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Integração econômica, identidade sul-americana e do sudeste asiático, como via para a cidadania global

RC: 76569
136
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/identidade-sul-americana

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

TEODORO, Antonio [1], COELHO, Artur da Silva [2], FIDELIS, Jussara [3]

TEODORO, Antonio. COELHO, Artur da Silva. FIDELIS, Jussara. Integração econômica, identidade sul-americana e do sudeste asiático, como via para a cidadania global. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 06, Ed. 02, Vol. 09, pp. 133-147. Fevereiro de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/educacao/identidade-sul-americana, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/identidade-sul-americana

RESUMO

O processo de globalização desencadeou possibilidade de mudanças em todos os campos do conhecimento e da vida em sociedade. Houve, também, uma descaracterização da política tradicional, tanto no âmbito doméstico quanto no internacional, tal processo, gerou a necessidade de se repensar o conceito clássico de cidadania até então vigente, que está em curso nas diferentes regiões do mundo. O objetivo deste estudo é mostrar que o processo de construção de uma cidadania global, parece estar trilhando o mesmo caminho do processo de globalização econômica já em adiantado curso, onde são formadas alianças regionais para fortalecimento regional e atuação forte junto ao comercio internacional. A metodologia utilizada foi pesquisa bibliográfica feita a partir do levantamento de referências teóricas já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como livros, artigos científicos, páginas de web sites. Os resultados mostram um processo similar de atuação dos blocos, visto que no caso da cidadania global, a estratégia está em fortalecer a identidade regional, para no segundo momento estabelecer uma cidadania regional com possibilidade posterior de encampar o processo de cidadania global.

Palavras-Chave: Cidadania global, bloco econômico, identidade regional.

INTRODUÇÃO

A expressão globalização surge na década de 80, esse termo objetivava explicar o movimento de abertura comercial e/ou a forte desregulamentação ocorrida durante os anos 70. Essa abertura se tornou possível, após o enfraquecimento do bloco socialista e a conversão de grande parte dos países que compunham o bloco capitalista. No geral, as empresas multinacionais apoiadas pelos Estados foram às propulsoras da convergência econômica que priorizou os aspectos econômico-financeiros em grande parte do mundo.

Dessa forma, novas bases de produção, distribuição e consumo de bens e serviços – facilitadas pelo aporte tecnológico, foram desenvolvidas em todas as partes do mundo, propiciando transformações culturais e criando novos desafios para se entender o surgimento de uma complexa sociedade do conhecimento[4].

No presente, verifica-se que as transformações locais estão cada vez mais vinculadas as condições das transformações globais, sendo o processo de integração entre os países um dos fatores que repercute na dinâmica das relações sociais que surgem com os movimentos de regionalização e globalização.

Tendo a globalização cada vez mais presente, a integração econômica emerge como forma de melhor cooperação entre os países, objetivando maior desenvolvimento socioeconômico. E nessa busca de uma maior cooperação surge a necessidade de um fortalecimento nas relações sócio econômicas, com possibilidade de surgimento e uma cidadania global, como base das relações entre os Estados-signatários dos Blocos Econômicos.

O artigo, no primeiro tópico, apresenta conceitos de identidade e cidadania, procurando demonstrar a diferenciação dos conceitos que estão presentes no contexto da cidadania global. No segundo tópico são apresentadas as fases da integração econômica e sua materialização no sudeste asiático e na América do Sul, bem como a noção de identidade desenvolvida nessas regiões. No terceiro tópico, é apresentada uma via para a cidadania global a partir da contextualização nos blocos sul-americano e do sudeste asiático. Por fim, as considerações finais sobre a possibilidade da cidadania global nessas regiões.

1. IDENTIDADE E CIDADANIA

A identidade é uma noção complexa e contestada. Em termos simples, identidade refere-se a um ator[5], ao senso de ser único ou distintivo por causa de atributos sociais, valores e padrões de comportamento. A identidade é uma função de dois fatores que são principalmente subjetivos. Um é como um ator se vê, outro é como os outros ou os estranhos veem esse ator. Os dois estão relacionados, mas não são idênticos. O próprio sentimento de uma pessoa ou grupo de ser distintivo pode ser mais forte do que a percepção ou reconhecimento do estranho.

A identidade nacional é um conjunto de crenças e representações simbólicas que dão sentido ao conceito individual de cidadania. Ela é resultado das instituições culturais da nação que adicionadas a símbolos e representações, produzem significados estruturantes para os indivíduos (MEDEIROS, 2002, p. 98).

A identidade é socialmente construída, combinando a lógica instrumental com a formação de hábitos socializados, normas e instituições. Além disso, essa construção de identidade não é divorciada de laços culturais e/ou históricos, mas é reforçada por ela. Proximidade simples, laços históricos e cultura compartilhada são suficientes para a identidade. Seu resultado pode ser indeterminado; a proximidade pode levar à guerra ou à paz; e os laços culturais próximos não tornam as nações imunes ao conflito. É preciso um senso de identidade comum ou coletiva para construir uma comunidade verdadeira, legitimar a cooperação ao nível nacional e internacional e reforçar as razões para uma atuação conjunta.

A cidadania é entendida, por diversos autores[6], como a associação dos direitos políticos, sociais, civis, econômicos, ambientais e difusos, com deveres dos cidadãos e do Estado. É um status concedido aos membros integrais de uma comunidade, sendo eles iguais em direitos e obrigações. Possui dois tipos de caráter: individual e universal, o primeiro estabelece que cada indivíduo possui direitos que dizem respeito somente a ele, além de ser restrita ao território, pois sua abrangência, delimita-se pelo território pertencente a um Estado-Nação; o segundo estabelece a permissão de direitos a todos, não importando o status ou classe social (MARSHALL, 1967).

Esse sentimento de pertença, qual seja, a um Estado-Nacional, vem sendo questionado visto que os Estados estão tendo sua soberania enfraquecida frente ao indivíduo, em função do processo de globalização – que impõe aos mesmos, que as decisões sejam de cunho político e/ou econômico, devam levar em consideração os interesses dos outros parceiros – uma vez que os laços que ligam os direitos de cidadania à nacionalidade estariam se tornando mais fracos. Nesse contexto, os Estado não parece ser mais capaz de definir, em função de seus próprios interesses, quem pode ou não entrar e se estabelecer em seu território, pois cada vez mais os direitos são atribuídos em nome da dignidade inerente da pessoa humana, e não da sua nacionalidade, o que relega ao segundo plano a distinção entre o nacional e o não nacional (REIS, 2004).

2. FASES DA INTEGRAÇÃO ECONÔMICA

Em particular a integração econômica é um processo que busca proporcionar amplo crescimento dos países signatários dos acordos, sem limitar-se à eliminação de barreiras alfandegárias, mas também priorizando a harmonização das políticas econômicas vigentes entre eles. A integração, no geral, é permeada por aspectos que abordam a vida econômica dos países envolvidos, visando minimamente eliminar obstáculos à livre circulação dos fatores de produção, e as diferenças entre as políticas econômicas vigentes. Mais especificamente, a integração também pode assumir uma escala setorial, na qual se fomenta a integração setor a setor sucessivamente em diferentes áreas de atividades, bem como para a execução de empreendimentos específicos que atingem o interesse comum (SANTOS, 1993).

A figura abaixo[7] permite uma melhor visualização do processo clássico de integração:

Figura 1 – Fases da integração econômica.

Fonte: Carvalho et al (2007, p. 117).

O ordenamento dos níveis de integração varia desde a concessão de tarifas preferenciais até a completa união das economias dos países participantes do Bloco não seguindo necessariamente a ordem da figura.

3. O BLOCO REGIONAL DA AMÉRICA DO SUL

O Mercado Comum do Sul (MERCOSUL[8]), instituído em 1991 e formado pelo Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, constituindo-se na proposta, em curso, de integração regional da América do Sul. No presente, verifica-se que a União Aduaneira, inicialmente prevista para o final dos anos 90 ainda não foi concretizada, apesar de sua área territorial ter se ampliado com a adesão de novos membros tais como o Chile, Bolívia, Peru e Venezuela – ampliação iniciada com a assinatura de um acordo entre MERCOSUL e Pacto Andino que culmina com a proposta de criação da Comunidade Sul-Americana de Nações[9].

No MERCOSUL, a integração se cristaliza na experiência jurídico-normativa que se desenha nos blocos econômicos, guardando intrínseca relação com o Direito internacional ortodoxo. Devido ao caráter intergovernamental do bloco e de suas instituições, qualquer tomada de decisão, tem que ser submetida à apreciação interna de cada Estado, o que torna o processo mais moroso e burocrático (MENEZES, 2002).

Em concordância com esse entendimento, Menezes (2002) informa que: as questões referentes ao processo de integração econômica e a criação do MERCOSUL tornam-se importantes para esclarecer que, quando os países tomaram a decisão de buscar a integração estavam envoltos por uma exigência histórica mundial. Os objetivos estabelecidos naquele momento foram inspirados em um novo cenário internacional. Com o MERCOSUL os Estados queriam, além de se inserirem no mercado mundial, também dispor de um instrumento político econômico, como forma de se fortalecer em frente às outras economias.

Conforme afirma Guerra (2015) o MERCOSUL se depara com dificuldades na implementação de um modelo comunitário, visto que deveriam ocorrer renúncias crescentes nas competências inerentes a soberania estatal, que não se materializaram. Atualmente, observa-se que, mesmo diante da “aceitação” por parte dos países-membros dos pressupostos de uma construção comunitária, a delegação ou transferência de determinados poderes, a limitação voluntária da soberania dos signatários, a convergência das políticas econômicas e a harmonização do direito, na prática pouco avançou, no que diz respeito aos termos de internacionalização efetiva das economias ou de uma interdependência entre os países (D’ANGELIS, 2002).

Embora as formações de blocos econômicos, no geral, e como o MERCOSUL especificamente, tenham buscado não apenas a integração econômica, mas também integração social e política, via consolidação da democracia e a implementação de direitos humanos, verifica-se que as cláusulas democráticas e de defesa de tais direitos, ainda não foram efetivamente incorporadas a agenda do processo de globalização econômica.

4. O BLOCO REGIONAL DO SUDESTE DA ÁSIA

O regionalismo asiático, não é um fenômeno contemporâneo, mas remete a diferentes origens e fundamentos no contexto das relações econômicas internacionais, sua existência é registrada anteriormente a qualquer explicação teórica dos processos de cooperação e integração regional surgidas concomitantemente ao desenvolvimento do sistema multilateral do comércio sob as bases do GATT/WTO[10].

Formalmente, inicia-se em 1957 com a iniciativa da Organização do Tratado do Sudeste Asiático (SEATO). Ocorre que, diante da insatisfação dos objetivos iniciais ali projetados, alguns países mantiveram relações diplomáticas mais estreitas na região, o que conduziu à criação, em 08 de agosto de 1967, da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), com a conclusão da Declaração de Bangkok[11]. Os signatários originais eram Indonésia, Tailândia, Filipinas, Malásia e Cingapura. Posteriormente foi ampliada com a adesão de Brunei, em 1985, Mianmar, Laos, Camboja, em 1997, e do Vietnam em 1999.

O registro documental da ASEAN considera a criação de uma estrutura para a ação comum entre os Estados, no que diz respeito à cooperação regional, com base no espírito da igualdade e parceria, contribuindo para paz, progresso e prosperidade na região[12].

A criação da ASEAN era vista como forma de equilíbrio de forças no cenário geopolítico em relação à China, ou ainda como alternativa de cooperação econômica entre os Estados em relação ao Japão e Coréia (NARLIKAR, 2003, p. 167).

Importante destacar que a ASEAN pode ser classificada como uma organização internacional de caráter regional, considerando a variedade das formas de Estados e organizações internacionais no domínio do Direito Internacional Público ortodoxo. A Declaração de Bangkok de 1967 faz referência expressa à criação de uma “Associação para Cooperação Regional entre Países do Sudeste Asiático”.

Mais amplamente, a declaração da ASEAN estabelece a colaboração e assistência mútua em matérias de interesse comum, em todos os campos, tais como social, cultural, técnico e científico e administrativo, assistência e capacitação técnica recíproca, nas áreas educacionais, profissionais e administrativas, a colaboração na área da agricultura e indústria, a expansão do comércio, incluindo o estudo dos problemas relacionados ao comércio internacional de bens, melhorias em seus transportes e infraestrutura de comunicação, além da elevação do padrão de vida das populações de seus signatários, em modelo similar à de outros blocos econômicos.

5. A NOÇÃO DE IDENTIDADE SUL-AMERICANA

Há mais de dois séculos os destinos da América Latina são motivos de debates que visam a formação de uma identidade continental sul-americana que a época, tinha a possibilidade de seguir por duas vias: uma seguindo o modelo ocidental apoiado no progresso e civilidade da Europa e outra, de autonomia latino-americana, com predomínio de suas crenças, tradições, valores e ideologias. Simon Bolívar influenciado pelos ideais de liberdade e democracia grega ambicionava a constituição de uma confederação americana de estados preparada para agir de forma bélica contra qualquer ameaça de domínio estrangeiro (GALVÃO, 2008).

Es una idea grandiosa pretender formar de todo el Mundo nuevo una sola nación con un solo vínculo que ligue sus partes entre sí y con el todo. Ya que tiene un origen, una lengua, unas costumbres y una religión, debería, por consiguiente, tener un solo gobierno que confederas ellos diferentes estados que hayan de formarse; mas no es posible, porque climas remotos, situaciones diversas, intereses opuestos, caracteres desemejantes, dividen a la América (LEOPOLDO, 1995, p. 30).

A América do Sul ganhou importância como concepção geográfica, em função do desenvolvimento da economia colonial em seu território no passado, e da premência de superar o subdesenvolvimento marcado pelo fracionamento regional, industrialização tardia e dependência econômico-financeira dos Estados Unidos. Ao mesmo tempo possui a complexidade de ser uma área de dimensões vastas, com culturas próprias e interesses específicos. Forma-se uma configuração do sistema mundo, entre o centro e a periferia com a diferenciação entre as duas Américas, qual seja, a anglo-saxônica ligada à economia mundial e a outra latina com raízes ibéricas, na periferia deste modelo.

Quando se fala do caráter do MERCOSUL, é importante falar de identidade, que anda sempre ligada às transformações sociais e desenvolvimento humano. As identidades são necessárias nas políticas internacionais e na sociedade local para assegurar um nível mínimo de ações esperadas, pois dizem a nós e aos outros quem somos, e ao fazê-lo implicam um conjunto particular de interesses ou preferências, respectivamente às escolhas de ação em domínios particulares e com respeito aos seus respectivos atores.

A conformação geográfica do MERCOSUL estimula a cooperação na área de infraestrutura de integração com a noção de espaço sul-americano integrado a opor-se ao ideológico latino-americano. As fronteiras minimizam-se e deixam de existir elementos de separação e apartamento, permitindo a construção de elos entre vizinhos (GALVÃO, 2009).

A identidade sul-americana tem em consideração o dualismo da vida transnacional e a relação entre o ambiente doméstico e o internacional. Tal identidade não exclui laços bilaterais ou multilaterais com os outros países da América Latina e de outros continentes ou outras formas de organização; não exclui a pluralidade intrínseca à própria América do Sul cuja identidade é também plural. A identidade sul-americana emerge assim como uma identidade coletiva proveniente do florescimento de uma cultura política sul-americana, que dá significado ao poder, aos interesses dos atores e estrutura o sistema.

6. A NOÇÃO DE IDENTIDADE DO SUDESTE ASIÁTICO

O Sudeste asiático, atualmente uma região de 10 nações que compõem a ASEAN, exibe notável grau de diversidade política, cultural e econômica. Estando localizado na encruzilhada entre a China e a Índia, e abrangendo as principais rotas marítimas que ligam o Pacífico e Índico, o Sudeste Asiático também está exposto a um fluxo constante de influências. Não obstante, o crescimento de uma forma de longo prazo e o relativamente robusto regionalismo (ASEAN) criou um sentido de identidade regional ao lado das ainda distintas identidades nacionais dos países do Sudeste Asiático (ACHARYA, 2013).

É valido ressaltar que a orientação do modelo de estado desenvolvimentista, com ênfase no crescimento econômico, e englobando questões ideológicas e de identidade, cujo pressuposto é um forte papel do Estado na ancoragem do desenvolvimento, agora prevalece em todo o Sudeste Asiático. Embora em graus diferentes nos países que o compõe, tal orientação tem ajudado a minimizar as tensões culturais, políticas e de segurança entre os membros, constituindo-se em base importante para existência da ASEAN.

Apesar desses aspectos da diversidade, o Sudeste Asiático tem desenvolvido um maior sentido de identidade regional do que outras partes da Ásia. De fato, a ideia do Sudeste Asiático como uma região em si e como identidade regional, coexiste com identidades nacionais que em certa medida se complementam. Visto que a ASEAN atua sobre assuntos de segurança, política, economia e socioculturais. Apesar algumas divisões internas e restrições impostas pela grande presença de poder e influência, a ASEAN continua a ser um dos grupos regionais mais coesos e dinâmicos da Ásia, sendo considerado fator chave na intermediação do fluxo de ideias para dentro e para fora Sudeste Asiático, além de player importante na reformulação das identidades nacionais dos estados do Sudeste Asiático, uma vez que tais identidades têm se mostrado menos excludentes e conflituosas.

Como tal, a identidade regional do Sudeste Asiático vai além de uma simples estimativa de semelhanças e diferenças estruturais entre os países, também conhecidas como “unidade em abordagem da diversidade. Portanto, não deve olhar apenas para o que é comum entre suas unidades constituintes, mas como os países da região, especialmente a elite engajada em um processo de socialização dentro de um contexto institucional (ASEAN) se “imaginam” fazer parte de uma região distinta.

Na visão de Acharya (2013), pode ser muito otimista argumentar que o conceito regional do Sudeste Asiático se tornará uma realidade permanente ou perdurará indefinidamente. Muito vai dependem de políticas externa (democratização da cultura política), (globalização) e eventos estratégicos que estão além do controle dos países do Sudeste Asiático. Estes eventos oferecerão fontes alternativas de identidade, o que poderia aumentar a diversidade do Sudeste Asiático.

7. CONCEITUANDO A CIDADANIA GLOBAL NO CONTEXTO DO MERCOSUL E ASEAN

A precedência de uma cidadania global é a possibilidade da igualdade para todos os indivíduos, concedendo a cada pessoa um espaço concreto e comum, em nível global, onde por meio do consenso seja possível a convivência pacífica, o compartilhamento de ideias e o cooperativismo.

A cidadania global refere-se ao sentimento de pertencer a uma comunidade mais ampla e a uma humanidade comum. Ela enfatiza a interdependência e a interconexão política, econômica, social e cultural entre os níveis local, nacional e global (UNESCO, 2016 p. 14).

Na visão de Janoski (1998), a cidadania global reflete o efeito de pertença ativa ou passiva. Entretanto, em um cenário universal, o sentimento de pertença se apresenta de forma complexa e em escala maior que em qualquer cenário nacional, isso ocorre em função da falta de uma identidade consistente, que não é amplamente adotada pela sociedade em geral. Ou seja, uma identidade justa que represente verdadeiramente uma conduta isonômica ao nível global[13].

É valido ressaltar que, mesmo que o entendimento de cidadania global esteja alçando maiores dimensões, sua evolução não tem sido consensual, e apesar de parecer de conhecimento comum, deve ser ressaltado que o cidadão não deixa de ser cidadão nacional para ser global. Sua ordem histórica de experiências, como ator social ativo, também não deveria causar alguma alteração nestes resultados, ou seja, descobrir-se ou atuar como cidadão global antes mesmo de causar algum impacto em nível nacional e/ou local não deve ser uma experiência que estabeleça limitações (FREITAS e SALEMA, 2012).

Como sugeriu Ednir (2015) o indivíduo não é uma ilha, mas sim uma pessoa com relacionamentos, que precisa ter acesso às redes globais e ter conhecimento do cotidiano mundial, ainda que em nível local ele não seja estimulado a ser e a dar mais de si, não anulando uma possibilidade pela má construção de outra.

No continente SUL-AMERICANO, e mais próximo aos brasileiros, está o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL[14]). Esse, que ainda se encontra na fase de união aduaneira a ser concluída, vem apresentando dificuldades para consolidar um espaço supranacional. Mesmo já possuindo legislação comum, que ainda tem uso limitado a uma parte dos estados membros. No MERCOSUL, por não haver entre os nacionais dos países que compõem o bloco, uma noção de igualdade comum, permanece a dificuldade para a consolidação do direito comunitário e a institucionalização de uma única cidadania.

Percebe-se assim que a integração sul-americana compreende divergências e conflitos que se instauraram em um contexto no qual, estados compartilham uma identidade coletiva, mas seguem mantendo sua individualidade, com sua própria identidade nacional e seus interesses. A inferência que se faz, é que a integração entre os países-membros só estará completa quando houver uma cidadania comum, o que está sendo construída no âmbito das instituições[15] que operacionalizam o bloco.

No que diz respeito ao Sudeste Asiático, verifica-se que ainda não foi concluiu o projeto de construção regional e o mesmo, parece não ter alcançado o tipo de identidade regional que se pretendida. Ocorre que a ideia de valores asiáticos, com predomínio da coletividade sobre o individualismo; respeito pela autoridade; além do elevado valor dado a educação voltada as economias mais dinâmicas; não estão presentes de forma equivalente em todos os países membros. Ainda concorre contra essa construção regional, a diversidade de abordagens religiosas, políticas e econômicas da região. Dentro desse contexto, a identidade do Sudeste Asiático vem representando, pelo menos, uma consciência regional, o que pode ajudar no fortalecimento da comunidade regional, e consequentemente na construção da cidadania do Sudeste Asiático.

Em países onde a identidade é uma questão delicada e a solidificação da própria identidade nacional é um desafio, o espaço para promover um sentimento de cidadania no âmbito global pode ser limitado. Isso ocorre particularmente em contextos em que identidades de cidadania nacional estão em conflito ou ameaçadas. Frequentemente, essas preocupações surgem da crença que a cidadania nacional é um precursor essencial da cidadania global (UNESCO, 2015, p. 19).

Na visão de Saaler e Szpilman (2011), a identidade do Sudeste Asiático propõe uma unidade pan-asiática, que recusa o domínio dos gigantes asiáticos – Japão e China – ou da globalização que propõe um sistema mundial unilateral em desenvolvimento.

De acordo com Wendt (1994), as instituições são mutuamente constitutivas, ou seja, elas incentivam os agentes a proceder sobre determinadas normas e princípios, em uma cultura de reciprocidade. Ao mesmo tempo, internalizam interesses e identidades coletivas e modificam os mesmos através de sua estrutura. A cultura de reciprocidade geraria um sentimento de futuro comum entre os membros do coletivo, fomentando o interesse coletivo de construção de cidadania regional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo de globalização desencadeou possibilidade de mudanças em todos os campos do conhecimento e da vida em sociedade. Além do consumismo e da massificação social, também houve descaracterização da política tradicional, seja no âmbito doméstico quanto no internacional, tal processo, gerou a necessidade de se repensar o conceito clássico de cidadania até então vigente. Foram criadas condições para a possibilidade da concepção de uma cidadania pós-nacional/global, capaz de ultrapassar as fronteiras estatais e apresentar-se como um elemento essencial à organização de um espaço público transnacional em que se faça viável a democratização das relações internacionais. Nesse cenário o viés econômico ganhou prioridade, fazendo com que inúmeros blocos regionais surgiram em diversas partes do mundo como forma de forma de maximizar os ganhos globais, e nesses blocos econômicos está se fazendo presente, mais o sentido de cidadania/identidade regional do que cidadania global, não sendo excludente que a solidificação da primeira leve a segunda.

No contexto da América do Sul, como foi especificado, o MERCOSUL ainda se encontra em consolidação, o que deixa a critério das jurisdições dos países signatários a tarefa de solucionar os conflitos que envolvem a ordem regional e os direitos internos. O que tem gerado grande dificuldade de integração. Como consequência, o processo de integração total está com dificuldades de se estabelecer, principalmente no que diz respeito aos direitos humanos, a democracia e a defesa nacional. Ficando no presente relacionado exclusivamente à esfera econômica. É evidente que ainda subsistem muitas críticas ao bloco, sobretudo considerando-se que se apresenta para a comunidade internacional como um processo de estrutura ainda pouco clara. Verifica-se que persiste a necessidade de firmar alianças de cooperação, para que assim se concretize o ideal de formar um vínculo de solidariedade e identidade regional entre os países, qual seja pensar no surgimento do “cidadão latino-americano”, aquele cidadão identificado não mais com seus territórios locais, mas com todos os povos que o cercam. O pressuposto seria substituir a cidadania nacional por uma cidadania multicultural, sendo este o contexto em que está sendo pensada a cidadania sul-americana.

No bloco asiático da ASEAN, a busca por uma identidade regional já percorreu um longo caminho, mas o projeto de construção da cidadania do sudeste asiático agora está sendo desafiadas tanto por fatores exógenos, associados à globalização econômica, as ameaças transnacionais; como por fatores endógenos como a ausência de estrutura normativa de garantia de direitos comuns, além das tensões ocasionadas pela ascensão da China no comércio internacional.

Devido à interação ativa entre valores e normas, o valor asiático poderia ser significativo para a cidadania do Sudeste Asiático, visto a ênfase na ética comunitária e no processo informal de homogeneização de interesses dos atores locais, o que indiretamente consolida cidadania regional. Tal cidadania regional é algo que está sendo almejado e buscado pelos estados da região e sociedades. E são esses esforços em direção à cidadania que podem tornar-se a força-motriz para moldar as relações internacionais do Sudeste Asiático.

O que se verifica é que tanto no MERCOSUL quanto na ASEAN, uma influência normativa poderia permitir um equilíbrio de dinâmicas de poder, que hoje é dominado pelas grandes potências à custa dos estados mais fracos da região. Fortalecer essa identidade regional é, portanto, um desafio crucial e fundamental para a relevância futura da ASEAN. A manutenção do estilo de liderança não-hegemônico e pluralista além da abordagem inclusiva da cooperação pode proporcionar uma melhor adequação às realidades dos países signatários, do que a liderança de estilo antigo da ordem mundial liberal liderada pelos americanos.

De qualquer forma, o que se percebe é que a busca por uma cidadania global nos blocos em questão, parece estar trilhando o mesmo caminho do processo de globalização econômica já em adiantado curso, qual seja, os países buscaram/buscam um fortalecimento de alianças regionais para maximizar sua participar do processo de globalização econômica. No caso da cidadania global, a estratégia dos blocos está em fortalecer a identidade regional, para no segundo momento estabelecer uma cidadania regional com possibilidade posterior de encampar o processo de cidadania global.

REFERÊNCIAS

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WENDT, A. (1994). Collective Identity Formation and the International State. The American Political Science Review, v88, n2, p.384-396.

APÊNDICE – REFERÊNCIAS DE NOTA DE RODAPÉ

4. Define então a chamada “sociedade do conhecimento” como uma ideologia capitalista que cumpre sua função na reprodução do capitalismo contemporâneo, que é a de enfraquecer as críticas radicais a essa formação societária e minar a luta por uma revolução (DUARTE, 2003).

5. Que pode ser uma pessoa, grupo de pessoas, estado ou grupo de estados.

6. Exemplo, Marshall (1967), Bendix (1964), Kymlicka (1995, 1998, 2000)

7. Essa é uma classificação usual e foi apresentada de forma progressiva apenas para efeito didático. Na prática, a formação de um bloco acontece de acordo com as conveniências dos países envolvidos, podendo ser iniciada em qualquer uma das etapas apontadas.

8. http://www.mercosul.gov.br/40-normativa/tratados-e-protocolos?layout=. Acesso em: 12/06/2018.

9. Sobre a Comunidade Sul-Americana de Nações ver site oficial do Ministérios das Relações Exteriores do Brasil: http://www.itamaraty.gov.br.

10. General Agreement on Tariffs and Trade (GATT); World Trade Organization.

11. Bangkok Declaration, 8 August 1967 (aqui referida como “Declaração de Bangkok de 1967” ou “Declaração da ASEAN de 1967”). A versão consolidada do tratado pode ser consultada em: <http://www.aseansec.org/1212.htm>. Acesso em: 8 jun. 2018.

12. Conforme considerada na Declaração da ASEAN: “Desiring to establish a firm foundation for common action to promote regional cooperation in South-East Asia in the spirit of equality and partnership and there by contribute towards peace, progress and prosperity in the region”

13. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro 1948, salvaguardou esta equidade, amparando os direitos de paz e igualdade entre todos os seres humanos, reconhecendo-os como cidadãos iguais em qualquer parte do mundo.

14. Para informações sobre o Bloco, visitar o sitio: http://www.mercosul.gov.br/

15. Comunidade Sul-Americana de Nações (CASA); União de Nações Sul- Americanas (UNASUL)

[1] Doutor em Ciências da Educação pela Universidade Nova de Lisboa; Professor Catedrático da Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – Lisboa.

[2] Mestre em Desenvolvimento Econômico -UFPR; Doutorando pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – Lisboa.

[3] Mestre em Gestão Urbana – PUC-Pr; Doutoranda em Educação – Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – Lisboa.

Enviado: Agosto, 2020.

Aprovado: Fevereiro, 2021.

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Artur da Silva Coelho

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