um sujeito para outro por haver componentes genéticos, orgânico e função materna, sendo considerado também que alguns comportamentos são globais em grande parte dos casos, embora exista a singularidade de cada sujeito. O autor destaca as hipóteses causais, seguindo a classificação etiológica como primários e secundários. Os primários referem-se às hipóteses de transtornos específicos de linguagem, de genética- neurológica e psicanalítica (transtornos nos processos de construção do sujeito psíquico), e os secundários referem-se às deficiências sensoriais, a danos cerebrais e ruptura brusca dos vínculos primários, que são essências para o desenvolvimento saudável.

Conforme Sibemberg (1998, p.60), “o autismo não é uma doença única, mas uma síndrome que envolve diferentes variáveis etiológicas, podendo ter associação com diferentes doenças”. Apresenta déficits na linguagem, interação social e no simbólico/ imaginário, cujas pesquisas realizadas no campo da medicina, psicologia e psicanálise concordam que há basicamente um distúrbio de linguagem no autismo. O autor salienta que a psicanálise considera a linguagem como base da constituição do sujeito psíquico, o Outro é o primeiro na função materna que “através do olhar, do toque, da palavra, engata a criança em um circuito de desejo […] vai construindo seus referentes imaginários e simbólicos, regulando um funcionamento corporal que transforma um corpo puramente orgânico em corpo erógeno” (SIBEMBERG, 1998, p. 65). A função materna é compreendida como uma troca recíproca entre a mãe e seu filho de forma inconsciente e com o meio que ocorre espontaneamente, mas quando há um déficit na constituição psíquica do bebê em apoderar-se dos registros subjetivos nessa relação, ocorre um desencontro, um desequilíbrio que poderá trazer sérios prejuízos para criança, na área da linguagem e na sua constituição como sujeito psíquico (JERUSALINSKY et al., 1999 e JERUSALINSKY, 2012).

O autismo se caracteriza por déficits na formação das redes de linguagem, sendo que algumas crianças apresentam retardos afásicos (perda completa da linguagem), disfásicos (prejuízos, dificuldade de linguagem) e, em alguns casos raros, retardos anártricos (alterações no nível de fonemas e palavras, sendo leve, moderado ou severo). Tais transtornos linguísticos afetam a função primordial do reconhecimento recíproco, causando a exclusão do outro e o isolamento externo da criança autista com o meio, conforme Jerusalinsky (2012). Referindo-se à etiologia do autismo como o “fechamento da porta de entrada na linguagem que é a função ‘primordial de reconhecimento’, cujo fracasso pode obedecer às causas mais diversas” Jerusalinsky (2012, p.63). No entanto, o autismo consiste principalmente no fracasso da construção das redes de linguagem e o predomínio de automatismos. Então o autor destaca as três estruturas psíquicas que a psicanálise trabalha nas psicopatologias, ou seja, neurose, psicose e perversão, sendo que em cada uma delas o sujeito apresenta dificuldades para conciliar seus desejos com a realidade. Argumentando que o autista não se encaixa em nenhuma dessas estruturas, pois o autismo se apresenta como uma ausência de sujeito.

[…] coloca para a psicanálise o problema de como estabelecer uma estrutura […] que se encontra fora da linguagem, na medida em que sabemos que o inconsciente está estruturado como uma linguagem. […] a prevalência dos automatismos cria um mecanismo de exclusão da criança a respeito da linguagem. É por isso que os autistas desviam seu olhar, não de qualquer coisa, mas especificamente do outro semelhante, assim como se fazem de surdos não a qualquer som, mas especificamente ao outro falante. (JERUSALINSKY, 2012, p. 64.65).

Seguindo esse raciocínio, o autor supracitado enfatiza que para a psicanálise, embora de forma polêmica, o autismo é entendido como uma quarta estrutura, ou seja, a estrutura da exclusão. Os “[…] autistas podem apresentar condutas evitativas da comunicação com o outro, ativos ou passivos, como por exemplo: rechaço do contato humano em geral ou de alguma pessoa em particular” (FOSTER, 1999, p.256).

TRATAMENTO

“Apostar num sujeito é fundamental no tratamento do autismo”. Jerusalinsky (2012, p.31). O autor ressalta que é possível a cura na psicanálise, por tanto deve-se procurar o mais rápido possível por tratamento precoce, considerando os três primeiros anos de idade, principalmente no primeiro, pois as chances de cura serão maiores, independentemente do tipo de autismo, no entanto, se logo no início alegar possíveis causas genéticas e declarar a incurabilidade, estará ignorando as possibilidades dessa criança vir a se constituir como sujeito. O terapeuta psicanalítico deve considerar o funcionamento psíquico do sujeito, pois com o passar do tempo se torna fixo e irreversível, dificultando a permeabilidade e flexibilidade que se encontram antes do terceiro ano de idade. É possível desenvolver novas condições favoráveis à constituição psíquica da criança autista, no entanto, a partir do quarto ano de idade, já poderá ser tarde para acessar essa abertura e alcançar bons resultados. (JERUSALINSKY, 2012).

Foster (1999) defende a intervenção precoce e preventiva do autismo através de uma equipe interdisciplinar, de modo a impedir ou minimizar os danos neuropsíquicos, além de evitar que quadros autistas se consolidem. É essencial o tratamento com psicoterapia e farmacoterapia complementado com estimulação precoce, terapia psicomotora e reeducação, pois se deve considerar o tempo de maturação da criança.  O autor enfatiza a importância da função materna para um bom desenvolvimento e maturação neuropsíquica, pois se não houver estímulos adequados ou não forem percebidos pela criança, seu desenvolvimento poderá sofrer um desequilíbrio emocional e neurológico podendo desenvolver condutas autistas, no entanto “ a criança que não vê, ou vê muito pouco, não olha, não é olhada e assim se toca e se fala menos com ela, produzindo – se isolamento. Sabemos que, além do mais, a conduta autista gera atitudes autistas em sua volta, bem como na família” (FOSTER, 1999, p.253).

Segundo o Ministério da Saúde, Brasil (2014), é de extrema importância buscar por tratamento precoce logo nos primeiros sinais de problemas do desenvolvimento infantil, proporcionando melhores resultados as terapias. O primeiro ano de idade da criança é considerado fundamental na plasticidade das estruturas cerebrais, nas conexões neuronais e na constituição psicossocial. É essencial intervir precocemente em casos de sinais que possam ser associados ao TEA, até o terceiro ano de idade. Considerando que não há psicofarmacos específicos para o autismo, apenas para tratar os sintomas e condições associadas a ele, “que acabam interferindo na aprendizagem, socialização, saúde e qualidade de vida” (BRASIL, 2016, p.7).

ESTIMULAÇÃO PRECOCE

“Estimulação precoce? O que isso quer dizer? É uma pergunta escutada inúmeras vezes por aqueles que se dedicam a tal intervenção clínica” (JERUSALINSKY, 2002, p.21). Trata-se de uma especialidade clínica que teve início com a Drª. Lydia Coriat em Buenos Aires e, na década de 1978 implementou-a no Brasil. Desde então se trabalha com bebês e crianças pequenas que apresentam problemas de desenvolvimento infantil. Nessa época os médicos e as famílias passaram a obter diagnósticos orgânicos, cada vez mais precoces, e não havia uma intervenção clínica de modo isolado que conseguisse atender os bebês com tal particularidade, viabilizando assim, o surgimento da clínica interdisciplinar em estimulação precoce (JERUSALINSKY, 2002). Seguindo esse conceito, o Centro Drª Lydia Coriat em Buenos Aires e Porto Alegre, utiliza-se da prática interdisciplinar em estimulação precoce, visando ao estímulo das funções psíquicas do sujeito, estimulando as já existentes e possibilitando novas condições a partir do nível em que se encontram. É preciso iniciar a estimulação antes dos três anos de idade, fazendo-se necessário observar e conhecer as fases do desenvolvimento infantil por parte do terapeuta, embora não seja uma técnica comportamental. (GORETTI; ALMEIDA; LEGNANI, 2014). A estimulação precoce consiste em restaurar, assegurar ou substituir a função materna, pois o terapeuta exerce a posição de um terceiro nessa relação mãe – bebê, no entanto é utilizado um terapeuta único para realizar as intervenções diretas com a criança, embora seja uma clínica interdisciplinar, pois entende- se que nesta fase do desenvolvimento, o bebê “ainda não tem uma diferenciação instrumental” (GORETTI; ALMEIDA; LEGNANI, 2014, p.421 e BONIATTI, 2016).

Para Boniatti (2016), a estimulação precoce consiste na formação psíquica do bebê sem desconsiderar os aspectos biológicos e estruturais desta fase do desenvolvimento, que é fundamental para a estimulação da neuroplasticidade em crianças com transtornos globais do desenvolvimento que não conseguem encontrar uma significação para si e o mundo externo. Algumas crianças com problemas na constituição psíquica apresentam condutas atípicas e estereotipadas, sendo importante a detecção e intervenção precoce o mais cedo possível, possibilitando uma reinscrição funcional da estrutura psíquica e menos chances da patologia se instalar plenamente.

Segundo Foster e Jerusalinsky (1999), a estimulação precoce é um método utilizado com crianças que apresentam problemas de desenvolvimento, podendo superar ou moderar seus efeitos, pois, se a criança receber a estimulação adequada, favorecerá sua maturação psíquica. Os autores destacam “os engramas constitucionais que incidem na relação mãe-filho, focos de observação para antecipar possíveis dificuldades, sendo os reflexos arcaicos, tônus musculares, sistemas posturais, gestualidade reflexa e os ritmos biológicos” (FOSTER, JERUSALINSKY, 1999, p.275). Portanto, a estimulação precoce se utiliza dessas experiências como via de acesso e elementos para reconstruir a relação da mãe com a criança.

A estimulação precoce, conforme Jerusalinsky et al. (1999), encontra uma fenda no desencontro da relação mãe-filho e no desejo dos pais em resolvê-lo, pois ao nascer um bebê com deficiência, os pais vivenciam o luto pela perda do filho idealizado, afetando profundamente a relação da mãe com o filho desconhecido, então se faz necessário reconstituir os aspectos deteriorados desse relacionamento, assegurando ou substituindo a função materna até que a mãe se restabeleça desta crise, pois o distanciamento prolongado da mãe poderá trazer prejuízos irreversíveis à criança, podendo até mesmo se instalar traços autistas.

A fragilidade desta criança não admite muita demora, uma vez que as consequências de um distanciamento materno podem ser graves e, se prolongadas por meses, irreversíveis. Sendo assim, podem se instalar ‘traços autistas’, pode se perder a oportunidade de moderar expressões patológicas no sistema nervoso e neuromuscular, características hipotônicas podem se acentuar e se transformar em mais permanentes ou pode se acentuar a lentidão de uma maturação já originalmente comprometida. (JERUSALINSKY et al., 1999, p.100).

Seguindo essa premissa, conforme Jerusalinsky (2002), a clínica de estimulação precoce age nos tempos primordiais do desenvolvimento infantil, intervindo nos aspectos estrutural (aparelho orgânico e psíquico) e instrumental (mecanismos que possibilitam a troca com o meio) dos bebês que apresentam um problema, sem se limitar a esperar por definição ou confirmação diagnóstica orgânica, pois se considera as condições de constituição da criança e não a patologia. A autora comenta que muitas vezes recebe bebês para estimulação, “aos quais os médicos percebem que ‘algo não está bem’, ainda que, exame após exame, não se encontre neles nenhum comprometimento orgânico de base” (JERUSALINSKY, 2002, p.36).  Também enfatiza a importância da clínica interdisciplinar por se tratar de bebês e crianças pequenas.

O Ministério da Saúde, conforme Brasil (2016), compreende a estimulação precoce como uma técnica sistemática e continua que se utiliza de vários recursos terapêuticos capazes de estimular a plasticidade cerebral, respeitando o tempo de maturação dos aspectos estruturais da criança. O período de zero a três anos de idade é fundamental para iniciar a estimulação precoce, possibilitando evitar ou amenizar déficits nas funções motoras, cognitivas, sensorial e interação social. A participação ativa da família também favorece a interação recíproca, sendo importante para o bebê que o “ambiente familiar seja estimulador a cada troca de posição, troca de roupa, oferta de brinquedos, banho, devem ser acompanhados de estímulos verbais e táteis”. (BRASIL, 2016, p.94).

O BEBÊ DA ESTIMULAÇÃO PRECOCE

Os bebês e as crianças pequenas são encaminhadas para tratamento em estimulação precoce por profissionais que atendem a infância como os pediatras, neurologistas, orientadores educacionais, entre outros. “[…] alertam que há algo que não anda bem com o bebê e que o problema por ele apresentado excede o âmbito do acompanhamento médico e educacional de rotina”. Jerusalinsky (2002, p.24).

Assim, chegam até nós pacientes com indicações de tratamento por causas bastante amplas: síndrome genética, lesão neurológica, malformação congênita, deficiência sensorial, deficiência física, atraso global do desenvolvimento, imaturidade generalizada, atrasos sem causas orgânicas definidas, condutas atípicas e problemas na relação mãe- bebê, são alguns dos mais recorrentes. (JERUSALINSKY, 2002, p. 24).

Nessa citação, a autora enfatiza o quanto é importante a prática interdisciplinar com bebês, principalmente pela especificidade que acometem a infância. Sendo possível, através de indicadores clínicos e cuidados parentais, observar se há déficits na sua constituição, possibilitando intervir com a estimulação precoce em momentos de estruturas mais permeáveis a inscrições e reinscrições. (JERUSALINSKY, 2002). O bebê que chega para estimulação precoce encontra-se fragilizado em sua constituição, tornando essencial “provocar a inscrição da paixão de objeto, geradora da força psíquica e o entusiasmo de viver”, segundo Molina (1998, p.11). A autora ressalta que é crucial favorecer ao bebê, condições para sua constituição subjetiva e cognitiva. Também é fundamental, considerar a singularidade e o tempo de maturação de cada sujeito, portanto, a constituição psíquica, resultará das capacidades de aquisição instrumental que acontecem na vida da criança (JERUSALINSKY, 2002).

Na obra “ Enquanto o Futuro Não Vem”, Jerusalinsky (2002), sob o ponto de vista neurológico, enfatiza que nos primeiros anos de idade, a criança está se constituindo como sujeito, passando por um processo de maturação das estruturas anátomo-fisiológicas; adquirindo linguagem, psicomotricidade, aprendizagem e também as primeiras inscrições psíquicas. A autora ressalta que o primeiro ano de idade da criança é a fase mais importante do desenvolvimento cerebral, pois as influências do ambiente são absorvidas como parte das estruturas dos neurônios, pois esse é um período de grande plasticidade cerebral e propício às intervenções com estimulação precoce.  Segundo Jerusalinsky (2002, p.84), “O ambiente rico em estímulos produz córtex mais grosso, com mais irrigação sanguínea, maiores neurônios, mais enzimas e maior ramificação das dendritas”. A autora descreve como se dá a estimulação sensorial dos bebês na clínica.

[…] um dos caminhos terapêuticos propostos consiste em expor o sistema sensorial do bebê a uma ampla gama de estímulos: tocam-se buzinas com diferentes volumes e timbres, acendem-se e apagam-se luzes de variadas cores, passa-se a mão do bebê por placas de texturas, lisas, rugosas ou ásperas. (JERUSALINSKY, 2002, p.51).

Embora seja importante essa variedade de estímulos sensoriais para o bebê, a autora ressalta que existem estudos que alertam em caso de bebês prematuros, ou seja, não se deve aplicar essa gama de estímulos, pois, se expostos constantemente a fortes estímulos do meio como luz e ruídos na sala de internação, poderá causar efeitos contraditórios e desorganizador ao recém-nascido, comprometendo sua melhora (JERUSALINSKY, 2002).

O TERAPEUTA DA ESTIMULAÇÃO PRECOCE

Quantos terapeutas para cada criança? Alfredo Jerusalinsky aborda o tema nas obras Escritos da Criança em 1998 e Psicanálise e Desenvolvimento Infantil em 1999, nas quais explica a necessidade de uma equipe inter e transdisciplinar trabalharem com o terapeuta único. Ressalta que era comum crianças nos anos 60 e 70 receberem cinco, seis ou mais tratamentos simultâneos em que cada terapeuta fazia a sua parte, causando uma fragmentação imaginária e trazendo prejuízos psíquicos à criança que se desorganizava com tantos discursos. Não possibilitando a constituição de um sistema de significantes no bebê, cujo código da língua encontrava-se tão fragmentado quanto os terapeutas que intervinham, os pais pouco participavam ou eram excluídos da instalação da língua de referência para a criança, contribuindo assim para se instalarem efeitos autísticos e próprios da psicose.

Era necessário devolver a estas crianças sua chance de entrar na linguagem, além de recuperar seus diversos handicaps. Ou seja, de entrar no humano, apesar de suas inabilidades. É assim que surgiu a idéia do terapeuta único, diante dos efeitos autísticos e psicotizantes provocados pela intervenção multidisciplinar com bebês. (JERUSALINSKY,1998, p.40 e JERUSALINSKY et al, 1999, p.186).

Seguindo essa linha de raciocínio Jerusalinsky et al. (1999), dá ênfase às condições desejáveis para o terapeuta desempenhar com sucesso sua função, pois deverá ter conhecimento técnico e habilidades específicas para conduzir a restauração das funções afetadas. Também é papel do profissional colocar a criança como sujeito no desejo do Outro. Ele é o único agente que trata direto com a criança, o único intermediário dos diversos discursos técnicos, científicos e outros saberes, utilizando-se da transferência que está em jogo para facilitar os registros e a compreensão dessa criança.

Como se vê, trata-se de um terapeuta único trabalhando em uma equipe interdisciplinar, guiado por uma transdisciplinar especificamente clínica que lhe permite, primeiro colocar seu saber específico a serviço da situação psíquica na qual a criança se encontra, e, segundo, reconhecendo a cada passo os limites de seu saber, tanto do lado clínico como do lado da subjetividade em jogo. (JERUSALINSKY,1998, p. 43 e JERUSALINSKY et al, 1999, p.189).

A função do terapeuta segundo Molina (1998, p.12) “[…] deverá alicerçar as possibilidades da família para operacionalizar a integração comunitária da pequena criança, […] pelas suas capacidades, potencialidades e por sua singularidade pessoal do que somente seja rotulado por sua patologia”. Cabe salientar que o terapeuta deve colaborar com o psicólogo psicanalista na assistência aos pais, visando ajudá-los na ressignificação da destituição narcísica prematura, levando-os a perceberem seu filho para além da patologia, que embora não tenha sido o idealizado, porém poderão vivenciar produções animadoras com o filho real. (MOLINA, 1998).

DISCUSSÃO

A estimulação precoce para Foster (1999) é uma das formas de intervir precocemente, em caráter preventivo e interdisciplinar, no tratamento do autismo. Por se tratar de uma prática clínica, que prioriza o tempo de maturação da criança, evitando ou diminuindo os prejuízos neuropsíquicos e a consolidação de quadros autistas. Sendo assim, os primeiros meses de idade do bebê são os principais na estimulação da linguagem, psicomotricidade e aprendizagem, pois nesse período da vida estão ocorrendo as primeiras inscrições psíquicas e o processo de maturação das estruturas cerebrais, é uma fase de grande capacidade neuroplástica. Além disso, Jerusalinsky (2002) confirma a estimulação precoce como forma de intervenção, que respeita o tempo de maturação de cada criança, singularidade e capacidades de se constituir como sujeito psíquico.

Outro fator importante a ser considerado é a função materna, cujo papel é fundamental na maturação neuropsíquica do sujeito. Deste modo, Foster (1999) afirma que havendo um desencontro na relação mãe-filho, em que a criança não receba estímulos adequados ou não consiga se apropriar destes, poderá causar sofrimentos emocional e neurológico, podendo até mesmo, desenvolver condutas autistas, bem como, atitudes autistas a sua volta.

Vale salientar que Jerusalinsky (2012) também entende a função materna como uma troca recíproca e inconsciente na relação mãe-bebê, pois, ao surgir alguma intercorrência nessa função, e o bebê não conseguir apoderar-se dos registros subjetivos necessários para a sua constituição como sujeito, ele poderá apresentar déficits na área da linguagem. O fracasso na formação das redes de linguagem é percebido principalmente em crianças autistas, comprometendo as funções primordiais de reconhecimento recíproco, ou seja, a diferenciação de si em relação ao outro, causando isolamento externo. O psicanalista compreende o autismo como uma ausência de sujeito, devido à exclusão do outro e o predomínio de automatismos.

Devido a tais circunstâncias, o enfoque da estimulação precoce é intervir com crianças de zero a três anos de idade, que apresentam sinais de risco e comprometimento nas fases do desenvolvimento infantil. Além disso, é considerado que, futuramente, alguns casos possam vir a ser relacionados ao autismo. Essa técnica poderá contribuir para o desenvolvimento da criança autista, evitando ou amenizando o déficit sensorial, motor, cognitivo, linguístico e social. Sendo assim, o Ministério da Saúde, Brasil (2014- 2016), enfatiza a urgência de intervir precocemente, considerando o tempo de maturação e plasticidade das estruturas cerebrais, ressaltando a importância da participação parental na construção de um ambiente estimulador, que através dos cuidados diários com a criança, possa favorecer a relação recíproca.

Seguindo essa linha de raciocínio, Jerusalinsky et al. (1999) ressalta que a estimulação precoce se utiliza de uma brecha na função do agente materno, para intervir, na construção ou substituição dessa função, pois o bebê em condição de risco psíquico encontra-se muito frágil e a ausência da função materna muito prolongada poderá causar danos irreversíveis, assim como instalar “traços autistas”. Boniatti (2016) também reconhece que o sujeito com déficit na constituição psíquica poderá apresentar condutas atípicas e estereotipadas, portanto se intervir com estimulação precoce nos primeiros meses de idade, poderá evitar ou minimizar as chances de anomalias se instalarem.

Tendo em vista que a estimulação precoce intervém nos primórdios da constituição do sujeito, entendendo que nessa fase o bebê ainda está em processo de construção dos instrumentos de intercâmbio com o meio, hábitos e rotinas diárias, também não consegue diferenciar-se em relação ao outro, Jerusalinsky (1998) e Jerusalinsky et al. (1999) asseguraram a ideia do terapeuta único, por entenderem que as intervenções multidisciplinares com bebês causavam- lhes prejuízos psíquicos, devido a vários discursos e terapeutas diferentes, em que cada um fazia “sua parte” literalmente, podendo provocar efeitos autísticos e psicotizantes. Portanto, o terapeuta único faz a mediação de outros saberes utilizando-se da transferência dessa relação como facilitadora dos registros da criança.

Seguindo esse pensamento, as autoras Goretti; Almeida; Legnani (2014) e Boniatti (2016) também defendem a importância de o terapeuta ser o único a intervir, sendo o terceiro na relação mãe-bebê, pois, nesse período, não há diferenciação instrumental formada. Dessa forma é necessário que o profissional conheça as fases do desenvolvimento infantil, embora conte com uma equipe interdisciplinar. Além do mais, deverá intervir urgente com o bebê que se encontra fragilizado, “provocar a inscrição da paixão de objeto, geradora da força psíquica e o entusiasmo de viver” conforme Molina (1998, p. 11), e igualmente colaborar junto ao psicólogo psicanalista com a finalidade de ajudar os pais a ressignificar a destituição narcísica prematura, levando-os a perceberem o filho para além da patologia.

Portanto, seguindo esse viés o terapeuta psicanalítico, especialista nas particularidades do autismo, consegue desenvolver novas situações favoráveis à formação do sujeito psíquico, precisando constituir a função primordial de reconhecimento por ser vital na relação parental e ser a porta de entrada da criança no mundo da linguagem. Considerando essas afirmativas, o psicanalista Jerusalinsky (2012) acredita na cura do autismo pela psicanálise, porém ressalta a urgência de intervir precocemente nos primeiros meses do bebê por ser um período de grande flexibilidade e permeabilidade do funcionamento psíquico em que as chances de cura serão mais amplas. O psicanalista afirma que independentemente do tipo de autismo, se declarar a incurabilidade desde o início, incluirá a criança e os pais em uma “profecia auto-cumprida: nunca pode acontecer aquilo que nem se tenta fazer” (JERUSALINSKY, 2012, p. 67).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo deste estudo, verificou-se a complexidade do diagnóstico de autismo, suas variações e particularidades desde suas primeiras descrições por Léo Kanner em 1943 até os dias atuais. O autismo tem despertado muitos interesses por áreas de diferentes abordagens, portanto, seguindo o viés psicanalítico, a literatura nos mostra que se trata de uma síndrome e pode ser agregada a outras doenças, não há tratamento único, nem um fármaco específico. Portanto é fundamental detectar o mais rápido possível e intervir com estimulação precoce nos primeiros três anos de idade, priorizando o primeiro, devido ao processo de formação dos aspectos estrutural (orgânico e psíquico) e instrumental (possibilitam a troca com o meio) do desenvolvimento infantil, possibilitando impedir ou diminuir as chances de anomalias se tornarem permanentes.

Diante da importância em detectar precocemente os déficits psíquicos do bebê e da pequena criança, foi desenvolvido o IRDI, um instrumento que ajuda avaliar se há sinais de risco para autismo, sendo possível fazer o encaminhamento para intervenção com estimulação precoce o mais rápido possível. Constatou-se que a psicanálise tem desenvolvido estudos de relevância no tratamento do autismo, assim como as contribuições da estimulação precoce em equipe interdisciplinar com terapeuta único e a participação na construção e validação do IRDI, um instrumento que pode mensurar os sinais de riscos para o autismo e ao mesmo tempo tem o cuidado de não tornar em patologia antes mesmo de ser, preservando a criança em idade tão precoce.

Observou-se que há uma concordância nos estudos consultados nesta pesquisa em relação à estimulação precoce com criança autista em relação ao tempo de maturação das estruturas psíquicas, a neuroplasticidade cerebral e a importância da função materna como estrutura do sujeito. Embora o autismo apresente uma composição genética, orgânica e função materna, não há um fator que o determine em sua singularidade, ou seja, é diferente de um sujeito para outro, apresentando-se como ausência de sujeito devido à exclusão do outro e o predomínio de movimentos automáticos e repetitivos. Entendendo a função materna como a principal no favorecimento das condições necessárias em um ambiente estimulador para a constituição do sujeito psíquico.

Percebe-se que há um grande desafio para os profissionais que intervêm com bebês e crianças pequenas que apresentam sinais de risco psíquico para seu desenvolvimento, bem como para autismo. A participação da família é fundamental no tratamento, tanto na detecção quanto na intervenção. Mas a atuação do terapeuta em EP também é essencial para assegurar a função materna, real, imaginária e simbólica (cuidados primários são o real, tradução da linguagem imaginária/ simbólica e triangulação edípica/simbólico) com a finalidade de favorecer a criança na sua constituição como sujeito de desejo, contribuindo para a inserção dela no campo da linguagem, pois é fundamental para um sujeito funcional.

Conclui-se a importância de intervir com a estimulação precoce, principalmente em sinais de autismo, pois se acredita em uma possível cura pela abordagem psicanalítica com a intervenção precoce. Por se tratar de uma prática clínica interdisciplinar, que prioriza os tempos primordiais de constituição do sujeito psíquico e orgânico,  utiliza-se terapeuta único no atendimento direto com os bebês e crianças pequenas, considerando que a maturação e a aquisição instrumental ainda não estão formadas nesta fase da vida. Tendo em vista que o autismo também está associado ao fracasso das redes de linguagem, entende-se que a estimulação precoce poderá contribuir no desenvolvimento da criança autista, evitando ou diminuindo os déficits cognitivo, sensorial, social e linguístico, proporcionando melhor qualidade de vida à criança bem como a família. Vale ressaltar que novos estudos sobre estimulação precoce no tratamento do autismo se fazem relevantes no sentido de aprofundar melhor o tema, trazendo novas contribuições a essa síndrome tão complexa.

REFERÊNCIAS

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_______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Portaria nº 324, de 31 de março de 2016. Disponível em:  <http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2016/abril/01/Portaria-324-de-31-de-mar–o-de-2016.pdf> Acesso em 31 mar 2018.

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APÊNDICE – REFERÊNCIAS DE NOTA DE RODAPÉ

3. Segundo o site www.lydiacoriat.com.br; o Centro Lydia Coriat é uma clínica interdisciplinar especializada em diagnóstico e tratamento dos problemas do desenvolvimento na infância e adolescência.

4. Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

5. Fundação de Amparo à Pesquisa do estado de São Paulo.

[1] Graduanda em Psicologia.

[2] Mestrado em Educação. Especialização em Educação Especial Inclusiva. Especialização em Administração e Planejamento para Docentes. Especialização em Psicologia Escolar. Aperfeiçoamento em Complementação Didático Pedagógica. Graduação em Psicologia.

Enviado: Agosto, 2019.

Aprovado: Fevereiro, 2020.

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