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A evolução da justiça militar no Brasil

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CONTEÚDO

RESENHA

GUIMARÃES, Fernanda De Oliveira Cedro [1]

GUIMARÃES, Fernanda De Oliveira Cedro. A evolução da justiça militar no Brasil. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 06, Ed. 06, Vol. 06, pp. 129-141. Junho de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/evolucao-da-justica

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo analisar aspectos de definição e competência da Justiça Militar no ordenamento jurídico brasileiro bem como sua evolução legislativa, em especial da lei 13.491/2017. A referida lei ampliou a competência da Justiça Militar em relação a certos crimes cometidos por militares contra civis, e, por isso, faz-se necessária uma análise da história e funcionamento da Justiça Militar brasileira, seguida de um exame mais detido sobre recentes discussões e julgamentos acerca dos limites de competência da Justiça Castrense.

Palavras-chave: Justiça Militar, Competência, Lei 13.491/2017, Direito Penal Militar, Direito Processual Penal Militar.

1. INTRODUÇÃO

No ano de 2021, a Justiça Militar completou 213 anos, se tornando a Justiça mais antiga do país. Conforme estudo sobre o tema da Dra. Mônely Arleu (2013), a Justiça Militar foi oficialmente criada em 1808, por D. João VI poucos meses depois da vinda da família real ao Brasil, com a criação do Conselho Supremo Militar de Justiça. Desde então, a Justiça Militar ultrapassou barreiras e permaneceu válida durante todo período republicano, adquirindo características próprias da Justiça Comum, ressalvando suas peculiaridades próprias.

A competência da Justiça Militar tem sido muito debatida desde a sua criação e cada dia mais vem ganhando espaço na seara cível e política brasileira e continua presentes desde então, principalmente após a mais recente atualização legislativa sobre o tema.

Neste entendimento, a competência atual da Justiça Militar encontra-se expressa na lei 13.491/17 que alterou significativamente o Código Penal Militar, ampliando assim a competência da Justiça Militar.

O objetivo final desta pesquisa é, portanto, fazer uma breve análise da história da Justiça militar em si com a observância da evolução da competência castrense diante das recentes alterações legislativas e decisões jurídicas sobre o tema.

2. A JUSTIÇA MILITAR BRASILEIRA

2.1 CONTEXTO HISTÓRICO

A Justiça Militar da União – ou Justiça Castrense – foi instituída em 1808, por lei assinada por D. João, com a denominação de Conselho Supremo Militar. Consolidada depois de 200 anos de História, a Justiça Militar, foi integrada ao Poder Judiciário pela Constituição de 1934, como resultado da decisão unânime da Assembleia Nacional Constituinte, à época (ROCHA, 2010).

Como é de conhecimento histórico, no início dos anos 1800 havia conflitos na Europa, em especial envolvendo países como França e Inglaterra.  Após a derrota da França para os ingleses na batalha de Trafalgar, Napoleão Bonaparte determinou o bloqueio continental, que proibia o acesso dos ingleses a qualquer porto que tivesse domínio francês. Entretanto, Portugal e Inglaterra mantinham relações políticas e comerciais próximas, o que impossibilitaria a adesão ao referido bloqueio.

Assim, em 1807, D. João embarcou no porto de Lisboa rumando ao Brasil, sua principal Colônia, no dia 8 de março de 1808. Durante toda viagem da família real, uma frota de navios ingleses fez a escolta dos portugueses, como prometido anteriormente.

Um mês após chegar em solo brasileiro, D. João expediu um dos primeiros atos de política externa, editando uma Carta Régia que criava o Conselho Supremo Militar e de Justiça, que era composto pelos Conselho de Justiça Supremo Militar, o Conselho Supremo Militar e o Conselho de Justiça. O recém-criado Conselho de Justiça funcionou até o ano de 1891, e teve como Presidentes de Honra os monarcas que governaram o Brasil: o Príncipe Regente Dom João, Dom João VI, Dom Pedro I e seu filho, Dom Pedro II.

A Guerra do Paraguai, no ano de 1870, marcou o início de grandes mudanças no Brasil (SILVA, s.d.), principalmente na vida jurídica, social e política e jurídica. Nesta época, o Império ostentava grande prestígio entre a população, porém não conseguia o apoio necessário para se sustentar, devido aos elevados custos provocados pela guerra.

Nesse contexto, a questão militar, caracterizada por discordâncias dentro do próprio Império, agravou em grande medida a crise da Monarquia em fins da década de 1880, instaurando assim a República de governo através de um golpe de Estado liderados pelo Marechal Manuel Deodoro da Fonseca.

Tal ato encerrou quase 50 anos de reinado de Dom Pedro II, decretando praticamente a expulsão do Imperador e de toda a sua família para a Europa. Com isso, a República seria a nova forma de governo do país, trazendo diversas mudanças nos órgãos da Administração Pública, para que fosse dissociada a identidade nacional brasileira com a imagem antiga do imperador português e de todo o sistema imperial atrelado a ele.

Outra mudança significativa foi a criação do Supremo Tribunal Militar (KORNIS e JUNQUEIRA, s.d.) feita através da Constituição Federal de 1891, substituindo o antigo Conselho Supremo Militar de Justiça. Em termos gerais, a Carta Magna de 1891 estabeleceu a característica de vitaliciedade do membro dessa justiça especializada, reforçando a noção de carreira profissionalizante, mas ainda separada do Poder Judiciário. A Justiça Militar só foi incluída– devidamente – como órgão do poder judiciário, quase 50 anos depois, apenas na Constituição federal de 1934.

Além desta modificação, a competência da Justiça militar foi estendida pela Constituição de 1934, ampliando a competência do tribunal militar para que julgasse os civis que praticassem crimes contra a segurança nacional ou contra instituições militares.

Dois anos depois, com o advento da Lei nº 244, de 11 de setembro de 1936, foi criado o Tribunal de Segurança Nacional – TSN – que seria o órgão de 1ª instância da Justiça Militar, o qual conheceria de todos os crimes praticados por militares e/ou civis contra a segurança nacional se fossem praticados com auxílio ou sob orientação de organizações estrangeiras, além de ser também de sua responsabilidade o julgamento dos crimes contra as instituições militares. De suas decisões, o Supremo Tribunal Militar seria responsável por conhecer os recursos, com efeito devolutivo.

A partir de 1945, foi promulgada uma nova Constituição no Brasil, trazendo grandes alterações no âmbito militar, em especial no Supremo Tribunal Militar, que teve o nome alterado para Superior Tribunal Militar, permanecendo até os dias atuais com este nome. Além disso, as competências administrativas instituídas desde o tempo Imperial, em 1808, foram excluídas, mantendo-se apenas as competências especificamente militares.

No ano de 1946, o brasil passou por um período inédito de democracia, com eleições diretas para Presidência da República, sendo eleito o presidente Eurico Gaspar Dutra. Na eleição seguinte, o presidente Getúlio Vargas voltou ao poder, seguido de Juscelino Kubitscheck e Jânio Quadros, este que em 1961 não encerrou seu mandato por ter renunciado algum tempo depois da posse.

Conforme estudo do professor Armando Soares de Castro Formiga, na segunda metade do século XX, o Brasil passou por várias mudanças relacionadas a diversas pautas sociais em especial à reforma agrária e desapropriações, reacendendo assim o debate acerca da previsão do Partido Comunista no país. Tal discussão acabou por desagradar os setores conservadores da sociedade, do partido oposto, composto principalmente pela União Democrática Nacional – UDN.

Diante disso, no primeiro trimestre de 1964, o General Olímpio Mourão Filho, comandante da 4ª Região Militar, marchou com suas tropas de Minas Gerais para o Rio de Janeiro, e por um ato político, conseguiram instaurar um governo militar no país, destituindo assim, o então Presidente Joao Goulart. Neste movimento, foi editado o Ato Institucional nº2, em 1965, que acabou trazendo diversas modificações nas competências e atribuições do Superior Tribunal Militar.

Apenas com a Constituição de 1967 a atuação da justiça militar foi ampliada, quando o regime civil-militar compreendido nos anos de 1964-1985 trouxe para alçada da justiça militar a possibilidade da inclusão de civis na hipótese de cometimento de “crimes contra a segurança nacional”, conforme esses fossem definidos pela lei. Antes da referida mudança, os julgamentos de civis pela Justiça Militar somente eram possíveis em casos de “segurança externa”, significando assim uma maior possibilidade de limites de atuação com a nova regra.

Sobre o tema, o doutrinador Rogério Romano Tadeu entende que: “O legislador ordinário só pode sujeitar civis à Justiça Militar, em tempos de paz, nos crimes contra a segurança externa do país ou às instituições militares”

Em 1985, quando se encerrou o governo militar, foi convocada uma Assembleia Constituinte para a edição da Constituição Federal de 1988, também conhecida como “Constituição Cidadã” que manteve a composição da Corte do Superior Tribunal de Justiça Militar, limitando a Justiça Militar a julgar e processar os crimes militares definidos em lei.

2.2 COMPETÊNCIA E COMPOSIÇÃO

A Justiça Militar tem previsão expressa na Constituição Federal de 1988 nos artigos 122 a 124, a saber:

Art. 122. São órgãos da Justiça Militar:

I – O Superior Tribunal Militar;

II – Os Tribunais e Juízes Militares instituídos por lei.

 Art. 123. O Superior Tribunal Militar compor-se-á de quinze Ministros vitalícios, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo Senado Federal, sendo três dentre oficiais-generais da Marinha, quatro dentre oficiais-generais do Exército, três dentre oficiais-generais da Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais elevado da carreira, e cinco dentre civis.

Parágrafo único. Os Ministros civis serão escolhidos pelo Presidente da República dentre brasileiros maiores de trinta e cinco anos, sendo:

I – Três dentre advogados de notório saber jurídico e conduta ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional;

II – Dois, por escolha paritária, dentre juízes auditores e membros do Ministério Público da Justiça Militar.

 Art. 124. à Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei.

Parágrafo único. A lei disporá sobre a organização, o funcionamento e a competência da Justiça Militar.

Em que pese a Constituição Federal ter fixado normas gerais sobre o tema, restou designado à lei ordinária a fixação da estrutura da Justiça Militar. Desta maneira, foi editada a Lei 8.457, de 4/9/1992 – a Lei de Organização Judiciária Militar da União.

No 1º grau de jurisdição, a referida norma previu, além do Juiz Federal da Justiça Militar, os Conselhos de Justiça, cada um deles formado por 4 (quatro) Oficiais das Forças Armadas e presidido por um juiz togado. Já o Superior Tribunal Militar é composto por 15 (quinze) Ministros, sendo 10 (dez) Oficiais-Generais da ativa e do posto mais elevado da carreira (3 da Marinha, 4 do Exército e 3 da Aeronáutica); e 5 (cinco) civis, 3 (três) oriundos da advocacia, um da magistratura militar e outro do Ministério Público Militar.

Atualmente, a despeito da possibilidade da existência dos Tribunais Militares, estes não foram criados pela legislação ordinária e, desta maneira, o Superior Tribunal Militar funciona como órgão superior e de 2º grau. Ademais, de maneira peculiar e diferente da Justiça Comum, a formação da Justiça Militar não se dá apenas por juízes togados, mas também por Oficiais das Forças Armadas.

Como já devidamente explicitado, o art. 124 da Constituição Federal/88 compreende a atribuição da Justiça Militar para julgar e processar os crimes militares, conforme definidos em lei. O Código Penal Militar define o conceito de crime militar – no art 9º, o qual se se refere àqueles praticados em tempo de paz bem como em tempo de guerra, devidamente expresso no art 10.

No ano de 2017, o art. 9º passou por importante alteração, inserida pela Lei 13.491/17, a qual trouxe importantes reflexos em relação à competência da Justiça Militar, o que será aprofundado adiante.

3. A AMPLIAÇÃO DA COMPETENCIA DA JUSTIÇA MILITAR PELA LEI 13491/17

O debate e as ações jurídicas sobre as competências da justiça militar, têm sido debatidos desde sua criação, porém, continuam atuais e constantes, principalmente com a mais recente alteração trazida pela lei 13.491/17.

Entretanto, antes de adentrar o debate da referida lei, cumpre-nos salientar a atuação das instituições militares – que gozam de prestígio perante a sociedade brasileira – e, mesmo de forma não intencional, criaram um sistema único e singular por sua constância e regularidade. Com isso, ao longo dos anos, a Corte Suprema do país – STF – reconheceu que o Direito Penal Militar agrega determinados bens jurídicos que não devem ser confundidos com os do Direito Penal Comum.

Sobre o tema, os doutrinadores estabeleciam diversos critérios para classificar um delito como militar, diferenciando-o assim do crime comum. O crime militar, conforme assevera Marcelo Uzeda (2018, p. 70), é definido como “conduta que, direta ou indiretamente, atenta contra bens e interesses jurídicos das instituições militares, qualquer que seja o agente”. Assim, o critério adotado no Brasil para a definição de crime militar foi o ratione legis, ou seja, crime militar é aquele que se encontra devidamente definido como crime na lei penal militar. Tal critério foi determinado desde a Constituição Federal de 1946 tendo permanecido na atual Constituição Federal, conforme dispõe os artigos 124 e 125, §4º.

Desta feita, verifica-se que a lei penal militar se utiliza dos critérios antes enumerados para escolher em que ocasiões uma conduta será considerada, ou não, crime militar. Sobre o assunto, assim ensina Saraiva (2009, p. 44):

[…] o artigo 9.º carrega consigo a mesclagem de várias características que adornam este especial modelo de delito. Por vezes, é a qualidade dos sujeitos (ativo ou passivo) que transforma um crime (que seria) comum em militar. Por outras, é o local da infração ou ter sido o fato praticado em detrimento da Administração Militar que os singulariza. De qualquer sorte, as exigências contidas neste artigo consubstanciam o primeiro passo na adequação típica de qualquer comportamento humano que se pretenda tratar como crime militar.

Desde sua criação, sempre houve dificuldades para a doutrina definir o conceito de crime militar, conforme preceitua Lobão (2011, p. 31):

[…] crime militar é a infração penal prevista na Lei Penal Militar que lesiona bens ou interesses vinculados à destinação constitucional das instituições militares, às suas atribuições legais, ao seu funcionamento, à sua própria existência, no aspecto particular da disciplina, da hierarquia, da proteção à autoridade militar, e ao serviço militar.

Com o advento da lei 13.491 de 13 de outubro de 2017, a definição de crime militar passou por importantes alterações no Código Penal Militar, a saber:

Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz:

I – Os crimes de que trata este Código, quando definidos de modo diverso na lei penal comum, ou nela não previstos, qualquer que seja o agente, salvo disposição especial;

II – Os crimes previstos neste Código e os previstos na legislação penal, quando praticados:

a) por militar em situação de atividade ou assemelhado, contra militar na mesma situação ou assemelhado;

b) por militar em situação de atividade ou assemelhado, em lugar sujeito à administração militar, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil;

c) por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou reformado, ou civil;

d) por militar durante o período de manobras ou exercício, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil;

e) por militar em situação de atividade, ou assemelhado, contra o patrimônio sob a administração militar, ou a ordem administrativa militar;

f) revogada.

III – os crimes praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do inciso II, nos seguintes casos:

a) contra o patrimônio sob a administração militar, ou contra a ordem administrativa militar;

b) em lugar sujeito à administração militar contra militar em situação de atividade ou assemelhado, ou contra funcionário de Ministério militar ou da Justiça Militar, no exercício de função inerente ao seu cargo;

c) contra militar em formatura, ou durante o período de prontidão, vigilância, observação, exploração, exercício, acampamento, acantonamento ou manobras;

d) ainda que fora do lugar sujeito à administração militar, contra militar em função de natureza militar, ou no desempenho de serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem pública, administrativa ou judiciária, quando legalmente requisitado para aquele fim, ou em obediência a determinação legal superior.

§ 1º Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares contra civil, serão da competência do Tribunal do Júri

§ 2º Os crimes de que trata este artigo, quando dolosos contra a vida e cometidos por militares das Forças Armadas contra civil, serão da competência da Justiça Militar da União, se praticados no contexto:

I – Do cumprimento de atribuições que lhes forem estabelecidas pelo Presidente da República ou pelo Ministro de Estado da Defesa;

II – De ação que envolva a segurança de instituição militar ou de missão militar, mesmo que não beligerante; ou

III – de atividade de natureza militar, de operação de paz, de garantia da lei e da ordem ou de atribuição subsidiária, realizadas em conformidade com o disposto no art. 142 da Constituição Federal e na forma dos seguintes diplomas legais:

a) Lei no 565, de 19 de dezembro de 1986 – Código Brasileiro de Aeronáutica;

b) Lei Complementar nº 97, de 9 de junho de 1999

c) Decreto-Lei no 002, de 21 de outubro de 1969 – Código de Processo Penal Militar; e

d) Lei no 737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral.

Como se verifica, os trechos em destaque aumentaram ainda mais a competência da Justiça Militar para o processo e julgamento de crimes praticados por militares, ainda que praticado contra civil, e, mesmo que o crime esteja tipificado fora do Código Penal Militar.

Isto significa dizer que, antes da lei de 2017, o inciso II trazia expressamente que os crimes previstos apenas no Código Penal Militar eram crimes militares e, com a respectiva inovação legislativa, a previsão é de que além dos crimes previstos no Código Penal Militar, todas as leis penais do país também serão consideradas crimes militares, se preenchidas as condições do inciso II do Código Penal Militar.

Em tese, o objetivo da referida lei foi regular a competência para julgamento de crimes praticados por militares federais durante a execução de suas missões precípuas, principalmente na área de segurança pública e da segurança nacional trazendo cada vez mais lisura e transparência para a instituição em geral.

Porém, verifica-se na prática que a ampliação desta competência acarretou muitos processos para a Justiça Militar, que antes tramitavam na justiça comum, além de diversas críticas a respeito de tal modificação. Nas palavras do doutor em Ciências Políticas Andrés Del Río em seu artigo “A quem serve a expansão da justiça militar?”:

A Justiça Militar é uma justiça corporativa, formada em sua imensa maioria por militares da ativa (sem formação jurídica e sujeitos à hierarquia e à disciplina castrenses) cujo trabalho consiste em aplicar legislação especial editada em 1969, no auge da ditadura civil-militar: o Código Penal Militar e o Código de Processo Penal Militar. (RÍO e GOMES, 2018, p.4-5).

No mesmo entendimento, o Ilmo. Promotor de Justiça Luiz Gustavo Gonçalves Ribeiro, assim descreve:

Todavia, a reboque e sem qualquer discussão da matéria no âmbito legislativo, a novel lei ampliou, também, a competência da justiça militar dos estados em vista do aumento exponencial do número de crimes de natureza militar, em violação material e formal a dispositivos constitucionais e convencionais de proteção de direitos humanos, sem prejuízo da própria violação dogmática à própria teoria do bem jurídico, que orienta a confecção e hermenêutica dos tipos penais. (RIBEIRO, 2017, p.7)

Como se verifica, não faltam argumentos para diversas críticas, assim como ocorre, invariavelmente, em toda inovação legislativa. Entretanto, por se tratar de uma justiça especializada, o todo e qualquer entendimento deve pautar-se por suas singularidades, priorizando a garantia da lei e da ordem e, em especial na preservação da Hierarquia e Disciplina, os quais são os princípios constitucionais basilares para as todas as instituições militares.

Ao inserir ao inserir o parágrafo 2º ao artigo 9º do Código Penal Militar, a lei 13.491/2017 tentou consolidar e pacificar os entendimentos dos tribunais pátrios. Nas palavras do promotor Cícero Robson Coimbra Neves (2018, p.63), sobre o tema “Inequivocamente, a Lei n. 13.491/17 – apesar de todos os ataques que vem sofrendo – importou em uma ampliação das hipóteses típicas nos crimes militares, o que leva a uma maior possibilidade de atuação dos atores do Direito Penal Militar”.

Ao ampliar o conceito dos crimes militares, a lei 13.491/17 possibilitou uma atualização de uma lei já consolidada no ordenamento jurídico, porém, que até então, não tinha grandes relevâncias fora do meio militar, mesmo com uma crescente demanda. Desta maneira, foi possibilitado uma maior interação com a legislação comum bem como com a sociedade em geral. Talvez, por si só, involuntariamente, essa seja a maior contribuição da referida lei.

4. CONCLUSÃO

O presente trabalho buscou traçar uma evolução histórica a respeito da definição da Justiça Militar e de sua competência, ao longo dos anos na história Brasileira, ressaltando em especial o dispositivo mais recente da lei 13.491/17.

Sobre a referida lei, o objetivo não foi esgotar o tema, já que ainda será amplamente debatido pela doutrina e pela jurisprudência ao longo dos próximos anos. Porém, é sabido que a carreira profissional militar tem uma especificidade que a diferencia da vida civil, e só por este motivo, deve ser levado em consideração na fixação da competência para julgar os crimes militares.

Assim, se o civil possui o direito de ser julgado por seus pares, pelos motivos expostos, nada mais justo que o militar, em determinadas ocasiões, seja julgado, igualmente, pelos seus, por clara aplicação do princípio da isonomia.

As condições demonstradas no § 2º, do art. 9º, do Código Penal Militar envolvem toda uma circunstância que justificaria o julgamento pela Justiça Militar da União. Para tanto, foi preciso analisar a estrutura e o real funcionamento da Justiça Militar, além de examinar alguns questionamentos e críticas recentes sobre o assunto.

Conforme exposto, diante das alterações realizadas, verifica-se que a Justiça Militar poderá processar e julgar os crimes previstos na legislação penal comum, bem como aplicar os institutos típicos do direito penal e processual penal comum com os requisitos que lhe são próprios.

Sem se inserir no mérito da questão em si e/ou em debates valorativos e políticos a respeito do tema – e concentrando-se exclusivamente aos aspectos legais e constitucionais – a nova leitura do artigo 9º do Código Penal Militar traduz o anseio da sociedade brasileira de que o sistema penal no Brasil deve ser atualizado no sentido de promover maior celeridade e efetividade à proteção aos bens jurídicos tutelados pela legislação comum e principalmente pela militar.

REFERÊNCIAS

ARLEU, Mônely. Breve Escorço Histórico, Estrutural e Funcional da Justiça Militar no Brasil. Direito Militar 1 mai. 2013. Disponível em: <http://direitocastrense.blogspot.com.br/2013/05/breve-escorco-historico-estrutural-e-funcional-da-justica-militar-no-brasil.html>. Acesso em: 02 de junho de 2021.

BRASIL. Congresso Nacional. Emenda Constitucional n° 45, de 30 de dezembro de 2004. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc45.htm>.Acesso em: 02 de Abr.  2021

BRASIL. Congresso Nacional. Lei Nº 13.491, de 13 de outubro de 2017. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13491.htm>. Acesso em: 02 de Abr.  2021.

BRASIL. Constituição (1891). Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, decretada e promulgada em 24 de fevereiro de 1891.

BRASIL. Constituição (1934). Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, promulgada em 16 de julho de 1934.

BRASIL. Constituição (1967). Constituição da República Federativa do Brasil decretada e promulgada em 24 de janeiro de 1967.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil promulgada em 5 de outubro de 1988.

KORNIS, Mônica; JUNQUEIRA, Eduardo. Verbete: Superior Tribunal Militar (STM). FGV CPDOC. Disponível em: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/superior-tribunal-militar-stm. Acesso em 01 de junho de 2021

CORRÊA, Univaldo. A evolução da Justiça Militar no Brasil. Revista de Direito Militar: artigos inéditos. Florianópolis: Associação dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais, 2002.

FARIA, Marcelo Uzeda de. Direito penal militar. 4ª ed. Salvador: Juspodivm. 2018

FORMIGA, Armando Soares de Castro. Aspectos da Codificação Civil no Século XIX. Curitiba: Juruá, 2012.

LOBÃO, Célio. (2011), Comentários ao código penal militar: parte geral. Rio de Janeiro, Forense. v. 1.

NEVES, Cícero Robson Coimbra; STREIFINGER, Marcello. (2018), Manual de direito penal militar. 2. ed., São Paulo, Saraiva.

RIBEIRO, Luiz Gustavo Gonçalves. Política pública de segurança dilacerada: o exemplo da Lei 13491/2017 e suas consequências penais e processuais penais. Rev. Bras. Polít. Públicas, Brasília, v. 8, nº 1, 2018 p.340-356

RÍO, Andrés Del; GOMES, Juliana Cesário Alvim. A quem serve a expansão da Justiça Militar? Le Monde Diplomatique, Brasil. 21 de maio de 2018. Disponível em: <https://diplomatique.org.br/a-quem-serveaexpansao-da-justiça-militar/>. Acesso em: 03 mai 2021.

ROCHA, Maria Elizabeth Guimarães Teixeira. Breves comentários sobre a mais antiga justiça do Brasil: Justiça Militar da União. Justiça & Cidadania, janeiro de 2010. Disponível em: https://www.editorajc.com.br/breves-comentarios-sobre-a-mais-antiga-justica-do-brasil-justica-militar-da-uniao/ Acesso em 02 de junho de 2021.

SILVA, Daniel Neves. Guerra do Paraguai. História do Mundo. Disponível em: https://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/guerra-do-paraguai.htm. Acesso em 01 de junho de 2021.

SARAIVA, Alexandre José de Barros Leal. (2009), Código penal militar comentado: artigo por artigo: parte geral. 2. ed. rev. e atual., São Paulo, Método.

[1] Pós Graduanda Em Direito Militar. Graduada Em Direito.

Enviado: Abril, 2021.

Aprovado: Junho, 2021.

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Fernanda De Oliveira Cedro Guimarães

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