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Entre Traidores e Seguidores da Lei de Moisés: Interação Cultural no Reinado de Antíoco IV Epífanes (167 a 164 a.C.) [1]

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CONTEÚDO

SANTOS, Edson da Silva dos [2], LOBIANCO, Luis Eduardo [3]

SANTOS, Edson da Silva dos; LOBIANCO, Luis Eduardo. Entre Traidores e Seguidores da Lei de Moisés: Interação Cultural no Reinado de Antíoco IV Epífanes (167 a 164 a.C.). Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 03, Ed. 02, Vol. 03, pp. 34-100, Fevereiro de 2018. ISSN:2448-0959

Resumo

Estuda a interação cultural entre judeus e gregos a partir da Revolta dos Macabeus, ocorrida entre os anos de 167 e 164 a. C. Compreender esse evento à luz dos conceitos de assimilação e resistência cultural por parte dos judeus ao helenismo. O livro de 1° Macabeus é a fonte principal para a presente pesquisa e tem como metodologia a Análise de conteúdo, de tipo quantitativo. A metodologia empregada levou a mostrar, na fonte, que o objetivo da pesquisa  foi alcançado. A pesquisa provou que houve um processo de assimilação e resistência cultural por parte dos judeus ao helenismo imposto pelo monarca grego Antíoco IV Epífanes, na primeira metade do século II a. C.

Palavras-Chave: Revolta dos Macabeus, Assimilação Cultural, Resistência Cultural, Judaísmo, Helenismo.

Introdução

Os capítulos a seguir, que compõem esta pesquisa, estão dentro do tema da mesma, que é a interação cultural entre judeus e gregos sob o reinado do monarca selêucida Antíoco IV Epífanes. Com isso, é importante esclarecer logo aqui o contexto no qual esse assunto está inserido, melhor dizendo, temos o dever de mostrar o recorte temporal e espacial que a interação em questão se deu. Pois bem, o tema exposto acima tem como ponto de partida a Revolta dos Macabeus, que ocorreu na Judéia entre os anos de 167 e 164 a. C.

A primeira dúvida que pode aparecer na cabeça do leitor é esta: o que teria sido  a Revolta dos Macabeus? Respondendo essa pergunta em poucas palavras, pois nesta parte da pesquisa não há a intenção de se aprofundar nisso, essa revolta foi um evento  no qual houve um conflito entre judeus, que queriam preservar o judaísmo e suas prescrições face ao helenismo (práticas gregas), imposto pelo monarca Antíoco IV Epífanes, e os aliados deste último, no caso os judeus que teriam aderido ao helenismo.

Dado isso, a seguir estão a questão, a hipótese e o objetivo que são os norteadores do presente estudo.

Tratando-se da questão, esta é a seguinte: quais os impactos que a instauração de práticas e cultos pagãos (gregos) tiveram no cotidiano judaico, no campo religioso? Como resposta a esse problema, a hipótese que buscamos defender é que a instauração de práticas e cultos gregos na Judéia dividiu os judeus em dois grupos: aqueles que foram assimilados e adotaram tais práticas e outros que resistiram, mantendo-se fiéis às suas tradições milenares e às determinações da Lei de Moisés.

O que foi falado até aqui se encaixa perfeitamente no objetivo da pesquisa, que é compreender o evento designado “Revolta dos Macabeus” à luz dos conceitos de assimilação e resistência cultural judaicas. Em outros termos, a meta do estudo é compreender os processos de assimilação e resistência cultural por parte dos judeus ao helenismo.

Para fins de orientação, nos próximos parágrafos vão estar descritos resumos do que vai ser falado em cada capítulo que está por vir.

No capítulo I vai ser abordada a Revolta dos Macabeus. Ele liga o evento envolvendo os judeus no início do século II a.C ao período helenístico, para se compreender as lutas travadas pelos Macabeus e os judeus insatisfeitos contra Antíoco IV Epífanes e suas práticas contrárias à Lei mosaica.

Já no segundo capítulo, a pesquisa vai contar com um amplo aparato de  conceitos que estão em consonância com seu tema e seu objetivo. Contudo, os conceitos estão ligados às concepções dos seguintes autores: Peter Burke, Andre Paul, Frederich Barth e Anthony Smith. É importante deixar claro que queremos olhar esse ocorrido sobretudo através da História Cultural.

No último capítulo, que é o III, vai ser analisada a fonte principal da pesquisa: o livro de 1° Macabeus. Este é datado do final do século II a.C e narra o evento que mais acima foi falado de maneira sucinta. Porém, além dessa fonte principal, também vai haver uma análise de alguns trechos da obra A Guerra Judaíca, do historiador judeu Flávio Josefo.

Capítulo I: A Insurreição dos Macabeus[4] e seu contexto histórico

Neste capítulo serão abordados dois pontos que estão em convergência com o tema deste estudo: a Insurreição ou Levante dos Macabeus e o contexto histórico no  qual ela estava inserida, neste caso, o período helenístico. Esses pontos serão de suma importância para entendermos, mais à frente, como se deram os processos de assimilação e resistência culturais por parte dos judeus (que residiam na Judéia no  século II a.C.) ao Helenismo imposto pelo rei selêucida Antíoco IV Epífanes. Esses processos culturais foram possíveis, porque houve um embate entre Judaísmo e Helenismo nesse mesmo século e que, por sua vez, acabou dividindo os judeus, entre aqueles que prosseguiram com sua tradição outrora legada por Moisés e os que  adotaram práticas pagãs gregas.

A partir disso, este capítulo divide-se em três tópicos. No primeiro, “A Insurreição dos Macabeus”, será abordado o que foi esse levante que acabou abalando a convivência dos judeus na Judéia, quando ele ocorreu e, por último, qual foi o seu objetivo. O segundo tópico, que é o “Período Helenístico”, será tratado o contexto no qual está inserida a Insurreição ou este Levante anteriormente descrito, em qual momento histórico está localizado esse período e qual foi sua relação com a Judéia e a Insurreição dos Macabeus ocorrida no século II a.C.; e, por último, o terceiro tópico intitulado “Consideração parcial”, serão retomados, de maneira bem sucinta, pontos que foram abordados nos tópicos anteriores, e por fim fazer uma conclusão parcial para fechar este capítulo.

A Insurreição dos Macabeus

Aqui será abordado um intervalo de tempo curto, de aproximadamente quatro anos  (167  a 164  a.C), que diz  respeito ao evento  conhecido na historiografia como a Revolta dos Macabeus (esta envolveu Jerusalém e os territórios no seu entorno). Não só neste capítulo, mas a maior parte desta pesquisa estará compreendida dentro desse recorte temporal curto, que por sua vez já é suficiente para compreendermos as relações, sobretudo culturais, mas também políticas, que estiveram envolvidas nesse acontecimento na Judéia nos anos acima mencionados.

A Judéia no século II a.C. foi palco de divergências culturais, se assim pode-se dizer. Essas divergências envolviam judeus e gregos que, respectivamente, representavam o judaísmo e o helenismo. Tratando-se dos judeus, eles se diferenciavam dos reinos que os rodeavam no sentido de serem monoteístas, ou seja, cultuavam apenas um D’s, conhecido pela historiografia como Yahweh. Ao contrário disso, os gregos em seu contexto religioso estavam mais próximos de grandes sociedades da época, pois eles prestavam cultos a diversas divindades. Isso caracterizava os gregos como politeístas. Esses contrastes de cultos, juntamente com costumes de vida opostos, seriam suficientes para transformar a Judéia em um caldeirão de tensões.

Para entendermos melhor o Levante ou a Insurreição dos Macabeus é necessário termos em mente que ele iniciou-se com uma imposição cultural efetuada por um monarca, que tinha um modo de viver diferente dos habitantes do território que estava sob seu domínio, neste caso, a Judéia. Esse monarca foi Antíoco IV Epífanes, que além de reinar sobre esse território, na primeira metade do século II a.C., também tinha sob sua jurisdição sobretudo a Síria. Antíoco IV quis forçar os judeus a adquirirem  costumes helenísticos, isto é, o rei queria que os seguidores da Lei abandonassem sua tradição que, como foi dito mais acima, os diferenciavam dos reinos vizinhos. A imposição forçada do helenismo já teria sido o suficiente para desencadear na Judéia o levante aqui tratado, que a princípio foi liderado por Matatias, e posteriormente pelo filho deste, Judas. O que foi dito anteriormente pode ser percebido com o acesso à fonte principal deste estudo, que é o livro de 1° Macabeus, sobretudo o capítulo 1, versículos 10 a 15 e 41 a 64 e capítulo 2, versículos 15 a 28 [5].

Embora 1º Macabeus seja a fonte central desta pesquisa, serão também utilizados, como fonte, fragmentos da narrativa de Flávio Josefo sobre esta insurreição, relatada no Livro I, §§ 31 a 40 de sua primeira obra História da Guerra dos Judeus contra os Romanos ou Guerra Judaica[6]. Retomando a fonte 1 Macabeus, é importante registrar, desde logo, que tal Livro encontra-se apenas na Bíblia Católica, posto que a Igreja o colocou em seu cânon. Para os judeus 1 e 2 Macabeus não constam da Bíblia Hebraica, uma vez que seus textos foram escritos em grego, portanto se não foram redigidos em hebraico, não têm inspiração divina. Os evangélicos seguem os judeus e em suas Bíblias também não há os Livros 1 e 2 Macabeus. Apesar disto, historicamente tanto judeus como cristãos reconhecem o episódio da Insurreição dos Macabeus, tanto que a festa judaica de Chanukah representa a “inauguração” simbólica (purificação) do Templo de Jerusalém em consequência da vitoriosa insurreição dos Macabeus, após o Templo ter sido profanado pelos gregos selêucidas sob as ordens de Antíoco IV Epífanes.

Sobre a festa judaica de Chanukah, que ocorre no mês do calendário hebraico de Kislev – equivalente a dezembro -, ela nos é descrita por Élie Barnavi, da seguinte forma:

HANUCÁ (“Inauguração”): oito dias consagrados à purificação e inauguração simbólica do Templo (164 a.C.), que a insurreição vitoriosa de Matatias, o Hasmoniano e seus filhos (a revolta dos Macabeus) contra os selêucidas da Síria tornou possíveis [7].

A respeito do Levante[8] dos Macabeus é indispensável trazermos para este capítulo diferentes autores que o estudaram e como esses estudiosos enxergaram esse episódio, que marcou a vida dos judeus, que residiam nos arredores da cidade de Jerusalém e também nela, onde havia o Templo no qual se prestava culto a Yahweh e ao mesmo tempo estava presente a Lei de Moisés e suas prescrições. Em suma, a historiografia tem muito a dizer sobre esse evento que impactou a população judaica entre 167 e 164 a.C. e as consequências dele posteriormente, como o reinado judaico dos Asmoneus na Judéia.

A partir do que foi dito anteriormente, num primeiro momento será abordado aqui o que teria motivado o Levante dos Macabeus ou “Revolta dos Macabeus” no território sob domínio do rei selêucida Antíoco IV Epífanes. Em outras palavras, primeiramente será tratado nesta parte da presente pesquisa, qual teria sido a origem das tensões envolvendo judeus e gregos no território da Judéia.

Benedikt Otzen[9], em sua obra O Judaísmo na Antiguidade, enxerga o levante liderado por Matatias como um embate entre dois partidos com interesses distintos, que por sua vez teria originado esse evento, isto é, a Revolta dos Macabeus. Segundo este autor, tal insurreição teria se dado por motivações contrárias na Judéia, e que acabou envolvendo o monarca Antíoco IV Epífanes. Otzen cita dois grupos ou partidos, que estariam envolvidos no ocorrido, “(…) o novo partido reformador de tendência grega ou helenística, cujo oponente natural era o ‘antigo’ partido conservador judaico”[10]. A partir dessa citação, podemos perceber bem claramente uma polarização que talvez possa ser dita como política, embora também religiosa. Isso porque o autor refere-se a “partidos”, que se encontravam em um confronto. Enfim, esse embate era basicamente entre o helenismo e o judaísmo, portanto tinha traços não só políticos, mas também culturais.

Além desse embate que havia entre partidos de interesses contrários, Otzen traz em sua obra um dado importante para entendermos o Levante dos Macabeus. Segundo o autor, Antíoco IV não foi o único autor do mal que assolou os judeus. Otzen entende esse rei selêucida como um instrumento nas mãos dos judeus helenistas. Em outros termos, Antíoco IV teve apoio de parte dos judeus, que estava indo de encontro à milenar tradição judaica passada de geração à geração.

Paralelamente à explicação acerca do motivo desse levante, dada por Otzen, Arnaldo Momigliano[11] informa que os judeus se encontravam em uma situação na qual o monarca selêucida estaria em guerra contra Ptolomeu VI Filométor, rei do Egito. Os romanos teriam conseguido a vitória para esse último monarca. Durante esse contexto, prossegue Momigliano, Antíoco IV teria tentado enfrentar os problemas econômicos e sociais resultantes dessa guerra através da interferência nos santuários locais e em suas finanças. Melhor dizendo, segundo Momigliano, a Revolta dos Macabeus na Judéia  teria se iniciado após Antíoco IV intervir em locais ditos sagrados para o povo de Israel e junto com isso ele também teria gerido as receitas, que se encontravam nesses locais.

Apesar dessa situação de instabilidade política pela qual a Judéia estava passando, é importante salientarmos que o foco mais profundo desta pesquisa é  a história cultural do Levante dos Macabeus. Sendo mais específico, nós temos por objetivo compreender esse evento a partir da leitura do Livro Bíblico correspondente e o texto de Josefo (já citados acima), à luz dos conceitos de resistência e de assimilação. Em outras palavras, buscamos entender dentro do levante, aqui estudado, os processos de interação cultural, que por sua vez envolviam assimilação e resistência por parte do grupo étnico judaico ao helenismo sustentado por Antíoco IV Epífanes na Judéia. Isso tendo como base de análise e respaldo o livro de 1° Macabeus, já mencionado acima.

Fazendo conexão ao relatado anteriormente, é importante restabelecermos o diálogo com Otzen, pois este autor traz uma explicação relevante, que envolve o helenismo e o ocorrido na Judéia no século II a.C. Segundo Otzen:

Encontraremos o helenismo mais tarde como um fenômeno cultural e religioso em diferentes contextos. Aqui bastará observar como a nova corrente cultural dividiu a população judaica e como as medidas  políticas dos selêucidas a respeito de Jerusalém e da sociedade judaica eram mescladas por tendências divisórias[12], levando a acontecimentos que caracterizaram grande parte do século II a. C. (…)[13].

A partir disso, o autor entende que aquilo que ele chama de “a nova corrente cultural”, que no caso é o helenismo, dividiu os judeus, e isso resultou no levante organizado por Matatias, que envolveu a cidade de Jerusalém e as terras ao seu redor, portanto o coração da Judeia. Além disso, nessa citação, Otzen faz uma menção às medidas políticas dos selêucidas, que acreditamos serem os meios pelos quais o rei Antíoco IV Epífanes lançou mão para desestabilizar a Judéia tanto política quanto religiosamente.

Remetendo-se à divisão que ocorreu na população judaica com o helenismo, como argumenta Otzen, podemos afirmar que houve judeus que se tornaram helenistas e aqueles judeus que continuaram seguindo a religião de seus antepassados. Desprendendo-se diretamente da historiografia, podemos ver isso nitidamente em duas passagens do livro de 1° Macabeus. A primeira relata o seguinte:

O rei prescreveu, em seguida, a todo o seu reino, que todos formassem um só povo, renunciando cada qual a seus costumes particulares. E todos os pagãos conformaram-se ao decreto do rei. Também muitos de Israel comprazeram-se no culto dele, sacrificando aos ídolos e profanando o sábado[14][15]

A segunda passagem narra:

Apesar de tudo, muitos em Israel ficaram firmes e se mostraram irredutíveis em não comerem nada de impuro. Aceitaram antes morrer que contaminar-se com os alimentos e profanar a Aliança sagrada, [16] como de fato morreram. Foi sobremaneira grande a ira que se abateu sobre Israel[17].

Na primeira passagem já fica evidente que alguns dentre o povo de Israel passaram a assumir uma postura diferente da cultura judaica, ou seja, relacionando a passagem com o que Otzen comenta a respeito do helenismo, podemos perceber que houve sim na Judéia um processo de assimilação cultural. Antes de falarmos da segunda passagem, é importante salientar que neste capítulo nós não vamos nos aprofundar  muito nesse processo de assimilação cultural, assim como também não vamos aqui tratar de maneira prolixa da resistência despertada pelos judeus ao helenismo. Isso nós iremos discorrer em um capítulo à parte neste estudo. Por enquanto, neste momento, nós só faremos apontamentos superficiais acerca desses processos culturais.

Retornando às passagens que acima foram mencionadas, a segunda, como pode ser percebido em suas partes em destaque, diz respeito a um sentimento de repulsa que os judeus tementes à sua religião despertaram contra as prescrições do rei Antíoco IV. Melhor dizendo, na segunda passagem podemos encontrar um processo de resistência cultural dos judeus ao helenismo imposto por esse rei a partir de 168 a.C.

Resumindo tudo o que foi dito, podemos dizer que o Levante dos Macabeus ocorrido no século II a.C. foi um evento que marcou o cotidiano judaico, porque os seguidores da Lei mosaica se viram diante, se assim podemos dizer, de uma inversão dos valores da sua cultura. Eles presenciaram, como pode ser visto no livro de 1° Macabeus, alguns dos seus semelhantes se “renderem” às práticas culturais dos gregos, práticas essas que eram o culto a outros deuses que não Yawheh e costumes que foram considerados contraditórios à Lei, como o consumo de animais impuros. Observando-se o lado dos “traidores da Lei”, estes passaram a se enquadrar no mundo dos gregos, mundo esse que diferia totalmente da realidade do judaísmo, este que tinha sua Lei e seu Templo voltados para o culto a Yawheh. O mundo dos gregos era o mesmo do helenismo, pois este cimentava todas as relações entre eles, isso desde a religião, posto que “helenismo” é um conceito cultural, até a política. Em suma, o Levante dos Macabeus representou a polarização da sociedade judaica sobre um pilar: a interação cultural.

Anteriormente, discutimos a origem do levante iniciado pelo sacerdote de Modin, Matatias, a partir das visões de Benedikt Otzen e Arnaldo Momigliano e, após isso, focamos por um curto período nos processos culturais que estiveram presentes no evento aqui abordado. Finalizamos esses dois pontos fazendo uma síntese deles. Doravante, nesta parte do capítulo, iremos tratar do objetivo do Levante dos Macabeus contra o helenismo e o monarca selêucida, que o impôs à força na Judéia.

A historiografia, além de discutir sobre o Levante dos Macabeus e seus impactos para a vida dos judeus, também nos traz a finalidade desse evento. Há um consenso  entre os estudiosos da insurreição em questão, de que ela teria por objetivo conseguir a liberdade tanto política quanto religiosa em face às imposições do monarca Antíoco IV. Sendo assim, Benedikt Otzen e Christiane Saulnier, respectivamente, nas obras O Judaísmo na Antiguidade[18] e A Revolta dos Macabeus[19] buscam dar conta de narrar esta insurreição de maneira bem sucinta e ainda de explicitar o seu objetivo. Mas os autores parecem não focar muito nos aspectos culturais, que estiveram envolvidos no evento perturbador no qual se encontrava a Judéia.

Primeiramente, quando esses autores fazem referência à liberdade política,  temos que saber que Matatias, seus filhos e seus companheiros buscaram o fim da subordinação de seu povo judeu ao rei Antíoco IV Epífanes. A liberdade política dos judeus seria a garantia de que eles poderiam agir de maneira autônoma e até mesmo de se relacionar com os povos vizinhos de maneira igual, sem status de inferioridade. Isso ao mesmo tempo garantia também a liberdade religiosa da população judaica. Segundo Otzen, política e religião não podem ser desassociadas.

Tratando-se da liberdade religiosa, ela daria aos judeus a capacidade deles preservarem seus costumes e a Lei, que são os componentes essenciais do judaísmo. Este se completa obviamente com a total devoção e adoração ao D’s de Israel e, na Antiguidade, também com o Templo de Jerusalém, que foi reconstruído após o retorno judaico do Exílio forçado na Babilônia (século VI a.C.), considerando que a invasão de Jerusalém por ordens do rei Nabucodonosor, da Babilônia, destruíra o 1º Templo – o de Salomão -, em 586 a.C. Tudo isso voltado exclusivamente para apenas um D’s, conhecido pela historiografia como Yahweh. Este D’s era o único, que segundo a tradição judaica, deveria ser devotado e cultuado pelo povo de Israel.

A Insurreição dos Macabeus e a polarização que ela causou entre os judeus, juntamente com o objetivo desse ocorrido, certamente asseguraram a continuidade do judaísmo. Resumindo, a preservação da religião judaica era o princípio desse levante.

Dito tudo isso, só nos resta finalizar esta parte do presente capítulo retomando de modo bem sucinto tudo que foi dito até aqui.

O Levante dos Macabeus iniciou-se por causa das imposições que o rei selêucida Antíoco IV Epífanes ordenou aos judeus que residiam na Judéia, no século II a.C. Esse ocorrido, como bem defendeu o historiador Benedikt Otzen, dividiu a população judaica. Uma parte das pessoas entre o povo despertou a resistência às imposições do monarca acima citado e, uma outra parte assumiu as práticas helenísticas, que  se fizeram presentes de maneira bastante intensa. Enfim, partindo da historiografia abordada aqui, a Revolta dos Macabeus buscou assegurar a tradição judaica contra as ameaças de um agente que portava um modo de vida distinto dos seguidores da Lei, esta que foi legada por Moisés ao povo de Israel no Sinai aproximadamente mil anos antes do levante promovido por Matatias.

Período Helenístico

Antes de iniciarmos o assunto desta parte do capítulo, é importante dizer que aqui será falado sobre o período helenístico a partir de Alexandre Magno, passando pelos Diádocos e Epígonos, e por fim chegaremos até a dinastia selêucida. Tudo isso tendo como principal foco a Judéia. Sendo assim, trabalharemos aqui rapidamente com um recorte temporal de aproximadamente 160 anos e sempre tendo em vista Jerusalém e seus arredores.

A relevância de tratarmos do período helenístico se dá como um meio de entendermos melhor o Levante dos Macabeus, que ocorreu sob o reinado da dinastia selêucida, na primeira metade do século II a. C. Em outras palavras, a insurreição provocada por Matatias, e que envolveu judeus que se sentiram indignados com a ousadia do monarca Antíoco IV Epífanes, precisa ser entendida dentro do período helenístico, pois este traz desde o imperador Alexandre Magno a experiência cultural dos gregos que abalaram os judeus.

A partir disso que foi dito, vamos dar um panorama geral usando uma passagem do livro de 1° Macabeus, do enredo político do período que será trabalhado aqui.

Depois de ter saído da terra de Cetim, Alexandre, o Macedônio, filho de Filipe, que já tinha dominado a Hélade, venceu Dario, rei dos persas e dos medos, e tornou-se rei em seu lugar. Empreendeu, então, numerosas guerras, apoderou-se de fortalezas e eliminou os reis da terra. Avançou até às extremidades do mundo e tomou os despojos de uma multidão de povos, e a terra silenciou diante dele. Assim exaltado, seu coração se elevou. E recrutou um exército sobremaneira poderoso, submetendo províncias, nações e soberanos, que se tornaram seus tributários. Depois disso tudo, caiu doente e percebeu que ia morrer. Convocou então seus oficiais, os nobres que tinham com ele convivido desde a mocidade e, estando ainda em vida, repartiu entre eles o reino. Alexandre havia reinado por doze anos quando morreu. Seus oficiais tomaram o poder, cada qual no lugar que lhe coube. Todos cingiram o diadema após sua morte e, depois deles, seus filhos, durante muitos anos (grifo nosso).[20]

Esse trecho nos dá uma visão rápida do reinado de Alexandre Magno e de sua expansão para além da Macedônia, e junto com isso a conquista de outros povos. Mas vamos discutir esse trecho a partir das partes que estão em destaque.

Primeiramente, vamos discorrer sobre a seguinte parte do trecho acima mencionado:

Depois de ter saído da terra de Cetim, Alexandre, o Macedônio, filho de Filipe, que já tinha dominado a Hélade, venceu Dario, rei dos persas e dos medos, e tornou-se rei em seu lugar. Empreendeu, então, numerosas guerras, apoderou-se de fortalezas e eliminou os reis da terra. Avançou até às extremidades do mundo e tomou os despojos de uma multidão de povos(…).[21]

Nessa parte podemos perceber que Alexandre teria se tornado um poderoso rei após se expandir para territórios do Oriente Próximo e até mesmo por causa de sua capacidade em subjugar outros povos.

A respeito disso, André Paul diz que Alexandre Magno, durante suas conquistas no Oriente, conservou as estruturas administrativas e religiosas que existiam nessa localidade. Porém, o rei impôs a cultura helenística e a organização grega de cidade. Além disso, quando Paul menciona os judeus, o autor diz que eles não desenvolveram resistência às tropas macedônicas[22]. Portanto, dá a entender com isso que mesmo com  as conquistas de outros povos ou reinos, se assim pode-se dizer, Alexandre Magno não interferiu nas estruturais locais, mas impôs o helenismo. A partir disso, podemos constatar que a imposição da cultura helenística na Judéia por Antíoco IV Epífanes não era novidade nos tempos de Alexandre, mas podemos supor que essa imposição cultural teria se dado de maneira distinta por parte desses dois reis. Isto é, se formos olhar para Jerusalém e seu entorno, parece que esses lugares já tinham “experimentado”o helenismo, mas não em maior grau quanto no século II a. C.

Em síntese, a cultura helenística já se fazia presente nos tempos de Alexandre, e, tratando-se da Judéia, tal cultura já estava “vagando” neste lugar por um longo tempo.

Antes de analisarmos a próxima parte do trecho de 1° Macabeus acima citado, é de  suma  importância  dizer  neste  momento,  de  maneira  bem  rápida, sobre  o tempo cronológico do período helenístico. Este teve duração de quase trezentos anos, começando no século IV a. C e indo até o século I a. C. Mas é relevante salientar que vamos trabalhar nesta parte do presente capítulo o período helenístico até o século II, que é o momento no qual eclode o Levante dos Macabeus na Judéia.

Retornando para o trecho acima citado, vamos analisar esta parte: “(…) recrutou um exército sobremaneira poderoso, submetendo províncias, nações e soberanos, que se tornaram seus tributários”[23]. Esta parte relaciona-se com a que foi destacada anteriormente, e que também diz respeito às conquistas efetuadas por Alexandre Magno. Com isso, muitos povos, como pode ser percebido, acabaram perdendo sua autonomia política e se submeteram ao mando desse rei [24]. Além disso, Paul diz que os judeus passaram a dialogar com os gregos a partir de Alexandre Magno. Resumindo, o povo de Israel passou a fazer parte do rol de povos conquistados por Alexandre da Macedônia a partir do século IV a.C.

Com isso que foi citado, já podemos imaginar que juntamente com a expansão  do filho do rei Felipe pelo Mediterrâneo e até mesmo pelo Oriente Próximo, o helenismo ganhou um grande espaço de influência. É importante termos em mente que ele chegou a diversos territórios como um fenômeno cultural. Visto isso, Paul diz o seguinte sobre a cultura helenística e de seu período:

Mas foi Droysen que, no decorrer do século XIX, deu a “helenismo” um conceito histórico de contornos precisos e estendeu seu campo ao período  que vai da derrota do império persa dos Aquemênidas, por Alexandre Magno (331 a.C.), até o fim do rei dos Ptolomeus, marcado pela batalha de Áccio (31 a.C.) Este período particular da história da antiguidade se caracterizava também aos seus olhos pelo encontro e até pela mistura de elementos culturais gregos e orientais (…) [25]

Nós podemos fechar por aqui o que foi dito com as duas partes do trecho do  livro de 1° Macabeus, e também encerrarmos por enquanto a discussão acerca do Helenismo e do espaço que ele ganhou com os territórios e reinos que foram conquistados por Alexandre Magno. A seguir vamos passar para a análise da terceira e última parte do trecho acima mencionado e a discussão dela com a historiografia pertinente ao que está sendo abordado neste capítulo.

A terceira parte do trecho é exposta da seguinte maneira: “Convocou então seus oficiais, os nobres que tinham com ele convivido desde a mocidade e, estando ainda em vida, repartiu entre eles o reino”[26]. Esta citação nos remete ao momento em que o império grandioso que Alexandre Magno construiu ao longo de aproximadamente 12 anos de reinado foi esfacelado com a sua morte. Mas, como pode-se  perceber  na citação, oficiais e nobres receberam as partes do reino que foi dividido. A partir dessa divisão, foram inaugurados os reinos dos Diádocos.

Os Diádocos[27] foram os responsáveis por dar continuidade à governança que outrora era função daquele rei. A partir deles formaram-se novas dinastias. Os sucessores dos nobres e oficiais que assumiram as possessões do antigo império de Alexandre Magno foram conhecidos como Epígonos[28]. Paul fala dos seguintes  monarcas ou Epígonos:

[…] – a da Macedônia, com Antígono, neto de Antígono, o Vesgo; foi conquistada pelos romanos em 146 a.C.; -a do Egito, com Ptolomeu II Filadelfo (282-246): cessou com a vitória dos romanos em Áccio (31 a.C.) e com a morte de Cleópatra, pouco depois; -a da Síria e da Ásia menor, com Seleuco I Nicanor (281-261 a.C.), que chegou ao fim com a intervenção dos romanos, em 64 a.C [29].

Na verdade, a monarquia que nos interessa aqui é a de Seleuco I Nicanor, pois é ela que faz parte da dinastia dos selêucidas, que no início do século II a.C vai ter em suas mãos o controle da Judéia. E é importante lembrarmos que o nosso foco é esse lugar, que vai ser palco de um evento de grande magnitude envolvendo os judeus e o rei Antíoco IV Epífanes. Este com suas políticas que tinham por finalidade a imposição do helenismo. Mas neste momento isso não vem ao caso. Agora é importante nos concentrarmos nos anos de gestão dos selêucidas sobre a Judéia até a época que ocorre o Levante dos Macabeus.

Antes de começarmos a falar da dinastia selêucida e de sua influência sobre os territórios que outrora pertenciam ao império extenso de Alexandre Magno, é relevante fazermos aqui uma síntese de tudo que foi citado desde a expansão desse rei para outras localidades além da Macedônia até a ocasião na qual o seu império é dividido entre seus súditos e sucessores.

Em síntese, podemos dizer que Alexandre Magno, que era filho do rei Felipe da Macedônia, inaugurou o período helenístico a partir de sua expansão e construção de  seu império de grande extensão territorial, que abrangia desde o Mar Mediterrâneo até à margem ocidental do Rio Indo, na Índia, portanto todo o Oriente Próximo. Esse amplo crescimento territorial aconteceu no século IV a.C. Mas no fim do governo desse rei, ele teria seu império esfacelado entre os seus súditos. Porém, há algo ainda mais importante e que também acompanhou a expansão dos domínios de Alexandre Magno: o  helenismo. Este já estaria “vagando” entre os povos que foram submetidos pelo filho do rei Felipe. Tratando-se da Judéia, esta, como já foi dito neste capítulo, já estava sendo ameaçada pela cultura helenística, que por sua vez se faria presente entre os judeus de maneira intensa sob o reinado de Antíoco IV Epífanes. Contudo, nesta síntese nós não vamos abordar o Levante dos Macabeus, que foi resultado da imposição do helenismo por parte desse rei. Vamos retornar agora ao momento no qual o vasto império de Alexandre Magno foi dividido entre seus súditos, que era o que estávamos tratando anteriormente. Com isso, os Diádocos, como ficaram conhecidos os sucessores do filho do rei Felipe na governança do reino dele, deram continuidade à gestão de seu antigo monarca. Após a morte dos Diádocos, inauguraram-se as linhagens dinásticas dos Epígonos, nas quais se encontravam os selêucidas, que mais à frente será comentado sobre eles. Em suma, o início do período helenístico foi marcado pela expansão do império de Alexandre Magno, conquistas de povos, e por último, surgimento de novos governantes após o falecimento desse rei.

Feita essa breve síntese, de tudo que foi exposto anteriormente, a partir daqui vamos iniciar nossa discussão sobre a dinastia selêucida, e tendo sempre como foco a Judéia entre os séculos IV e II a.C. Em vista disso, é importante nós abordarmos a relação desse território com os selêucidas a partir de 200 a.C. Para isso, podemos contar aqui mais uma vez com André Paul, que situa muito bem a dominação desse lugar por Antíoco III.

Paul menciona uma batalha na qual Antíoco III vence Ptolomeu em 200 a.C. e assegura para si o domínio sobre a Síria e a Judéia, este último território, que outrora pertencia ao rei egípcio vencido. O autor salienta que Antíoco IV, após a morte de seu pai (Antíoco III), fundou sozinho várias cidades e ainda promoveu uma helenização muito forte[30]. Portanto, Paul dá entender que a Judéia até antes do ano citado não pertencia aos selêucidas e que esse território estava sob o domínio da dinastia Lágida, que o autor aponta como Ptolomeu, rei do Egito. A batalha foi realmente significativa para Antíoco III, pois este aumentou sua possessão no Oriente Próximo e ainda garantiu para si a subjugação da Judéia, e que também teve sobre o seu domínio a Síria. Além disso, há outro ponto que mais acima foi destacado pelo autor, que é o incentivo dado pelo rei selêucida Antíoco IV Epífanes (este herdou o trono de seu pai, Antíco III, após  a sua morte) para intensificar o helenismo nos territórios sobre sua jurisdição. Aqui  mais uma vez vemos a cultura helenística se manifestar, afinal, ela sempre esteve presente nos territórios dos Epígonos. Talvez possamos dizer que o helenismo foi uma marca deixada pelos gregos e macedônicos em todos os lugares que eles dominaram a partir de Alexandre Magno. Devemos lembrar que a tradição helenística cimentava todos os campos da sociedade grega, isso desde a política até a religião. Além disso, como já foi exposto, essa tradição era marcada por portar uma religião de caráter politeísta. Isto é, os gregos cultuavam um panteão com diversos deuses.

Anteriormente fizemos dois apontamentos importantes que envolviam a Judéia:  a conquista desse território por Antíoco III e a helenização intensa provocada a partir do reino de seu filho, Antíoco IV Epífanes. Agora, a partir deste momento, vamos falar rapidamente do Levante dos Macabeus e realizar uma pequena discussão sobre a relação desse último rei selêucida com os judeus. Sabemos que esse evento já foi discutido no início deste capítulo, mas ele retornará para as discussões que serão efetuadas porque  ele é um importante elemento para entendermos como Antíoco IV agiu diante dos judeus. Tudo isso faz parte do que estamos tratando aqui, que é a dinastia selêucida.

Como já sabemos, o Levante dos Macabeus teria sido motivado por questões culturais, sendo mais específico, por impasses religiosos. Em outros termos, esse  levante se deu porque a tradição que os judeus portavam seria ameaçada pelo helenismo imposto de maneira forçada por Antíoco IV Epífanes. O helenismo trazia junto consigo o politeísmo e até mesmo costumes, que ao ver da etnia judaica, eram contrários à Lei. Com isso, a preservação da religião judaica e de seus costumes se tornou o principal motivo da luta travada a princípio pelo sacerdote Matatias, e depois por seu filho Judas. É importante salientar que essa luta era direcionada contra o rei selêucida mais acima citado. Rei esse que quis que seu modo de vida fosse compartilhado ou até mesmo assimilado entre os seus súditos. Dito isso, é importante apontarmos, de maneira mais precisa, a postura assumida por Antíoco IV Epífanes.

Primeiramente, é importante lembrarmos aqui que, segundo Otzen, o rei selêucida em questão não teria agido sozinho para impor o helenismo na Judéia. Isto é, Antíoco IV teria sido favorecido para que suas imposições fossem efetuadas sobre os judeus. Para o autor, o rei teria tido como aliados os judeus helenistas, que por sua vez teriam aderido ao helenismo e se tornado inimigos dos Macabeus. Benidikt Otzen aponta em sua obra uma das medidas adotadas por Antíoco IV Epífanes para com os judeus:

Quando Jerusalém e o templo foram cercados pela nova pólis, o segundo tornou-se o lugar de culto comum tanto para os judeus quanto para os não- judeus. Os judeus ainda podiam cultuar seu Deus, Iahweh, no templo; ao mesmo tempo, os gregos e os judeus apóstatas que habitavam na Acra  podiam render culto no mesmo local, uma vez que estes identificavam de modo sincrético Iahweh, o antigo Deus do templo, com Zeus. Portanto, para os helenistas, o templo de Jerusalém fora retirado do isolamento em que estava e recebera uma importância nova e cosmopolita, como os outros santuários antigos e famosos do império selêucida. Dessa forma, eles devem ter imaginado que tal desenvolvimento seria, a longo prazo, vantajoso para o sacerdócio. Contudo, os judeus ortodoxos ressentiam-se amargamente da profanação do templo. Houve uma reação, e esta não tardou a chegar[31].

Nessa citação podemos perceber que o rei selêucida aplica uma de suas medidas para helenizar Jerusalém, que é o cercamento dessa cidade e do seu templo pela nova pólis. E também há presença de judeus, que Otzen denomina como “apóstatas”[32]. O autor nos faz remontar a um assunto que já tinha sido discutido neste capítulo, de maneira bem superficial, que são os processos de assimilação e resistência culturais. Porém, não podemos esquecer que o nosso foco neste momento é a dinastia selêucida.

Podemos finalizar por aqui, tudo que foi dito acerca dos selêucidas com  a Judéia. Podemos fazer uma contraposição entre Antíoco III e seu filho, Antíoco IV Epífanes. Ao contrário do seu pai, Antíoco IV, usando de sua posição política em seu reino, fez valer de maneira bem intolerante da imposição do modo de vida helenístico  ao povo de Israel. Mas como bem salientou Otzen, o rei não agiu sozinho em seu ato de menosprezo à tradição judaica. O rei selêucida teve ajuda dos judeus helenizados. Sendo assim, a governança de Antíoco IV Epífanes foi marcada por instabilidades sociais por parte dos judeus e até mesmo por favorecimento dado por alguns deles a esse rei.

Consideração Parcial

O que nos resta a fazer aqui é um breve resumo do que foi tratado ao longo deste capítulo e, por último, realizar uma conclusão parcial. Para isso, é necessário que esse breve resumo seja realizado a partir dos principais pontos que foram trabalhados no capítulo: o Levante dos Macabeus e seu impacto para a população judaica; a influência do período helenístico nesse evento e a atuação da dinastia selêucida, especialmente do rei Antíoco IV Epífanes, que teria dado impulso à Revolta dos Macabeus.

Primeiramente, o Levante dos Macabeus representou para os judeus um momento no qual eles ajustaram suas posições em defesa de culturas distintas, como foi o caso de Matatias, seus filhos e seus companheiros, e dos “desertores da Lei”, respectivamente a favor do Judaísmo e do Helenismo na Judéia. Em suma, podemos dizer que o evento ocorrido no século II a.C se deu sobre a base da interação cultural. Isso porque o levante aqui tratado foi um embate entre o Judaísmo e o Helenismo. Um buscando sobrepor-se ao outro através do clima de tensões, que foi instaurado entre o povo de Israel.

A partir disso, o período helenístico é o segundo ponto que deve ser abordado aqui, pois ele é de extrema relevância para entendermos a insurreição dos Macabeus contra os seus inimigos, que no caso eram Antíoco IV e os judeus helenizados. É no período em questão que a cultura helenística vai se proliferar sobre a grande extensão territorial edificada e almejada por Alexandre Magno. É válido lembrarmos que esse período era compreendido entre os séculos IV e I a.C. O helenismo já estava  “sondando” os povos que foram conquistados pelo rei mencionado antes, especialmente o da Judéia. Esta já estava na zona de influência do helenismo desde o século IV a.C., mas como já foi salientado neste capítulo, essa influência vai se fazer mais intensa e perturbadora quase duzentos anos mais tarde, com o Levante dos Macabeus. Portanto, a Judéia já estava em contato com os padrões de vida helenísticos mesmo antes desse levante, mas foi nele que esses padrões ganharam maior destaque.

Com isso, neste momento, o que falta é abordarmos a atuação da dinastia selêucida. A Judéia, como bem salientou Arnaldo Momigliano, passou ao domínio de Antíoco III após este derrotar o rei Lágida[33], que reinava sobre o Egito. Mas os nossos olhares devem estar atentos para o monarca Antíoco IV Epífanes, pois foi ele quem  usou de sua posição política sobre a Síria e a Judéia para impor de modo intolerante os costumes helenísticos sobre este último lugar. Medidas essas que interferiam, principalmente, na religião judaica e no seu cotidiano. É importante sabermos que o helenismo era marcado pelo politeísmo e costumes distintos dos judeus. Sendo assim, foi com Antíoco IV Epífanes, que a cultura helenística teve maior atuação na Judéia, pois até antes de seu reinado não havia nesse território uma influência da cultura em questão. E talvez possamos dizer que o rei selêucida foi o grande motivador para que o helenismo conseguisse penetrar junto a um povo que era conservador na religião e no seu dia a dia.

Esses pontos nos fazem pensar que o terreno para o helenismo já estava dado para a Judéia a partir do momento no qual esta passou a ser subjugada e inserida ao império de Alexandre Magno. Isto é, Jerusalém e seu entorno já “participavam”, mesmo que de maneira indireta, do modo de vida helenístico. Porém, isso se acentuou com Antíoco IV e suas políticas para eliminar o judaísmo totalmente, isso através das proibições de práticas como a circuncisão e o culto dedicado a Yahweh no templo de Jerusalém. Enfim, podemos dizer que os integrantes do Levante dos Macabeus estavam não só combatendo o monarca selêucida, mas também um inimigo que há muito tempo fazia-se presente próximo aos judeus: o Helenismo.

Capítulo II: Conceitos Adotados e seus Teóricos

No capítulo anterior foi tratado e discutido sobre o Levante dos Macabeus ocorrido no século II a.C., na Judéia. Além disso, também se fez uma ligação entre esse evento e o período helenístico. Em suma, o capítulo I da presente monografia dedicou- se a dar um panorama geral do levante em questão e de seu contexto histórico.

Neste capítulo serão discutidos os conceitos e seus teóricos que estão relacionados ao tema desta pesquisa. Isto é, vamos ter a oportunidade de enxergar o Levante dos Macabeus, a partir dos conceitos que são pertinentes com o assunto abordado aqui.

Dito isso, é importante deixar evidente que nesta pesquisa está se fazendo uma história cultural da Insurreição dos Macabeus. Relacionado a esse aspecto, o historiador Peter Burke em seu livro intitulado O que é história cultural? trata sobre o termo cultura. A definição a seguir é importante para compreendermos o que estava por trás de povos distintos como os judeus e os gregos. O autor esclarece, que na verdade esse termo já tinha sido definido em 1871, na obra de Edward Tylor, intitulada Primitive Culture. Tylor definiu cultura como “o todo complexo que inclui conhecimento, crença, arte, moral, lei, costume e outras aptidões e hábitos adquiridos pelo homem como membro da sociedade”[34].

Por fim, é de extrema importância conhecermos os conceitos que serão discorridos mais adiante. Tais conceitos são: a)Judaísmo”, b)Helenismo”,”Hibridismo Cultural”(conceito de tipo “guarda-chuva”), dentro do qual serão tratados os conceitos de c)Imitação” e d)Apropriação”e, sobretudo utilizar-se-á e)“Resistência”e “Resistência Cultural”, além da referência de Peter Burke sobre o conceito de f)“Identidade Cultural”. Finalmente, em uma pesquisa que opõe duas sólidas etnias da Antiguidade: gregos e judeus, seria inconcebível não trazer a este trabalho um último e importante conceito de certo modo, interligado: o de g) “Grupo

Étnico”. Ao todo, vários conceitos que serão abordados mais à frente, e que também identificam, respectivamente, cada tópico do presente capítulo. Este tem como último tópico intitulado “Acerca dos conceitos”.

Judaísmo

O primeiro conceito que será descrito aqui e que também representa para este trabalho um importante elemento para se entender o Levante dos Macabeus, é o de “Judaísmo”. Todavia, a pergunta que se faz é esta: o que se entende aqui por “Judaísmo”? Este termo se define a partir da concepção do historiador André Paul. Este é especialista em estudos sobre judaísmo ligado à antiguidade. Além disso, o conceito em questão se encontra na obra desse historiador com o nome de O Judaísmo Tardio– História Política.

Um dos referenciais teórico-conceituais deste trabalho acabou de ser  evidenciado. Com isso, podemos partir para a definição do conceito de “Judaísmo” proposto por Paul. O autor o define da seguinte maneira:

“Judaísmo” implica, portanto, uma dimensão religiosa e moral (com uma doutrina e um ensinamento, com regras e costumes), mas também fronteiras culturais e limites sociais. Em resumo, designa a vida judaica no seu todo, enquanto diz respeito tanto aos indivíduos chamados “judeus” como ao grupo específico e determinado que os institui e define como tais[35]

A partir dessa definição podemos constatar dois pontos importantes que distinguem os judeus dos outros povos do Oriente Próximo. Sendo mais específico, essa diferença reside, na época do Levante dos Macabeus, na maneira como judeus e gregos se portavam. Isso nos leva ao primeiro ponto do termo “Judaísmo” de Paul, que é a “(…) dimensão religiosa e moral (…)”[36]. Essa dimensão se evidencia melhor nas práticas cotidianas dos judeus como a circuncisão, a devoção a um único D’s, que no caso é Yahweh, e também não menos importante e está relacionado ao hábito alimentar, que é não consumir carne de porco, pois segundo os ensinamentos judaicos esse animal é enxergado como impuro.

A respeito dessas práticas, podemos trazer para o assunto deste tópico a historiadora Christiane Saulnier e sua obra já  mencionada no capítulo  anterior deste trabalho, A revolta dos Macabeus. Além das práticas descritas acima, no tópico de seu livro intitulado A fidelidade à Lei, a autora aponta outros costumes dos judeus. Tais costumes são: oração e jejum; reserva do sábado[37].

Tudo isso acaba nos guiando para o segundo ponto da definição de “Judaísmo” de André Paul, que em suas palavras se descrevem desta maneira: “(…) fronteiras  culturais e limites sociais”[38]. Entendemos esse trecho do historiador tendo uma relação estreita com as práticas judaicas que foram abordadas anteriormente. Mas por que isso? Porque essas práticas diferenciavam o povo judeu, como já foi falado aqui, dos outros povos que portavam costumes totalmente distintos deles. As práticas, por sua vez, levavam a criar as “fronteiras” que Paul descreve, entre os judeus e os indivíduos não judeus. Trazendo isso para o evento que faz parte da temática desta pesquisa, as fronteiras culturais e sociais trazidas por Paul se tornam nítidas no momento em que judeus e gregos se enfrentam para defenderem suas causas.

As fronteiras culturais e sociais trazidas pelo historiador André Paul na sua definição de “Judaísmo” dão a entender bem quem pertence a este ou não. Em outras palavras, judeus e gregos (estes representados pelo rei selêucida Antíoco IV Epífanes) ocupam pólos de costumes distintos. De um lado os judeus que são tementes à Lei, e de outro os gregos que veneram diversos deuses e adotam práticas que, aos olhos do povo judeu, são aterrorizantes.

Em síntese, o conceito de “Judaísmo” empregado nesta pesquisa demonstra claramente os pontos elementares dos judeus que residiam na Judéia no século II a. C. Pontos estes que já foram evidenciados e explicados mais acima: “dimensão religiosa e moral” e “fronteiras culturais e sociais”. Tudo isso tendo como base o ponto de vista do historiador André Paul. Dados esses pontos a partir da concepção do historiador em questão, torna-se mais fácil nós traçarmos no plano imaginário como os judeus que deram início à revolta contra os gregos estavam defendendo suas tradições contra estes que queriam impor o modo de vida helenístico a eles. Enfim, o conceito de  “Helenismo” será descrito no próximo tópico.

Helenismo

No tópico anterior definimos o conceito de “Judaísmo” a partir da concepção do historiador André Paul. Este também vai cooperar aqui com o seu entendimento do conceito de “Helenismo”, que, assim como o conceito anteriormente exposto, o termo que será discorrido neste tópico partirá também da mesma obra desse historiador.

Traduzindo o que foi dito anteriormente em outras palavras, ou melhor, em uma questão, o que se entende neste estudo como “Helenismo”? Como já foi dito mais acima, Paul também traz sua contribuição acerca desse conceito. Informando uma citação desse historiador, que já foi descrita no capítulo anterior, esse especialista em judaísmo antigo define o conceito tratado nesta parte do capítulo da seguinte maneira:

Mas foi Droysen que, no decorrer do século XIX, deu a “helenismo” um conceito histórico de contornos precisos e estendeu seu campo ao período  que vai da derrota do império persa dos Aquemênidas, por Alexandre Magno (331 a.C.), até o fim do reino dos Ptolomeus, marcado pela batalha de Áccio (31 a.C.). Este período particular da história da antiguidade se caracterizava também aos seus olhos pelo encontro e até pela mistura de elementos culturais gregos e orientais (…).[39](grifo nosso)

As partes em destaque dessa citação nos levam a duas questões básicas: quais seriam os elementos culturais gregos? E, quais seriam os elementos culturais orientais? Para nos ajudar a responder a primeira questão, é indispensável o estudo do historiador Arnaldo Momigliano acerca daquilo que ele chama de “civilização helenística”. Parafraseando Momigliano, essa civilização permaneceu grega na língua, costumes e na consciência de si mesma [40].

A partir desse pensamento, o historiador nos traz elementos que compõem basicamente a cultura grega que esteve envolvida ao helenismo. Elementos esses, já citados acima, que podem ser descritos desta forma: língua, costumes e consciência grega. Talvez possamos constatar que o “Helenismo”, com a definição de André Paul e os elementos da “civilização helenística” de Arnaldo Momigliano, nada mais era que a perpetuação dos hábitos gregos para outros territórios.

A segunda questão levantada mais acima acerca do trecho em destaque da definição dada por Paul ao conceito de “Helenismo” pode ser respondida, olhando para os judeus, da seguinte maneira. Os elementos culturais orientais que compõem o “Judaísmo”, como já foram descritos no tópico anterior, são: circuncisão, devoção apenas a um D’s, consumo de animais ditos puros, oração, jejum e reserva do sábado. Esses elementos que estão relacionados ao “Judaísmo” se contrapõem ao modo de viver dos gregos, estes que, como acabamos de perceber anteriormente, estão abrigados pelo “Helenismo”. Tratando-se dos judeus em relação ao helenismo, Momigliano diz que “(…) permaneceram basicamente convencidos da superioridade de suas crenças e maneiras de viver e lutaram por elas”[41].

Mais um detalhe é importante destacar aqui, que é quando André Paul fala, na sua definição da ideia de “Helenismo”, da mistura de “(…) elementos culturais gregos e orientais (…)”[42]. Para entendermos melhor o que Paul está querendo dizer, o historiador Benedikt Otzen esclarece isso. Ele nos demonstra um caso concreto de “mistura”, que diz respeito a uma das medidas adotadas na Judéia por Antíoco IV Epífanes.

Quando Jerusalém e o templo foram cercados pela nova pólis, o segundo tornou-se o lugar de culto comum tanto para os judeus quanto para os não- judeus. Os judeus ainda podiam cultuar seu Deus, Iahweh, no templo; ao mesmo tempo, os gregos e os judeus apóstatas que habitavam na Acra podiam render culto no mesmo local, uma vez que estes identificavam de modo sincrético Iahweh, o antigo Deus do templo, com Zeus.[43] (grifo nosso)

Em outras palavras, a mistura que se percebe entre elementos culturais gregos e orientais, sobretudo judaicos, é evidenciada por Otzen no momento em que tanto gregos quanto judeus apóstatas identificam Iahweh com Zeus.

Em suma, o que se buscou trazer neste tópico, basicamente, foi a definição de outro conceito importante para esta pesquisa, que é o de “Helenismo”. Porém, é importante deixar claro que esse conceito se define ou tem como referencial teórico neste trabalho o historiador André Paul. Além disso, após a definição de “Helenismo”, também se buscou aqui identificar os elementos culturais gregos que estão agregados a esse conceito.

Hibridismo Cultural

O título deste tópico, como já foi dito no início do presente capítulo, é um conceito de tipo “guarda-chuva”. Mas porque o conceito de “Hibridismo Cultural” está aqui como uma espécie de “guarda-chuva”? Porque nele estão contidos outros conceitos que serão discorridos mais adiante neste capítulo. Com isso, como também já foi adiantado no início, os conceitos que estão agregados à ideia de “Hibridismo Cultural” são: “Imitação/Apropriação”, “Resistência/Resistência Cultural” e “Identidade Cultural”.

Antes de adentrarmos no conceito que é título deste tópico, é importante sinalizar duas coisas. Primeiro, todos os termos descritos acima têm como referencial teórico, adotado por este trabalho, um dos historiadores mais renomados da história cultural, que é o inglês Peter Burke. E por último, é relevante lembrar que cada conceito acima mencionado será tratado e discutido por tópicos. Sendo assim, mais adiante o quadro teórico-conceitual aqui adotado será exposto de maneira fragmentada, isso até mesmo para uma melhor compreensão por parte do leitor.

O conceito de “Hibridismo Cultural” faz parte do título de uma das inúmeras obras do historiador cultural Peter Burke. A respeito da cultura, o autor apresenta seu ponto de vista: “(…) toda inovação é uma espécie de adaptação e que encontros culturais encorajam a criatividade”[44]. Em outras palavras, o historiador quer dizer que a cultura é resultado do encontro de outras culturas. Com efeito, em seu livro, Burke estabelece uma crítica à ideia de “essencialismo cultural”, melhor dizendo, esse historiador se contrapõe à concepção que diz basicamente que a cultura guarda a sua essência. Além disso, é notório que na obra Hibridismo cultural o autor tem por proposta analisar a mistura (cultural) do que fazer uma réplica dela[45]. Enfim, é importante nós conhecermos esses traços da obra de Peter Burke, porque é ela que nos servirá de base para falarmos e discutirmos sobre os conceitos adotados por este estudo, e que serão abordados mais à frente.

Para finalizarmos, é importante dizer que, como se percebeu nos tópicos anteriores, a partir daqui também não ficaremos presos apenas às definições dadas por Peter Burke aos conceitos usados neste trabalho. Possivelmente estabeleceremos diálogos com outros estudiosos para entendermos melhor essas definições ao longo do presente capítulo.

Imitação/Apropriação

Neste tópico os conceitos de “Imitação” e “Apropriação” serão entendidos como um complementando o outro. Isto é, eles estão unidos para se entender o ocorrido que está sendo estudado por esta pesquisa. Sendo assim, podemos passar para a definição desses conceitos dada pelo renomado historiador cultural Peter Burke:

Na história do Ocidente, uma das maneiras como a interação cultural tem sido discutida desde a antiguidade clássica é por intermédio da idéia de imitação (…). Uma alternativa à imitação era a ideia de apropriação (…)[46]. (grifo nosso)

Tanto o conceito de “imitação” quanto o conceito de “apropriação”, trazidos por Burke em sua obra, são entendidos aqui como “assimilação cultural”. Dito isso, traduzindo o que esse historiador disse acerca dos conceitos empregados para o caso  que está sendo analisado nesta pesquisa (o Levante dos Macabeus), houve uma significativa minoria de judeus que assimilaram a cultura helenística, na prática a cultura grega, e a partir disso, em alguma medida, acabaram se igualando aos gregos e a seus padrões de vida.

Como já foi demonstrado no capítulo I e mais acima no tópico que fala sobre o conceito de “Helenismo”, também tivemos a oportunidade de perceber no parágrafo anterior que parte dos judeus que viviam na Judéia, sendo mais específico, nas proximidades de Jerusalém, se “deixaram levar” por costumes trazidos por indivíduos estranhos a sua cultura. Costumes esses, que são válidos serem lembrados, como a adoração, por parte dos judeus apóstatas a Zeus (isso foi descrito mais acima, quando o historiador Benedikt Otzen fala dos gregos e dos Judeus apóstatas que identificavam Iahweh com Zeus) e o consumo de animais que, para a tradição judaica, são vistos como impuros, por exemplo, a carne de porco.

O historiador Benedikt Otzen pode contribuir para o que está sendo falado aqui a respeito dos conceitos de “Imitação” e “Apropriação”, tratando-se especialmente da Insurreição dos Macabeus que aconteceu no século II a.C.

Segundo Otzen, entre os judeus helenistas havia um projeto de que o povo de  D’s teria que sair de seu isolamento para integrar-se ao mundo grego. Melhor dizendo, o povo judeu a partir desse projeto passaria a dialogar com elementos da cultura helenística trazidos por Antíoco IV Epífanes no século II a.C. “O desejo de romper esse isolamento e ser aceito na sociedade das nações, ou seja, distanciar-se da forma de vida que os gregos consideravam bárbara, era o que estava por trás dos esforços dos judeus helenistas”[47]. Em síntese, podemos entender isso como, possivelmente, um processo de assimilação por parte de alguns judeus, que Otzen identifica como “helenistas”, à cultura helenística ou à cultura grega.

Resumindo tudo que foi dito anteriormente, tivemos dois propósitos no presente tópico. O primeiro foi apresentar a definição, do historiador cultural Peter Burke, dos conceitos de “Imitação” e “Apropriação”, que nesta pesquisa, como já foi salientado,  um complementa o outro. E, para melhor entender esses conceitos na prática, falamos dos judeus que adotaram os costumes gregos durante o Levante dos Macabeus ocorrido na Judéia. Relacionado a esse último ponto, o outro propósito que tivemos aqui foi,  além de abordar os conceitos em questão, estabelecer uma discussão acerca deles com o historiador Benedikt Otzen, através da sua obra intitulada O Judaísmo na Antiguidade. Esse historiador foi essencial para que nós pudéssemos conceber como se deu o  processo de “assimilação cultural” por parte dos judeus à cultura helenística. Enfim, o presente tópico não se resumiu apenas à dimensão teórica, mas também podemos conceber como essa teoria se deu na prática com o fato histórico que está  sendo estudado nesta pesquisa.

Resistência/Resistência Cultural

Antes foi tratado sobre o processo de “assimilação cultural” ou “imitação/apropriação” (nesta pesquisa esses três conceitos são válidos). Além disso, tivemos a oportunidade de ver, a partir da Insurreição dos Macabeus, exemplos desse processo. Todavia, neste tópico, o que presenciaremos mais adiante é o oposto disso, se assim podemos descrever. Houve assimilação por parte de alguns judeus (a minoria) à cultura grega no século II a. C., mas também tiveram outros que resistiram (a maioria) à imposição dessa cultura.

Como no tópico anterior, onde os conceitos de “imitação” e “apropriação” foram entendidos como um complementando do outro, aqui também vai ser feito algo semelhante a isso. Nesse caso, os conceitos de “Resistência” e “Resistência Cultural” vão estar juntos.

O historiador Peter Burke vai contribuir mais uma vez, para este estudo, com a definição dos conceitos que serão tratados aqui. Burke os define da seguinte maneira:

A aceitação do estrangeiro costuma levar a problemas difíceis que têm sido discutidos no seio das próprias culturas de empréstimo. E isso nos leva à segunda das possíveis estratégias, a estratégia da resistência, da defesa das fronteiras culturais contra a invasão. (…). De mesma forma como algumas culturas são inusitadamente receptivas a ideias ou artefatos estrangeiros, outras são inusitadamente resistentes (…)[48].(grifo nosso)

Os trechos em negrito nos mostram de maneira bem clara em que consistem os conceitos de “Resistência/Resistência Cultural”, que é defender uma cultura contra a invasão de outra. Trazendo isso para o fato que está sendo estudado neste trabalho, o historiador André Paul nos fala melhor acerca do Levante dos Macabeus. Segundo o autor, a Judéia se encontrava em uma guerra civil entre partidários e adversários mais  ou menos ferrenhos da helenização[49].

Como pode ser percebido tanto com a definição de Peter Burke dada acima quanto com o exemplo dado por Paul, podemos imaginar o desenrolar do processo de resistência por parte dos judeus que se colocavam contra a helenização, esta que, como já foi salientado em diversas partes deste estudo, foi imposta por um rei que tinha um costume de vida totalmente diferente dos judeus que habitavam a Judéia no século II a.C. Costume esse que, é válido lembrar, tinha como componentes o culto a deuses gregos, sobretudo a Zeus, e o consumo de animais que, no cotidiano judaico, eram repreensíveis. Sendo assim, a resistência dos judeus, os mesmos que a princípio tinham como líder Matatias e depois Judas, se davam contra o padrão de vida helenístico, ou melhor, padrão de vida grego.

Outro historiador que ilustra melhor o que está sendo tratado aqui é Arnaldo Momigliano. Este diz o seguinte acerca da resistência despertada por muitos judeus ao modo de vida grego: “O repúdio ao helenismo em Jerusalém era sem dúvida uma reafirmação da fidelidade da comunidade judia ao Deus de Abraão, Isaac e Jacó (…)”[50]. Essa afirmação deixa mais evidente ainda o ato de resistir e contra o que os judeus estavam resistindo.

O debate efetuado antes, que se deu através da exemplificação de um momento do Levante dos Macabeus, nos serviu para compreender de maneira mais didática a definição de “Resistência/Resistência Cultural”, dada pelo historiador cultural Peter Burke. Em outras palavras, a concepção desses conceitos é de suma importância para este trabalho, pois ela nos passa outro ângulo acerca do levante em questão. Ângulo esse que, como ficou explícito ao longo do presente tópico, está relacionado aos judeus que lutaram contra Antioco IV Epífanes para garantir a proteção e a perpetuação da tradição judaica e os judeus “traidores da Lei”.

Fazendo um balanço dos pontos que foram falados neste tópico, no início dele nós procuramos deixar claro que tanto o conceito de “Resistência” quanto o de “Resistência Cultural” são entendidos aqui no sentido de um complementando o outro. Após isso, trouxemos a concepção do historiador cultural Peter Burke acerca desses conceitos. Concepção essa que deixou bem evidente o que nós queríamos passar. Contudo, não nos atemos apenas ao universo teórico de “Resistência/Resistência Cultural”. Buscamos compreender também esses conceitos no campo da prática, ou  seja, enquadrando o caso do Levante nos Macabeus. Esse enquadramento se deu, como ficou perceptível mais acima, através de exemplos trazidos por historiadores como André Paul e Arnaldo Momigliano. Estes estudiosos acabaram cumprindo um papel essencial aqui. Enfim, mais uma vez realizamos um exercício que se dá em dois campos distintos, mas que se complementam. De um lado a teoria, que foi a definição dos conceitos de “Resistência/Resistência Cultural”, de outro, o campo prático para a aplicação dessa teoria, que foi o caso da Insurreição dos Macabeus.

Identidade Cultural

Antes nós vimos dois processos culturais distintos, mas ligados a um mesmo agente, no caso os judeus. Processos esses que são, por um lado, a “Assimilação Cultural”, e de outro, a “Resistência Cultural”. Ambos tendo como referencial teórico nesta pesquisa o historiador cultural Peter Burke. Com isso, nos resta fechar o tópico “Hibridismo Cultural” com mais um conceito que é bastante importante para este estudo, que é “Identidade Cultural”. Este, assim como os conceitos antes mencionados, também vai contar com a definição desse historiador, que pode ser encontrada em sua obra que foi utilizada aqui como base para a definição desses conceitos.

Podemos perceber, nos tópicos anteriores, que definíamos os conceitos e depois partíamos para os exemplos nos quais eles estavam relacionados. Tais exemplos, como podemos perceber, são trazidos a partir do Levante dos Macabeus. O que vamos realizar a seguir não foge a essa conduta.

O autor e historiador Peter Burke define a ideia de “Identidade Cultural” em seu livro da seguinte maneira: “A identidade cultural é frequentemente definida por contraste (…)”[51]. (grifo nosso) Como pode ser percebido com as palavras do autor, de maneira bem esclarecedora, o conceito em questão é definido por diferenças.

O contraste ou diferença que marca a “Identidade Cultural” já estava sendo revelado neste capítulo desde o início. Isso porque tivemos a oportunidade de falar  sobre os conceitos de “Judaísmo”, “Helenismo”, “Assimilação Cultural” e “Resistência Cultural”. Em todos eles nós vimos algo em comum, que eram os gregos e os judeus.

Para entendermos melhor a definição de “Identidade Cultural”, é necessário que relacionemos mais uma vez esse conceito com a Insurreição dos Macabeus. Nesse evento podemos constatar o envolvimento de agentes distintos que, como já pudemos constatar  mais  acima,  são  os  gregos  e  os  judeus.  Cada  um destes representa uma identidade cultural. Para melhor entendermos o que fazia parte dessa identidade, é relevante que nós destaquemos cada particularidade desses agentes.

Primeiramente, podemos destacar as particularidades da identidade cultural grega. Para isso, mais uma vez vamos usar as palavras do historiador Arnaldo Momigliano para citá-la. Quando Momigliano vai falar sobre aquilo que ele define  como “civilização helenística”, ele diz que esta permaneceu com os traços gregos: “(…) permaneceu grega na língua, nos costumes e sobretudo na consciência de si mesma”[52]. Trazendo esses traços para a dinastia selêucida, que governava a Judéia, aproximadamente entre 168 e 164 a.C., o monarca Antioco IV Epífanes os incorporava. E dando um enfoque maior aos costumes gregos, o que se vê na Judéia é uma imposição do culto a Zeus sendo efetuada por esse monarca, e assim fazendo com que alguns judeus passassem a prestar culto ao deus estrangeiro. Sendo assim, a identidade cultural grega é marcada, como já ficou explícito mais acima, por portar um modo de vida próprio.

Já se tratando das particularidades da identidade cultural judaica, podemos ver, principalmente do ponto de vista dos costumes, que ela é marcada por uma diferença radical da identidade grega. Christiane Saulnier, como já pudemos ver neste capítulo, nos traz algumas práticas que estavam ligadas ao cotidiano dos judeus. Práticas essas que são: oração, jejum, reserva do sábado e a circuncisão. Além disso, e diferente dos gregos, os judeus prestavam culto a Yahweh, somente. Com isso, a identidade cultural judaica é marcada por um intenso contraste a ainda pelo fato do monoteísmo, pois ao contrário disso, os gregos eram politeístas (prestavam culto para outros deuses além de Zeus).

Em síntese, podemos ver ao longo deste tópico a exploração da ideia de “Identidade Cultural” definida por Peter Burke. Este entende que esse conceito é definido por contraste. A partir disso, buscamos discorrer sobre as particularidades de dois agentes distintos que estavam envolvidos no Levante dos Macabeus. De um lado os gregos, e de outro os judeus. Eles, como se demonstrou mais acima, são totalmente diferentes  em  seus  costumes,  especialmente  tratando-se  de  seus  cultos. Por fim, acabamos por demonstrar, através de exemplos, os contrastes que estão na definição do conceito de “Identidade Cultural” de Burke.

Grupo Étnico

Após termos abordado os conceitos nos tópicos anteriores, finalmente chegamos ao último termo adotado por este estudo, que é “Grupo Étnico”. Como já é rotina no presente capítulo, é importante deixar evidente que o referencial teórico adotado para a definição desse conceito é Fredrik Barth. Este foi antropólogo social e publicou várias obras ao longo da sua carreira acadêmica. Todavia, a que nos servirá de base aqui para definir o conceito em questão é Grupos étnicos e suas fronteiras, pelo menos a introdução dessa obra que se encontra no livro Teorias da Etnicidade[53]. Esclarecido isso, a seguir podemos passar para a definição do conceito que está sendo abordado neste tópico.

O antropólogo social Fredrik Barth define “Grupo Étnico” como:

O termo grupo étnico, na bibliografia antropológica, é geralmente entendido (…) para designar uma população que: 1 – perpetua-se biologicamente de modo amplo, 2 – compartilha valores culturais fundamentais, realizados em patente unidade nas formas culturais, 3 – constitui um campo de  comunicação e de interação, 4 – possui um grupo de membros que se identifica e é identificado por outros como se constituísse uma categoria diferenciável de outras categorias do mesmo tipo[54].

Resumindo essa definição em poucas palavras, podemos dizer que o conceito de “Grupo Étnico” de Barth tem como pontos centrais: indivíduos que pertencem à mesma coletividade e que possuem a mesma cultura. Dito isso, podemos trazer essa definição para os judeus que se encontravam na Judéia no século II a.C., no calor da insurreição liderada por Matatias contra Antíoco IV Epífanes e a imposição aos judeus de seu modo de vida helenístico[55].

Podemos enquadrar esses últimos sujeitos da seguinte forma nas características que compõem a definição acima dada à ideia de “Grupo Étnico”: 1) Tanto os Judeus quanto os Gregos perpetuaram-se biologicamente de modo amplo, mas há diferenças entre os gregos modernos e os antigos. Quanto aos judeus, praticamente não há diferença entre os judeus da Antiguidade e os atuais; 2) Quanto aos “valores culturais”, havia na Antiguidade uma grande diferença entre Gregos e Judeus. Os primeiros eram politeístas e falavam a língua grega koiné, derivada do grego clássico e os judeus eram monoteístas e falavam hebraico ou aramaico; 3) É óbvio que tanto Gregos como Judeus constituíam na Antiguidade um campo de comunicação e interação entre eles, mas diferentes de outros povos; 4) Tanto Gregos quanto Judeus se autoidentificavam como, respectivamente, Gregos e Judeus e outros povos ou estes dois mesmos sabiam as diferenças entre eles.

Quando Matatias inicia o confronto contra o monarca acima mencionado, e depois seu filho Judas dá continuidade a isso, o que estava em jogo naquele momento era o modo de vida da coletividade que eles faziam parte. Isto é, uma coletividade de judeus que tinha a sua própria maneira de agir. Modo de vida esse que era presidido  pela Lei e suas prescrições. A respeito disso, Barth fala o seguinte:

O conteúdo cultural das dicotomias étnicas parecem ser analiticamente de duas ordens: 1. sinais ou signos manifestos – os traços diacríticos que as pessoas procuram e exibem para demonstrar suas identidades, tais como o vestuário, a língua, a moradia, ou o estilo geral de vida; 2. orientações de valores fundamentais – os padrões de moralidade e excelência pelos quais  as ações são julgadas[56]. (grifo nosso)

A partir dessa citação, é perceptível que o autor divide o conteúdo cultural das etnias em aspectos objetivos e subjetivos. Relacionando isso mais uma vez com os judeus, os aspectos objetivos estariam relacionados, basicamente, a como que  eles agiam no cotidiano (aqui não é indispensável lembrar que o consumo de carne de porco é algo condenável entre a etnia judaica). Tratando-se dos aspectos subjetivos, nisso se enquadram a Lei de Moisés. Esta como instrumento norteador para o que os judeus devem fazer ou não. Em suma, o que podemos constatar é que a dimensão cultural, especialmente relacionado ao ocorrido que está sendo estudado nesta pesquisa, está dividida em dois pólos que se complementam: visível (aquilo que pode ser percebido facilmente no cotidiano) e o “invisível” (diz respeito ao inconsciente dos indivíduos).

Com a definição dada por Fredrik Barth ao termo “Grupo Étnico” e a relação disso com os judeus, podemos trazer para cá outro autor que também trabalha com aquilo que ele denomina como “dimensões da etnia”. Tal autor é Anthony Smith. Este em sua obra que tem como título The Ethnic Origins of Nations[57] traz seis elementos  que fazem parte das “dimensões da etnia”, que são: 1) “Um nome coletivo”; 2) “Mito comum de origem”; 3) “Uma história compartilhada”; 4) “Uma cultura compartilhada e diferenciada”; 5) “Uma associação com território específico”; 6) “Um senso de solidariedade”. Dados esses elementos, podemos perceber que eles têm algo em comum com a definição do conceito de “Grupo Étnico” de Barth, que é a cultura ser compartilhada.

Vamos fazer aqui um movimento parecido com o que foi realizado com o conceito de “Grupo Étnico”, que é o enquadramento de Gregos e Judeus nas características descritas no parágrafo anterior que fazem parte do termo “dimensões da etnia”. Tal enquadramento se dá no seguinte víeis: 1) Tratando-se de nome coletivo: Judeus e Helenos ou Gregos; 2) Mito comum: para os Gregos, os deuses do Olimpo (resumidamente) e para os Judeus, pode-se considerar o Patriarca Abrão, embora a maioria dos historiadores não seja unânime ao considerar que os Judeus tiveram um Mito comum de Origem, pois Abraão seria de fato uma real personagem histórica; 3) história compartilhada: para os Judeus é a história dos Hebreus (desde o início do II milênio a.C.), à qual se seguiu a dos Judeus até nossos dias e para os Gregos desde ao menos o Período Homérico (séculos XII a IX a.C.); 4) Cultura compartilhada e diferenciada: a cultura hebraico-judaica obviamente é diferente da cultura grega já na Antiguidade; 5) Associação com um território específico: para os Gregos é a Hélade (Grécia) e para os Judeus é a Judéia, melhor dizendo: Israel; 6) Senso de solidariedade: já que pertencem a uma mesma etnia, Gregos são solidários com Gregos e Judeus são solidários com Judeus.

Apesar de trazermos Anthony Smith para o que está sendo abordado no presente tópico, é importante deixar claro que o conceito adotado por este estudo é o de “Grupo Étnico”, de Fredrik Barth. O que se realizou mais acima foi apenas uma comparação de ideias entre autores, para assim podermos perceber um ponto em comum entre eles.

Sendo assim, o que fizemos foi um paralelo entre pensamentos distintos que estão relacionados à questão étnica.

O conceito de “Grupo Étnico”, de Fredrik Barth, foi mais um dentre os outros que foram adotados aqui para compreendermos melhor os judeus e sua coletividade. Neste tópico se buscou traçar, como foi feito nos anteriores, a definição do conceito e aplicação dele ao ocorrido que está sendo abordado neste trabalho. Portanto, buscamos mais uma vez a definição do conceito em questão e sua relação com o Levante dos Macabeus ocorrido na Judéia.

Acerca dos Conceitos

O presente capítulo pretendeu trazer os conceitos que são importantes para nós compreendermos o momento histórico que faz parte do tema desta pesquisa. Em outros termos, os conceitos adotados aqui serviram para atender o objetivo principal deste trabalho e também como meio de respaldar a hipótese central do mesmo.

Relembrando os conceitos que foram abordados mais acima, eles contaram basicamente com as definições dadas por estudiosos como, André Paul, Peter Burke e Fredrik Barth. Isso porque este estudo, como já ficou evidente em alguns trechos, trilha o caminho da história cultural. Referente a isso, podemos dar um maior destaque a um dos estudiosos citados anteriormente: o historiador cultural Peter Burke. Este, sem sombra de dúvidas, foi o que deu maior peso no que diz respeito às definições dos conceitos de “Assimilação Cultural” (entendido pelo autor como “imitação” ou “apropriação”, mas como já foi dito, os três são válidos aqui), “Resistência/Resistência Cultural” e “Identidade Cultural”. Mas por que dar tanto destaque assim a esse historiador? Porque, além de estarmos lidando com um grande especialista nessa área, Burke com suas definições demonstra estar mais próximo do que queremos passar neste trabalho. E, desses quatro conceitos trazidos por ele, dois são centrais, que no caso são “Imitação” e “Resistência Cultural”. Enfim, a contribuição de Burke é bastante relevante.

Outro historiador que também é destaque nesta pesquisa é André Paul. Ele já tinha contribuído um pouco, no capítulo anterior, com o contexto histórico do Levante dos Macabeus. Mas no atual capítulo, ele foi trazido novamente, dessa vez para as definições dos conceitos de “Judaísmo” e “Helenismo”. Ambos os conceitos são centrais neste trabalho, assim como os que foram descritos no parágrafo anterior. André Paul, assim como Peter Burke, é referencial teórico de ponta aqui.

Apesar dos conceitos abordados neste capítulo, e suas respectivas definições, apenas quatro deles são ditos como principais ou centrais para o presente estudo. Como ficou explícito acima, são eles “Judaísmo”, “Helenismo”, “Assimilação Cultural” e “Resistência Cultural”. Esses que no próximo capítulo desempenharão papéis fundamentais no momento da análise das fontes.

Capítulo III: Análise das narrativas acerca da Revolta dos Macabeus[58]

No capítulo II tivemos a oportunidade de nos familiarizar com a parte teórica da presente monografia, e que é de suma importância para enxergarmos o fato estudado pela mesma. Parte essa que envolveu, basicamente, a exposição dos conceitos adotados e a definição deles a partir de determinadas concepções teóricas[59].

Agora será feito um movimento diferente do que foi realizado nos capítulos anteriores. Esse movimento consiste em analisar os documentos ou fontes que usaremos como base para respaldarmos a hipótese deste estudo, e junto com isso, buscar alcançar o objetivo dele.

Com o propósito do capítulo exposto no parágrafo acima, para orientar melhor o leitor a se guiar nas abordagens que estão por vim, os tópicos a seguir servem para isso: “Sobre as fontes” (aqui serão abordadas informações acerca dos documentos que vão  ser analisados, que no caso são 1º Macabeus e A Guerra Judaica); “Método empregado” (nesta etapa haverá algo que é essencial para qualquer pesquisa, que é a metodologia adotada para análise de documentos); “Antecedentes da Revolta”[60] (neste tópico começaremos a mergulhar no livro de 1º Macabeus, mostrando trechos dele que dizem respeito ao que ocorreu antes de Matatias liderar a revolta contra o rei Antíoco IV Epífanes); “Assimilados e Resistentes” (aqui, se assim podemos dizer, é considerado o tópico central não só do capítulo, mas de toda a pesquisa. Pois é a partir dos trechos que se encontraram nele que se sustenta a hipótese defendida); “Uma breve história da dinastia dos asmoneus” (este será o último tópico da pesquisa. Nele falaremos, de maneira bem breve, da família que assumiu o poder na Judéia após a morte do rei grego mencionado mais acima). Enfim, essa é a trajetória que será seguida até o final do capítulo.

Sobre as Fontes

Antes de irmos para as fontes e analisá-las, é importante nós conhecermos elas melhor. Isso porque, para o historiador/pesquisador, é necessário ter domínio sobre a documentação que serve de respaldo para a hipótese que se busca corroborar. E, por  aqui se tratar de um trabalho de pesquisa, é necessário que as fontes em questão, que no caso são o livro de 1º Macabeus e História da Guerra dos Judeus contra os Romanos, tenham suas informações passadas para o leitor e que ele tenha a oportunidade de saber com o que estamos trabalhando.

Livro de 1º Macabeus (fonte principal)

O livro de 1º Macabeus é bastante antigo. Ele data, segundo historiadores como André Paul e Christiane Saulnier, da segunda metade do século II a. C. Sendo mais específico quanto ao ano desse século ao qual o livro citado se encontra, ele é de 135. Pois bem, como pode ser visto a data da produção do documento é posterior ao ocorrido descrito por ele, já que o Levante ou Revolta dos Macabeus se inicia com Matatias no ano de 167 a. C., e termina três anos depois, em 164 com a vitória de Judas sobre Antíoco IV Epífanes e seus aliados. Em outros termos, o autor que escreveu essa obra não esteve presente no evento em questão.

Anteriormente foi mencionada a autoria da fonte que será trabalhada mais à frente por esta monografia. Tratando-se desse aspecto, é notória a obscuridade que paira sobre quem escreveu o livro de 1º Macabeus. Transformando isso que foi dito em uma questão: quem escreveu esse livro? Não se sabe. Como bem disse Saulnier:

O conjunto se apresenta como relato histórico, que se situa na linha das crônicas de Israel. Atribuída a pena anônima, a obra é composta para glorificar os filhos de Matatias e deve ser considerada como obra circunstancial, feita em memória dos antepassados da dinastia asmonéia, provavelmente para legitimar a sua origem[61].(grifo nosso)

Retirando a parte grifada que se refere ao desconhecimento acerca de quem escreveu 1º Macabeus, a outra parte apresenta uma característica importante desse livro. Este é escrito pelo autor para enaltecer aqueles que estiveram lutando pela liberdade da Judéia em face à influência pagã sobre a mesma. Ou seja, estamos nos dando com relato construído a partir de determinada perspectiva sobre o Levante.

A respeito do que foi dito no final do parágrafo anterior, mais uma vez trazemos Saulnier para dialogar. “Sem negar o valor de sua informação, não convém, entretanto, esquecer que se trata de documento ‘partidário’, que dá apenas um aspecto dos fatos,  silenciando os movimentos de oposição diferentes dos encabeçados pelos Macabeus”[62].

Apesar de não sabermos quem seja o autor de fato do livro de 1º Macabeus, podemos trazer, para este ponto do estudo, André Paul que fala melhor sobre a nacionalidade de quem escreveu o livro e seu seguimento ideológico.

O autor, desconhecido, é um judeu de Jerusalém partidário resoluto da causa asmonéia; escreveu seu livro pelo ano 100 a.C., provavelmente em hebraico (o texto hebraico sobre o qual foi feita a tradução grega que possuímos perdeu-se logo, mas os Padres da Igreja o atestam)[63]. (grifo nosso)

Essa citação, partindo do trecho em destaque, deixa bem evidente que o autor desconhecido estava ao lado dos asmoneus, estes que descendiam justamente de quem lutou contra a tirania de Antíoco IV Epífanes contra os judeus e sua tradição milenar. Com isso, podemos encerrar por aqui tudo que foi dito acerca de quando o livro de 1º Macabeus foi escrito e do desconhecimento de quem o produziu.

Outro ponto que merece ser abordado aqui diz respeito à aceitação do livro em questão por seguimentos judaicos e cristãos. Para os judeus, a obra não foi aceita por eles por causa dos seguintes motivos: “O descrédito em que haviam incorrido os Asmoneus (dinastia proveniente dos Macabeus), a medíocre ancianidade (…), sua edição em língua grega (…)”[64]. Chamando a atenção para esse último motivo, 1º Macabeus não foi aceito na Bíblia Hebraica[65] porque foi escrito em língua pagã/grega, que não era de inspiração divina[66].

Ao contrário dos judeus, os cristãos, no caso os católicos, já viram esse livro  com outros olhos. Se referindo também ao livro de 2° Macabeus, Saulnier diz:

Não obstante, estes textos não foram oficialmente aceitos no cânone da Igreja católica senão em 1442 e, em seguida, foram mantidos no cânone fixado pelo Concílio de Trento; em contrapartida, não figuram na Bíblia da Reforma[67].

Com esse trecho exposto, podemos constatar que 1º Macabeus demorou muito tempo para ser incorporado, como livro oficial, à Bíblia Católica[68]. Entretanto, durante todo esse tempo de informalidade, a obra serviu de exemplo para que os cristãos lutassem contra o paganismo e sua influência.

História da Guerra dos Judeus contra os Romanos (fonte complementar)

Antes de falarmos dessa obra, é importante nós conhecermos quem a escreveu.  O autor de História da Guerra dos Judeus contra os Romanos ou A Guerra Judaica, como também a obra é chamada, é o historiador judeu Flávio Josefo. Este, nas palavras de André Paul, é descrito como:

Aristocrata judeu descendente dos Asmoneus, (…) recebeu formação de fariseu. Foi diplomata, esteve em missão em Roma, foi alto funcionário e general, encarregado de organizar, na Galiléia, a defesa contra a invasão romana (em 66). Prisioneiro de Vespasiano, ao qual se rendeu (em 67), tornou-se logo protegido dele, que o libertou com o nome de Flávio[69].

Sem sombra de dúvidas, é notável que Josefo foi um homem de diversos atributos.

Outro detalhe que é relevante nós sabermos, e que a citação acima passa de maneira simples, é que o historiador judeu portou cidadania romana[70] a partir de Vespasiano. Sobre quando ele nasceu e morreu, Benekikt Otzen nos informa que o “Historiador judeu nascido em Jerusalém em 37 d.C.; morreu em Roma em 110 d.C. “[71]. Consideramos suficientes as informações dadas até aqui a respeito do autor do livro que vamos falar adiante.

A Guerra Judaica foi uma das obras escritas por Josefo em determinado momento da sua vida, e que depois, entre os anos de 75 e 79 d. C., seria traduzida para a língua grega e publicada[72].

Ela analisa um recorte temporal, que ao nosso entender, é bem amplo. Como  bem disse Paul “Estende-se da intervenção de Antíoco Epífanes na Palestina (175 a.C.) até a queda de Massada. É quase que a única fonte para o estudo desses dois séculos da história judaica”[73]. Porém, para atender ao recorte temporal desta pesquisa, o que nos interessa na obra de Flávio josefo é o livro I §§ 31 a 40. Neste é narrado o reinado de Antíoco IV Epífanes e o Levante dos Macabeus. Portanto, vamos trabalhar com um trecho pequeno de História da Guerra dos Judeus contra os Romanos.

Dadas todas as informações possíveis acerca das fontes ao leitor, esperamos ter subtraído todas, se não a maioria, das dúvidas sobre o livro de 1º Macabeus e A Guerra Judaica. Mas é importante adiantar desde já que, no momento de analisar seus trechos, haverá um método específico, que será falado no próximo tópico.

Método Empregado

Com a exposição das informações no tópico anterior acerca das fontes utilizadas por esta pesquisa, precisamos falar a partir deste momento sobre o método adotado que servirá para analisá-las.

Análise de Conteúdo de Tipo Quantitativo é a metodologia empregada para analisar as fontes adotadas por este estudo. Como ponto de partida para explicar melhor como que ela funciona, vamos fazer uso do texto intitulado “Análise de Conteúdo – Método Básico”[74], de autoria do renomado e falecido prof. Dr. Ciro Flamarion Cardoso, que fez parte do corpo docente de História da Universidade Federal Fluminense (UFF).

Dado isso, é importante elucidar desde já que Ciro Cardoso, em seu texto, informa que o método em questão se desenvolve em três etapas. São elas: 1) Transcrição do  texto  a  ser  analisado;  2) A construção de Grades de Leitura e Análise de tipo

Quantitativo, composta por três colunas, que são: a) Categorias e Subcategorias Temáticas (que informam os temas presentes na fonte estudada); b) Unidades de Registro (que podem ser apenas uma palavra ou pequeno grupo de palavras presentes na fonte analisada) e c) Unidades de Numeração, nas quais são postos algarismos que indicam o número de Unidades de Registro presentes na mesma linha, imediatamente à esquerda e que, por sua vez, fazem direta referência às Categorias e Subcategorias Temáticas igualmente escritas na mesma linha, ainda mais à esquerda e 3) a interpretação dos resultados da análise da fonte, realizada na Grade de Leitura e Análise de tipo Quantitativo[75].

Referindo-se a última etapa descrita anteriormente, a interpretação se dá no seguinte sentido.

A interpretação dos resultados obtidos na Grade de Leitura e Análise de tipo Quantitativo – porque possui Unidades de Numeração -, Grade esta cujas Categorias Temáticas e Subcategorias são escolhidas pelo pesquisador após ler a fonte a ser analisada, demonstram quais temas estão mais ou menos presentes na fonte.

Em geral, a Grade supracitada é lida linha por linha, da direita para a esquerda, ou seja, iniciando-se com a coluna das Unidades de Numeração, as quais indicam o número de Unidades de Registro extraídas da fonte analisada e, por fim, chega-se à maior ou menor importância dos temas presentes nas colunas mais à esquerda da Grade, aquela das Categorias e Subcategorias Temáticas, análise e interpretação sempre feitas linha por linha.

Depois que a Grade é interpretada, efetua-se um processo de conclusão da mesma. Isto é, o que podemos extrair a partir dos dados da fonte?.  Essa pergunta terá resposta quando formos analisar os trechos determinados do livro de 1º Macabeus e da obra de Flávio Josefo utilizada aqui.

Antecedentes da Revolta[76]

Nos tópicos anteriores tivemos a oportunidade de sabermos melhor sobre a fonte e o método para analisá-la. Na realidade o que vimos foi uma abordagem mais teórica dessas coisas, deixando de lado a prática. Porém, daqui em diante vamos unir teoria e prática, esta que se consolida com a análise de trechos do livro de 1º Macabeus e A Guerra Judaica. Sendo assim, nas próximas páginas o que veremos são exposições de trechos desses documentos e o emprego da metodologia “Análise de Conteúdo de Tipo Quantitativo”.

Dito isso, é importante passarmos para o leitor como que se dará o movimento  de análise da fonte (não só neste tópico, mas também no próximo). Primeiramente, com o objetivo de fazer o leitor entrar em contato com 1º Macabeus, será exposto o trecho deste na íntegra, e depois haverá a Grade de Leitura e Análise[77], onde serão  enquadradas partes do trecho mostrado antes. Por último, haverá a interpretação dos resultados obtidos a partir da grade.

A seguir, para tirar as dúvidas sobre o movimento demonstrado antes, encontra- se o trecho do capítulo 1 da fonte adotada por esta monografia, que vai do versículo 10 a 15:

Deles saiu aquele rebento ímpio, Antíoco Epífanes, filho do rei Antíoco. Ele tinha estado em Roma como refém e se tornara rei no ano cento e trinta e sete da dominação dos gregos. Por esses dias apareceu em Israel uma geração de perversos, que seduziram a muitos com estas palavras: ‘Vamos, façamos aliança com as nações circunvizinhas, pois muitos males caíram sobre nós desde que delas nos separamos.’ Agradou-lhes tal modo de falar. E alguns dentre o povo apressaram-se em ir ter com o rei, o qual lhes deu autorização para observarem os costumes pagãos. Construíram, então, em Jerusalém, uma praça de esportes, segundo os costumes das nações, restabeleceram seus prepúcios e renegaram a Aliança sagrada. Assim associaram-se aos pagãos e se venderam para fazer o mal[78]

A GRADE DE LEITURA E ANÁLISE

CATEGORIAS TEMÁTICAS E SUBCATEGORIAS TEMÁTICAS UNIDADES DE REGISTRO UNIDADES DE NUMERAÇÃO
PODER Antíoco IV Epífanes “filho do rei Antíoco”, “tornara rei”, “dominação dos gregos”, “rei” 4
SOCIEDADE Judeus “Israel”, “o povo” 2
ASSIMILAÇÃO CULTURAL Judeus que adotaram costumes gregos “façamos aliança com as nações circunvizinhas”, “deu autorização para observarem os costumes pagãos”, “Construíram (…) praça de esportes”, “restabeleceram seus prepúcios”, “renegaram a Aliança”, “associaram-se aos pagãos”, “se venderam para fazer o mal.” 7

 

Dada a grade acima e o enquadramento de partes do trecho de 1º Macabeus, podemos efetuar a interpretação da mesma.

O número 7 é a Unidade de numeração que se destaca, e que por sua vez está relacionada à Categoria temática e subcategoria temática “Assimilação cultural” e “Judeus que adotaram costumes gregos”. Em comparação a isso, “Sociedade” e “Judeus” é praticamente sem expressão, pois sua Unidade de Numeração tem número 2.

Isso nos leva a concluir que os versículos do capítulo 1 de 1º Macabeus, que vão de 10 a 15, quer passar a ideia de traição por parte de alguns judeus a sua tradição. Isto é, os versículos em questão demonstram um processo de acolhimento por parte desses judeus à cultura grega[79].

A conclusão exposta anteriormente nos faz resgatar uma discussão que já tinha ocorrido nesta pesquisa, de maneira breve[80], que no caso foi a que diz respeito ao processo de assimilação cultural por parte de alguns judeus, da Judéia, ao helenismo. Este, como falou Júlio Paulo Tavares Zabatiero:

(…) introduziu uma nova “cultura” (…) incluindo novos hábitos (e.g.: roupas, esportes olímpicos, banhos públicos), novas festas nacionais e religiosas, nova língua, a presença mais aberta de relações homossexuais, uma nova forma de explicar, narrar e representar a vida  (teatro, filosofia grega versus sabedoria oriental, novos gêneros textuais, como a biografia, a retórica) e novas formas de religião do outro lado do Mediterrâneo, mas também pelo sincretismo entre religiões orientais e ocidentais[81]. (grifo nosso)

As partes em destaque da citação fazem referência, em alguma medida, ao que é descrito nos versículos que foram analisados antes: a construção da praça de esportes por parte dos judeus que traíram sua tradição. Com efeito, vemos claramente como que há um diálogo entre fonte e historiografia.

O que foi citado e dito nos últimos parágrafos gera a seguinte dúvida. O que o helenismo tem a ver com a conclusão obtida a partir dos resultados da Grade de Leitura e Análise, na qual foram enquadradas partes que vão do versículo 10 a 15 do capítulo 1 de 1º Macabeus? Tem a ver no sentido de nos revelar, para além da fonte, que os judeus “traidores da Lei” estavam indo ao encontro de uma coisa maior que eles. Tal coisa se solidifica em costumes distintos do judaísmo, como a aceitação de práticas gregas, e aqui se enquadra até mesmo o esporte. Isso nos mostra o caráter do helenismo que tinha ganhado muitos espaços, e que agora estava penetrando na Judéia.

O presente tópico teve por propósito, além de analisar os versículos  mencionados acima, transmitir a ideia de que o movimento de assimilação cultural por parte de alguns entre o povo de Israel já estava em curso, mesmo antes da revolta que começou em 167 a. C. com Matatias, sacerdote de Modin.

Para finalizar, faço uso das palavras de Thiago Borges de Santana, que abarcam o que será tratado em “Assimilados e Resistentes”.  “(…)  parte  da  população  rompeu a aliança com o deus dos seus antepassados, contudo existiram aqueles que (…) se revoltaram abertamente como é o caso de Matatias e os seus cinco filhos (1Mc 2. 2-5)”[82].

Assimilados e Resistentes[83].

A seguir, entraremos com os trechos do livro de 1º Macabeus mais importantes para esta pesquisa. Importantes no sentido de mostrarem mais indícios que sustentam a hipótese aqui defendida. E, fazendo juízo ao título do presente tópico, estaremos diante de grupos de pessoas que estiveram na Revolta ocorrida entre 167 e 164 a.C., cada um com intenções distintas.

1º Macabeus: 1, 41-64

Adiante se encontra mais uma parte de 1º Macabeus que será analisada.

O rei prescreveu, em seguida, a todo o seu reino, que todos formassem um só povo, renunciando cada qual a seus costumes particulares. E todos os gentios conformaram-se ao decreto do rei. Também muitos de Israel comprazeram-se no culto dele, sacrificando aos ídolos e profanando o  sábado. Além disso, o rei enviou, por emissários, a Jerusalém e às cidades de Judá, ordens escritas para que todos adotassem os costumes estranhos a seu país e impedissem os holocaustos, o sacrifício e as libações no Santuário, profanassem sábados e festas, contaminassem o Santuário e tudo o que é santo, construíssem altares, recintos e oratórios para os ídolos e imolassem porcos e animais impuros. Que deixassem, também, incircuncisos seus filhos e se tornassem abomináveis por toda sorte de impurezas e profanações, de tal modo que se olvidassem assim da Lei e subvertessem todas as observâncias. Quanto a quem não agisse conforme a ordem do rei, esse incorreria em pena de morte. Nesses termos ele escreveu a todo o seu reino, nomeou inspetores para todo o povo e ordenou às cidades de Judá que oferecessem sacrifícios cada uma por sua vez. Muitos dentre o povo aderiram a eles, todos os que eram desertores da Lei. E praticaram o mal no país, reduzindo Israel a ter de se ocultar onde quer que encontrasse refúgio.

No décimo quinto dia do mês de Casleu do ano cento e quarenta e cinco, o rei fez construir, sobre o altar dos holocaustos, a Abominação da desolação. Também nas outras cidades de Judá erigiram-se altares e às portas das casas e nas praças queimava-se incenso. Quanto aos livros da Lei, os que lhes caíam nas mãos eram rasgados e lançados ao fogo. Onde quer que se encontrasse, em casa de alguém, um livro da Aliança ou se alguém se conformasse à Lei, o decreto real o condenava à morte. Na sua prepotência assim procediam, contra Israel, com todos aqueles que fossem descobertos, mês por mês, nas cidades. No dia vinte e cinco de cada mês, ofereciam-se sacrifícios  no  altar  levantado  sobre  o  altar  dos  holocaustos.  Quanto às mulheres que haviam feito circuncidar seus filhos, eles, cumprindo o decreto, as executavam com os mesmos filhinhos pendurados a seus pescoços, e ainda com os seus familiares e com aqueles que haviam operado a circuncisão.

Apesar de tudo, muitos em Israel ficaram firmes e se mostraram irredutíveis em não comerem nada de impuro. Aceitaram antes morrer que contaminar-se com os alimentos e profanar a Aliança sagrada, como de fato morreram. Foi sobremaneira grande a ira que se abateu sobre Israel[84].

A GRADE DE LEITURA E ANÁLISE

CATEGORIAS e SUBCATEG. TEMÁTICAS UNIDADES DE REGISTRO UNIDAD NUMER
HELENISMO Sociedade Gregos / Selêucidas “emissários”; “inspetores”; “procediam, contra Israel” 3
Poder Rei Antíoco IV Epífanes “O rei prescreveu”; “decreto do rei”; “o rei enviou […] ordens escritas”; “quem não agisse conforme a ordem do rei, esse incorreria em pena de morte”; “o decreto real o condenava à morte.”; “cumprindo o decreto” 6
Religião / Atos / Costumes Gregos / Anti- Judaicos “profanassem sábados”; “todos adotassem os costumes estranhos a seu país”; “impedissem os holocaustos, o sacrifício e as libações no Santuário”; “contaminassem o Santuário”; “construíssem altares […] para os ídolos”; “imolassem porcos e animais impuros.”; “deixassem […] incircuncisos seus filhos”;”se olvidassem assim da Lei e subvertessem todas as observâncias.”; “o rei fez construir […] a Abominação da desolação.”; “Quanto aos livros da Lei […] eram rasgados e lançados ao fogo.”; “mulheres que haviam feito circuncidar seus filhos, eles […] as executavam com os mesmos filhinhos pendurados a seus pescoços”; 11
Sociedade Pró- Selêucida Judeus – Assimilação ao     Helenismo “muitos de Israel comprazeram-se no culto dele”;”sacrificando aos ídolos”; “profanando o sábado”; “Muitos dentre o povo aderiram a eles”; “desertores da Lei.”; “praticaram o mal no país, reduzindo Israel” 6
JUDAÍSMO Sociedade Pró- Judaica / Religião Judaica Judeus – Resistência ao Helenismo / Manutenção do Judaísmo “muitos em Israel ficaram firmes”; “se mostraram irredutíveis”; “não comerem nada de impuro.”; “Aceitaram antes morrer que contaminar-se com os alimentos e profanar a Aliança sagrada”; 4

 

Com essa grade exposta, podemos perceber que as Categorias e Subcategorias Temáticas que mais se destacam são “Religião/Atos/Costumes” e “Gregos e Anti- Judaicos”, que em suas Unidades de Numeração totalizam o número 11. Tudo isso dentro da Categoria Temática mais ampla: Helenismo.

Olhando para o que se demonstra menos relevante, a sociedade greco-selêucida  é a que porta o menor número em sua Unidades de Numeração, que no caso é 3. Porque só tem três Unidades de Registro na Grade de Leitura e Análise.

Partindo da interpretação acima, podemos concluir que o fragmento bíblico que foi para a Grade de Leitura e Análise dá clara ênfase às muitas formas de desrespeito à cultura, tradição e, sobretudo, à religião judaica.

A conclusão efetuada, junto com os elementos que estão na grade acima, principalmente os que dizem respeito às Categorias temáticas e subcategorias temáticas, respectivamente, “Sociedade Pró-selêucida” e “Judeus-Assimilação ao Helenismo”, nos leva a entrar na discussão sobre assimilação cultural por parte dos judeus na primeira metade do século II a.C.

Tratando-se desse ponto, Marcel Simon e André Benoit expõem as seguintes palavras em seu livro:

Até então, o helenismo contara com numerosos adeptos entre os judeus, sobretudo na aristocracia. (…) Renunciar aos usos judaicos em troca dos pagãos era afastar-se do Deus único, primeiro passo em direção à apostasia. Nesse sentido, a tentativa, realizada por Antíoco, de colocar Zeus no lugar de Iahweh representava a conclusão natural de uma política cujas primeiras manifestações encontraram a opinião judaica dividida[85]. (grifo nosso)

O trecho em destaque afasta qualquer incerteza acerca de ter havido um processo de assimilação cultural por parte de algumas pessoas do povo de Israel. Em outras palavras, Simon e Benoit acabaram fortalecendo parte da hipótese aqui defendida.

Já se direcionarmos nosso olhar para o lado dos resistentes, ou seja, quem não se deixou levar pelo helenismo advindo do monarca Antíoco IV Epífanes[86], os estudiosos antes mencionados dizem:

Contra os helenizantes, oportunistas ou de boa-fé, os hasidim (os piedosos) ergueram o estandarte da revolta com o apoio das massas populares. A rebelião começou na pequena cidade de Modin, por iniciativa do sacerdote Matatias (167). Morto este, seu filho Judas, dito Macabeu (o significado do epíteto seja “martelador”), assumiu a chefia da insurreição[87]. (grifo nosso)

Vemos na parte grifada, bem claramente, um processo de resistência cultural partindo dos judeus que queriam preservar sua identidade cultural[88]. Isto é, como já foi destacado em diversos momentos deste trabalho, a luta liderada pelo sacerdote Matatias, e posteriormente por seu filho, Judas, tinha por finalidade assegurar o judaísmo e seus preceitos contra a imposição de costumes gregos.

Fechamos o atual tópico deixando evidente que a hipótese deste estudo já está defendida, e teve apoio forte para isso, no caso os autores do livro Judaísmo e cristianismo antigo: de Antíoco Epifânio a Constantino[89], para além da fonte aqui analisada. Com isso, acreditamos ter chegado a nosso objetivo e ter demonstrado ao leitor, de maneira satisfatória, o percurso para defender a ideia de assimilação e resistência cultural por parte dos judeus de Jerusalém e seus arredores à imposição de práticas gregas, efetuada pelo rei selêucida Antíoco IV Epífanes. Porém, apesar de termos conseguido isso, a pesquisa não termina por aqui. Em breve estaremos  analisando mais um trecho do documento utilizado por este estudo.

1º Macabeus: 2, 15-28

Neste momento, finalmente chegamos ao último trecho da fonte que será analisado:

Os emissários do rei, encarregados de forçar à apostasia, vieram à cidade de Modin para procederem aos sacrifícios. Muitos israelitas aderiram a eles, mas Matatias e seus filhos conservaram-se reunidos à parte. Tomando então a palavra, os emissários do rei disseram a Matatias: ‘Tu és chefe ilustre e de prestígio nesta cidade, apoiado por filhos e irmãos. Aproxima-te, pois, por primeiro, para cumprir a ordem do rei, como o fizeram todas as nações bem como os chefes de Judá e os que foram deixados em Jerusalém. Assim, tu e teus filhos sereis contados entre os amigos do rei e sereis honrados, tu e teus filhos, com prata e ouro e copiosos presentes.’ A essas palavras replicou Matatias em alta voz: ‘Ainda que todas as nações que se encontram na esfera do domínio do rei lhe obedeçam, abandonando cada uma o culto dos seus antepassados e conformando-se às ordens reais, eu, meus filhos e meus irmãos continuaremos a seguir a Aliança dos nossos pais. Deus nos livre de abandonar a Lei e as tradições. Não daremos ouvidos às ordens do rei, desviando-nos de nosso culto para a direita ou para a esquerda.’  Mal  terminou ele de proferir essas palavras, um judeu apresentou-se, à vista de todos, para sacrificar sobre o altar de Modin, segundo o decreto do rei. Ao  ver isso, Matatias inflamou-se de zelo e seus rins estremeceram. Tomado de justa ira, ele arremessou-se contra o apóstata e o trucidou sobre o altar. No mesmo instante matou o emissário do rei, que forçava a sacrificar, e derrubou o altar. Ele agia por zelo pela Lei, do mesmo modo havia procedido Fineias para com Zambri, filho de Salu. A seguir clamou Matatias em  alta  voz através da cidade: ‘Todo o que tiver o zelo da Lei e quiser manter firme a Aliança, saia após mim!’ Então fugiu, ele e seus filhos, para as montanhas, deixando tudo o que possuíam na cidade[90].

A GRADE DE LEITURA E ANÁLISE

 

Vemos bem evidente, na Grade de Leitura e Análise, que “Resistência por parte dos judeus à cultura grega (helenismo)” é a Subcategoria temática que mais tem Unidades de Numeração: 10. Por sua vez, esse número está relacionado à Categoria temática e subcategoria temática “Hibridismo cultural”[91].

A Grade também nos demonstra qual é a Categoria temática e subcategoria temática que porta a menor unidade de numeração. Elas são, respectivamente, “Assimilação por parte dos judeus à cultura grega (helenismo)” com o número 3 nas Unidades de Numeração.

A interpretação feita antes nos direciona à conclusão de que, o trecho do capítulo 2 de 1° Macabeus (versículo 15 a 28), se dedica, majoritariamente, a transmitir o processo  de  resistência  por  parte  de  Matatias  e  seus  aliados  às práticas gregas, especialmente o culto a um deus diferente de Yahweh, que estavam se proliferando na Judéia[92].

O fragmento analisado leva a um ponto que já tinha sido abordado de maneira superficial: a apostasia. Esta, como já tinha sido definida no primeiro capítulo, está relacionada ao ato de quem abandonou sua fé antiga. Relacionando isso com o evento abordado aqui e com os assimilados, podemos dizer que tal prática se desenvolveu em um momento em que se via o helenismo ganhando força, frente ao judaísmo. Mergulhando nesse assunto, é necessário resgatar parte da fala de Benedikt Otzen que foi transcrita para o capítulo 1 desta monografia.

Os judeus ainda podiam cultuar seu Deus, Iahweh, no templo; ao mesmo tempo, os gregos e os judeus apóstatas que habitavam na Acra podiam render culto no mesmo local, uma vez que estes identificavam de modo sincrético Iahweh, o antigo Deus do templo, com Zeus[93]. (grifo nosso)

Para além do que a fonte nos passa, o autor dessa citação traz um elemento importante e que fortalece cada vez mais a hipótese defendida por este trabalho. Nas partes em destaque podemos ver uma identificação que os judeus apóstatas faziam de Iahweh com Zeus.

Diante dos versículos 15 a 28 de 1º Macabeus e com o elemento sinalizado  antes, ainda pode restar dúvidas sobre ter ocorrido um processo de assimilação cultural envolvendo judeus? Acreditamos que não, pois, no tópico anterior, esse processo já se comprovou, e agora ele ganhou mais sustento. Aqui também podemos efetuar outra indagação. Se a apostasia faz parte de um processo de assimilação cultural, e que direcionou alguns judeus para o culto a outro deus sem ser Yahweh, ela também não poderia ser uma porta de entrada para a integração desses agentes à civilização helenística[94]? A resposta para essa questão foi dada, de maneira invertida, por Marcel Simon e André Benoit no tópico anterior. Só a fim de resgate, os autores disseram que “Renunciar aos usos judaicos em troca dos pagãos era afastar-se do Deus único, primeiro passo em direção à apostasia”[95]. Mudando a maneira como eles expõem sua perspectiva, a questão acima tem como resposta que sim, a apostasia pode ser uma porta de entrada para os judeus que a ela seguiram, abandonando assim os “usos judaicos” de Simon e Benoit. A respeito do abandono de tais usos, podemos acrescentar a eles a negação destes preceitos que fazem parte do judaísmo: a reserva do sábado; a alimentação; oração e jejum; e a circuncisão[96]. Em síntese, a apostasia significou, para alguns judeus, a saída deles dos costumes de seus pais e a entrada em um mundo distinto, que ia de encontro ao judaísmo.

Após termos falado sobre o processo de assimilação cultural, é importante que regressemos à conclusão obtida a partir da análise realizada mais acima. Ela dá conta de passar, como foi visto, o movimento de Matatias e seus aliados contra o helenismo, aqui entendido como resistência cultural/Resistentes[97].

Quando o Levante dos Macabeus começa, no ano de 167 a.C., o que se vê é uma força se revelando contra outra de grande magnitude. Esta, para além da pessoa de Antíoco IV Epífanes e os assimilados, é a experiência helenística que desde o reinado  de Alexandre Magno, no século IV, foi se disseminando por diferentes regiões por onde este rei passou[98]. O que queremos dizer com isso? Queremos passar a ideia de que o monarca selêucida acima citado e seus aliados serviram apenas de instrumento para colocar em prática, de maneira mais rápida, os costumes gregos que se movimentavam em torno da Judéia.

A respeito do movimento de resistência liderado por Matatias, podemos trazer as palavras de Zabatiero:

(…) Antíoco Epífanes profana o templo de Jerusalém, proíbe as práticas religiosas tradicionais e persegue os judeus desobedientes à sua política. Em resposta, os macabeus lideram a revolta contra a proibição da fé judaica, em um movimento que eventualmente trará a independência a Judá em relação aos governantes helênicos (c. 141 a.C.)[99]. (grifo nosso)

Os resistentes se colocaram contra tudo aquilo que representou uma ameaça ao judaísmo, como pode ser subentendido a partir das partes em destaque dessa citação. Ou seja, fazendo uma ponte entre as palavras de Zabatiero e o trecho do capítulo 2 de 1º Macabeus que foi analisado, onde Matatias trucida o judeu apóstata e o agente do rei responsável por forçar a apostasia, o levante era justamente para conservar os costumes judaicos frente aos costumes estrangeiros. Por fim, esse episódio demarca claramente quem queria resistir e quem não queria.

História da Guerra dos Judeus contra os Romanos (A Guerra Judaica), Livro I , §§ 31 a 40

Naquele tempo quando Antíoco, cujo sobrenome era Epífanes, estava disputando com Ptolomeu VI, a soberania da Síria, discórdia ergueu-se entre os nobres judeus. Havia reivindicações rivais ao poder supremo, já que nenhuma categoria individualmente poderia tolerar submissão para seus  pares. Onias, um dos sumo sacerdotes, tirando proveito com a mão erguida, expulsou os filhos de Tobias da cidade. Este último refugiou-se junto a Antíoco e pediu a ele para usar suas forças armadas como guias para uma invasão da Judeia. O rei, tendo acalentado de há muito esta intenção, consentiu, e partindo à frente de um imenso exército tomou a cidade de assalto, matou um grande número dos seguidores de Ptolomeu, deu a seus soldados licença irrestrita para pilhar, e ele próprio saqueou o Templo e interrompeu, por um período de três anos e seis meses, o  procedimento regular dos sacrifícios diários. O sumo sacerdote Onias escapou em direção a Ptolomeu e, obtendo dele um lugar no nomo de Heliópolis, construiu uma pequena cidade no modelo de Jerusalém e um templo parecido com o nosso. […].

Não satisfeito com seu […] o sucesso em capturar a cidade e com a pilhagem e o massacre em grande escala, Antíoco, levado por suas paixões ingovernáveis e com a profunda irritação da memória do que ele  havia sofrido no cerco, pressionou os judeus a violar o código de seu país deixando seus filhos incircuncisos e sacrificando suínos sobre o altar. Estas ordens foram desobedecidas por todos, e os mais eminentes não cumpridores destas ordens foram massacrados. Bacchides, que foi enviado por Antíoco para comandar a guarnição, com estas ímpias ordens […] e sua […] brutalidade, foi culpado de todo o excesso de iniquidade, torturando indivíduos eminentes um após o outro, e diariamente exibindo diante dos olhos de todos a aparência de uma cidade capturada, até pela extravagância dos seus crimes ele provocou suas vítimas para se arriscarem em represálias.

Estas começaram com Matthias, filho de Asmoneu, um sacerdote de uma cidade chamada Modin, que armando um grupo armado composto dele próprio e de sua família de cinco filhos, matou Bacchides[…]. Medo  da grande guarnição levaram-no a buscar refúgio, naquele momento, nas montanhas; porém, a ele se juntando muitas das pessoas comuns, ele convocou coragem para descerem, lutarem e derrotarem os generais de Antíoco, e os empurrar para fora da Judeia. Este sucesso trouxe-lhe poder supremo; sua expulsão dos estrangeiros levou seus compatriotas a voluntariamente submeterem-se à sua liderança, a qual, com a sua morte, ele deixou para Judas, o mais velho de seus filhos.

Judas, presumindo que Antíoco não permaneceria inativo, além de recrutar uma força nativa, fez uma aliança – ele foi o primeiro a fazer isso – com os romanos;  e  quando  Epífanes  invadiu novamente o país, atingiu-o pesadamente e forçou-o a se retirar. […] com este sucesso, ele atacou a guarnição não ainda eliminando-a da capital, mas expulsou as tropas  da cidade alta e confinou-as na parte de baixo da cidade, conhecida como Acra. Sendo agora senhor do Templo, ele purificou toda a área e cercou com muralhas à sua volta, substituiu os vasos antigos e contaminados para os cultos por outros os quais ele […] fez e trouxe para dentro do santuário, construiu outro altar e reinstalou os sacrifícios expiatórios. A cidade estava quase recuperando seu aspecto santificado quando Antíoco morreu, deixando seu filho Antíoco igualmente como herdeiro de seu reino e o seu repúdio dos judeus”[100].

A GRADE DE LEITURA E ANÁLISE

CATEGORIAS TEMÁTICAS E SUBCATEGORIAS TEMÁTICAS UNIDADES REGISTRO UNID. NUMER.
PODER Disputa Gregos e Egípcios Antíoco IV Epífanes e Ptolomeu VI “Antíoco”, “estava disputando com Ptolomeu VI”, “a soberania da Síria” 3
Judeus Onias e Tobias “discórdia”, “entre os nobres judeus”, “Havia reivindicações rivais”, “ao poder supremo”, “Onias”, “expulsou os filhos de Tobias da cidade” 6
Aliança Judeus Tobias “refugiou-se junto a Antíoco” 1
Judas “fez uma aliança (…) com os romanos” 1
MENOSPREZO AO JUDAÍSMO Ataque à Jerusalém “O rei”, “consentiu”, “tomou a cidade de assalto”, “matou um grande número dos seguidores (…)”, “deu a seus soldados licença (…) para pilhar”, “saqueou o Templo”, “foram massacrados”, “torturando indivíduos eminentes”, “aparência de uma cidade capturada” 9
Proibição da Lei mosaica “pressionou os judeus a violar o código”, “deixando seus filhos incircuncisos”, “sacrificando suínos no altar” 3
RESISTÊNCIA CULTURAL Oposição dos judeus aos atos de  Antíoco IV Revolta dos Macabeus “Estas ordens foram desobedecidas por todos”, “vítimas para se arriscarem em represálias”, “armando um grupo armado”, “matou Bacchides”, “levaram-no a buscar refúgio”, “convocou coragem para descerem”, “lutarem”, “derrotarem os generais de Antíoco”, “os empurrar para fora da Judéia”, 12

 

Epífanes “recrutar uma força nativa”, “ele atacou a guarnição”, “expulsou as tropas da cidade”
RESTAURAÇÃO Purificação do “ele purificou toda a área”, “substitui os vasos
DOS COSTUMES Templo de Jerusalém por Judas antigos e contaminados”, “construiu outro altar”, “reinstalou os sacrifícios expiatórios” 4
JUDAICOS

 

A Guerra Judaica é a segunda fonte mais importante deste estudo. Entretanto,  tal importância caminha no viés de sustentar apenas uma parte da hipótese defendida aqui, que no caso é o processo de resistência cultural. Olhando para a parte da assimilação cultural, não existem resquícios a respeito disso no trecho da obra de Flávio Josefo analisado acima[101]. Esse último aspecto fica mais forte na seguinte passagem:Passamos agora para a interpretação da Grade de Leitura e Análise.

Como podemos perceber, as Subcategorias temáticas que mais se destacam, por causa da sua Unidade de numeração com número 12, são “Revolta dos Macabeus” e “Oposição dos judeus aos atos de Antíoco IV Epífanes”, que por sua vez estão relacionadas à Categoria temática “Resistência Cultural”. Contudo, vão de encontro a isso as Subcategorias temáticas “Tobias” e “Judas”, por pouco se destacarem na grade, pois ambas portam as mesmas Unidades de numeração, que é 1. É válido lembrar que “Tobias” e “Judas” fazem parte da Categoria temática e subcategoria temática, respectivamente, “Poder”, “Aliança” e “Judeus”.

A conclusão que obtemos a partir da interpretação realizada é que Flávio Josefo, o historiador judeu, se preocupou em demonstrar, no fragmento analisado, o movimento de revolta por parte dos judeus à ameaça que afetava o judaísmo e suas prescrições. Ameaça essa que vinha de Antíoco IV Epífanes, que se encontrava em uma zona  cultural distinta dos judeus opositores à sua causa.

(…) Antíoco, levado por suas paixões ingovernáveis e com a profunda irritação da memória do que ele havia sofrido no cerco, pressionou os judeus a violar o código de seu país deixando seus filhos incircuncisos e sacrificando suínos sobre o altar. Estas ordens foram desobedecidas por todos (…)[102].

Apesar disso, tal obra não provoca a queda da hipótese principal desta pesquisa. Pois esta não se resumiu apenas a análise das fontes, mas também ao diálogo com os teóricos que em alguma medida cooperaram para nos auxiliar.

O percurso que se fez no atual tópico teve por propósito voltar na questão sobre assimilação e resistência cultural por parte dos judeus ao helenismo, que é crucial para este estudo. Isso envolveu, fazendo juízo ao título deste capítulo, análise das fontes, interpretação das mesmas, conclusão obtida após a análise e discussão com a historiografia pertinente com o assunto abordado. Consideramos missão cumprida as análises realizadas aqui e a comprovação da hipótese defendida.

O que veremos a seguir é uma abordagem breve sobre o período posterior a Revolta dos Macabeus.

Uma breve história da dinastia dos asmoneus[103]

No ano de 164 a.C., Judas, a personagem que havia tomado o controle da revolta contra Antíoco IV Epífanes[104] e seus aliados, após a morte de seu pai, consegue retomar o templo de Jerusalém que havia sido profanado pelo rei selêucida citado. Esse local foi purificado por Judas, e este foi sucedido na liderança do Levante dos Macabeus por seu irmão, Jônatas, que com sua morte, em 143 a.C., passou a liderança para Simão, seu outro irmão.

Antes de entrarmos de fato na dinastia dos asmoneus, é necessário nós compreendermos por que do termo “asmoneus”. Seguem as palavras de Simon e Benoit:

Durante cerca de um século, numa Palestina de novo praticamente independente sob a suserania muito teórica dos reis de Antioquia, seus descendentes conseguiram manter-se no poder, formando a dinastia real e sacerdotal dos macabeus, também chamada dinastia dos asmoneus, do nome de Asmon, avô de Matatias[105]. (grifo nosso)

Dado o porquê do termo em questão, podemos falar, de maneira sucinta, de  como foi a governança dos reis dessa dinastia.

Simão teria sido o fundador da dinastia dos asmoneus, segundo Saulnier[106]. A gestão dele sobre a Judéia durou de 143 a 134 a.C., aproximadamente, e foi marcada pelos seguintes episódios: expulsão da guarnição da Cidadela, que ficava em Jerusalém (141 a.C.); especificidade religiosa dos judeus reconhecida; e, acumulação da tarefa de estratego e sumo sacerdote[107]. Isso representou para o grupo étnico judaico uma importante força que direcionava a Judéia para uma independência. Esta que, na era de Antíoco IV Epífanes, era impossível de se realizar.

A respeito da morte de Simão Macabeu[108], e consequentemente o fim de seu governo, Saulnier fala que ele “(…) devia morrer em 135/134 a.C., assassinado por seu genro Ptolomeu, que o havia convidado para um banquete em seus domínios de Jericó (…)”[109]. Com essa perda, o controle da Judéia passaria para o filho de Simão, João Hircano.

O novo governante exerceria sua autoridade com a realização deste grande feito: ampliação dos domínios de seu reino (aqui podemos enquadrar regiões como a Iduméia, a Samaria, algumas cidades da Transjordânia e parte norte da Galiléia[110]). Por outro lado, João Hircano enfrentou dificuldades em alguns momentos de seus quase trinta  anos de reinado. Dentre elas, podemos citar uma que é mencionada por André Paul em seu livro, que foi o cerco efetuado por Antíoco VII à Jerusalém[111]. Contudo, tal dificuldade foi superada graças à relação que Hircano possuía com Roma, pois foi esta que acabou fazendo com que o rei selêucida não invadisse Jerusalém. O sucessor de Simão esteve à frente dessa cidade, como etnarca e sumo sacerdote[112], de 134 a 105 a.C. Após sua morte, seu filho mais velho, Aristóbulo I, ocupou o lugar no trono.

Aristóbolo I, segundo Paul, governou apenas durante um ano (de 104-103 a.C.). Entretanto, é importante mostrar um detalhe que está entrelaçado à legitimidade de sua sucessão. Na fala do especialista citado:

(…) ele aprisionou sua mãe, que morreu de fome na prisão, e seus irmãos, um dos quais mandou matar (o exercício da função política do Estado competia legitimamente à viúva do rei; quanto a Aristóbulo, devia contentar-se com o sumo pontificado)[113].

Usando esse trecho como base, podemos nos questionar acerca da legitimidade do novo governante no trono, e perceber o que ele foi capaz de fazer para alcançar sua aspiração, que como ficou evidente, era ser rei[114]. Dito isso, não há muito o que falar sobre Aristóbulo I e seu reinado, já que este durou pouco. Podemos mostrar que o novo governante: “(…) seguiu a política militar e cultural de seu pai e, com a cumplicidade de Cleópatra III, concluiu a anexação da Galiléia, cuja população ele se empenhou em ‘judaizar’ à força”[115].

O trono real, junto com o cargo de sumo sacerdote, foi ocupado no ano de 103

a.C. pelo irmão de Aristóbulo, Alexandre Janeu. O novo rei, nas palavras de Saulnier, ganha a seguinte notabilidade. “(…) conquistava o título real e começava a governar um território que se estendia da Iduméia até a Galiléia e à Transjordânia”[116]. Tais territórios são a marca do expansionismo dos asmoneus, que começou com João Hircano. Em outras palavras, fica evidente para nós o quanto que a dinastia que assumiu o controle da  Judéia (após a morte de Antíoco IV Epífanes e a purificação do Templo de Jerusalém)  se desenvolveu. Por fim, Alexandre Janeu morreu em 76 a.C. e deixou sua esposa, Salomé Alexandra, reinando em seu lugar. A rainha, nas palavras de Paul, “(…) sucedeu  a seu marido no trono de 76 a 67 a.C. Seu filho mais velho, Hircano II, foi sumo sacerdote, sem exercer o poder civil. Seu segundo filho, mais capaz e vigoroso, foi deixado de lado”[117].

Salomé Alexandra se demonstrou uma governante que conseguiu cativar a população. Porém, se foi bom por um lado seu reinado, por outro ele foi conturbado.

As relações da rainha com os Estados estrangeiros foram amplas e frutuosas. Alexandra continuou a recrutar mercenários e dobrou o efetivo de seu exército. Os fariseus a dissuadiram várias vezes de retomar as guerras de seus predecessores. Apesar disso, ela lançou uma expedição contra Damasco, conduzida por seu filho Aristóbulo. Mas a expedição fracassou (AJ 13, 418) e foram necessárias negociações e presentes para se evitar a ocupação do reino asmoneu por Tigrano, rei da Armênia, que, tendo invadido a Síria, marchava sobre a Judéia (em 70 a.C.)[118].

Depois da morte da rainha, o que nós assistimos é uma briga entre seus filhos, Aristóbulo II e Hircano, pela ocupação de seu lugar ao trono.

Finalizamos este tópico usando mais uma vez a fala de André Paul, a respeito de tal briga e mostrando o fim de quase cem anos de dominação da dinastia dos asmoneus. “Somente a intervenção de uma grande força externa poderia pôr-lhe fim. Roma ou, melhor, Pompeu iria encarregar-se disso”[119].

Conclusões

A presente monografia, desde seu início, buscou corroborar a hipótese aqui elucidada. Para isso, nos dedicamos a enxergar a Insurreição dos Macabeus dentro de seu contexto. Fizemos uso dos conceitos pertinentes para observamos o que estava sendo defendido; e por último (e não menos importante) buscamos elementos nas fontes para tal corroboração.

Exposta essa trajetória, podemos elencar duas conclusões plausíveis deste trabalho, e que serão retomadas mais à frente de maneira resumida. A primeira está relacionada à presença muito antiga do helenismo nas proximidades da Judéia. A segunda conclusão é a hipótese que se buscou sustentar aqui, que é o processo de assimilação e resistência cultural dos judeus ao helenismo de Antíoco IV Epífanes.

No final do primeiro capítulo, depois de termos abordado um recorte temporal longo[120], surgiu a ideia de que a Judéia estava “participando” do helenismo indiretamente. Porque esse fenômeno cultural[121] já estava presente ao redor desse lugar desde Alexandre Magno e sua expansão para o Oriente. Porém, os judeus só sentiram realmente o incômodo do helenismo quando o rei selêucida supracitado o impôs à força. Em outras palavras, o grau de incômodo dos judeus ao helenismo se revelou gritante apenas na primeira metade do século II a. C.

A segunda conclusão elencada mais acima é a que tem maior relevância para  este estudo. Houve, sem sombra de dúvidas, uma divisão entre os judeus dentro da Revolta dos Macabeus. Uma minoria deles assimilou o helenismo, enquanto que a maioria resistiu a ele. Contudo, é necessário adicionarmos uma constatação que efetuamos em determinado momento do terceiro capítulo: a assimilação por parte dos judeus da Judéia ao helenismo começou antes da revolta de Matatias e seus filhos,  contra Antíoco IV Epífanes e seus aliados[122]. Diante de tal constatação, é importante ressaltarmos aqui que ela não desbanca a hipótese defendida neste trabalho, mas apenas nos faz ver a assimilação cultural dentro de uma perspectiva mais ampla de tempo.

Esperamos ter sido bem sucedidos ao alcançar o objetivo desta pesquisa, e também ter trazido para o campo científico da História uma abordagem original acerca de um tema que, a princípio, não é muito familiar ao leitor.

Referências

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ZABATIERO, J.P.T. Uma história cultural de Israel. 1. Ed. São Paulo: Paulus, 2013.

[1] Monografia do Curso de História da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Licenciado em História.

[2] Licenciado em História – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

[3] Orientador Professor Doutor – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

[4] O termo “Macabeus” se refere ao sobrenome (ou apelido) do filho do sacerdote Matatias: Judas, que após a morte de seu pai teve que tomar a liderança da guerra contra o rei selêucida Antíoco IV Epífanes e sua influência pagã na Judéia.

[5] SOCIEDADE BÍBLICA CATÓLICA INTERNACIONAL e PAULUS: A Bíblia de Jerusalém. São Paulo, 1985, pp. 788 a 792.

[6] JOSEPHUS. The Jewish War. Livro I, §§ 31 a 40. Tradução do original grego para inglês por ST. J. THACKERAY. Coleção LoebClassical Library. Cambridge, Massachusetts e Londres: Harvard University Press, 1984, pp. 16 a 21.

[7] BARNAVI, Élie (direção). História Universal dos Judeus: da Gênese ao fim do século XX. São Paulo: Cejup, 1995, p. 72.

[8] A Insurreição dos Macabeus também pode ser entendida como um Levante ou uma Revolta.

[9] OTZEN, Benedikt. O Judaísmo na Antiguidade. A história política e as correntes  religiosas de Alexandre Magno até o imperador Adriano. São Paulo: Paulinas, 1984.

[10] Ibidem,p. 29.

[11] MOMIGLIANO, Arnaldo. Os limites da helenização: A interação cultural das civilizações Grega, Romana, Céltica, Judaica e Persa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1991.

[12] Negritos de destaque do autor da presente monografia.

[13] OTZEN, Benidikt. Op. Cit. p. 31.

[14] Negritos de destaque do autor desta monografia.

[15] SOCIEDADE BÍBLICA CATÓLICA INTERNACIONAL e PAULUS: A Bíblia de Jerusalém. Op. Cit., p. 721.

[16] Negritos de destaque do autor desta monografia.

[17] SOCIEDADE BÍBLICA CATÓLICA INTERNACIONAL e PAULUS: A Bíblia de Jerusalém. Op. Cit. p. 722.

[18] OTZEN, Benedikt. Op. Cit.

[19] SAULNIER, Christiane. A Revolta dos Macabeus. São Paulo: Paulus, 1987.

[20] SOCIEDADE BÍBLICA CATÓLICA INTERNACIONAL e PAULUS: A Bíblia de Jerusalém. Op. Cit. p., 719.

[21] SOCIEDADE BÍBLICA CATÓLICA INTERNACIONAL e PAULUS: Op. Cit. p. 719.

[22] PAUL, André. O Judaísmo Tardio – História política. São Paulo: Edições Paulinas, 1983.

[23] SOCIEDADE BÍBLICA CATÓLICA INTERNACIONAL e PAULUS: A Bíblia de Jerusalém. Op. Cit. p., 719.

[24] PAUL, André. Op. Cit.

[25] PAUL, André. Op. Cit. p., 93.

[26] SOCIEDADE BÍBLICA CATÓLICA INTERNACIONAL e PAULUS: A Bíblia de Jerusalém. Op. Cit. p., 719.

[27] Na definição do historiador André Paul, o termo Diádoco designa, em grego (diádochoi), os “sucessores” do rei. Este no caso foi Alexandre

[28] Mais uma vez nos remontamos a compreensão de André Paul, mas dessa vez da palavra Epígono. O autor em seu livro O Judaísmo Tardio – História Política a define da seguinte maneira: “Surgiram daí três monarquias ‘helenísticas’, chefiadas pelos sucessores dos diádocos, chamados epígonos (em grego, epígonoi, ‘nascidos depois’).

[29] PAUL, André. Op. Cit. pp. 21-22.

[30] PAUL, André. Op. Cit. p., 25.

[31] OTZEN, Benedikt. Op. Cit., pp. 35-36.

[32] Aquele que abandona a sua antiga fé.

[33] Lágida ou Ptolomeu.

[34] TYLOR, Edward APUD BURKE, Peter. O que é história cultural? Trad. Sergio Góes de Paula. 2.ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Zahar, 2008, p. 43.

[35] PAUL, André. Op. Cit., p. 91.

[36] Ibidem, p. 91.

[37] SAULNIER, Christiane. Op. Cit., p. 42.

[38] PAUL, André. Cit., p. 91.

[39] Ibidem, p. 93.

[40] MOMIGLIANO, Arnaldo. Op. Cit., p. 13.

[41] Ibidem, p. 16.

[42] PAUL, André. Op. Cit., p. 93.

[43] OTZEN, Benedikt. Cit., p. 35.

[44] BURKE, Peter. Hibridismo cultural. São Leopoldo-RS: Editora Unissinos, 2006, p. 17.

[45] Ibidem, p. 21.

[46] Ibidem, p. 41.

[47] OTZEN, Benedikt. Op. Cit., p. 37.

[48] BURKE, Peter. Op. Cit., pp. 80-82.

[49] PAUL, André. Op. Cit., p. 26.

[50] MOMIGLIANO, Arnaldo. Op. Cit., p. 92.

[51] BURKE, Peter. Op. Cit., p. 81.

[52] MOMIGLIANO, Arnaldo. Op. Cit., p. 13.

[53] BARTH, Fredrik. “Grupos Étnicos e suas Fronteiras”, in POUTIGNAT, Philippe e STREIFF- FENART. Teorias da Etnicidade seguido de Grupos Étnicos e suas Fronteiras de Fredrik Barth. Trad. Elcio Fernandes. 2ed. São Paulo: Editora Unesp, 2011.

[54] BARTH, Fredrik. “Grupos Étnicos e suas Fronteiras”, in POUTIGNAT, Philippe e STREIFF- FENART. Op. Cit., pp. 189-190.

[55] Daremos continuidade à relação entre o conceito de “Grupo Étnico” e a Insurreição dos Macabeus em breve.

[56] BARTH, Fredrik. “Grupos Étnicos e suas Fronteiras”, in POUTIGNAT, Philippe e STREIFF- FENART. Op. Cit., p. 194.

[57] SMITH, Anthony D. The Ethnic Origins of Nations. Oxford: Blachwell Publishers, 1996.

[58] As narrativas que serão analisadas dizem respeito ao livro de 1º Macabeus e A Guerra Judaica, do historiador judeu Flávio Josefo

[59] Não é conveniente elencar aqui todos os autores/teóricos que serviram de âncora para definir os conceitos adotados por este estudo, já que isso ficou a cargo de ser realizado no capítulo anterior. Apesar disso, os conceitos estarão presentes nas próximas páginas

[60] Abordarmos o que ocorreu antes do levante é importante para se ter em mente o contexto dele

[61] SAULNIER, Christiane. Op. Cit., p. 8.

[62] Ibidem, p. 8.

[63] PAUL, André. Op. Cit., p. 82.

[64] SAULNIER, Christiane. Op. Cit., p. 7.

[65] Termo usado por Saulnier para designar a Torá, que é a Lei de Moisés e os primeiros cinco Livros da Bíblia Hebraica.

[66] Aqui “inspiração divina” entendemos por Yahweh atuar.

[67] SAULNIER, Christiane. Op. Cit., p. 7.

[68] A respeito da aceitação do livro de 1º Macabeus pela Bíblia Católica, é válido lembrar que isso já tinha sido dito, em poucas linhas, no capítulo 1 desta monografia.

[69]PAUL, André. Op. Cit., p. 84.

[70] Aqui podemos perceber uma característica peculiar do império romano: a mobilidade social. Por exemplo, um escravo poderia se tornar romano; em contrapartida, na Grécia, tal mobilidade é ausente, impedindo assim escravos de se tornarem cidadãos.

[71] OTZEN, Benedikt. Op. Cit., p. 299.

[72] Trecho parafraseado da página 84 de “O Judaísmo Tardio – História Política”.

[73] PAUL, André. Op. Cit., p. 84.

[74] Esse texto foi desenvolvido por Ciro Flamarion para explicar, aos alunos do Programa de Pós-Graduação em História da UFF, como funciona, com base em bibliografia específica trazida pelo Professor Ciro a seu texto, a “Análise de Conteúdo de Tipo Quantitativo”. Ele forneceu o texto aos discentes. Tudo isso ocorreu no 1º período de 2000.

[75] Nós enxergarmos o que o autor da fonte, ou seja, quem a escreveu, quer passar através das informações contidas na mesma.

[76] Como já foi sinalizado neste trabalho, o momento anterior a Revolta dos Macabeus ganhará espaço aqui, com o propósito de entendermos o contexto que se desenvolveu esse ocorrido.

[77] É importante lembrar que essa grade faz parte da segunda etapa do método adotado por esta pesquisa. Isso pode ser revisto no tópico “Método empregado”.

[78] SOCIEDADE   BÍBLICA   CATÓLICA   INTERNACIONAL   e   PAULUS: A Bíblia de Jerusalém. Op. Cit. p., 719.

[79] A análise realizada demonstra duas coisas. A primeira delas é que podemos constatar que houve, com certeza, processo  de assimilação cultural por parte dos judeus aos costumes gregos, e isso é bom, pois contribui para sustentar a hipótese defendida por esta pesquisa. A segunda coisa, e que está relacionada ao que foi dito antes, é que tal assimilação se desenvolveu desde antes da Revolta dos Macabeus.

[80] No capítulo 1 do presente estudo se abordou, rapidamente, trechos do livro de 1º Macabeus que ajudam a corroborar a hipótese defendida aqui. Até se fez um diálogo com a historiografia acerca do Levante dos Macabeus. Só para lembrarmos, BenediktOtzen foi o teórico que cooperou para sustentar a ideia de assimilação e resistência cultural por parte dos judeus ao helenismo.

[81] ZABATIERO, J.P.T. Uma história cultural de Israel. 1. Ed. São Paulo: Paulus, 2013, pp.275-276.

[82] SANTANA, Thiago Borges de. O Modus Vivendi helênico e a Revolta dos Macabeus no séc. II aec. Revista Orácula, São Paulo, ano 9, n. 14, p. 31-45, mar. 2013, p. 41.

[83] Usa-se “Assimilados” e “Resistentes” para denominar os agentes envolvidos no Levante dos Macabeus. Os agentes são, por um lado, judeus que passaram a se inserir nos costumes gregos; por outro, há os judeus que se colocaram contra tais costumes. Ligado a isso, é importante destacar aqui que, as denominações acima, partem das ideias de “Assimilação” e “Resistência” culturais. Estas foram definidas no capítulo anterior, a partir da percepção do historiador cultural Peter Burke.

[84] SOCIEDADE BÍBLICA CATÓLICA INTERNACIONAL e PAULUS: A Bíblia de Jerusalém. Op. Cit. pp. 721-722.

[85] SIMON, Marcel; BENOIT, André. Judaísmo e cristianismo antigo: de Antíoco Epifânio a Constantino. São Paulo: EDUSP, 1987, p. 52.

[86] É válido aqui voltarmos para A Grade de Leitura e Análise, e observarmos os elementos que fazem parte de “Sociedade Pró-Judaica/Religião Judaica” e “Judeus-Resistência ao Helenismo/Manutenção do Judaísmo”. A importância disso está no fato de sempre usar a fonte como ponto de partida, não só para defender a hipótese, mas também para estabelecer diálogo com a historiografia.

[87] SIMON, Marcel; BENOIT, André. Op. Cit., p. 52.

[88] Apenas para lembrar, “Identidade Cultural” foi um dos conceitos definidos no capítulo anterior. Retomando as palavras do ilustre historiador Peter Burke, “A identidade cultural é frequentemente definida por contraste”.

[89] Nós não estamos descartando a importância de outros autores que foram usados ao longo desta monografia. Todos eles acabaram contribuindo na sustentação da hipótese defendida aqui. Entretanto, por estarmos no capítulo que se dedica especialmente à análise da fonte, Marcel Simon e André Benoit trouxeram mais elementos que dialogam com trecho de 1º Macabeus analisado neste tópico. Consequentemente, esses estudiosos se mostram mais “capazes” de corroborar a ideia defendida por nós.

[90] SOCIEDADE BÍBLICA CATÓLICA INTERNACIONAL e PAULUS: A Bíblia de Jerusalém. Op. Cit. pp. 722-723.

[91] O trecho analisado nos traz informações mais precisas sobre assimilação e resistência culturais. A precisão reside no fato do autor de 1º Macabeus, para além de falar sobre um enfrentamento entre assimilados e resistentes, expor um caso específico que envolve estes últimos. Isso pode ser visto no momento que é falado da apostasia feita por um judeu, e a aversão de Matatias a esse ato.

[92] A respeito desse movimento, nós retornaremos a ele em breve.

[93] OTZEN, Benedikt. Op. Cit., pp. 35-36.

[94] Neste trabalho, no capítulo anterior, tivemos a oportunidade de ver o que Arnaldo Momigliano entende por “civilização helenística”. Reveja o tópico “Helenismo”.

[95] SIMON, Marcel; BENOIT, André. Op. Cit., p. 52.

[96] Esses preceitos foram extraídos da obra de Christiane Saulnier, intitulada “A Revolta dos Macabeus”, e tinham sido citados, não na ordem que estão agora, no capítulo anterior. Resolvemos resgatar isso para dar mais sustância à resposta  dada a questão feita.

[97]Como tinha ficado entendido em diversos momentos deste trabalho, o levante ocorrido entre 167 e 164 a.C. é visto a partir da ideia de “resistência cultural”; Enquanto que os agentes envolvidos nele são intitulados de “resistentes”.

[98] Sobre o helenismo e sua disseminação, já teve uma rápida abordagem sobre isso no capítulo 1, no tópico “Consideração Parcial”. Não é conveniente falar disso novamente.

[99] ZABATIERO, J.P.T. Op. Cit., p. 277.

[100] JOSEPHUS. Op. Cit., pp.16 a 23.

[101] Podemos perceber uma divergência entre o livro de 1º Macabeus e “História da Guerra dos Judeus contra os Romanos”. Isso fica mais claro na citação exposta mais adiante.

[102] JOSEPHUS. Op. Cit., pp. 18-19.

[103] Apesar de a presente monografia trabalhar com um recorte temporal bem delimitado, que vai de 167 a 164 a.C., optamos por falar um pouco do período posterior a esses anos. Acreditamos que falar da dinastia dos asmoneus é falar da continuidade da história dos macabeus.

[104] Segundo Saulnier, Antíoco IV teria morrido por doença.

[105] SIMON, Marcel; BENOIT, André. Op. Cit., p. 52.

[106] Veja o título da sessão 3, que se encontra no livro dessa autora intitulado “A revolta dos Macabeus”, na página 35.

[107] Tais episódios podem ser vistos na página 36 do livro de Saulnier já citado. Lá também podem ser encontrados outros acontecimentos além dos mencionados. A decisão por citar apenas alguns deles parte do pressuposto de tratarmos, de maneira breve, de cada governante da dinastia dos asmoneus. Sendo assim, estamos fazendo juízo ao título do presente tópico.

[108] O nome “Simão Macabeu” pode ser encontrado no livro “O Judaísmo na antiguidade: A história política e as correntes religiosas de Alexandre Magno até o imperador Adriano”, que já foi citado e utilizado por esta pesquisa.

[109] SAULNIER, Christiane. Op. Cit., p. 36.

[110] PAUL, André. Op. Cit., pp. 34-35.

[111] Leia a página 34 de “O Judaísmo Tardio”, do autor antes mencionado.

[112] Termos usados por André Paul para identificar as funções que João Hircano assumiu, quando sucedeu seu pai no reino.

[113] PAUL, André. Op. Cit., p. 35.

[114] A respeito do termo “rei”, este, segundo André Paul, foi usado por Aristóbulo para se intitular como tal. Contudo, o  autor sinaliza para o sentido de que esse termo vai designar Alexandre Janeu, filho daquele, como é visto nas moedas. Nelas, segundo Paul, Aristóbulo é identificado como “sumo sacerdote”. Isso que foi dito está na página 35 do livro já citado do autor há pouco mencionado.

[115] PAUL, André. Op. Cit., p. 35.

[116] SAULNIER, Christiane. Op. Cit., p. 37.

[117] PAUL, André. Op. Cit., p. 38.

[118] PAUL, André. Op. Cit., p. 39.

[119] PAUL, André. Op. Cit., p. 40.

[120] É válido lembrar que teve um tópico chamado “Período helenístico”, que se dedicou a falar desde a expansão de Alexandre Magno para além da Macedônia até o momento que explode o Levante dos Macabeus, em 167 a. C.

[121] “Fenômeno cultural” é a definição dada por BenediktOtzen ao helenismo. Leia a página 31 do livro desse autor que porta o título “O Judaísmo na antiguidade. A história política e as correntes religiosas de Alexandre Magno até o imperador Adriano”. Este já foi utilizado por este estudo em diversos momentos.

[122] Reveja o tópico do capítulo 3 chamado “Antecedentes da Revolta”.

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Edson da Silva dos Santos

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