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A prescrição intercorrente na execução fiscal e os desafios da fazenda pública

RC: 85703
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/prescricao-intercorrente

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

PIMENTEL, Marcela Paranhos [1]

PIMENTEL, Marcela Paranhos. A prescrição intercorrente na execução fiscal e os desafios da fazenda pública. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 06, Ed. 05, Vol. 11, pp. 05-44. Maio de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/prescricao-intercorrente, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/prescricao-intercorrente

RESUMO

O presente trabalho tem por objeto o estudo da prescrição intercorrente no âmbito da execução fiscal, passando pela definição do instituto da prescrição, a diferença de efeito no Direito Civil e no Direito Tributário, bem como a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema. Em razão da impossibilidade de eternização do processo executivo, a prescrição intercorrente, por meio da Lei nº 11.051 de 2004 com a inclusão do §4º no artigo 40 da Lei nº 6.830, surgiu por questões de segurança jurídica e de estabilidade nas relações sociais, para pôr fim à inércia do credor exequente pela ausência de diligências frutíferas interruptivas do lapso temporal. Desse modo, para entender a aplicação do instituto no rito do mencionado artigo 40, foram colacionados vários julgados do Superior Tribunal de Justiça acerca de pontos importantes, como a suspensão da execução quando da não localização do devedor ou de bens penhoráveis, a prévia intimação da Fazenda quando da declaração da prescrição e as diligências interruptivas previstas na Lei de Execução Fiscal. Com o julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.340.553/RS, houve a fixação de várias teses essenciais sobre o tema, o que tornou ainda mais relevante a análise do novo entendimento do STJ para entender o que mudou e o que foi mantido. A partir desse contexto, foram abordados no último capítulo os desafios da Fazenda Pública com o procedimento da execução fiscal e as possíveis soluções para dar mais efetividade à recuperação do crédito público.

Palavras-chaves:  Prescrição intercorrente, Execução Fiscal, Fazenda Pública, Desafios, Soluções.

1. INTRODUÇÃO

O tema da prescrição intercorrente na execução fiscal é de suma importância para a atuação da Fazenda Pública, não só por ser uma das principais formas de extinção do processo executivo e do crédito exequendo, mas que, por vezes, demanda uma mudança na gestão da dívida ativa, especialmente após o julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.340.553/RS pelo Superior Tribunal de Justiça. Nessa decisão, foram fixados os marcos temporais das fases do rito do artigo 40 da Lei nº 6.830, os quais são fundamentais para o desenvolvimento da execução fiscal.

Diante das teses proferidas pelo Tribunal Superior, que serão explicadas no segundo capítulo do presente trabalho, notou-se que para a Fazenda Pública tornou-se necessária uma postura mais ativa, no sentido de atuar com mais agilidade e eficiência para o bom êxito da execução fiscal e evitar assim a consumação do prazo prescricional, independendo de mera petição do órgão de representação do ente público para a interrupção da contagem, sendo necessária a efetiva localização do devedor e de bens penhoráveis a partir das diligências requeridas.

Nesse cenário desafiador, foram pesquisadas várias iniciativas que foram feitas tanto no âmbito do Poder Judiciário como nos órgãos de procuradorias para a implementação de programas relativos à inteligência artificial para a melhoria no processamento das execuções fiscais, as quais representaram uma taxa de 87% de congestionamento nos processos judiciais na Justiça Federal em 2019, de acordo com a publicação Justiça em Números, edição 2020, compilada pelo Conselho Nacional de Justiça.

Desse modo, buscou-se não apenas desenvolver o instituto da prescrição intercorrente no âmbito da execução fiscal, a partir de sua conceituação, diferenças nas áreas civil e tributária, mais também a análise da jurisprudência do STJ. Bem como a verificação das dificuldades da Fazenda Pública, a qual é o principal ator no procedimento da execução fiscal, e as possíveis soluções para o incremento e maior racionalidade na recuperação do crédito público.

2. A PRESCRIÇÃO

2.1 A PRESCRIÇÃO NO DIREITO CIVIL

No âmbito do Direito Civil Brasileiro, a prescrição surgiu com o Código Civil de 1916 no Título III, regulada nos artigos 161 a 179, cujo projeto textual foi elaborado pelo jurista Clóvis Beviláqua. Uma das críticas feita pela doutrina civilista era a ausência de distinção entre os prazos prescricionais dos prazos decadenciais, pois foram ambos inseridos para a Parte Geral do Código Civil, o que acabou gerando confusão quanto à aplicação da norma.

De acordo com Agnelo Amorim Filho (1960, p. 305/306), o qual se propôs a criar um critério científico para explicar a diferença entre a prescrição e a decadência, muitos autores se basearam na associação entre prescrição e fim do direito de ação e a decadência como extinção do direito material:

O critério mais divulgado para se fazer a distinção entre os dois institutos é aquele segundo o qual a prescrição extingue a ação, e a decadência extingue o direito. Entretanto, tal critério, além de carecer de base científica, é absolutamente falho e inadequado, pois pretende fazer a distinção pelos efeitos ou consequências, se bem que aqueles sejam, realmente, os principais efeitos dos dois institutos. O critério apontado apresenta-se, assim, com uma manifesta petição de princípio, pois o que se deseja saber, precisamente, é quando o prazo extintivo atinge a ação ou o direito. O que se procura é a causa e não o efeito.

Processo distintivo indiscutivelmente mais vantajoso do que aquele é o sugerido por Câmera Leal, assim resumido pelo seu autor: “É de decadência o prazo estabelecido pela lei, ou pela vontade unilateral ou bilateral, quando prefixado ao exercício do direito pelo seu titular. E é de prescrição, quando fixado, não para o exercício do direito, mas para o exercício da ação que o protege. Quando, porém, o direito deve ser exercido por meio da ação, originando-se ambos do mesmo fato, de modo que o exercício da ação representa o próprio exercício do direito, o prazo estabelecido para a ação deve ser tido como prefixado ao exercício do direito, sendo, portanto, de decadência, embora aparentemente se afigure de prescrição”. (CÂMARA LEAL, Da Prescrição e da Decadência, 1.º ed., págs. 133 e 134). Todavia, o critério proposto por CÂMARA LEAL, embora muito útil na prática, se ressente de dupla falha: Em primeiro lugar, é um critério empírico, carecedor de base científica, e isso é reconhecido pelo próprio CÂMARA LEAL, pois ele fala em “discriminação prática dos prazos de decadência das ações” (op. cit., pág. 434). Com efeito, adotando-se o referido critério, é fácil verificar, praticamente, na maioria dos casos, se determinado prazo é prescricional ou decadencial, mas o autor não fixou, em bases científicas, uma norma para identificar aquelas situações em que o direito nasce, ou não, concomitantemente com a ação, pois é esse o seu ponto de partida para a distinção entre os dois institutos. Em segundo lugar, o critério em exame não fornece elementos para se identificar, direta ou mesmo indiretamente (isto é, por exclusão), as denominadas ações imprescritíveis. Faz-se necessário, assim, intensificar a procura de um outro critério, e temos a impressão que, tomando-se como ponto de partida a moderna classificação dos direitos desenvolvida por CHIOVENDA e, particularmente, a categoria dos direitos protestativos, chegar-se-á, indubitavelmente, àquele critério ideal, isto é, a um critério dotado de bases científicas e que permite, simultânea e seguramente, distinguir, a priori, a prescrição da decadência, e identificar as denominadas ações imprescritíveis. É o que nos propomos demonstrar com o presente trabalho. (Grifos nossos)

Nesse sentido, para o autor Agnelo Amorim, o início da prescrição não se confunde com o nascimento do direito de ação e sim com o surgimento da pretensão, a qual consiste na exigibilidade de uma obrigação que foi descumprida pelo devedor a partir da violação de um direito subjetivo do credor. Enquanto o direito de ação é utilizado como instrumento processual provocador da jurisdição estatal diante da recusa em satisfazer a pretensão.

De acordo com a classificação proposta por Chiovenda (1960, p. 12), o direito subjetivo é gênero que abrange duas espécies: os direitos a uma prestação e os direitos protestativos. Nas palavras de Francisco Amaral (2013, p. 575), o direito subjetivo consiste em uma faculdade conferida pelo ordenamento jurídico a alguém de ter, fazer ou exigir de outrem determinado comportamento. Complementa o doutrinador Caio Mário (1999, p. 22) que esse poder de ação fica à disposição do titular do direito subjetivo e que não depende do seu exercício, pois o indivíduo pode conservar-se inerte, sem exercer a vontade, e ainda assim, será portador do direito.

Conforme ensinado por Agnelo Amorim, a prescrição surge com o nascimento da pretensão, a qual por sua vez nasce da frustração de um direito subjetivo, esse foi o raciocínio adotado pelo artigo 189 do Código Civil de 2002. Assim, a inércia do titular ao longo de determinado lapso temporal é penalizada com a perda da possibilidade de exigir em juízo o cumprimento do dever jurídico.

Nas palavras de Francisco Amaral (2013), os direitos potestativos:

O direito potestativo é o poder que o agente tem de influir na esfera jurídica de outrem, constituindo, modificando ou extinguindo uma situação sub­jetiva sem que esta possa fazer alguma coisa senão sujeitar-se”, ao que acresce que “ (… ) como o direito potestativo é o dever de determinar mudanças na situação jurídica de outro sujeito, mediante ato unilateral, sem que haja dever contrapos­to e correspondente a esse poder, chama-se, também, direito formativo ou de formação. O lado passivo da relação jurídica limita-se a sujeitar-se ao exercício de vontade da outra parte. E não havendo dever, não há o seu descumprimento, não há lesão. Conseqüentemente não há pretensão. (Grifos nossos)

Como se pode inferir, apenas os direitos com prestações que dão origem a pretensões que podem se sujeitar à prescrição, caso sejam violados, pois os direitos potestativos não dependem do comportamento de outrem para produzir efeitos, pelo contrário, o seu exercício pode ser realizado mediante a mera vontade do titular, criando um estado de sujeição de outras pessoas.

No que concerne à contagem do prazo prescricional, o Código Civil de 2002 adotou o entendimento de que o termo inicial da prescrição é concomitante ao surgimento da pretensão, a qual se origina da violação ao direito subjetivo a uma prestação, esse é o teor do Enunciado n. 14 do CJF/STJ, aprovado na I Jornada de Direito Civil, realizada em setembro de 2002: Art. 189: 1) o início do prazo prescricional ocorre com o surgimento da pretensão, que decorre da exigibilidade do direito subjetivo; 2) o art. 189 diz respeito a casos em que a pretensão nasce imediatamente após a violação do direito absoluto ou da obrigação de não fazer.

Sobre esse artigo 189 do Código Civil, o doutrinador Miguel Reale (1999, p. 68) dispõe:

Ainda a propósito da prescrição, há problema terminológico digno de especial ressalte. Trata-se de saber se prescreve a ação ou a pretensão. Após amadurecidos estudos, preferiu-se a segunda solução, por ser considerada a mais condizente com o Direito Processual contemporâneo, que de há muito superou a teoria da ação como simples projeção de direitos subjetivos.

Desse modo, fica claro que o direito de ação não se confunde com a prescrição, pois o primeiro consiste no direito de provocar o Poder Judiciário para conceder provimento jurisdicional para resolver determinado litígio, sendo de natureza pública, autônoma, abstrata, processual e indisponível. Não depende, portanto, o seu exercício da existência do direito material, pois o autor pode promover o ajuizamento da ação e obter uma sentença de improcedência ou até mesmo terminativa sem análise meritória. O fundamento para essa distinção entre os institutos situa-se no art. 5º, XXXV da Constituição Federal, o qual preceitua o princípio da inafastabilidade da jurisdição e configura uma garantia fundamental ao titular do direito fundamental à ação.

Um dos pressupostos para a ocorrência da prescrição é a inércia do titular da pretensão para exercitá-la em juízo em determinado lapso de tempo. Esse prazo é estipulado em lei, de forma que as partes não podem alterá-lo, conforme artigo 192 da legislação civilista. Com efeito, por se tratar de norma de ordem pública, tendo caráter imperativo pautado no interesse público, seus fundamentos se assentam na necessidade de estabilização das relações sociais e na segurança jurídica para a pacificação social e evitar a eternização dos conflitos.

Para Dalmar Pimenta (2010, p. 120), as condições para a prescrição abrangem não só a inércia pura e simples do exercício da pretensão, como também a ausência de causas preclusivas, sejam suspensivas, interruptivas ou até mesmo impeditivas ao instituto, de modo a não comprometer a fluência do prazo, e podem assim ser enumeradas de acordo como o autor citado:

A primeira delas é a existência de uma ação exercitável, isto é, a prescrição dirige-se a uma ação que possa ser exercitada pelo detentor de determinado direito que tenha sido violado. A inércia do titular da ação é a passividade diante da violação do seu direito. O detentor do direito necessita exercitar seu direito de ação para proteger seu direito subjetivo, mas fica inerte. A continuidade da inércia durante determinado tempo é importante, uma vez que não é qualquer inércia que enseja a prescrição. A inércia deve durar mais do que o prazo prescricional previsto em lei para o exercício do direito violado. Quanto à ausência de causas preclusivas no curso da prescrição, torna-se importante, uma vez que a lei, em determinados casos, impede, em virtude da ocorrência de determinado fato ou ato jurídico, a fluência do prazo prescricional. As causas preclusivas podem ser de suspensão, interrupção e impedimento.

Não obstante a previsão de causas impeditivas e suspensivas previstas nos artigos 197, 198 e 199 do Código Civil, ou seja, respectivamente inibem o início da fluência do prazo e suspendem o fluxo do prazo em curso, o tempo ainda consiste em um fator relevante para a verificação do fenômeno da prescrição. A prescrição tem a finalidade de preservar a estabilidade social e a segurança jurídica na deliberação de conflitos com pacificação social, de modo a conferir segurança necessária ao ordenamento jurídico para a garantia das relações jurídicas firmadas entre os titulares de direito.

2.2 A PRESCRIÇÃO NO DIREITO TRIBUTÁRIO

Antes de abordar especificamente sobre a prescrição, cumpre tecer algumas considerações sobre a obrigação tributária, bem como a decadência, a fim de expor a sequência lógica desde o surgimento da obrigação com o fato gerador até a execução do crédito tributário, momento no qual se faz necessária a análise da prescrição.

A obrigação tributária decorre de um vínculo estabelecido entre o Estado, consubstanciado na figura do credor e o devedor, o qual pode ser pessoa física ou jurídica, para o cumprimento de uma prestação que pode ser de dar (pagar tributo ou prestação pecuniária), de fazer ou não fazer, conforme se trate de obrigação principal ou acessória respectivamente, à luz do disposto no artigo 113, caput, §1º e §2º do CTN.

Não obstante a expressão fato gerador seja definida pelo CTN no artigo 114 como sendo a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência, existem dois sentidos distintos a serem considerados: o primeiro que se refere à situação abstratamente descrita na norma jurídica como hipótese de incidência do tributo e o segundo sentido é a materialização do primeiro, com a concretização da previsão legal.

O fato gerador consiste exatamente na ocorrência material da previsão contida na norma jurídica, capaz de gerar a relação jurídico-tributária, sendo, portanto, a realidade fática apresentada, a qual é regulada pelo legislador como objeto de tributação. O ilustre jurista Paulo de Barros Carvalho (s.d, p. 28) adota a nomenclatura fato jurídico-tributário e hipótese tributária para evitar a ambiguidade gerada pela expressão fato gerador adotada pelo CTN. Sobre o fato jurídico-tributário esclarece o aludido autor:

Como decorrência do acontecimento do evento previsto hipoteticamente na norma tributária, instala-se o fato, constituído pela linguagem competente, irradiando-se o efeito jurídico próprio, qual seja o liame abstrato, mediante o qual uma pessoa, na qualidade de sujeito ativo, ficará investida do direito subjetivo de exigir de outra, chamada de “sujeito passivo”, o cumprimento de determinada prestação pecuniária. Empregando a terminologia do Código Tributário Nacional, diríamos: “ocorreu o ‘fato gerador’ (em concreto), surgindo daí a obrigação tributária”; é a fenomenologia da chamada incidência dos tributos.

Uma vez ocorrido o fato gerador ou fato jurídico-tributário ou até mesmo o fato imponível (ATALIBA, 1991, p. 61) estará configurada a obrigação tributária, havendo o início da contagem do prazo decadencial para que o Fisco promova o lançamento a fim de constituir o crédito tributário. Nessa etapa, a obrigação tributária é quantificada, tornada certa, líquida e exigível pelo lançamento, com a identificação do sujeito passivo e definição dos seus elementos materiais de modo que o devedor tome ciência da exação a ser cumprida.

O fenômeno da decadência consiste na perda do direito potestativo da Fazenda Pública de promover o lançamento e de constituir o crédito tributário em virtude do decurso do prazo quinquenal, cujo termo vai variar a depender da espécie do lançamento do tributo. O artigo 150 do CTN se refere ao lançamento por homologação, no qual cabe ao sujeito passivo realizar a declaração do montante devido, com todos os elementos necessários à sua quantificação, bem como promover a antecipação do pagamento devido, submetendo-o posteriormente à homologação da autoridade fazendária. Segundo Geraldo Ataliba (1969, p. 287/288):

O lançamento por homologação – impropriamente chamado autolançamento – ocorre quando a lei atribuiu ao sujeito passivo a incumbência de todo o preparo material e técnico do ato, que, destarte, se reduz a uma simples homologação. O lançamento persiste sendo ato privativo do fiscal. O contribuinte é mero preparador. O lançamento, propriamente dito, no caso, consiste na homologação (Grifos nossos)

Desse modo, o prazo de 5 anos, caso não haja previsto outro em lei, será contado a partir da ocorrência do fato gerador, conforme o art. 150 §4º do mesmo diploma legal, considerando-se extinto o crédito tributário e homologado o lançamento, caso não haja manifestação da Fazenda Pública durante esse interregno, exceto se comprovado dolo, fraude ou simulação. Para as demais espécies de lançamento, de ofício e por declaração e nos casos de dolo, fraude ou simulação, o termo inicial é contabilizado na forma do artigo 173, I do CTN, sendo o primeiro dia do ano seguinte ao qual o lançamento poderia ter sido efetuado. Contudo, caso haja alguma medida preparatória, o prazo deverá ser contabilizado a partir dela, nos termos do artigo 173, parágrafo único.

Contudo, muito embora haja a regra da contagem do prazo decadencial para os tributos sujeitos à lançamento por homologação, a súmula 555 do STJ estabelece que se o contribuinte não faz a declaração do montante devido, o que provavelmente significa que não realizou o pagamento antecipado, o prazo será contado na forma do artigo 173, I do CTN. Consequentemente, a Administração Tributária deverá promover o lançamento de ofício, uma vez que não há o que ser homologado, em razão da ausência de declaração do devedor, na forma do artigo 149, V.

A prescrição no Código Tributário Nacional encontra-se disciplinada no artigo 174 como a perda do direito de cobrar o crédito tributário por meio da execução fiscal, caso decorridos 5 anos contados da constituição definitiva. O crédito tributário é constituído a partir da notificação do lançamento, porém essa constituição definitiva só ocorrerá se após a ciência do sujeito passivo, não houver impugnação administrativa ao lançamento ou pagamento pelo devedor no prazo estipulado. Nesse sentido, o ilustre doutrinador Sacha Calmon Navarro Coelho (2018, p. 139) explicita:

a) inércia do contribuinte: que não realiza o pagamento, não solicita o parcelamento, não apresenta embargos. Dessa inércia, com o esgotamento do prazo de defesa, ocorre a constituição definitiva do crédito e;

b) discussão do crédito tributário administrativamente por parte do contribuinte: enquanto perdurar a discussão, o crédito estará suspenso, tornando-se impossível atribuir definitividade, o que apenas se caracterizará quando alcançada a última decisão administrativa (irrecorrível). (Grifos nossos)

Esse trâmite de eventual discussão administrativa por meio da impugnação do sujeito passivo ocorre no âmbito do processo administrativo fiscal, regulado na esfera federal pelo Decreto nº 70.235/1972, devendo-se dar conhecimento dos atos praticados ao contribuinte, sob pena de nulidade do processo e de, inclusive, contaminar o crédito tributário constituído. Caso a impugnação do sujeito passivo seja julgada procedente, o lançamento tributário deverá ser anulado ou alterado, conforme previsão expressa no artigo 145, I do Código Tributário Nacional. Por outro lado, se for julgada improcedente e não couber mais recurso administrativo, haverá o julgamento definitivo com a correspondente notificação ao contribuinte.

Na legislação federal, o art. 21 e o art. 43 do Decreto 70.235/72 estabelecem a concessão de prazo de 30 dias para pagamento voluntário pelo sujeito passivo após a notificação da decisão administrativa definitiva, como se pode observar pelo texto transcrito a seguir:

Art. 21. Não sendo cumprida nem impugnada a exigência, a autoridade preparadora declarará a revelia, permanecendo o processo no órgão preparador, pelo prazo de trinta dias, para cobrança amigável.

 § 3° Esgotado o prazo de cobrança amigável sem que tenha sido pago o crédito tributário, o órgão preparador declarará o sujeito passivo devedor remisso e encaminhará o processo à autoridade competente para promover a cobrança executiva.

Art. 43. A decisão definitiva contrária ao sujeito passivo será cumprida no prazo para cobrança amigável fixado no artigo 21, aplicando-se, no caso de descumprimento, o disposto no § 3º do mesmo artigo.

Desse modo, apenas com a notificação do devedor sobre o julgamento definitivo ou escoado o prazo para pagamento da dívida, haverá o termo inicial do prazo prescricional para a Fazenda Pública ajuizar a respectiva execução fiscal para a cobrança judicial do crédito tributário. Sendo esse o entendimento da segunda parte da súmula 622 do STJ, cuja redação merece exposição:

A notificação do auto de infração faz cessar a contagem da decadência para a constituição do crédito tributário; exaurida a instância administrativa com o decurso do prazo para a impugnação ou com a notificação de seu julgamento definitivo e esgotado o prazo concedido pela Administração para o pagamento voluntário, inicia-se o prazo prescricional para a cobrança judicial.

Ressalte-se que quando o contribuinte reconhece o débito fiscal e emite declaração, não há necessidade de lançamento pela autoridade competente, pois o crédito tributário já haverá se constituído, conforme o disposto na Súmula nº 436 do STJ. Assim, não é mais necessária qualquer outra providência pela Administração Tributária, sendo possível a inscrição imediata em dívida ativa. Sobre a contagem do prazo nessa situação, Leandro Paulsen (2014, p. 211) ensina:

Isso porque, provindo do próprio contribuinte o reconhecimento do débito, não há abertura de prazo para impugnação. O Fisco pode encaminhar prontamente o crédito nela representado para cobrança, sem prejuízo do lançamento de eventuais diferenças. Assim, quanto aos valores declarados ou confessados, considera-se definitivamente formalizado o crédito tributário no momento mesmo da apresentação da declaração, sendo que “o prazo prescricional tem início a partir da data em que tenha sido realizada a entrega da declaração do tributo e escoado o prazo para pagamento espontâneo”. Efetivamente, o prazo conta-se “do dia seguinte ao vencimento da exação ou da entrega da declaração pelo contribuinte, o que for posterior”, porquanto, “Só a partir desse momento, o crédito torna-se constituído e exigível pela Fazenda pública”.

A respeito do prazo prescricional, o artigo 46 da Lei nº 8.212/1991 previa o prazo de 10 anos para a cobrança dos créditos oriundos da Seguridade Social. Contudo, com a edição da Súmula Vinculante 8 do STF, foi considerado inconstitucional esse dispositivo pela invasão da

competência reservada à lei complementar para tratar de prescrição em matéria tributária, à luz do artigo 146, III, “b” do texto constitucional. Posteriormente, o Congresso Nacional revogou o aludido artigo 46 por meio da Lei Complementar nº 128/2008 no art. 13, I, “a”. Logo, não é possível que lei ordinária disponha sobre a prescrição de crédito tributário, devendo ser respeitado o prazo quinquenal previsto no Código Tributário Nacional, o qual foi recepcionado como lei complementar pela Constituição de 1967, a qual já previa essa exigência legislativa no artigo 19 §1º, com quórum diferenciado sobre o tema.

O instituto da prescrição está previsto também como causa de extinção do crédito tributário no artigo 156, V do Código Tributário Nacional, de modo que a prescrição ocasiona também a perda do direito material de crédito, diferentemente do tratamento dispensado pelo Código Civil. Nesse sentido, cita-se trecho da obra de Hugo de Brito Machado (2006, p. 245):

Na Teoria Geral do Direito a prescrição é a morte da ação que tutela o
direito, pelo decurso do tempo previsto em lei para esse fim. O
direito sobrevive, mas sem proteção. Distingue-se, neste ponto, da
decadência, que atinge o próprio direito. O CTN, todavia, diz expressamente que a prescrição extingue o crédito tributário (art. 156, V). Assim, nos termos do Código, a prescrição não atinge apenas a ação para o crédito tributário, mas o próprio crédito, vale dizer, a relação material tributária.

Uma das consequências em atribuir-se à prescrição o efeito da extinção do crédito tributário e não apenas a perda da pretensão de cobrança judicial é a possibilidade de o sujeito passivo exigir a emissão de certidão negativa de débitos fiscais diante de um crédito prescrito. Afinal, extinto o crédito, é também inexistente o vínculo obrigacional, portanto, ausente qualquer direito subjetivo da Fazenda Pública. Nesse mesmo sentido, caso haja recolhimento pelo devedor de crédito já prescrito, será possível pleitear a repetição do indébito pago indevidamente. Com base no artigo 165, I do CTN mencionado no julgado acima, o direito à restituição é assegurado ao sujeito passivo, independentemente de prévio protesto, ou seja, a obrigação da restituição não depende de qualquer manifestação volitiva de quem pagou indevidamente o tributo, seja por cálculo do Fisco ou do próprio sujeito passivo. O fundamento centra-se na vedação ao enriquecimento sem causa e também no princípio da legalidade, pois a obrigação tributária deve respeitar o disposto na lei, sendo essa a determinação contida na própria Constituição Federal no artigo 150, I e também no artigo 97 do Código Tributário Nacional.

2.3 A PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NA EXECUÇÃO FISCAL E A DIFERENÇA ENTRE A PRESCRIÇÃO ORDINÁRIA TRIBUTÁRIA

Neste tópico, abordaremos a conceituação do instituto da prescrição intercorrente no âmbito da execução fiscal e faremos uma comparação com a prescrição ordinária já estudada anteriormente. Por razões de estrutura do presente trabalho, o tema da contagem da prescrição intercorrente, bem como os seus termos iniciais serão tratados no próximo capítulo de forma a compreender mais detalhadamente o histórico da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto.

A prescrição intercorrente tributária, resultado de uma construção doutrinária e jurisprudencial, encontra-se prevista no art. 40 §4º da Lei nº 6.830 de 1980, dispositivo introduzido pela Lei nº 11.051/2004 como um instituto que ocorre durante o trâmite da execução fiscal, em virtude da inércia processual da Fazenda Pública no transcurso do mesmo prazo definido em lei para a prescrição ordinária do crédito público tributário ou não tributário.

O fundamento do instituto é a segurança jurídica para que não ocorra a eternização de execuções pendentes, pois o processo tem natureza instrumental e deve chegar a um fim. No caso da execução fiscal, o objetivo é a satisfação do crédito público. Contudo, não pode ser baseado na prática de atos processuais inúteis que não conduzirão à localização de bens penhoráveis ou do devedor. Nesse sentido, a prescrição intercorrente em consonância com os princípios da economia processual e da razoável duração do processo visa pôr fim à execução em razão da negligência do credor para promover impulso útil ao processo e evitar a sujeição do executado indefinidamente às eventuais constrições em seu patrimônio a fim de concretizar o direito subjetivo de crédito do exequente.

Sob esse aspecto, a prescrição intercorrente e a prescrição ordinária são similares, pois ambas se assentam nas premissas da inércia do titular de uma pretensão em exercê-la e do transcurso de determinado lapso temporal. Ademais, o prazo é igual para o exercício, uma vez que a jurisprudência do STJ assentou que com relação aos créditos de natureza tributária, o artigo 40 da Lei nº 6.830 deveria ser interpretado conjuntamente com o artigo 174 do CTN, pois a matéria de prescrição tributária é reservada à disciplina de lei complementar, conforme previsão constitucional expressa no art. 146, III, b. A seguir, um trecho do voto do Ministro Luiz Fux no Agravo Regimental no Recurso Especial nº 418.162/RO:

Pacificou-se no STJ o entendimento de que o artigo 40 da Lei de Execução Fiscal deve ser interpretado harmonicamente com o disposto no artigo 174 do CTN, que deve prevalecer em caso de colidência entre as referidas leis. Isto porque é princípio de Direito Público que a prescrição e a decadência tributárias são matérias reservadas à lei complementar, segundo prescreve o artigo 146, III, b da CF. Em consequência, o artigo 40 da Lei n. 6.830/1980 não pode prevalecer sobre o CTN e sua aplicação sofre limites impostos pelo artigo 174 do referido Código. Assim, após o transcurso de determinado tempo sem a manifestação da Fazenda Estadual, deve ser decretada a prescrição intercorrente. Essa exegese impede seja eternizada no Judiciário uma demanda que não consegue concluir-se por ausência dos devedores ou de bens capazes de garantir a execução. Deveras, a suspensão decretada com suporte no art. 40 da Lei de Execuções Fiscais não pode perdurar por mais de 05 (cinco) anos porque a ação para cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva (art. 174, caput, do CTN). (Grifos nossos). (STJ, AgRg no Resp nº 418.162/RO 1ª Turma, Min. Rel. Luiz Fux, julgamento em 17/10/2002, Dje 11/11/2002, p. 5)

Esse e outros precedentes deram origem à Súmula 314 do STJ, cuja redação assim dispõe: Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição qüinqüenal intercorrente. Desse modo, não localizados bens penhoráveis ou o devedor, o processo de execução é suspenso pelo prazo de 1 ano, durante o qual não corre a prescrição. Finalizado esse período, o juiz determina o arquivamento dos autos sem baixa na distribuição e a partir desse fenômeno conta-se o prazo de 5 anos para a Fazenda Pública diligenciar na condução do processo.

A diferença entre as prescrições ordinária e intercorrente é principalmente temporal, sendo que a prescrição ordinária é o fenômeno que uma vez consumado impedirá a inscrição em dívida ativa e o consequente ajuizamento da ação judicial para a cobrança do crédito público e cuja contagem se inicia a partir da constituição definitiva do crédito. Enquanto a prescrição intercorrente ocorre quando já está em curso a execução fiscal e, portanto, relaciona-se com a inércia da Fazenda Pública para a prática de atos processuais úteis e diligentes de modo a impulsionar o processo executivo para a satisfação do crédito. Segue-se passagem esclarecedora de Marcelo Polo (CHUCRI, 2016, p. 648) sobre as prescrições citadas:

A prescrição ordinária atinge a eficácia da pretensão (ou o próprio direito, no caso do crédito tributário) pelo fato de não ter exercido o direito a uma prestação no tempo. Há um direito material a uma prestação e um prazo para o seu exercício. Visto de outro modo, o titular do crédito tem o dever de exigir (ação de direito material) seu crédito pelo meio jurídico-processual próprio (ação de direito processual) em um determinado. Trata-se, pois, a prescrição ordinária de instituto de direito material: é uma sanção de direito material (encobrir a eficácia da pretensão ou exigir diretamente o crédito tributário) aplicada ao titular de um direito material. No caso da prescrição intercorrente, o direito de cobrança do crédito inscrito em dívida ativa já foi exercido com o ajuizamento da execução fiscal, vindo-se a interromper a prescrição ordinária com o despacho do juiz que ordena a citação (tanto para o crédito tributário quanto para o crédito não tributário). Então a que direito se liga a prescrição intercorrente? Aqui a diferença entre os institutos: a prescrição intercorrente se liga, na verdade, a um implícito dever de natureza processual de dar impulso útil ao processo executivo. A sanção, contudo, é, tal como a prescrição ordinária, de direito material: encobre a eficácia da pretensão para os créditos de natureza não tributária e fulmina o próprio direito de crédito de natureza tributária. Ou seja, tem-se estipulado o prazo de exercício de um dever processual a que se comina uma sanção de direito material. É, portanto, figura híbrida, anômala, um tertium genus.

Essa sanção de direito material mencionada no trecho acima da prescrição intercorrente ocorre, pois, a consequência da consumação do instituto acarreta não só a extinção da execução fiscal como também a extinção do próprio crédito exequendo. É diferente do tratamento da prescrição no direito civilista, a qual apenas gera a perda da pretensão, ou seja, a exigibilidade judicial de atos positivos ou negativos que fica comprometida, porém é possível o cumprimento espontâneo do direito pelo devedor, pois o direito material não se perde.

3. A EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ SOBRE A PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE

3.1 A SUSPENSÃO PROCESSUAL E O TERMO INICIAL DA CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO

Desde a redação original da Lei nº 6.830, já havia a previsão no caput do artigo 40 de suspensão da execução fiscal pela não localização do devedor ou de bens penhoráveis suficientes para a satisfação do crédito exequendo. Enquanto o parágrafo 2º do mesmo dispositivo determinou o limite máximo de 1 ano de paralisação do processo, durante o qual não haveria o curso da prescrição, uma vez findo o prazo sem qualquer movimentação processual eficiente para a citação do executado ou o encontro de bens, seria arquivado o processo. Contudo, no parágrafo 3º, o legislador trouxe o possível desarquivamento dos autos quando localizados a qualquer tempo o devedor ou os seus bens passíveis de penhora. Tal previsão encontrou críticas na doutrina diante da noção de perpetuidade da execução fiscal e ausência de prescrição. Sobre essa polêmica, discorre Ernesto José Toniolo (2006, p. 108/109):

Isto significa que, para alguns, o art. 40 da LEF cria nova hipótese de suspensão ou de interrupção da prescrição, aparentemente não atendendo à reserva de lei complementar prevista no artigo 146, III, “b”, da CF, ao menos nas execuções fiscais fundadas em créditos de natureza tributária. A previsão contida no art. 40 da LEF, de que não correria a prescrição enquanto suspenso o processo, foi fortemente criticada por boa parte da doutrina, que entendia violada a reserva de lei complementar estabelecida pelo art. 146, III, “b”, da Constituição Federal. Desta forma, durante a suspensão da execução fiscal pela ausência de bens penhoráveis, fluiria o prazo prescricional, ao menos quanto aos créditos de natureza tributária. Antes de sumulada a matéria pelo STJ, já prevaleciam entendimentos nos quais, após a suspensão do processo por um ano, reiniciava-se a contagem do prazo prescricional, independentemente do arquivamento previsto no art. 40§ 3º, da LEF, se a parte não demonstrasse que estava diligenciando no intuito de tornar efetiva a execução. Desta maneira, o prazo suspenso por um ano voltaria a contar após o seu transcurso, até que se verificasse a prescrição, dentro de 5 anos.

Esse entendimento do STJ (presente nos seguintes julgados: Resp 40996/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, julgamento em 02/02/1994. DJ 07/03/1994 e o Resp 160036/SP, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, julgamento em 12/03/1998, DJ 25/05/1998)     mencionado no trecho destacado acima era no sentido de que não havia nenhum conflito entre a previsão contida no artigo 40 da Lei de Execuções Fiscais e o Código Tributário Nacional, pois enquanto o artigo 174 do CTN disciplinaria as hipóteses de interrupção da prescrição, a Lei 6.830 teria apenas previsto condições de suspensão do curso prescritivo. Na prática, significou a aplicação do art. 40 §2º como prazo de suspensão da prescrição ordinária tributária, findo o qual seria retomada a contagem.

Contudo, houve uma mudança na jurisprudência no STJ (um dos julgados que exemplificam essa alteração é o Resp 625193/RO, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 15/02/2005, DJe 21/03/2005) no sentido de que a prescrição dos créditos tributários deveria ser regulada pelo CTN em virtude de sua natureza de lei complementar, não mais sendo aplicado o art. 40 §2º da Lei nº 6830 como hipótese de suspensão da prescrição ordinária. Assim, o prazo previsto no artigo 174 do Código Tributário Nacional deveria ser aferido no período de arquivamento, realizado após a suspensão processual de 1 ano, reconhecendo-se a prescrição intercorrente. Essa conclusão visou harmonizar ambos os dispositivos, considerando-se a reserva de lei complementar assegurada pelo artigo 146, III, “b” da Constituição Federal de 1988.

Como resultado dessa interpretação entre os dispositivos legais, houve a publicação da súmula 314 do STJ em 2006, com a redação de que na ausência de bens penhoráveis, haveria a suspensão do processo de execução no período de 1 ano, findo o qual se iniciaria o prazo quinquenal da prescrição intercorrente. Desse modo, o artigo 40 deveria ser interpretado conforme os limites do artigo 174 do CTN, uma vez que é esse que prevê os casos de interrupção do prazo prescricional, nele não incluídos os do dispositivo da Lei nº 6830. Nesse sentido, significou que o início do prazo de suspensão não é condicionado à iniciativa da Fazenda Pública ou de um despacho judicial, prolongando-se indevidamente a execução e sim mediante a ocorrência de alguma das duas situações fáticas descritas acima, a partir das quais a contagem seria feita de forma automática.

Com o advento da Lei nº 11.051/04, houve a inserção do §4º ao artigo 40 da Lei nº 6.830/80, positivando-se o marco inicial da prescrição intercorrente como sendo a decisão que ordena o arquivamento da execução fiscal, após decorrido o prazo de 1 ano de suspensão pela não localização do devedor ou de bens penhoráveis para satisfazer o crédito exequendo. A inovação legislativa também permitiu a decretação de ofício da prescrição intercorrente, desde que ouvida previamente a Fazenda Pública para opor alguma causa de suspensão ou de interrupção da prescrição.

É pertinente consignar que ainda existe discussão jurisprudencial sobre a inconstitucionalidade do aludido dispositivo legal.  A Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (Arguição de Inconstitucionalidade nº 0004671-46.2003.404.7200 (Rel. Desembargadora Federal Luciane Amaral Corrêa Münch. Porto Alegre, julgamento em 27/08/2010, publicação em 14/09/2010) com fulcro no artigo 146, III, “b” do texto constitucional e na ausência de previsão no CTN de causa de suspensão da prescrição, acolheu parcialmente a arguição de inconstitucionalidade do §4º do art. 40 da Lei nº 6.830 para dar-lhe interpretação conforme à Constituição Federal, no sentido de entender que a contagem da prescrição se inicia do despacho que ordena a suspensão e não do arquivamento do processo. Dessa forma, o prazo prescricional seria quinquenal conforme o disposto no art. 174 do CTN e não de 6 anos, o que resultaria da soma do lapso de paralisação da execução e o início da prescrição intercorrente.

A crítica que se coloca ao entendimento acima manifestado é que o TRF da 4ª Região declarou a inconstitucionalidade do marco inicial de prescrição intercorrente previsto pela Lei 6.830, a qual é lei ordinária. Contudo, a interpretação mais consentânea com a intenção do legislador infraconstitucional é de o §2º do art. 40 não trata de suspensão da prescrição ordinária e sim da suspensão do processo executivo, o qual acaba gerando secundariamente a suspensão da fluência do prazo prescricional. Logo, nessa ordem de ideias, a norma legal é disposição de ordem processual, o que viabilizaria a sua previsão em lei ordinária, não havendo reserva qualificada à lei complementar. Frise-se que a constitucionalidade do artigo 40 §4º também foi submetida à apreciação do Supremo Tribunal Federal por meio do Recurso Extraordinário nº 636.562/SC, cuja repercussão geral foi reconhecida em 2011, tema nº 390, que até a conclusão do presente trabalho, encontra-se pendente de julgamento.

Um outro apontamento acerca da arguição julgada pelo TRF da 4ª Região, feito por João Aurino Melo Filho (2011, p. 1/6), é de que a conclusão do tribunal se baseou equivocadamente na ideia de que a prescrição intercorrente decorre do CTN e, portanto, não poderia uma lei ordinária criar hipótese de suspensão da prescrição que não estivesse prevista em lei complementar.  Além do fato de que o objeto da inconstitucionalidade foi o marco inicial da contagem da prescrição intercorrente e não a criação de uma nova espécie de prescrição pela Lei 11.051.

A inovação trazida por essa lei ordinária foi uma importante mudança, pois a redação antiga do art. 219 §5º do Código de Processo Civil de 1973 não permitia a decretação de ofício quanto aos direitos patrimoniais, apenas tendo sofrido modificação de conteúdo na redação com a Lei nº 11.280/2006, a qual passou a determinar expressamente esse dever ao magistrado.

Em 2018, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Especial nº 1.340.553-RS (Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgamento em 12.09.2018, DJe 15/10/2018) sob a sistemática de recursos repetitivos para determinar, entre outros pontos pertinentes, o marco e fluência da prescrição intercorrente. Da leitura da decisão, verifica-se que o fundamento para a contagem automática do prazo de suspensão de 1 ano foi o de evitar o grande volume de processos em trâmite no Poder Judiciário, os quais tem pouca ou nenhuma probabilidade de êxito, seja por falta de iniciativa da Fazenda Pública em promover diligências frutíferas ou porque de fato tornou-se inviável a satisfação do crédito por fatores alheios ao controle da parte exequente.

Primeiramente, o STJ definiu que o início do prazo de suspensão é contado de forma automática da data de ciência da Fazenda Pública sobre a não localização do devedor ou de bens penhoráveis, independentemente de despacho judicial expresso determinando a suspensão ou de petição da exequente requerendo a paralisação do feito que não seja com base no artigo 40 da Lei 6.830.

Quanto a esse primeiro aspecto, ressalte-se que em Embargos Declaratórios opostos pela Fazenda Nacional nesse mesmo acórdão paradigma, o STJ deixou claro que a não localização do devedor ou de bens poderá ser aferida por quaisquer meios válidos admitidos pela lei processual, descritos no art. 8 da Lei 6.830. Logo, não necessariamente deve haver a certificação da situação pelo oficial de justiça, haja vista a expressa previsão legal de formas distintas de citação do devedor.

O juiz tem o dever de proferir despacho sobre a suspensão do prazo, porém tal manifestação não é necessária para o início da fluência da suspensão processual, pois como foi relatado anteriormente, basta a ciência da Fazenda de que não foram encontrados bens penhoráveis ou o executado, o que costuma ocorrer com a vista de autos ao representante judicial do ente público. Trata-se apenas de uma medida de organização processual para que sejam delineados os marcos temporais de paralisação e posteriormente se for o caso, da consumação da prescrição intercorrente.

Caso a Fazenda Pública durante esse período de 1 ano não pratique algum ato eficaz para a retomada da execução, o arquivamento dos autos sem baixa na distribuição ocorrerá de forma automática, prescindindo-se de qualquer decisão judicial ou petição da exequente. É exatamente a partir desse arquivamento que terá início o prazo de prescrição intercorrente, a qual será de 5 anos se o crédito for tributário, com base no artigo 174 do CTN, conforme visto anteriormente.

Quanto aos créditos não tributários, dependerá da previsão na legislação de regência e do entendimento jurisprudencial quanto ao fundamento a ser aplicado. A título de exemplo, para as multas administrativas, a jurisprudência do STJ assentou que o prazo prescricional fosse de 5 anos conforme a previsão contida no art. 1º do Decreto nº 20.910/1932, o que posteriormente foi mantido com o advento da Lei nº 11.941/2009 que acrescentou o art. 1º-A à Lei nº 9.873/1999, sendo o lapso quinquenal contado a partir do término do processo administrativo para a ação executiva para a aplicação da multa em âmbito federal.

Desse modo, diante das teses fixadas pelo STJ no Recurso Especial Repetitivo nº 1.340.553/RS não há mais indefinição e paralisação da execução fiscal além do tempo necessário definido pela lei, já que nem o juiz e nem a Fazenda Pública podem alterar a fluência do prazo. Os marcos de início da suspensão e início da prescrição intercorrente foram fixados e a contagem é automática, exceto quando for demonstrada a ocorrência de efetiva causa suspensiva ou interruptiva da prescrição, como será descrito mais adiante.

3.2 A INTIMAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA

Do disposto no artigo 40 §1º e §4º da Lei nº 6.830 há a determinação expressa de vista de autos da Fazenda Pública sobre o momento de suspensão do processo e antes de ser decretada a prescrição intercorrente de ofício pelo juiz. Logo, por imposição legal, há no mínimo dois momentos processuais em que é necessário que o ente público seja cientificado.  Sobre esse aspecto, foram transcritas algumas ementas da jurisprudência do STJ:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. EXECUÇÃO FISCAL. SUSPENSÃO DO PROCESSO NOS TERMOS DO ART. 40 DA LEF. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE AFASTADA. 1. Não há violação do artigo 535 do Código de Processo Civil quando o Tribunal de origem resolve a controvérsia de maneira sólida e fundamentada, apenas não adotando a tese do recorrente. 2. É ilegal a decretação da prescrição intercorrente se a Fazenda Pública não tinha ciência inequívoca da suspensão do processo nos termos do artigo 40, § 1º, da Lei 6.830/80, porquanto requerida a suspensão do feito executivo por prazo certo e fim específico, não tendo havido a comunicação pessoal dos atos processuais subsequentes. 3. Recurso especial provido. (STJ, Recurso Especial nº 1.247.951/MG, Segunda Turma, Rel. Min. Castro Meira, julgamento 20.09.2011, DJe 22.11.2011)

PROCESSO CIVIL – TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – TERMO INICIAL – SÚMULA 314/STJ – ARGÜIÇÃO PELO EXECUTADO – OITIVA DA FAZENDA PÚBLICA – INEXISTÊNCIA – CONTRADITÓRIO – DESRESPEITO. 1. A prescrição intercorrente, passível de ocorrência no bojo do processo executivo, conta-se da data do arquivamento da execução fiscal, após findo o prazo de um ano da suspensão determinada pelo magistrado. Inteligência da Súmula n. 314/STJ. 2. O contraditório é princípio que deve ser respeitado em todas as manifestações do Poder Judiciário, que deve zelar pela sua observância, e não só nas hipóteses de declaração da prescrição ex officio. 3. Cabível a prescrição intercorrente em execução fiscal desde que a Fazenda Pública seja previamente intimada do decreto que a declarar, para opor algum fato impeditivo à incidência da prescrição. 4. Recurso especial provido. (STJ, Recurso Especial nº 963.317/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, julgamento 05.08.2008, DJe 01.09.2008)

A necessidade de dar ciência à Fazenda Pública decorre da aplicação do princípio do contraditório previsto no art. 5º, LV do texto constitucional e também no art. 10 do CPC de 2015, o qual estabelece que o juiz não pode decidir sem antes dar oportunidade de manifestação às partes, ainda que se trate de matéria que pode ser conhecida de ofício. Com efeito, deve ser oportunizada à parte exequente a alegação eventual de causas suspensivas ou interruptivas da prescrição a fim de afastar a consumação da prescrição intercorrente. Outro fundamento é o princípio da indisponibilidade do interesse público, segundo o qual toda a atuação estatal deve ser pautada na legalidade, uma vez que não se pode dispor do que pertence ao povo, dando-se ensejo à frustração da perseguição do crédito público pela não intimação da Fazenda.

Quanto ao arquivamento da execução após transcorrido 1 ano de paralisação processual, o Superior Tribunal de Justiça em vários julgados sempre entendeu que o arquivamento do processo é uma consequência automática da fluência do prazo de suspensão, prescindindo-se de despacho formal que o declare. Do mesmo modo, assentou o órgão julgador que será dispensável a intimação da Fazenda Pública acerca da suspensão do prazo, quando o próprio credor exequente fizer a solicitação em juízo. Nesse sentido, seguem-se ementas de algumas decisões do Tribunal Superior:

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. ICMS. PEDIDOS DE SUSPENSÃO SUCESSIVOS. DILIGÊNCIAS PARA LOCALIZAÇÃO DE BENS INFRUTÍFERAS. PRAZO QUINQUENAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. 1. Na hipótese em exame, o entendimento do Sodalício a quo está em consonância com a orientação do Superior Tribunal de Justiça de que, em execução fiscal, é desnecessário o ato formal de arquivamento, o qual decorre do transcurso do prazo de um ano de suspensão, prescindindo de despacho que o efetive (Súmula 314/STJ) e de que não há como deixar de pronunciar a prescrição intercorrente, nos casos em que não encontrados bens penhoráveis para a satisfação do crédito, após o decurso do prazo quinquenal… (Grifos nossos). (STJ, AgRg no Agravo em Recurso Especial nº 502682/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgamento em 06/08/2015, Dje 10/02/2016).

PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. PRÉVIA OITIVA DA FAZENDA PÚBLICA. INOVAÇÃO RECURSAL. DECRETAÇÃO. POSSIBILIDADE. INTIMAÇÃO DA SUSPENSÃO. DESNECESSIDADE. SUSPENSÃO REQUERIDA PELA EXEQÜENTE. PRECEDENTES. 1. A parte agravante não ventilou, nas razões do recurso especial, a alegada necessidade de prévia oitiva da Fazenda pública, de forma que não é possível conhecer do recurso, nesse ponto, pois consubstancia verdadeira inovação em sede recursal – a qual é inviável em razão da já consumada preclusão. 2. Cabe à exeqüente a providência de dar impulso ao processo. Assim, deveria a Fazenda providenciar o regular andamento do feito, evitando a paralisação por mais de cinco anos, sendo prescindível a intimação da suspensão do feito se o pedido de sobrestamento foi formulado pela própria exequente. 3. Precedentes de ambas as Turmas de Direito Público. 4. Agravo regimental não provido. (STJ, AgRg no REsp 1.036.026/PE, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, Segunda Turma, DJe 21/5/10)

Confira-se que nesse ponto, não houve alteração de entendimento do STJ, pois a tese 4.2 do Resp 1.340.553/RS determina que uma vez finalizado o prazo de 1 ano de suspensão processual, é iniciado automaticamente o prazo prescricional do crédito exequendo, durante o qual a execução fiscal ficará arquivada sem baixa na distribuição. Dessa forma, é dispensável a intimação da Fazenda Pública acerca do arquivamento, pois já foi cientificada dos pressupostos que ensejaram a suspensão processual, quais sejam a não localização do devedor ou de bens penhoráveis, a partir dos quais há a fluência de forma automática.

Ressalte-se que, não obstante, os fundamentos já mencionados acerca da prévia intimação da Fazenda Pública para ser decretada a prescrição intercorrente, o Superior Tribunal de Justiça, antes do julgamento paradigmático do Recurso Especial nº 1.340.553/RS, chegou a proferir algumas decisões para reconhecer a nulidade da sentença quando ausente a intimação prévia da Fazenda Pública prevista no §4º do artigo 40, somente com a demonstração do efetivo prejuízo da falta de notificação pela ocorrência de causa suspensiva ou interruptiva do prazo prescricional. A justificativa para essa conclusão é que a exequente teve a oportunidade de na insurgência recursal em face da sentença extintiva da execução fiscal, de opor causa modificativa da fluência da prescrição, porém não o fez. Nesse sentido, houve a chance de manifestação da Fazenda Pública de sustentar algum óbice para o reconhecimento da prescrição. Contudo, sem o efetivo prejuízo, não poderia ser declarada a nulidade do pronunciamento judicial impugnado.

De modo semelhante foi a tese estampada no paradigma julgado em 2018, no subitem 4.4, o qual será transcrito novamente a seguir:

4.4.) A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 245 do CPC/73, correspondente ao art. 278 do CPC/2015), ao alegar nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da LEF, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu (exceto a falta da intimação que constitui o termo inicial – 4.1 onde o prejuízo é presumido), por exemplo, deverá demonstrar a ocorrência de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição.

Percebe-se que se adotou a máxima do princípio pas de nullité sans grief, previsto no art. 278 do Código de Processo Civil, com a lógica de o mero descumprimento da falta de intimação da Fazenda Pública não gerar nulidade, exceto quando a parte prejudicada a sustentar com a comprovação de efetivo prejuízo. Assim sendo, na linha do exposto anteriormente, ainda que a exequente não tenha sido intimada no momento oportuno, deve alegar no primeiro momento possível alguma causa suspensiva ou interruptiva da prescrição, sob pena de não ser demonstrado interesse recursal e ficar preclusa a matéria.

Esse raciocínio aplica-se tanto quando há o decurso do prazo de suspensão mais o período da prescrição intercorrente, que em dívida ativa tributária totalizam-se 6 anos, e a Fazenda não é intimada na forma do art. 40 §4º da Lei nº 6.830, quanto em qualquer outra intimação ao longo desse procedimento. Entretanto, no caso de ausência de localização do devedor ou de bens penhoráveis, a falta de intimação acarreta prejuízo presumido, ou seja, não é necessária sua demonstração concreta. Pelo fato de o prazo de 1 ano de suspensão processual ter o seu termo inicial contado do momento em que a Fazenda toma ciência da negativa de retorno dessas diligências, não há como suprimir essa comunicação à parte exequente.

No próximo tópico, será abordado o impacto das diligências frutíferas na contagem do prazo de prescrição intercorrente.

3.3 A UTILIDADE DAS DILIGÊNCIAS DO ARTIGO 40 DA LEI 6.830/80 PARA A INTERRUPÇÃO DA CONTAGEM DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE

O Superior Tribunal de Justiça já havia consolidado jurisprudência (como no AgRg no Resp 1271917/PE, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, julgamento em 16/02/2012, DJe 27/02/2012) para considerar que os requerimentos da Fazenda Pública que não se mostrassem efetivos na localização do devedor ou de seus bens penhoráveis não tinham o condão de suspender ou de interromper o prazo da prescrição intercorrente. Essa conclusão buscava evitar, que durante o período de arquivamento após a suspensão de 1 ano, fossem realizados pedidos de desarquivamento dos autos próximos ao término do prazo para a realização de diligências, cujo objetivo fosse apenas impedir o curso da prescrição.

Primeiramente, para entender o que é a efetividade da diligência, podemos considerar que a inutilidade é aferida quando da repetição da providência e a partir da análise do desenvolvimento do processo, sabe-se que é claramente protelatória e não objetiva satisfazer o crédito exequendo, ou seja, não visa aos fins da execução. De fato, o constante adiamento do prazo prescricional é um fenômeno a ser combatido, evitando-se o acúmulo de execuções fiscais sem o necessário andamento processual, atrapalhando a prestação jurisdicional justa e efetiva, que se configura tanto um direito fundamental previsto no art. 5º, LXXVIII do texto constitucional, quanto uma norma fundamental processual respaldada nos artigos 4º e 8º do Código de Processo Civil.

No Recurso Especial nº 1.340.553/RS, a tese nº 4.3 manteve essa essência da aptidão para a interrupção da prescrição intercorrente apenas com a efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação, desde que requeridas dentro do prazo de 1 ano de suspensão somado à prescrição, de acordo com a natureza tributária ou não do crédito exequendo. Sob esse aspecto, ficou consignado ainda que mesmo tais medidas sendo concretizadas após a fluência de 6 anos (no caso do crédito tributário) ou de acordo com o previsto na lei de regência do crédito (sendo não tributário), não haveria a consumação da prescrição intercorrente, caso pleiteadas pela Fazenda Pública, leia-se protocoladas, dentro desse lapso temporal.

Novamente, esse entendimento prestigia a tutela jurisdicional satisfativa que deve permear as execuções fiscais no sentido de oportunizar à Fazenda Pública que altere a fluência da prescrição intercorrente, desde que requeira medidas que na prática vão ao encontro do objetivo que é próprio da execução da dívida ativa. Ao mesmo tempo, incentiva e reconhece a iniciativa tempestiva e frutífera da parte credora exequente, pois ainda que a penhora apesar de realizada, não se mantenha no tempo, não será reconhecida a prescrição, como no exemplo citado pelo Ministro Relator Mauro Campbell, cujo trecho do primeiro aditamento do seu voto será transcrito a seguir:

(…)A Fazenda Pública de posse de um indicativo de endereço ou bem penhorável peticiona em juízo requerendo a citação ou penhora consoante as informações dadas ao Poder Judiciário. Essa petição, por si só, não satisfaz ao requisito do art. 40, §3º, da LEF. Para todos os efeitos, o devedor ou os bens ainda não foram encontrados (trata-se de mera indicação). É preciso também que a providência requerida ao Poder Judiciário seja frutífera, ou seja, que resulte em efetiva citação ou penhora (constrição patrimonial). Desse modo, estarão “Encontrados que sejam, […] o devedor ou os bens”, consoante o exige o art. 40, §3º, da LEF.

Outrossim, a providência requerida ao Poder Judiciário deve resultar em efetiva citação ou penhora – constrição patrimonial (isto é: ser frutífera/eficiente), ainda que estas ocorram fora do prazo de 6 (seis) anos. Aí sim estarão Encontrados que sejam, a qualquer tempo, também na letra do art. 40, §3º, da LEF. Indiferente ao caso que a penhora (constrição patrimonial) perdure, que o bem penhorado (constrito) seja efetivamente levado a leilão e que o leilão seja positivo. Cumprido o requisito, a prescrição intercorrente se interrompe na data em que protocolada a petição que requereu a providência frutífera, até porque, não é possível interromper a prescrição intercorrente fora do prazo de 6 (seis) anos, já que não se interrompe aquilo que já se findou. Isto significa que o Poder Judiciário precisa dar resposta às providências solicitadas pelo exequente dentro do prazo de 6 (seis) anos, ainda que para além desse prazo, sob pena de restar caracterizado o prejuízo a que me referi no item “4.4” das teses propostas. Nesse sentido, a demora do Poder Judiciário para atender aos requerimentos tempestivos (feitos no curso do prazo de seis anos) há que ser submetida à mesma lógica que ensejou a publicação da Súmula n. 106/STJ (“Proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da justiça, não justifica o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência”). Se a providência requerida for infrutífera, decreta-se a prescrição, salvo se o Poder Judiciário excepcionalmente reconhecer a sua culpa (aplicação direta ou analógica da Súmula n. 106/STJ), o que deve ser averiguado de forma casuística, já que depende de pressupostos fáticos. (Grifos nossos) (STJ, 1ª Seção, Resp 1340553/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgamento em 12.09.2018, DJe 15/10/2018, p.58-59).

Essa passagem do voto é interessante, pois perpassa pela inegável função colaborativa do Poder Judiciário de dar uma resposta adequada à providência requerida pela Fazenda Pública. Do contrário, seria imputar injustamente um ônus considerável unicamente à credora por fatores que não estão na sua esfera de controle. Conforme mencionado no trecho colacionado acima, o resultado do leilão do bem penhorado é indiferente para fins de interrupção da prescrição intercorrente, uma vez que a parte exequente não tem ingerência para garantir o saldo positivo da alienação judicial.

Um outro exemplo que pode ser mencionado é com relação às respostas dos ofícios aos órgãos de registro de bens realizados tanto pela Fazenda Pública, quanto pelo Poder Judiciário. Não há como saber quanto tempo vai levar para se obterem as informações necessárias para a localização de bens do devedor, o que acaba comprometendo o desenvolvimento processual da execução fiscal. Desse modo, diante da dificuldade enfrentada nessa busca de patrimônio, deve ser analisado em cada caso, se o atraso é de fato por inércia da Fazenda ou se a mora é em decorrência de falhas dos órgãos judiciais, com base na súmula nº 106 do STJ, afastando-se a consumação da prescrição intercorrente.

Ademais, muito embora tenham sido mencionadas apenas as causas interruptivas previstas no artigo 40 da Lei nº 6.830/80, é possível fazer uma análise com base em um exame de compatibilidade e adequação das causas interruptivas e suspensivas previstas no Código Tributário Nacional. Para o crédito tributário, são aplicáveis os incisos I e IV do artigo 151, os quais representam as causas suspensivas de moratória e o parcelamento, e o inciso IV do artigo 174, sendo causa interruptiva, sobre o reconhecimento de débito pelo devedor.

Quanto ao instituto do parcelamento, são produzidos dois efeitos que afetam a cobrança do crédito tributário, o primeiro deles é a suspensão da exigibilidade do crédito, consoante o previsto no artigo 151, VI do CTN. Consequentemente, caso já esteja em curso a execução fiscal, quando homologado o pedido de parcelamento junto ao Fisco, o processo judicial será suspenso, em virtude da impossibilidade de continuação de atos constritivos ao patrimônio do devedor, enquanto estiverem sendo adimplidas as parcelas da dívida. O segundo efeito consiste na interrupção da prescrição, com base no artigo 174, parágrafo único, IV, pois configura um reconhecimento da dívida por parte do devedor. Desse modo, é possível que a fluência da prescrição intercorrente seja interrompida quando houver a adesão ao parcelamento, recomeçando a contagem por inteiro quando houver o inadimplemento de alguma das prestações pelo devedor ou com a exclusão formal do programa. Assim já se manifestou farta jurisprudência do STJ, a seguir um trecho transcrito acerca do tema:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. PARCELAMENTO. EXCLUSÃO FORMAL DO PROGRAMA. INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO. RECOMEÇO DA DATA DA EXCLUSÃO. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. PREMISSAS FÁTICAS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. 1. O STJ possui jurisprudência no sentido de que a adesão a parcelamento tributário é causa de suspensão da exigibilidade do crédito e interrompe o prazo prescricional, por constituir reconhecimento inequívoco do débito, nos termos do art. 174, IV, do CTN, voltando a correr o prazo a partir do inadimplemento da última parcela pelo contribuinte… (Grifos nossos) (AgInt no REsp 1372059/PE, Rel. Ministro Herman Benjamim, Segunda Turma, julgado em 18/10/2016, DJe 25/10/2016).

Da leitura dos julgados, percebe-se que a Fazenda Pública deve ser diligente para que em caso de descumprimento das condições do parcelamento pelo sujeito passivo, não deixe escoar o prazo quinquenal da prescrição intercorrente, uma vez que o crédito voltará a ser exigível, devendo a pretensão ser exercida no prazo legal. Ressalte-se que esse contexto não demandará o rito previsto no artigo 40 da Lei nº 6.830 com a suspensão processual por 1 ano, pois esse procedimento só se aplica para os casos de não localização do devedor ou de bens penhoráveis.

4. OS DESAFIOS DA FAZENDA PÚBLICA NAS EXECUÇÕES FISCAIS E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

Uma pesquisa realizada pelo Conselho Nacional de Justiça na publicação Justiça em Números 2020, referente ao ano de 2019, revelou que no primeiro grau de jurisdição, que abrange a justiça comum e juizados especiais, excluídas as turmas recursais, o Poder Judiciário possuía no final do ano um total de 77 milhões de processos pendentes. Mais da metade (55,8%) desse montante eram processos em fase de execução e 70% deles eram execuções fiscais. Ademais, além de as execuções terem representado 39% do total de casos pendentes naquele ano, apresentaram uma taxa de congestionamento equivalente a 87%. O detalhamento desse percentual de 87% foi exemplificado da seguinte forma: ”…ou seja, de cada cem processos de execução fiscal que tramitaram no ano de 2019, apenas 13 foram baixados. Desconsiderando esses processos, a taxa de congestionamento do Poder Judiciário cairia em 8,1 pontos percentuais, passando de 68,5% para 60,4% em 2019” (CNJ, 2020, p. 155).

Desse cenário exposto, é inegável o impacto das execuções fiscais no Poder Judiciário, não só em termos de volume ocupado no acervo, como também na grande quantidade de processos que não se desenvolvem de forma efetiva (em média o tempo de trâmite de uma execução fiscal no acervo judicial é de 8 anos), o que acaba gerando a baixa recuperação e muitas vezes a frustração do crédito público.

Contudo, é preciso ressaltar que não é recente essa constatação, pois em um relatório ainda mais detalhado feito em 2012, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada promoveu um estudo avaliando todos os processos de execuções fiscais com baixa definitiva na Justiça Federal no ano de 2009 e foi constatado que em 43,5% dos casos o devedor não é encontrado pelo sistema judicial. De acordo com o IPEA (2012, p. 19) em 47,4% dos processos ocorreu pelo menos uma tentativa inexitosa de citação, e em 36,9% dos casos não houve qualquer citação válida. Pode-se afirmar que em 43,5% dos executivos fiscais o devedor não é encontrado pelo sistema de justiça.

A ausência de localização do devedor é uma das dificuldades enfrentadas pela Fazenda Pública para que a execução fiscal tenha êxito, principalmente em execuções em face de pessoas jurídicas que são dissolvidas irregularmente. Nessa situação, a sociedade empresária deixa de exercer a atividade empresarial no domicílio tributário fornecido ao Fisco, sem fazer a comunicação dessa mudança junto às autoridades competentes, o que acaba ocasionando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente, com base na Súmula 435 do STJ. Consequentemente, a execução se prolonga por mais tempo e há o risco maior de não ser satisfeito o crédito exequendo.

Além dessa dificuldade para citar o devedor, nesse relatório de pesquisa do IPEA em 2012, apontou-se que em média a execução fiscal permanece por 1.315 dias na etapa de citação, contando-se o tempo de demora para a localização de executado. Essa informação revela que a citação é uma providência crucial para o desenvolvimento processual regular e não por outra razão que o STJ fixou a tese no Recurso Especial nº 1.340.553/RS de que logo após a primeira tentativa frustrada de citação do devedor, a suspensão processual deverá ser declarada pelo juiz, cuja contagem será automática a partir da data de ciência da Fazenda Pública sobre a não localização do executado. Esse marco foi assim estabelecido pela maioria dos julgadores da 1ª Seção nos termos do voto do Ministro Relator Mauro Campbell Marques:

(…) o grande problema que enfrentamos hoje nas execuções fiscais decorre justamente da falta de decisão expressa dos juízes determinando a suspensão do feito pelo art. 40, da LEF, o que acaba por submeter o início do prazo da prescrição intercorrente à subjetividade dos magistrados e procuradores. (Grifos nossos) (STJ, 1ª Seção, Resp 1340553/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgamento em 12.09.2018, DJe 15/10/2018, p. 170).

Basicamente, a essência que permeou o julgado do STJ foi de não condicionar o início da contagem do prazo de suspensão e de prescrição intercorrente a uma decisão judicial expressa, mesmo quando já intimada a Fazenda Pública acerca do resultado infrutífero da diligência requerida. Dessa forma, buscou-se prestigiar a segurança jurídica, pois a execução fiscal não deve ficar indefinidamente em trâmite, sujeitando-se à omissão do magistrado em declarar os marcos temporais necessários para a sucessão de atos processuais e implicando-se que o executado tenha contra si um processo executivo que constrange o seu patrimônio sem limite de tempo.

Contudo, apesar de por um lado ter havido em tese um incremento na celeridade processual, essa nova perspectiva delineada pelo Tribunal Superior tornou ainda maiores as dificuldades na gestão do crédito público por parte dos órgãos de representação judicial dos entes federativos. Porquanto, não só passou a ser exigida uma postura mais ativa da Fazenda Pública na realização das diligências necessárias à satisfação do crédito exequendo, como também esse novo entendimento em recurso especial repetitivo não teve modulação de efeitos, atingindo-se todas as execuções fiscais em curso de forma imediata.

Outro fator determinante e necessário para o desenvolvimento regular da execução fiscal é a localização de bens penhoráveis, conforme já foi relatado no capítulo anterior. Inclusive, retomando-se um fator abordado anteriormente, não é rara a demora na resposta de ofícios dirigidos aos órgãos de registro de imóveis e de títulos e documentos, além de outros órgãos públicos com o Detran, e a recorrente frustração de tais diligências, sendo muitas vezes requerida pela parte exequente a indisponibilidade de bens do executado com base no artigo 185-A do CTN.

Desse modo, analisando-se alguns dos problemas já relatados, verifica-se cada vez mais a importância de melhoria na gestão do crédito público pela própria Fazenda credora por meio de algumas iniciativas sugeridas e já adotadas por parte de algumas Procuradorias que serão mencionadas a seguir. A primeira delas foi na Procuradoria da Fazenda Nacional com a criação do Regime Diferenciado de Cobrança de Créditos (RDCC) previsto na Portaria PGFN nº 396/2016.

O RDCC foi concebido com o objetivo de racionalizar a cobrança dos débitos inscritos em Dívida Ativa da União, aumentando a eficiência e a recuperação do crédito público por meio de algumas medidas administrativas e judiciais, as quais além de contribuírem para a redução do número de execuções fiscais malsucedidas, buscam se concentrar nos créditos que possuem de fato chances de êxito de recuperação. Sobre a necessidade de mudança da política de gestão da dívida ativa da Fazenda Nacional, confira-se a seguir trecho do Parecer PGFN nº 609/2016 (p. 9):

19. Entretanto, ao que tudo indica, e consoante ressaltado pelo Dr. Daniel de Saboia Xavier, Coordenador-Geral da CGD, em mensagem eletrônica de 11 de março último, “Ao longo do tempo, contudo, cresceu na PGFN uma cultura – talvez induzida pela falta de clareza em algumas orientações – de somente se requerer a suspensão da execução após esgotadas as diligências em relação ao (s) devedor(es). O efeito prático não poderia ser outro: milhares de execuções indo e vindo sem qualquer perspectiva de satisfação do crédito”. Alia-se a esse entendimento, muito provavelmente, a adoção de uma política extremamente cautelosa pela Fazenda Nacional de gestão de sua dívida ativa, certamente, influenciada pelos meios até então disponíveis de gerenciamento do estoque e gestão da qualidade do seu crédito, no sentido de não requerer a dita suspensão ou só o fazer depois de esgotadas inúmeras diligências, sendo certo que, em diversas situações, a própria Fazenda Nacional voltava-se contra eventuais suspensões determinadas de ofício pelo Juiz.

20. Acontece que a política de gestão da dívida ativa da Fazenda Nacional anteriormente adotada mostrou-se inadequada e ineficiente, na medida em que não produz os resultados práticos almejados e ainda provoca um acúmulo de execuções fiscais ajuizadas sabidamente incobráveis, justamente, porque ou não se localizou o devedor ou bens aptos à penhora, não obstante as inúmeras diligências realizadas, e, apesar disso, continuam em curso no Poder Judiciário os processos indiciais atinentes a tais execuções, sem que tenham sido suspensos, conforme recomendação expressa do referido art. 40 da LEF. 21. Este procedimento, por certo, abarrota o Poder Judiciário com um incontável número de execuções fiscais incobráveis (inexistência de bens aptos a garantir a execução, por exemplo) e absorve precioso tempo e força de trabalho dos Procuradores da Fazenda na condução de tais processos e na tentativa, no mais das vezes, em vão de continuar a cobrar tais créditos, impedindo-os de dirigir seus esforços para a cobrança daqueles créditos tributários com perspectiva de recebimento, ao final do processo. 22. Urge, portanto, alterar essa política de gestão e cobrança da dívida ativa da Fazenda Nacional, e é nesse quadro que exsurge o projeto de Novo Modelo de Cobrança da Dívida Ativa da União e a minuta de Portaria ora examinada, que institui o Regime Diferenciado de Cobrança de Créditos, notadamente, quando os comandos que dimanam do art. 40 da LEF são claros, expressos e se aplicam a toda e qualquer execução fiscal ajuizada e não apenas àquelas de valores inferiores ou iguais a l (um) milhão de reais. 23. Desse modo, caso existam (e devem existir inúmeras) execuções fiscais ajuizadas e em curso, que já se sabe não constar dos autos garantia útil à satisfação, integral ou parcial, do crédito executado, nada impede, mas recomenda, que a Fazenda Nacional requeira a suspensão do seu curso, na forma recomendada pelo Art. 40, caput, da LEF. (Grifos nossos)

Analisando-se o trecho transcrito e alguns dispositivos da Portaria que instituiu o Regime Diferenciado de Cobrança de Créditos, ficou clara a necessidade de conferir maior efetividade ao procedimento da execução fiscal e não permanecer na insistência de diligências que só atrasam o deslinde da controvérsia e que não contribuem para a recuperação do crédito.

Nesse sentido, a Portaria PGFN nº 396/2016, com as mudanças realizadas posteriormente pelas Portarias PGFN nº 376/2018, nº 422/2019 e nº 520/2019, adotou no artigo 20 a suspensão das execuções fiscais na forma do artigo 40 da Lei nº 6.830, com base em dois critérios. O primeiro deles é relativo ao valor da execução, pois serão suspensas aquelas cujo valor consolidado seja igual ou inferior a um milhão de reais e o segundo critério é sobre o grau de recuperabilidade do crédito, sendo suspensas as execuções, cujos créditos sejam considerados irrecuperáveis ou de baixa perspectiva de recuperação. Essas orientações são condicionadas à ausência de informações de bens e direitos úteis à satisfação parcial ou total do crédito executado e não são aplicadas nos casos de execuções fiscais em face de pessoas jurídicas de direito público e se o executado estiver em processo de falência ou de recuperação judicial.

Para aferir o grau de recuperabilidade do crédito público inscrito na dívida ativa da União, recorre-se à classificação feita pela Portaria MF nº 293 de 2017, a qual no artigo 10, estabeleceu 4 classes (rating) que variam de acordo com o potencial de recuperação, sendo as classes C e D, respectivamente relacionadas aos créditos de baixa perspectiva de recuperação e créditos considerados irrecuperáveis, estes detalhados no artigo 11 do mesmo ato normativo. Da leitura do aludido dispositivo em conjunto com a redação do artigo 20 da Portaria nº 396/2016, com as alterações já mencionadas, percebe-se que o procurador da fazenda nacional pode requerer a suspensão da execução fiscal em relação aos créditos das classes C e D, em uma atuação pautada no princípio da eficiência, economicidade e racionalidade na gestão da dívida ativa.

Ademais, o RDCC estabeleceu quatro procedimentos a serem observados de acordo com determinada circunstância que se apresenta na execução fiscal, de forma a setorizar esforços e gerar mais eficiência na persecução da dívida ativa da Fazenda Pública Nacional. O primeiro deles é o Procedimento Especial de Diligenciamento Patrimonial que se aplica aos devedores com execuções não garantidas por depósito, seguro garantia ou carta de fiança, conforme artigo 2º com redação dada pela Portaria PGFN nº 422/2019. Basicamente é uma consulta periódica às bases cadastrais patrimoniais dos devedores para verificar a localização de bens e direitos passíveis de expropriação judicial, com a produção de um relatório, cujo resultado permite subsidiar a realização de diligências pelas unidades descentralizadas da PGFN.

O segundo procedimento elencado é o protesto extrajudicial das certidões de dívida ativa para os devedores incluídos nesse regime diferenciado. Ressalte-se que o protesto extrajudicial dessas certidões passou a ser previsto com a Lei nº 12.767/2012, que inseriu o parágrafo único no artigo 1º da Lei nº 9.492/1997, incluindo-se as certidões de dívida ativa no rol de títulos protestáveis. Uma das vantagens é a desnecessidade de atuação do Poder Judiciário para a cobrança do devedor, contribuindo-se para a redução do volume de processos judiciais em trâmite. Além disso, trata-se de uma medida que apesar menos gravosa do que a constrição de patrimônio como a penhora, estabelece algumas restrições financeiras ao devedor, como por exemplo o impedimento de acessar serviço de financiamento, por conferir publicidade ao descumprimento das obrigações tributárias, o que estimula a adimplência e a arrecadação fiscal. Desde março de 2013 a outubro de 2015, o índice de recuperação do crédito para as certidões de dívida ativada União sujeitas a protesto foi de 19,2%, cujo montante consolidado foi de R$728.260.828,54 reais.

Acrescente-se que o procedimento especial de acompanhamento de parcelamentos tem por objetivo a verificação periódica do cumprimento do parcelamento pelo devedor, conforme o disposto no artigo 12 da Portaria nº 396/2016 e havendo eventuais alterações patrimoniais, promover as medidas necessárias para evitar fraude e tentativa de esvaziamento de bens para não satisfazer o crédito público. Por fim, há também um acompanhamento das execuções, cujos créditos estão garantidos por depósito, fiança bancária, seguro garantia ou penhora ou suspensas por decisão judicial para que se possa adotar alguma ação contida no artigo 17, que pode ser o prosseguimento da execução da garantia, a substituição de algum bem penhorado, ou ainda a sua reavaliação ou alienação antecipada.

Como resultado desse sistema, que sem dúvida demandou uma mudança organizacional na estrutura da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional com a criação de grupos de trabalho para atender funções específicas como a realização dos procedimentos de acompanhamento anteriormente mencionados, além da adoção dos requisitos para a suspensão da execução, no ano de 2019, mais de 200 mil execuções fiscais sem garantia foram arquivadas devido à falta de potencial de recuperação do crédito e o valor recuperado com execução forçada foi de R$7,1 bilhões, em contrapartida ao montante de R$6 bilhões em 2018 (PGFN, 2020, p. 14).

É relevante ressaltar sobre esse assunto do aumento de arrecadação e diminuição do número de execuções fiscais ajuizadas, trecho de uma entrevista concedida pelo Procurador da Fazenda Nacional Daniel Saboia sobre a solução Rating da Dívida Ativa e Ajuizamento Seletivo de Execuções Fiscais (SERPRO, 2020):

A classificação de créditos inscritos representa novo paradigma na atividade de cobrança da dívida ativa. Dela decorreram diversos outros projetos, que modificaram completamente a relação entre fisco e contribuinte e, da mesma forma, o funcionamento da Justiça. A partir da possibilidade de identificação do perfil dos contribuintes inscritos, diversas execuções fiscais deixaram de ser ajuizadas em função da possibilidade de recuperação por outros meios mais adequados ao caso concreto. Da mesma forma, a classificação dos créditos permitiu a execução de projetos de desistência de recursos e ações judiciais, nas quais não se identificava uma efetiva perspectiva de recuperação. Em 2016, antes da implantação do projeto, a PGFN ajuizou 237 mil novas execuções fiscais não previdenciárias, um montante que representou R$ 141,4 bilhões. Em 2017, ano de implantação da medida, o número de novas execuções foi reduzido para 76 mil, ou seja, uma queda de quase 70%. Até março de 2020, foram ajuizadas apenas 4.093 novas execuções fiscais não previdenciárias. Por outro lado, o resultado da recuperação obtido com a execução fiscal subiu de R$ 1,1 bilhão, em 2016, para R$ 7,1 bilhões, em 2019, representando um incremento de 545%. No que se refere à desistência de recursos originados de execuções fiscais, apenas no STJ, foram 1.150 desistências. (Grifos nossos)

Diante do exposto, são inegáveis a importância, o impacto dessa seleção e organização da dívida ativa na classificação dos créditos, a fim de concentrar esforços naqueles que de fato são recuperáveis, evitando-se o ajuizamento massivo de execuções fiscais sem potencial de êxito que só congestionam o Poder Judiciário, geram gastos de recursos e perda de tempo dos profissionais envolvidos.

Outra solução relevante que com o passar dos anos vem sendo cada vez mais discutida, aprimorada e aplicada é o uso de tecnologias, mormente a inteligência artificial para auxiliar as procuradorias e os órgãos judiciais a terem mais eficiência e celeridade no processamento de dados de ações mecânicas e repetitivas, as quais se deixadas a cargo de pessoas, demandariam mais recursos humanos e tempo para serem realizadas.

No âmbito do Poder Judiciário, é possível citar alguns exemplos já existentes de programas que tem modificado a rotina de trabalho e produzido bons resultados. O primeiro deles ocorreu na 12ª Vara de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que utiliza sistema de inteligência de artificial para realizar bloqueio de bens de devedores de tributos municipais. Em 2018, de uma só vez e de forma muito rápida, houve o bloqueio de bens em 6.619 execuções fiscais, com o total de arrecadação de mais de R$31 milhões de reais, bem como em apenas 3 dias, o sistema eletrônico de penhora realizou todo o trabalho que a equipe do cartório levaria 2 anos para finalizar. Além disso, as consultas ao Bacenjud, Renajud e Infojud com o respectivo bloqueio foi concluído pelo programa em apenas 25 segundos, o que caso fosse feito por um servidor, levaria 35 minutos por processo (TJRJ, 2018).

Outro exemplo é o programa Elis usado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, implantado em novembro de 2018, desenvolvido para resolver inconsistências nas certidões de dívida ativa, elevado número de demandas novas, por meio da análise, triagem e minutagem em lotes sucessivos de despachos iniciais nas execuções fiscais e assinatura no processo judicial eletrônico (TJPE, 2020). A ferramenta tornou possível a realização em 15 dias de atividades que só seriam concluídas por servidores e juízes em 18 meses e permitiu a redução de cerca de 70%do acervo, o qual passou de 450 mil processos para 150 mil.

No Tribunal de Justiça do Estado de Minais Gerais, o programa Radar, criado em junho de 2018 pelos servidores da Diretoria Executiva de Informática do próprio órgão, permite selecionar e separar recursos com pedidos idênticos, além de possibilitar a formação de um esboço de voto padrão a partir do que já foi decidido pelos Tribunais Superiores e em Incidentes de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) (TJMG, 2018). Desse modo, o programa já identifica outras demandas similares e procede ao julgamento conjunto de forma muito rápida.

Uma iniciativa interessante foi da Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco em parceria com a Universidade de Pernambuco (UPE) e a Agência de Tecnologia da Informação de Pernambuco para a solução de problemas da advocacia pública por meio da inteligência artificial. O Projeto Aurora (PGE-PE, 2020) foi assim concebido e a partir de março de 2020, quatro procuradores estaduais participaram do programa Sala de Aula Aberta da UPE frequentando a matéria de Computação Inteligente, na qual vinte mestrandos do Programa de Pós-Graduação em Engenharia da Computação ficaram à disposição para criar soluções oriundas de problemas apresentados pelos advogados públicos. Dessa união de esforços, em setembro de 2020, foram elaborados 6 motores destinados a ajudar o trabalho direcionado inicialmente para a recuperação da dívida ativa estadual e desjudicialização do processo de cobrança do crédito. O objetivo da PGE-PE é a expansão do trabalho desenvolvido para outros setores dentro da instituição, como a Corregedoria e as Procuradorias do Contencioso e Consultiva.

Essa colaboração entre diferentes instituições revela-se primordial para o aprimoramento das atividades das procuradorias, seja com o exemplo do Estado de Pernambuco que agregou experiências de estudantes de engenharia da universidade, seja até mesmo com a parceria entre órgãos públicos, como a Secretaria da Fazenda Estadual. Um exemplo desse arranjo é o compartilhamento de dados e o acesso do procurador ao sistema da dívida ativa para dar baixa na certidão, principalmente com a extinção em massa de execuções fiscais pela consumação da prescrição intercorrente a partir do julgamento do Recurso Especial nº1.340.556. Essa atuação conjunta e coordenada evita que haja uma sobrecarga de trabalho e permite troca de experiências para uma eficiente gestão da dívida ativa, já que tanto a procuradoria como a secretaria da fazenda têm funções a serem desempenhadas no processo de formação do crédito público.

Outra medida interessante a ser desenvolvida é o incentivo aos servidores do setor de tecnologia da informação do próprio órgão de representação judicial à criação de softwares e programas específicos destinados a atender as necessidades de atuação dos procuradores. Nesse sentido, a Procuradoria Geral do Estado de Goiás participou do Workshop de Trabalhos Finais dos Cursos de Inteligência Artificial em 2019 realizado pela Universidade Federal de Goiás. Dois projetos foram desenvolvidos dentro do Núcleo Central de Segurança e Inteligência da PGE-GO, sendo que um deles foi apresentado por um servidor e foi denominado “Avaliação Automática de Textos Jurídicos”, cujo objetivo é o reconhecimento de padrões nos textos de pareceres jurídicos para que novos pedidos de aposentadoria de servidor sejam classificados e seja apresentado pelo programa um tipo específico de parecer ao procurador que estiver analisando o pedido, facilitando o trabalho na busca de dados.

O outro foi desenvolvido por um pesquisador do Instituto Mauro Borges de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos, intitulado “Uso de aprendizagem da máquina para identificação da taxa de risco dos créditos tributários nos processos de execução fiscal” (IMB, 2019), exatamente para melhor estimular a recuperação dos créditos inscritos em dívida ativa. Cumpre acrescentar que em dezembro de 2020, foi criado um grupo de trabalho para a elaboração de peças processuais utilizadas no rito da execução fiscal, as quais foram inseridas em um programa de inteligência artificial chamado Sistema Cora, responsável pela geração de peças jurídicas. Tal iniciativa ajudou a promover a padronização dos documentos usados na atuação judicial, permitindo-se uma atuação mais eficaz da PGE.

Por sua vez, em uma situação distinta envolvendo uma grande dívida ativa e fraude fiscal no Estado de São Paulo, destacou-se a atuação da PGE-SP no famoso caso da fabricante de refrigerantes Dolly, que acabou culminando na prisão temporária do empresário dono da marca e outros envolvidos, além do ajuizamento de ações cautelares fiscais pela PGE-SP e a PGFN para promover a indisponibilidade de bens em cerca de R$150 milhões de reais (JOTA, 2019) a fim de garantir o crédito público. O Grupo de Atuação Especial para Recuperação Fiscal (Gaerfis) da PGE-SP havia inicialmente encontrado dificuldade para investigar as dissimulações e operações fraudulentas realizadas por empresas associadas à fabricante, quando em 2017, a empresa Neoway venceu a licitação para a prestação de serviços de informática à Procuradoria de São Paulo. Graças à expertise da contratada em Big Data, ou seja, ao processamento de grande volume de dados, proveniente à época de cerca de 3 mil fontes públicas que puderam ser cruzadas com o banco de informações da própria PGE-SP, foi possível identificar com maior rapidez o faturamento, atividades econômicas e contratações feitas pelas empresas envolvidas, permitindo que os procuradores direcionassem a busca aos créditos que fossem recuperáveis.

Por conseguinte, reunindo-se os exemplos mencionados anteriormente, sem prejuízo de tantos outros que têm representado uma mudança de atuação na gestão da dívida ativa pelos órgãos de procuradorias, percebe-se que o uso da tecnologia, seja por meio da criação de softwares específicos em parceria com outras instituições públicas ou privadas, ou até mesmo desenvolvido pelos próprios servidores do setor de informática, seja pela aderência aos programas de inteligência artificial a partir da contratação de empresas especializadas, é fundamental para a efetividade na recuperação do crédito público.

O Regime Diferenciado de Cobrança de Crédito adotado pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional foi uma medida de suma importância, pois com o rating de créditos, foi possível segmentar os perfis de devedores e a origem da dívida ativa que compunha a maior parte do estoque do ente público. O resultado, conforme já relatado, foi a diminuição do número de execuções fiscais ajuizadas e maior retorno dos valores cobrados, que efetivamente tinham maiores chances de resgate. Novamente, com o apoio da inteligência artificial por meio de técnicas de mineração e análise de dados foi possível definir estratégias distintas de cobrança a partir dos padrões coletados.

De acordo com o relatório de pesquisa denominado Tecnologia Aplicada à Gestão dos Conflitos no Âmbito do Poder Judiciário Brasileiro realizado pelo Centro de Inovação, Administração e Pesquisa do Judiciário da Fundação Getúlio Vargas (CIAPJ/FGV, 2021, p. 69) apontou-se a existência de 64 projetos de inteligência artificial sendo aplicados ou em fase de desenvolvimento em 47 tribunais brasileiros, além da plataforma Sinapses do CNJ. Ressalte-se que esse avanço tecnológico, o qual vem sendo paulatinamente aplicado ao setor público, pode ajudar também nos maiores desafios da Fazenda Pública para o bom êxito nas execuções fiscais: a efetividade nas diligências de localização do devedor e de bens penhoráveis.

O exemplo já comentado da 12ª Vara de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro revelou os inúmeros benefícios da implantação do programa nas execuções fiscais, permitindo-se em pouquíssimo tempo, uma celeridade espantosa na resolução de processos, além de um considerável valor recuperado em apenas 3 dias por meio de penhoras automatizadas.

Desse modo, o crescente investimento em tecnologia para o aprimoramento e automação de processos, além de programas que promovam o refinamento das informações com a segmentação de devedores e o rating do crédito público além de outras funções associadas à mineração de dados, junto com a parceria e compartilhamento de experiências entre órgãos públicos e demais pessoas jurídicas públicas e privadas são algumas das ferramentas essenciais para superar as dificuldades na recuperação do crédito público e gerar maior racionalidade e eficiência na administração dos ativos fazendários.

5. CONCLUSÃO

A execução fiscal continua a ser a principal forma de cobrança da dívida ativa pela Fazenda Pública e o estudo da prescrição intercorrente revela-se primordial pois além de ser um tema positivado recentemente, com a introdução legislativa do §4º no artigo 40 da Lei 6.830 pela Lei n 11.051/2004, trata-se de uma das principais formas de extinção do processo executivo. Com o julgamento do Recurso Especial nº 1.340.553 em sede de recursos repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça proferiu uma decisão paradigmática definindo os marcos temporais da suspensão do processo e o início da contagem da prescrição intercorrente, definindo como se daria o rito do já mencionado artigo 40, gerando assim efeitos automáticos nas execuções em curso.

Desse modo, o primeiro capítulo incumbiu-se de traçar os delineamentos iniciais sobre o instituto da prescrição, tais como o conceito e distinções entre a prescrição intercorrente, objeto do presente trabalho e a prescrição ordinária, a qual no Direito Tributário, diversamente do disposto no Código Civil, acaba possuindo duplo efeito: extinção da pretensão de cobrança e do próprio direito de crédito.

Em seguida, no segundo capítulo buscou-se trazer a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre alguns aspectos da prescrição intercorrente na execução fiscal antes e depois do julgamento do Recurso Especial nº 1.340.553, o qual alterou a forma de contagem dos prazos previstos no artigo 40 da Lei nº 6.830 e fixou teses importantes sobre o início automático dos prazos de suspensão da execução fiscal com a não localização do devedor e de bens penhoráveis e da necessidade de efetividade das diligências requeridas pela Fazenda Pública para que pudessem interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando o mero peticionamento do órgão de representação judicial.

Por fim, no último capítulo foram apresentados alguns desafios da Fazenda Pública com a execução fiscal, mormente aqueles relativos às diligências interruptivas mencionadas anteriormente, pois o STJ passou a exigir uma postura mais ativa da instituição a partir da decisão do já citado recurso especial repetitivo. Como uma possível solução para a melhoria na gestão da dívida ativa e consequentemente para maior êxito na recuperação do crédito, vários exemplos de aplicação da tecnologia da inteligência artificial foram citados tanto no Poder Judiciário como no âmbito das Procuradorias. Tal iniciativa associada à maior integração entre os órgãos públicos envolvidos na cobrança do crédito público para compartilhamento de dados e de experiências, assim como parceria com instituições públicas e privadas podem contribuir sobremaneira na atuação judicial e extrajudicial da Fazenda Pública, inclusive com incremento na arrecadação dos entes públicos.

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[1] Pós-graduação em Direito e Advocacia Pública (UERJ), graduação em Direito pela Universidade Federal Fluminense (UFF).

Enviado: Abril, 2021.

Aprovado: Maio, 2021.

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Marcela Paranhos Pimentel

2 respostas

  1. Gostaria de parabenizá-lo pelo excelente artigo, uma pesquisa feita com muita dedicação e atualizada em tema de grande relevância.

  2. Prezado Davi, muito obrigada pelo elogio. De fato, é um assunto importante e quis trazer alguns casos para ilustrar o quem vem sendo feito na prática. Abraços

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