REVISTACIENTIFICAMULTIDISCIPLINARNUCLEODOCONHECIMENTO

Revista Científica Multidisciplinar

Pesquisar nos:
Filter by Categorias
Administração
Administração Naval
Agronomia
Arquitetura
Arte
Biologia
Ciência da Computação
Ciência da Religião
Ciências Aeronáuticas
Ciências Sociais
Comunicação
Contabilidade
Educação
Educação Física
Engenharia Agrícola
Engenharia Ambiental
Engenharia Civil
Engenharia da Computação
Engenharia de Produção
Engenharia Elétrica
Engenharia Mecânica
Engenharia Química
Ética
Filosofia
Física
Gastronomia
Geografia
História
Lei
Letras
Literatura
Marketing
Matemática
Meio Ambiente
Meteorologia
Nutrição
Odontologia
Pedagogia
Psicologia
Química
Saúde
Sem categoria
Sociologia
Tecnologia
Teologia
Turismo
Veterinária
Zootecnia
Pesquisar por:
Selecionar todos
Autores
Palavras-Chave
Comentários
Anexos / Arquivos

O tratamento jurídico do aborto na história das legislações criminais brasileiras

RC: 22829
297
4.8/5 - (42 votes)
DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/aborto

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

PAAPE, Pamela Dieter [1]

PAAPE, Pamela Dieter. O tratamento jurídico do aborto na história das legislações criminais brasileiras. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 03, Ed. 11, Vol. 05, pp. 83-96 Novembro de 2018. ISSN:2448-0959

RESUMO

Para que possamos entender a existência de algo devemos conhecer primeiro sua base histórica, visando assim o estudo comparado da história do aborto no âmbito interno do estado brasileiro, demonstrando como o passado espelha as nossas atitudes sociais na atualidade, com o intuito de conhecê-la e mostrá-la, destacando o por que são importantes para a formação da legislação atual brasileira sobre esse assunto. De forma a pontuar a influência das legislações nacionais antigas no tratamento legal trazido no presente código penal de 1940. Comparando assim, desde as primeiras legislações criminais que tiveram início no Brasil império com o nosso código penal vigente.

Palavra-chave: Aborto, História, Legislações brasileiras.

INTRODUÇÃO

Os povos antigos não viam o aborto como um crime (nos primórdios da sociedade humana). Entretanto, no Brasil desde a colonização pelos Portugueses (em 1500), o aborto foi repudiado, a intenção era a mulher ser mãe, seria algo natural, tendo a maternidade como uma obrigatoriedade implícita as mulheres dessa época. Tendo como objetivo povoar o Brasil, a terra nova precisava ser habitada, independentemente da situação financeira e social da família que ganharia um novo membro, sendo desejado ou não, nasceria para ser um cidadão brasileiro.

Está pesquisa tem como tema o tratamento jurídico do aborto na história das legislações criminais brasileiras.

A presente investigação, portanto, parte do seguinte problema de pesquisa: Como arcabouço histórico das legislações criminais brasileiras refletem com relação ao aborto perante o Código Penal de 1940?

Parte-se da hipótese de que como o Código Penal vigente trata do aborto de forma tão arcaica, que se vislumbra poucas mudanças significativas entre as legislações sobre o tema no decorrer da história das legislações brasileiras, todavia, a sociedade avançou muito sobre esse assunto, entretanto, a legislação não conseguiu alcançá-la.

O objetivo geral desse artigo é mostrar a evolução histórica do aborto nas legislações brasileiras e como isso reflete na legislação criminal em vigor.

Os objetivos específicos desse trabalho são: a) apontar as formas legais de se realizar o aborto com base na legislação contemporânea brasileira; e b) mostrar a importância das políticas públicas para evitar o aborto com base na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

1.1 COMPARAÇÕES LEGISLATIVAS SOBRE O ABORTO

A primeira codificação que marca a criminalização do aborto no Brasil foi o “código criminal do império do Brazil” de 1830 (Lei de 16 de dezembro de 1830). A elite dominante da época junto da igreja católica via o aborto como um desregramento moral. Havendo um aumento na incidência da prática abortiva, resolveram criar uma lei que proibia e punia a prática de aborto, criaram assim o Código Criminal do Império de 1830.

Assim, o legislador ao editar o texto do Código criminal do império do Brazil de 1830 (BRASIL, 1831, p. 21), dispôs no art. 199, in verbis:

Art. 199. Occasionar aborto por qualquer meio empregado interior, ou exteriormente com consentimento da mulher pejada. Penas – de prisão com trabalho por um a cinco annos. Se este crime fôr commettido sem consentimento da mulher pejada. Penas – dobrada.

Essa primeira codificação sobre o aborto no Brasil punia terceira pessoa que atuasse na prática de aborto. Essa legislação já demonstrava o que o nosso Código Penal vigente (1940) explana, ou seja, o consentimento ou não da gestante, para a prática abortiva. Sendo que a pena nesse caso seria dobrada se fosse praticado sem o consentimento da mulher (previsão do código criminal do império de 1830).

Já no código penal de 1940 a intenção do legislador foi a mesma, que é a de punir de forma mais severa o aborto praticado sem o consentimento da gestante; a pena no código penal em vigor para o aborto praticado com o consentimento da gestante é de reclusão, de um a quatro anos (art. 126 do Código penal de 1940), enquanto sem o consentimento da gestante é de reclusão, de três a dez anos (art. 125 do Código Penal de 1940).

Nessa conduta ainda se tem a espécie de consentimento da gestante, se esse for válido a gestante responderá pelo artigo 126 do código penal de 1940. Já se o consentimento for inválido que é o que ocorre nos casos em que ouve fraude, grave ameaça ou qualquer outra forma que levaria a gestante a aceitar a prática abortiva só que de forma inválida e eivada de um vício. Sendo assim, se a gestante não for imputável a mesma arcará com a pena prevista no artigo 126 do código penal. Agora se a gestante for inimputável não haverá sanção penal para a mesma.

É inegável que o aborto praticado sem o consentimento da gestante tem uma penalização bem mais gravosa, tanto no Código de 1830 quanto no de 1940, entretanto, na legislação criminal atual o regime prisional para os agentes que executaram as práticas criminosas é o mesmo para ambos, sendo o regime de reclusão.

Já no Código Criminal de 1890, se manteve a penalização quando a gestante deixa que o aborto seja praticado, tendo como atenuante se o aborto fosse praticado para acobertar sua desonra. Isso demonstrava claramente a influência da igreja católica na vida das pessoas, principalmente das mulheres, que era a parte fraca da situação social naquela época.

Assim, o legislador ao editar o texto do código penal dos estados unidos do Brazil de 1890 (BRASIL, 1890, p. 27), dispôs no art. 301, in verbis:

Art. 301. Provocar abôrto com annuencia e accordo da gestante: Pena – de prissão cellular por um a cinco annos. Paragrapho unico. Em igual pena incorrerá a gestante que conseguir abortar voluntariamente, empregado para esse fim os meios; e com reducção da terça parte, si o crime for commettido para occultar a deshonra propria.

Após a leitura da letra da lei, se tem a certeza que o aborto nessa época era criminalizado principalmente por causa, da imagem da mulher perante a sociedade. O comportamento feminino fora dos padrões afetava a honra masculina e por consequência a da igreja (grande influenciadora da época). Sendo que tal situação ainda se encontra presente na sociedade contemporânea, não fugindo muito dos parâmetros legais apenas modificando a sua aplicabilidade.

Além do poder crítico e moral da igreja católica, também se tinha a questão das mulheres que eram mães solteiras ou “mães sós” como destaca Priore. Mulheres que tinham para si todo o trabalho de criar e sustentar seus filhos sozinhas, sem nenhuma ajuda nem mesmo do estado. Situação a qual não foge muito da realidade atual de muitas mulheres na sociedade brasileira moderna, chamadas atualmente de mães solteiras, mulheres que tem filhos que não possuem o registro na certidão de nascimento de um pai ou se tem esse é ausente ou desaparecido. Tendo essas mulheres todos os ônus da criação de um ser humano, e isso advém da cultura trazida desde o brasil império.

De acordo com os ensinamentos de Priore (1994, p. 55):

A grande maioria das mulheres na colônia, esmagadas sob um sistema de excessivo labor e nula ajuda institucional, via assustada a chegada de filhos que constituía uma sobrecarga. Tal como ocorria na Europa, o sentimento de opressão era maior para quem sustentava a criança: a família, e não o Estado. No Brasil, ao dizer “família”, vale “mães sós” que compunham a grande maioria, sobretudo nas classes subalternas. A opção para tais mulheres era a contracepção, o aborto ou infanticídio.

O que restava para essas mulheres desamparadas era apenas se livrar do fruto da concepção indesejada, ou seja, abortar ou cometer um infanticídio após o nascimento da criança. A situação Brasileira não era muito diferente a qual já ocorria na Europa, ou seja, mulheres sozinhas cuidando de seus filhos, sem amparo, criando pessoas muita das vezes sem a mínima dignidade humana para sobreviver.

Dessa forma é perceptível com relação a história do aborto no âmbito da legislação brasileira, de forma a compreender que o presente não evoluiu muito em relação ao passado. A cultura do aborto ainda permanece em todas as classes sociais no Brasil; e a sua punição criminal não evoluiu de forma notável no decorrer da história. A situação da mulher que aborta também é literalmente a mesma muita das vezes abandonada pelo genitor do feto ou pressionada por esse a praticar um aborto.

A última previsão histórica sobre o aborto no Brasil é o decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), que permanece em vigor, e a previsão desse tema está expressa em seus seguintes artigos: 124 a 128.

Com a leitura desses artigos é possível perceber a similaridade entre as leis anteriores ao código penal atual, conforme já anteriormente enfatizado. Todavia, hoje se tem conhecimento da existência de vários tipos abortivos alguns são amparados pelo direito penal não sendo puníveis em situações bem específicas e excepcionais e temos também as práticas abortivas puníveis taxativamente previstas em lei.

Entretanto, é possível ver certas peculiaridades que não tinham sido tratadas em legislações anteriores, como por exemplo, o aborto quando a gravidez resulte de estupro precisando do consentimento da gestante para que o aborto seja realizado, sendo autorizado pela legislação pátria.

Conforme os ensinamentos de Neto (2016, p. 418):

O artigo 128 traz duas possibilidades de exclusão de antijuricidade. Vale dizer, nas hipóteses previstas, não há crime. A expressão “não se pune”, que, a princípio poderia levar à conclusão de tratar-se de escusa absolutória, mostra-se como causa de exclusão de ilicitude, em análise mais acurada, respaldada pelos mestres Magalhães Noronha e Damásio E. de Jesus.

O que foi trazido por Pedro Lazarini Neto é uma das inovações legislativas do código penal de 1940, mostrando assim, que em certas minúcias sobre o aborto o tratamento em relação a prática abortiva permaneceu o mesmo, já em outros ouve a busca para se tentar abranger os assuntos exigidos pela sociedade da época. Sendo assim, como qualquer outra lei, houve a mantença e mortificação de tipos penais.

1. 2. FORMAS LEGAIS DE ABORTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Apesar do tratamento jurídico do aborto não ter avançado significativamente, há práticas abortivas que através da criação, edição, interpretação extensiva e modernização do Código penal de 1940 se tornaram legais, sendo inovações legislativas, são as seguintes:

O primeiro que vamos tratar é o aborto necessário ou terapêutico que está previsto no artigo 128, inciso I do Código Penal, ocorre quando a gravidez gera um risco para a vida da gestante e que a única forma que o médico encontra para priorizar a vida da grávida é abortar o feto.

Conforme leciona Capez (2013, p. 159):

É a interrupção da gravidez realizada pelo médico quando a gestante estiver correndo perigo de vida e inexistir outro meio para salvá-la. Consoante a doutrina, trata-se de espécie de estado de necessidade, mas sem a exigência de que o perigo de vida seja atual. Assim, há dois bens jurídicos (a vida do feto e da genitora) postos em perigo, de modo que a preservação de um (vida da genitora) depende da destruição do outro (vida do feto). O legislador optou pela preservação do bem maior, que, no caso, é a vida da mãe, diante do sacrifício de um bem menor, no caso, um ser que ainda não foi totalmente formado.

Assim sendo, quando a vida da mãe está em risco durante a gravidez optando a gestante pelo aborto para preservar a sua vida, a lei penal amparará essa escolha, sem opor qualquer tipo de sanção à gestante.

Aborto sentimental, humanitário ou ético tem sua previsão expressa no artigo 128, inciso II do Código Penal é o caso quando a gravidez advém de um estupro. O Estado não obriga a gestante a abortar, nessa situação quem decide se deve ou não é ela. Sendo que se a vítima optar por abortar essa manobra será realizada por um médico e esse fato será amparado por uma excludente da ilicitude, ou seja, não haverá sanção penal a ser aplicada, estando diante de uma situação de exercício regular de direito.

O aborto eugenésico, eugênico ou piedoso é realizado quando o feto possui algum tipo de deformidade ou enfermidade, não sendo permitido em nosso ordenamento jurídico, salvo no caso de feto anencefálico.

De acordo com os ensinamentos de Capez (2013, p. 163):

Aliás, no que toca ao abortamento do feto anencéfalo ou anencefálico, entendemos que não há crime, ante a inexistência de bem jurídico. O encéfalo é a parte do sistema nervoso central que abrange o cérebro, de modo que sua ausência implica inexistência de atividade cerebral, sem a qual não se pode falar em vida. A Lei n.9.434, de 4-2-97, em seu art. 3º, permite a retirada post mortem detecidos e órgãos do corpo humano depois de diagnosticada a morte encefálica. Ora, isso significa que, sem atividade encefálica, não há vida, razão pela qual não se pode falar em crime de aborto, que é a supressão da vida intrauterina. Fato atípico, portanto.

O entendimento do doutrinador está em consonância com a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 54 do Distrito Federal, perante o Supremo Tribunal Federal, em que a corte declarou a inconstitucionalidade dos artigos 124, 126, 128, incisos I e II do Código Penal brasileiro. Estes artigos tipificavam a conduta de se abortar feto anencefálico, essa decisão trouxe a possibilidade da gestante que esteja nessa situação poder abortar. Sendo assim, o aborto de feto anencefálico não é mais uma conduta típica.

1.3. AS POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE O ABORTO NO BRASIL

Quando falamos em direito constitucional contemporâneo, temos as questões de caráter social e público bem evidentes, sendo possível vislumbrar, quais os principais direitos buscados e o que a constituição federal tem tratado de forma primordial. Através da constituição federal enxergamos todas as matérias tratadas em legislações infraconstitucionais (constitucionalização do Direito), e qual é sua relevância e âmbito de aplicação. Sendo assim, quando falamos de políticas públicas com relação ao aborto, partimos do viés constitucional para as legislações infraconstitucionais. Ou seja, a política pública é um dever constitucional público.

Nessa esteira, Barroso (2010, p. 106 e 107) observa que:

Essa constitucionalização do Direito, potencializada por algumas características associadas ao contexto filosófico do pós-positivismo – centralidade da ideia de dignidade humana e dos direitos fundamentais, desenvolvimento da nova hermenêutica, normatividade dos princípios, abertura do sistema, teoria da argumentação -, tem tornado o debate jurídico atual extremamente rico e instigante. Nele têm-se colocado temas que definirão o futuro da Constituição, dentre os quais: o papel do Estado e suas potencialidades como agente de transformação e de promoção dos direitos fundamentais; a legitimidade da jurisdição constitucional e da judicialização do debate acerca de determinadas políticas públicas; a natureza substantiva ou procedimental da democracia e o conteúdo das normas constitucionais que a concretizam, para citarapenas alguns exemplos.

Na citação acima Barroso faz menção a um dos temas que definirão o futuro da constituição que é a judicialização do debate acerca de determinadas políticas públicas, temos uma decisão recente do Supremo Tribunal Federal, órgão máximo da justiça brasileira no qual Barroso é ministro, em que ele colocou na pauta o debate sobre políticas públicas, direitos das mulheres, equiparação de gênero e o aborto.

Sobre as políticas públicas em relação ao aborto, interessante se faz observar o Habeas Corpus/RJ n. 124.306 no STF (BARROSO, 2016, p. 14), que possui o seguinte entendimento conforme o conteúdo do trecho de seu voto:

Nesse ponto, ainda que se pudesse atribuir uma mínima eficácia ao uso do direito penal como forma de evitar a interrupção da gestação, deve-se reconhecer que há outros instrumentos que são eficazes à proteção dos direitos do feto e, simultaneamente, menos lesivas aos direitos da mulher. Uma política alternativa à criminalização implementada com sucesso em diversos países desenvolvidos do mundo é a descriminalização do aborto em seu estágio inicial (em regra, no primeiro trimestre), desde que se cumpram alguns requisitos procedimentais que permitam que a gestante tome uma decisão refletida. É assim, por exemplo, na Alemanha, em que a grávida que pretenda abortar deve se submeter a uma consulta de aconselhamento e a um período de reflexão prévia de três dias. Procedimentos semelhantes também são previstos em Portugal26, na França e na Bélgica.

Em seu voto no Habeas Corpus/RJ 124.306, Barroso exemplificou uma forma de melhor evitar a prática abortiva no Brasil, utilizando de políticas públicas procedimentais para a mulher no início da gravidez desista de realizar o aborto, descriminalizando o aborto, e implantando políticas públicas eficazes. Assegurando assim, a integridade física e psicológica da gestante de forma que sua decisão será mais pensada e analisada. Além disso, se tem uma forma mais eficaz de assegurar os direitos do feto.

Esse procedimento é muito aplicado em países que possuíam um nível de aborto muito grande mesmo havendo a criminalização dessa prática. Então, ouve a análise pelo governo desses países da implantação de uma forma alternativa de tratamento com relação a gestante, uma forma de conscientizar a mulher daquilo que ela está prestes a fazer, e como isso vai refletir na sua vida, em seu corpo e na sua mente.

Portanto, implantaram um procedimento em que houve a descriminalização do aborto e passou a se ter consultas de aconselhamento para que a gestante com até três meses de gestação que queira fazer um aborto, reflita sobre as consequências desse ato. Esse método poderia ser aplicado no Brasil com certas mudanças para se adequar a cultura brasileira, seria um grande avanço social tanto para as vidas que estão sendo geradas, quanto para as gestantes.

Conforme o Habeas Corpus/RJ 124.306 no Supremo Tribunal Federal (BARROSO, 2016, p. 16):

De um lado, já se demonstrou amplamente que a tipificação penal do aborto produz um grau elevado de restrição a direitos fundamentais das mulheres. Em verdade, a criminalização confere uma proteção deficiente aos direitos sexuais e reprodutivos, à autonomia, à integridade psíquica e física, e à saúde da mulher, com reflexos sobre a igualdade de gênero e impacto desproporcional sobre as mulheres mais pobres. Além disso, criminalizar a mulher que deseja abortar gera custos sociais e para o sistema de saúde, que decorrem da necessidade de a mulher se submeter a procedimentos inseguros, com aumento da morbidade e da letalidade.

De acordo com o entendimento de Barroso, a tipificação do aborto traz mais malefícios do que benefícios a sociedade e a mulher. Sendo que o grande propósito do ministro Luís Roberto Barroso com a decisão desse Habeas Corpus que repercutiu em todo âmbito jurídico, político e midiático do país, foi a de chamar à atenção para a questão do aborto e a necessidade de se ter a implantação de políticas públicas pelo governo, que sejam eficazes.

Muitos profissionais da área jurídica acharam que essa decisão legalizaria o aborto a partir do terceiro mês de gestação. Pelo contrário, essa decisão foi uma forma do Supremo Tribunal Federal mostrar para o governo e para a população que o aborto se tornou uma questão de ordem pública e que deve ser analisada e discutida de forma a respeitar tanto os direitos do feto, quanto os da gestante o que não ocorre atualmente.

Diante do Habeas Corpus/RJ 124.306 no STF, Luís Roberto Barroso possui o seguinte entendimento sobre o assunto acima tratado tendo no trecho de seu voto o conteúdo a seguir (BARROSO, 2016, p. 6):

Antes de avançar, porém, cumpre estabelecer uma premissa importante para o raciocínio a ser desenvolvido: o aborto é uma prática que se deve procurar evitar, pelas complexidades físicas, psíquicas e morais que envolve. Por isso mesmo, é papel do Estado e da sociedade atuar nesse sentido, mediante oferta de educação sexual, distribuição de meios contraceptivos e amparo à mulher que deseje ter o filho e se encontre em circunstâncias adversas. Portanto, ao se afirmar aqui a incompatibilidade da criminalização com a Constituição, não se está a fazer a defesa da disseminação do procedimento. Pelo contrário, o que ser pretende é que ele seja raro e seguro.

Assim sendo, Barroso em diversas reportagens (citadas na referência deste trabalho) trouxe sua real intenção com relação a essa decisão, demonstrou claramente que seu propósito foi o de chamar à atenção para a necessidade de implantação de políticas públicas e não para a legalização do aborto com até três meses de gestação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente investigação, portanto, parte do seguinte problema de pesquisa: Como arcabouço histórico das legislações criminais brasileiras refletem com relação ao aborto perante o Código Penal de 1940? O reflexo da história das legislações criminais sobre o atual Código Penal de 1940 é simplesmente a sua base estrutural, ou seja, seu alicerce, todavia, essas legislações foram ampliadas e melhoradas através do tempo, para poder suprir as necessidades da sociedade moderna e para se adequar na igualdade social entre homens e mulheres.

Já com relação a hipótese trazida consigo enxergar claramente que a nossa legislação penal não é tão arcaica como pensava, claro que ainda falta muito para se chegar no ideal social para todos, entretanto, olhando para o Código do império de 1830 nítida é a evolução legislativa.

O objetivo geral foi alcançado consegui mostrar a evolução histórica do aborto nas legislações brasileiras e seus reflexos no Código Penal de 1940.

Os objetivos específicos foram satisfeitos apontei as formas de abortos legais vigentes e aprofundei e esclareci diversos pontos chaves quantos as políticas públicas para evitar a prática do aborto.

REFERÊNCIAS

BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 2ª ed. São Paulo: SARAIVA, 2010.

BRASIL. LEI DE 16 DE DEZEMBRO DE 1830.CÓDIGO CRIMINAL DO IMPÉRIO DO BRAZIL. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/LIM-16-12-1830.htm>. Acesso em: 18 out. 2018.

________. DECRETO Nº 847, DE 11 DE OUTUBRO DE 1890.CODIGO PENAL DOS ESTADOS UNIDOS DO BRAZIL DE 1890. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1851-1899/d847.htm>. Acesso em: 18 out. 2018.

________. Supremo Tribunal Federal – Plenário. ADPF. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – 54. ADEQUAÇÃO – Ementa: INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ – FETO ANENCÉFALO – POLÍTICA JUDICIÁRIA – MACROPROCESSO. Parte: Confederação nacional dos trabalhadores na saúde – CNTS. Relator: Ministro Marco Aurélio.  Vencedores: Marco Aurélio, Rosa Weber,Dias Toffoli, Celso de Mello, Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Cármen Lúcia Antunes Rocha, Gilmar Mendes e Ayres Britto. Vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticianoticiastf/anexo/adpf54.pdf> acesso em: 19 out. 2018.

________. Supremo Tribunal Federal – 1ª Turma. Habeas Corpus 124306. Ementa: DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA SUA DECRETAÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE DA INCIDÊNCIA DO TIPO PENAL DO ABORTO NO CASO DE INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GESTAÇÃO NO PRIMEIRO TRIMESTRE. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. Relator ministro Marco Aurélio. Partes: Pacientes: Edilson dos Santos e Rosemere Aparecida Ferreira, Impetrante: Jair Leite Pereira. Vencedores: Marco Aurélio, Luiz Fux, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/HC124306LRB.pdf> Acesso em: 19 out. 2018.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, volume 2, parte especial: dos crimes contra a pessoa a dos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos (arts. 121 a 212). 13. ed. São Paulo: SARAIVA, 2013.

MOURA, Rafael Moraes. O Estado de São Paulo – Estadão. ‘Decisão sobre aborto é para que se adotem políticas públicas’, diz Barroso. 01 de dezembro de 2016 às 03h00. Disponível em: <http://brasil.estadao.com.br/noticias/geral,decisao-sobre-aborto-e-para-que-se-adotem-politicas-publicas-diz-barroso,10000091794>acesso em: 20 out. 2018.

NETO, Pedro Lazarini. Código penal comentado e leis penais especiais comentadas. 5ª edição. São Paulo: CRONUS, 2016.

PRIORE, Mary Del. A mulher na história do Brasil (Coleção repensando a história). 4ª ed. São Paulo: CONTEXTO, 1994.

UOL NOTÍCIAS. Decisão (sobre aborto) é para adotar políticas públicas’, diz Barroso. Conteúdo Estadão.Em Brasília 01/12/2016 ás 08h47. Disponível em: <https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/estado/2016/12/01/decisao-sobre-aborto-e-para-adotar-politicas-publicas-diz-barroso.htm> acesso em: 20 out. 2018

[1] Bacharelada em direito e advogada. Advogada autônoma.

Enviado: Outubro, 2018

Aprovado: Novembro, 2018

4.8/5 - (42 votes)
Pamela Dieter Paape

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Pesquisar por categoria…
Este anúncio ajuda a manter a Educação gratuita