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O envolvimento do sistema Renina-Angiotensina nas disfunções cardiovasculares e seus recursos farmacológicos

RC: 41322
1.242
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/renina-angiotensina

CONTEÚDO

ARTIGO DE REVISÃO

SILVA, Thiago Fernandes da [1], VAZ, Tânia Maria [2], SOUZA, Miguel Soares de [3], FERREIRA, Lívia Penna [4], FILHO, Marcelo Limborço [5], FONTES, Marco Antonio Peliky [6], MARINS, Fernanda Ribeiro [7]

SILVA, Thiago Fernandes da. Et al. O envolvimento do sistema Renina-Angiotensina nas disfunções cardiovasculares e seus recursos farmacológicos. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 04, Ed. 11, Vol. 02, pp. 181-196. Novembro de 2019. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/renina-angiotensina

RESUMO

O sistema renina-angiotensina (SRA) desempenha importante função na regulação da pressão arterial e na homeostasia do organismo. Porém, em determinadas condições, a hiperatividade do SRA colabora para a gênese de diversas doenças cardiovasculares, como aterosclerose, insuficiência cardíaca e infarto do miocárdio. Para atenuação de seus efeitos prejudiciais alternativas terapêuticas foram desenvolvidas com a finalidade de modular suas ações através da interferência seletiva sobre seus componentes ou em associações medicamentosas. Nos últimos anos, a descoberta de um novo eixo do SRA capaz de produzir efeitos opostos ao clássico possibilitou a análise de novas estratégias com alto potencial terapêutico. Estudos recentes sugerem que a estimulação deste novo eixo do sistema, pode contrabalancear os efeitos deletérios da via clássica. Nesta revisão será realizada uma breve explanação do sistema renina-angiotensina e serão abordadas as diferentes terapias, existentes e em fase experimental, para o tratamento das principais doenças cardiovasculares.

Palavras-Chave: Sistema renina-angiotensina (SRA), Angiotensina II (Ang II), Angiotensina-(1-7) [Ang-(1-7)], Inibidores daenzima conversora de angiotensina (IECA), Antagonistas dos receptores AT1 da angiotensina II (ARA II).

INTRODUÇÃO

Elemento crucial na regulação fisiológica e patológica das funções cardíacas, vasculares e renais1,2, o sistema renina-angiotensina (SRA) está envolvido no controle da pressão arterial e homeostase do corpo humano3,4.

Em resposta à hipotensão, ao aumento da atividade simpática e às alterações na concentração de cloreto de sódio (NaCl) vascular, o SRA é ativado, desencadeando uma sequência de ações consistentes, inicialmente culminando com a liberação da renina5,6.

Por sua vez, a renina, enzima proteolítica, é produzida e armazenada pelas células justaglomerulares do rim5, e secretada na corrente sanguínea com a função de converter o angiotensinogênio, uma alfa-2-globulina sintetizada principalmente no fígado, em angiotensina I (Ang I), um decapeptídeo pró-hormônio inativo7. Este, sob influência da enzima conversora de angiotensina (ECA), uma protease encontrada, sobretudo nas células endoteliais vasculares do pulmão, que cliva dois aminoácidos de sua extremidade, formando assim a angiotensina II (Ang II), um octapeptídeo fisiologicamente ativo8.

A Ang II, principal componente circulante gerado a partir do eixo tradicional do SRA, promove ações localmente, em nível de tecido, ou por meio do transporte de seus componentes na corrente sanguínea4,7,9.Tais ações, em sua maioria, são intermediadas pela ativação do receptor de Ang II do tipo 1 (AT1R), envolvido em respostas vasoconstritoras, pró-oxidantes e pró-inflamatórias, e receptor do tipo 2 (AT2R), que desempenha ações antagônicas se comparadas ao AT1R8,10,11.

Em condições de hiperatividade, o SRA contribui significativamente para uma série de eventos prejudiciais aos rins, vasos e coração, associados principalmente ao infarto do miocárdio, hipertrofia cardíaca, aterosclerose e insuficiênciacardíaca5,12.

Estudos realizados nas últimas décadas indicam a descoberta de uma nova via de sinalização envolvida na ativação do SRA8,11,13, capaz de hidrolisar a Ang I e Ang II a partir da enzima conversora de angiotensina 2 (ECA 2), formando um heptapeptídeo vasoativo, a angiotensina-(1-7) [Ang-(1-7)]. Este peptídeo exerce suas ações via receptor Mas (Figura 1), desempenhando um papel fundamental que contrapõe muitos efeitos da Ang II1,14, induzindo, entre outras funções, vasodilatação, natriurese e diurese10.

Entre as principais estratégias terapêuticas, envolvendo o sistema renina-angiotensina no tratamento das disfunções cardiovasculares, incluem-se: os inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), os antagonistas dos receptores AT1 da angiotensina II (ARA II), e os inibidores diretos de renina (IDR)15,16(Figura 1).

Figura 1: A cascata de funcionamento do sistema renina-angiotensina e suas interações medicamentosas. IDR, inibidor direto da renina; IECA, inibidor da enzima conversora de angiotensina; ECA e ECA 2, enzima conversora de angiotensina; ARA II, antagonista do receptor AT1 da angiotensina II; e AT1 e AT2, subtipos de receptores da angiotensina II. O símbolo vermelho indica inibição e o símbolo em verde estimulação.

Sabendo da importância do SRA nos distúrbios ligados ao sistema cardiovascular, bem como de seus componentes serem alvos nos principais tratamentos clínicos e protocolos medicamentosos de pacientes com disfunções cardiovasculares, torna-se necessário comparar o potencial terapêutico e os efeitos colaterais nas diferentes terapias de escolha. Sendo assim, o presente trabalho procurou revisar o papel das principais terapêuticas disponíveis na prática clínica e apontar perspectivas inovadoras para o desenvolvimento de novos medicamentos que atuem nas doenças do sistema cardiovascular por meio dos componentes do SRA.

METODOLOGIA

Foi realizada uma pesquisa bibliográfica mediante a busca eletrônica de artigos científicos indexados em quatro bases de dados (SciELO, PubMed, ResearchGate e Google Acadêmico), abrangendo publicações entre os anos de 1997 ao corrente ano de 2019, totalizando, portanto, um período de 22 anos.

O estudo compreendeu os trabalhos mais relevantes publicados originalmente na língua portuguesa e inglesa, a partir dos seguintes descritores: sistema renina-angiotensina (SRA), angiotensina II (Ang II), angiotensina-(1-7) [Ang-(1-7)], disfunções cardiovasculares, inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), antagonistas dos receptores AT1 da angiotensina II (ARA II), utilizados isoladamente e/ou em combinação.

A amostra abrangeu publicações de artigos selecionados a partir da leitura prévia de seus resumos anexados, e seguiram os seguintes critérios de inclusão: I) Artigos indexados em bases de dados científicas, II) Idiomas de publicação: foram selecionados artigos em língua portuguesa e inglesa, III) Ano de publicação: foram selecionados artigos publicados entre 1997 a 2019. Foram excluídos trabalhos que abordavam apenas a correlação do SRA e doenças renais, e artigos que descreveram apenas o polimorfismo no SRA. Portanto, após pré-análise e exploração do material, foram utilizados 37 artigos científicos nesta revisão de literatura. Os resultados encontrados serão separados abaixo em dois grandes tópicos, terapias convencionais e novas terapias em desenvolvimento.

TERAPIAS CONVENCIONAIS

As terapias convencionais atualmente disponíveis ainda envolvem o eixo clássico do sistema renina-angiotensina, utilizando os inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA), os antagonistas dos receptores AT1 da angiotensina II (ARA II) e os inibidores diretos de renina (IDR).

INIBIDOR DA ENZIMA CONVERSORA DE ANGIOTENSINA (IECA)

Na década de 1970 foi desenvolvida a primeira classe de medicamentos anti-hipertensivos: os inibidores da enzima conversora de angiotensina (IECA)17. Ao longo dos anos, sua utilização expandiu-se para o tratamento de diversas doenças cardiovasculares6,18.

Os IECAs diferem-se em relação à sua farmacocinética, farmacodinâmica e biodisponibilidade8, classificados em três subgrupos com base na sua estrutura química como demonstra a tabela 16,8.

Tabela 1: Subgrupos dos inibidores da enzima conversora de angiotensina.

Grupo sulfidrilo alacepril, altiopril, captopril, espirapril e zofenopril.
Grupo carboxilato benazepril, cilazapril, delapril, enalapril, lisinopril, moexipril, perindopril, quinapril, ramipril e trandolapril.
Grupo fosfanato fosinopril.

Fonte: Adaptado de VIJAYARAGHAVAN e DEEDWANIA (2011); HERAS e colaboradores (2012).

Esta classe de medicamentos é capaz de ligar-se competitivamente com o sítio de ação da ECA, impedindo a conversão de Ang I em Ang II6,8. Durante esta inibição ocorre uma diminuição da transformação das cininas, desta forma, o nível de bradicinina se eleva ocasionando efeitos benéficos como vasodilatação e redução da formação de coágulos sanguíneos6.

No primeiro momento, o bloqueio da enzima conversora de angiotensina leva a queda dos níveis de Ang II e elevação dos níveis de renina e Ang I devido a uma perda do mecanismo de feedback negativo18. Porém, a longo prazo, verifica-se que vias alternativas ocasionam um fenômeno de escape à ECA que induz a normalização nos níveis de Ang II, uma vez que o bloqueio pelos IECA se restringe à via clássica19.

A terapêutica com IECA possui grande aceitabilidade dentre os usuários17. Entretanto, reações adversas podem ocorrer, sendo as mais relevantes: tosse seca causada pelo aumento nos níveis de bradicinina17,20, alteração do paladar caracterizado por sabor metálico, erupções cutâneas, hipotensão, hipercaliemia e, em casos mais raros, angiodema, toxicidade hepática e insuficiência renal10,18. Sua utilização é contraindicada em indivíduos que apresentem estenose das artérias renais e durante a gravidez18,20.

Os inibidores da ECA apresentam atualmente a melhor terapêutica de escolha para as disfunções cardiovasculares17, atuando na reabilitação das funções endoteliais por meio da redução da pressão arterial e da espessura da camada íntima das artérias, reduzindo assim a possibilidade de desenvolvimento e progressão da placa aterosclerótica6,7,21. Desempenham ainda ações cardioprotetoras, proporcionando efeito antimitogênico no músculo cardíaco, dificultando a ocorrência de hipertrofia e favorecendo a cicatrização após o infarto do miocárdio10,22, portanto, possuem potencial de aumentar a sobrevida de seus usuários18.

ANTAGONISTA DO RECEPTOR AT1 DA ANGIOTENSINA II (ARA II)

Grande parte dos efeitos prejudiciais da Ang II no organismo é mediada pelo receptor do tipo AT1 (AT1R)11. Neste contexto, no início dos anos 90 foram desenvolvidos os antagonistas do receptor AT1 da Ang II (ARA II) que atuam de forma seletiva11,18. Os principais fármacos atualmente disponíveis desta classe são: azilsartan, candesartan, eprosartan, irbesartan, losartan, olmesartan, telmisartan e valsartan6,8,17.

Por meio do bloqueio ocasionado pelos ARA II, os níveis de Ang II livres se elevam, já que o receptor AT1 se encontra indisponível, resultando num desvio deste peptídeo para os receptores do tipo AT223,24, que produzem respostas opostas ao AT1R, destacando-se a vasodilatação10. Desta forma, é possível que os receptores AT2 auxiliem no efeito terapêutico dos ARA II ainda que sua função fisiopatológica não esteja completamente esclarecida8.

Estes antagonistas são uma alternativa para indivíduos intolerantes aos inibidores da ECA, já que devido sua alta seletividade não ocasionam tosse seca6,10. As principais reações adversas atribuídas aos ARA II são: hipotensão sintomática em pacientes que fazem uso de diuréticos em altas doses, hipercaliemia em portadores de doença renal, cefaleia, tontura, dor nas costas, distúrbios gastrointestinais e, raramente, hipersensibilidade cutânea, sendo contraindicados para o uso de gestantes10,18,20.

O principal efeito terapêutico dos ARA II é uma intensa vasodilatação com redução da pré e pós-carga, proporcionando baixa da tensão na parede sistólica e volume diastólico, além de melhoria na remodelação vascular8,10. Demonstram eficácia no tratamento de hipertensão arterial, insuficiência cardíaca congestiva, disfunção ventricular esquerda, pós-infarto do miocárdio e na prevenção do acidente vascular encefálico2,20.

INIBIDOR DIRETO DA RENINA (IDR)

Tendo em vista que a renina é fundamental para a síntese de Ang I e Ang II na via clássica do sistema renina-angiotensina, em teoria, seu bloqueio seria o mais eficiente para atenuação dos efeitos deletérios desse sistema no organismo6,16. Contudo, a elaboração de um inibidor direto da renina (IDR) clinicamente efetivo foi retardada pela dificuldade de se efetuar testes em modelos animais, mesmo que transgênicos, devido à alta especificidade de ligação entre a renina humana e o angiotensinogênio, bem como a complexidade de geração de uma droga farmacologicamente adequada16.

No ano de 2007 foi aprovado pela Food and Drug Administration nos Estados Unidos o uso do primeiro IDR, o aliscireno, como terapia para a hipertensão primária4,23-25. Este fármaco atua como um forte inibidor competitivo de renina impossibilitando a conversão do angiotensinogênio e, por conseguinte, descontinuando a sequência de eventos do SRA8,18. Ainda estão em estudos outros possíveis resultados desta inibição, como a diminuição da renina plasmática e o bloqueio de seu receptor20.

O aliscireno possui boa tolerabilidade com raras interrupções de tratamento, entretanto alguns efeitos colaterais foram relatados: diarreia, quando em superdosagem, erupção cutânea, cefaleia, nasofaringite, aumento de creatinofosfoquinase e angiodema16,26, sendo seu uso impróprio para gestantes20.

Diversas pesquisas em modelos animais ainda estão em desenvolvimento para a comprovação da eficácia do aliscireno como terapia de disfunções cardiovasculares, incluindo a progressão da placa aterosclerótica, insuficiência e remodelação cardíaca2,20. Em ensaios clínicos de curta duração com murinos e coelhos foi encontrado efeito positivo, reduzindo a morbidade cardiovascular e hipertrofia do ventrículo esquerdo, que segundo os autores está associada à diminuição da ativação imunitária inata, do estresseoxidativo e da fibrose16,20. Outros estudos com baixas doses de aliscireno em ratos transgênicos hipertensos demonstraram uma redução na remodelação cardíaca estrutural e da atividade elétrica, levando a crer que tal fármaco apresenta efeitos intrínsecos no coração2.

MULTITERAPIA

A monoterapia atual, apesar de eficiente, é limitada e apresenta falhas4. Sendo assim, foi considerada o uso da multiterapia com o objetivo de tornar o bloqueio do SRA mais satisfatório4,20,27.Um dos objetivos da combinação do IECA com ARA II é impedir a geração da Ang II por vias alternativas e assim proporcionar uma inibição mais completa sobre o SRA6,8.

Estudos relataram uma redução expressiva da pressão arterial e da mortalidade por doenças cardiovasculares através desta associação medicamentosa27. Por outro lado, foram descritos riscos de hipercaliemia, insuficiência renal crônica e hipotensão sintomática como efeitos colaterais8. Portanto, doses menores destes fármacos podem apresentar melhor equilíbrio entre o resultado terapêutico e o adverso18,20.

Tendo em vista que o uso monoterápico de IECA e ARA II elevam a renina plasmática, a associação destes com o IDR podem apresentar – ao menos em teoria – efeitos complementares benéficos16. De acordo com Giestas e colaboradores18 (2010) o uso concomitante de tais terapias em pacientes com disfunções cardiovasculares demonstrou redução da hipertensão, hipertrofia e insuficiência cardíaca.

NOVAS TERAPIAS EM DESENVOLVIMENTO

ANGIOTENSINA-(1-7) [ANG-(1-7)]

No final da década de 1980, a descoberta da Ang-(1-7)28, um heptapeptídeo vasoativo, formada a partir da Ang II por meio da enzima conversora de angiotensina II (ECA 2)11,29, comprovou a existência de uma segunda via do sistema renina-angiotensina, capaz de equilibrar os efeitos do eixo clássico no organismo24.

No ano de 1986 foi identificado um receptor acoplado à proteína G denominado Mas30. Todavia, somente em 2003 elucidou-se que grande parte das ações da Ang-(1-7) são mediadas por ativação deste receptor14,31, que proporciona respostas vasodilatadoras e anti-hipertensivas capazes de contrabalancear a atividade do eixo Ang II/receptor AT18,14.

Em estudos posteriores foi observado que a ligação da Ang-(1-7) ao receptor Mas ocasiona a liberação de óxido nítrico promovendo ações antiploriferativas das células do músculo liso vascular, vasodilatação7,14,24, efeitos anti-fibróticos e anti-trombóticos, desempenhando assim um papel importante nas funções cardíacas3,8,32, tornando este novo eixo um importante e potencial alvo terapêutico23.

Conforme Jiang e colaboradores1 (2014) e De Mello2 (2017), o uso de Ang-(1-7) em modelos animais evitou a progressão das lesões ateroscleróticas, reduziu a ocorrência de insuficiência cardíaca após o infarto do miocárdio e aumentou a perfusão coronariana bem como a atividade endotelial da aorta. Outros resultados obtidos por De Castro33 (2008) indicaram que o eixo Ang-(1-7)/Mas apresentou atividade fundamental durante a isquemia facilitando a remodelação cardíaca e a modulação da função endotelial.

Experimentos efetuados em camundongos Mas knockout revelaram um aumento da resistência vascular, local e sistêmica, e redução do débito cardíaco, indicando assim um importante papel deste receptor na manutenção hemodinâmica13. Devido à capacidade de vasodilatação da Ang-(1-7), foram realizados ensaios em pacientes com pré-eclâmpsia demonstrando resultados positivos após a administração intravenosa de uma formulação de Ang-(1-7)3.

Sem dúvida, a utilização terapêutica da Ang-(1-7) e de fármacos que estimulem a atividade da ECA 28, são alternativas promissoras para o tratamento das disfunções cardiovasculares por meio da regulação da pressão arterial, da recuperação da função cardíaca e endotelial14,31,34.

RECEPTOR DA ANGIOTENSINA II DO TIPO 2 (AT2R)

A descoberta do receptor da Ang II do tipo 2, já no início da década de 1990, contribuiu para evidenciar novos efeitos desse peptídeo além dos previamente conhecidos associados ao AT1R32,35. Este receptor é expresso de forma abundante no período fetal, tendo uma marcante redução após o nascimento18,24. Entretanto, na fase adulta, o AT2R volta a ser expresso notavelmente em alguns estados patológicos, como na insuficiência cardíaca, no infarto do miocárdio e nas lesões cerebrais e vasculares7.

Análises sugerem que o AT2R modula respostas anti-inflamatórias, antiproliferativas, antioxidantes, vasodilatadoras e neuroregenerativas que contrapõem os efeitos do AT1R17,26,36. Experimentos in vitro e in vivo propõem que a ativação do receptor AT1 module a expressão do AT2, presumindo, assim, a existência de um mecanismo intrínseco capaz de articular os efeitos da Ang II no sistema cardiovascular14,37.

O uso de agonistas do receptor AT2 representa uma nova alternativa, ainda em desenvolvimento, de grande potencial terapêutico para o tratamento de diversas disfunções cardiovasculares7,8,14.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O sistema renina-angiotensina (SRA), por meio de seus componentes, é capaz de gerar eventos benéficos e/ou prejudiciais ao sistema cardiovascular. Sabendo disto, foram criadas terapias utilizando IECA, ARA II e IDR com a finalidade de bloquear de forma parcial seu eixo clássico. Entretanto, por não exercerem sua eficácia de forma satisfatória em todos os pacientes ou apresentarem efeitos adversos, a busca por novas alternativas terapêuticas continua. Novos tratamentos, como a estimulação do receptor AT2 e do eixo Ang-(1-7)/Mas tornaram-se uma perspectiva promissora para o desenvolvimento de futuros medicamentos, e uma esperança para pacientes refratários às terapias existentes. Deste modo, novos estudos experimentais e ensaios clínicos são necessários para avaliar cuidadosamente as vantagens dessas terapêuticas nas disfunções cardiovasculares.

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32. RIGATTO, K.V.; BÖHLKE, M.; IRIGOYEN, M.C. Sistema renina angiotensina: da fisiologia ao tratamento. Revista da Sociedade de Cardiologia do Rio Grande do Sul, v. 13, n. 3, p. 1-5,2004.

33. DE CASTRO, C.H. Avaliação dos efeitos da angiotensina-(1-7) e do seu receptor Mas no controle da função cardíaca utilizando animais geneticamente modificados. Belo Horizonte. Universidade Federal de Minas Gerais; 2008.

34. SANTOS, R.A.S.; SAMPAIO W.O.; ALZAMORA, A.C.; MOTTA-SANTOS, D.; ALENINA, N.; BADER, M. et al. The ACE2/Angiotensin-(1-7)/MAS Axis of the Renin-Angiotensin System: Focus on Angiotensin-(1-7). Physiological Reviews, v. 98, n. 1, p. 505-553, 2018.

35. DOSTAL, D.E.; BAKER, K.M. The Cardiac Renin-Angiotensin System Conceptual, or a Regulator of Cardiac Function?. Circulation Research, v. 85, n. 7, p. 643-650, 1999.

36. TE RIET, L.; VAN ESCH, J.H.; ROKS, A.J.; VAN DEN MEIRACKER, A.H.; DANSER, A.H. Hypertension: Renin–Angiotensin-Aldosterone System Alterations. Circulation Research, v. 116, n. 6, p. 960-975, 2015.

37. CUNHA, R.S.; FERREIRA, A.V.L. Sistema renina-angiotensina-aldosterona e lesão vascular hipertensiva. Revista Brasileira de Hipertensão, v. 7, n. 3, p. 282-292, 2000.

ANEXO

Figure in English

Figure 1: The functioning cascade of the renin-angiotensin system and its drug interactions. DRI, direct renin inhibitor; ACEI, angiotensin converting enzyme inhibitor; ACE and ACE 2, angiotensin converting enzyme; ARB, angiotensin II AT1 receptor blocker; AT1 and AT2, angiotensin II receptor subtypes type 1 and type 2, respectively. The red symbol indicates inhibition and the green stimulation of each component.

[1] Graduando em Biomedicina da Faculdade de São Lourenço – UNISEPE.

[2] Graduanda em Biomedicina da Faculdade de São Lourenço – UNISEPE.

[3] Graduando em Biomedicina da Faculdade de São Lourenço – UNISEPE.

[4] Farmacêutica, Bioquímica, Docente da Faculdade de São Lourenço – UNISEPE.

[5] Biólogo, mestre e doutor em Fisiologia e Farmacologia UFMG, Professor da Faculdade de São Lourenço – UNISEPE.

[6] Fisioterapeuta, mestre e doutor em Fisiologia e Farmacologia UFMG, Professor Associado do Depto. de Fisiologia & Biofísica do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais e Pesquisador nível ” 1B ” do CNPq. É Membro da Sociedade Brasileira de Fisiologia e Regular Member da American Physiological Society. Com Pós-doutorado na área de Neurociência Cardiovascular na University of Sydney, Austrália.

[7] Fisioterapeuta, Mestre e Doutora em Fisiologia e Farmacologia UFMG, Docente da Faculdade de São Lourenço – UNISEPE.

Enviado: Novembro, 2019.

Aprovado: Novembro, 2019.

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Fernanda Ribeiro Marins

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