REVISTACIENTIFICAMULTIDISCIPLINARNUCLEODOCONHECIMENTO

Revista Científica Multidisciplinar

Pesquisar nos:
Filter by Categorias
Administração
Administração Naval
Agronomia
Arquitetura
Arte
Biologia
Ciência da Computação
Ciência da Religião
Ciências Aeronáuticas
Ciências Sociais
Comunicação
Contabilidade
Educação
Educação Física
Engenharia Agrícola
Engenharia Ambiental
Engenharia Civil
Engenharia da Computação
Engenharia de Produção
Engenharia Elétrica
Engenharia Mecânica
Engenharia Química
Ética
Filosofia
Física
Gastronomia
Geografia
História
Lei
Letras
Literatura
Marketing
Matemática
Meio Ambiente
Meteorologia
Nutrição
Odontologia
Pedagogia
Psicologia
Química
Saúde
Sem categoria
Sociologia
Tecnologia
Teologia
Turismo
Veterinária
Zootecnia
Pesquisar por:
Selecionar todos
Autores
Palavras-Chave
Comentários
Anexos / Arquivos

Overlap Myasthenic Syndrome Associada a Síndrome de Sjögren: Relato de Caso

RC: 13622
147
5/5 - (3 votes)
DOI: ESTE ARTIGO AINDA NÃO POSSUI DOI
SOLICITAR AGORA!

CONTEÚDO

PORTELA, Felipe Queiroz [1], RABELO, Ronaldo Marques Pontes [2], OLIVEIRA, Mariza Marques [3], RODRIGUES, Marcus Vinicius Gomes [4], SOUSA, Nise Alessandra de Carvalho [5], GALVÃO, Maria de Lourdes de Souza [6], VIEIRA, Aline Ferreira  [7], TAKATANI, Massanobu  [8]

PORTELA, Felipe Queiroz; et.al. Overlap Myasthenic Syndrome Associada a Síndrome de Sjögren: Relato de Caso. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 03, Ed. 02, Vol. 02, pp. 146-152, Fevereiro 2018. ISSN:2448-0959

RESUMO

A Miastenia Gravis e a Síndrome de Eaton Lambert são doenças caracterizadas por fraqueza muscular flutuante devido distúrbio da transmissão do impulso nervoso na junção neuromuscular. Ambas as doenças são mediadas por auto-anticorpos, e é possível a associação delas com outros distúrbios autoimunes. Este relato descreve o caso de uma paciente, de 39 anos de idade, que evoluía há 3 anos com quadro de redução progressiva da força muscular de predomínio proximal, que piorava ao final do dia; a mesma foi submetida à investigação neurológica e preencheu critérios para os diagnósticos de Miastenia Gravis e Síndrome de Eaton Lambert – quadro conhecido como Overlap Myasthenic Syndrome –, condição com poucos casos descritos. Além do diagnóstico acima, também havia critérios para o diagnóstico de Síndrome de Sjögren, e se optou pelo tratamento com imunossupressor oral e Imunoglobulina Humana intravenosa com melhora parcial dos sintomas.

Palavras-Chave: Miastenia Gravis, Síndrome de Eaton Lambert, Overlap Myasthenic Syndrome, Síndrome de Sjögren.

INTRODUÇÃO

A Miastenia Gravis (MG) e a Síndrome de Eaton-Lambert (SEL) são distúrbios que acometem a junção neuromuscular com fisiopatologia distinta (KIM et al., 2012). A MG é uma doença mediada por anticorpos, caracterizada por fraqueza muscular flutuante e que melhora com o uso de substâncias que agem inibindo a enzima acetilcolinesterase e é considerada um distúrbio da transmissão neuromuscular com envolvimento pós-sináptico (BRASIL NETO, 2013; HAUSER, 2015; ROWLAND, 2011). Tais anticorpos agem contra os receptores nicotínicos de acetilcolina na junção neuromuscular ou contra a tirosinaquinase específica do músculo; alguns casos não apresentam anticorpos mensuráveis (BRASIL NETO, 2013; HAUSER, 2015; KIM et al., 2012; ROWLAND, 2011). Diferente da MG, a SEL possui anticorpos dirigidos contra os canais de cálcio sensíveis a voltagem do tipo P/Q na membrana pré-sináptica gerando uma liberação inadequada de acetilcolina na junção neuromuscular, podendo determinar sintomas autonômicos com maior frequência que a MG (BRASIL NETO, 2013; HAUSER, 2015; ROWLAND, 2011).

Ambas as doenças apresentam associação com outros distúrbios autoimunes e com hiperplasia tímica, e podem ser a apresentação inicial de neoplasias como o timoma, observado principalmente na MG, e o carcinoma de pequenas células do pulmão como causa de SEL (BRASIL NETO, 2013; HAUSER, 2015; ROWLAND, 2011; ROOHI et al., 2006; ZHANG et al., 2015). A associação entre essas duas doenças da junção neuromuscular é rara, e é denominada como Overlap Myasthenic Syndrome (OMS). Existem poucos casos descritos na literatura de OMS, sendo de fundamental importância testes eletrofisiológicos e quantificação de anticorpos séricos para distinguir tais processos patológicos (KIM et al., 2012; ROOHI et al., 2006). Dentre os distúrbios autoimunes que podem estar associados a essas doenças está a Síndrome de Sjögren, condição auto-imune que causa disfunção das glândulas salivares e lacrimais (SHIBOSKI et al., 2016). Nesse trabalho descrevemos uma paciente com diagnóstico dessas duas doenças da junção neuromuscular associado a síndrome de Sjögren.

RELATO DE CASO

Uma mulher de 39 anos de idade, sem comorbidades prévias, evoluía há 2 anos com quadro de paraparesia de predomínio proximal, mais acentuada ao final do dia, com progressão para tetraparesia também de predomínio proximal e discreta ptose palpebral à esquerda. Não apresentava sintomas sensitivos, visuais, bulbares ou de comprometimento de musculatura respiratória. Diante do quadro, foi aventada a hipótese de síndrome miastênica e iniciada a investigação com exames complementares. Inicialmente se obteve dosagem do anticorpo anti-receptor de acetilcolina igual a 18,70 nmol/L (valor de referência inferior a 0,45 nmol/L). Desta forma, a paciente recebeu o diagnóstico de MG, e foi instituído o tratamento com piridostigmina oral (fármaco inibidor da acetilcolinesterase, enzima responsável pela degradação da acetilcolina na fenda sináptica), porém a resposta clínica foi pobre, o que não é esperado para pacientes portadores dessa enfermidade. Com o decorrer da investigação diagnóstica a paciente foi submetida à eletroneuromiografia dos 4 membros, que demonstrou potenciais de ação polifásicos com amplitude e duração diminuídas e teste de estimulação repetitiva com facilitação pós esforço, com incremento de aproximadamente 206% na amplitude, a qual passou de 940 mcV para 1,9 mV no nervo ulnar direito com registro no músculo abdutor do dedo mínimo. Tal resultado é compatível com SEL mas não com MG. Diante do exuberante quadro motor, optou-se pela terapia com Imunoglobulina Humana Intravenosa (IVIg), na dose de 400 mg/kg por dia, durante 5 dias, com frequência mensal, e uso diário de piridostigmina 360 mg fracionada em quatro tomadas, somada a prednisona 60 mg. Este regime terapêutico trouxe melhora importante na sintomatologia motora da paciente: a mesma estava dependente de cadeira de rodas para locomoção antes do tratamento, e passou a deambular com apoio unilateral. Após um mês da primeira infusão de IVIg, a terapia de manutenção pôde ser ajustada para 40 mg/dia de prednisona e 450 mg/dia, fracionada em cinco tomadas, de piridostigmina.

Ao longo das internações para infusão da IVIg, a paciente queixava de xerostomia e xeroftalmia, e apresentava bradicardia sinusal com síndrome de baixo débito, resolvida após implante de marca-passo definitivo. Devido à forte associação classicamente descrita entre SEL e neoplasias e outras doenças autoimunes, a paciente foi submetida a exames de triagem para neoplasias e dosagem de marcadores de autoimunidade, e assim foram identificadas: hiperplasia tímica em tomografia de tórax; sialoadenite crônica em material obtido de biopsia de glândulas salivares (representada por ácinos descaracterizados, ductos dilatados e ectásicos, septos espessados, fibrose periacinar e periductal de permeio a infiltrado inflamatório crônico difuso); e ceratoconjutivite seca após avaliação especializada, o que permitiu a confirmação dos critérios para Síndrome de Sjögren.

A paciente recebeu 3 infusões mensais com IVIg na fase de indução do tratamento, seguida por infusões trimestrais, e foi indicada a timectomia devido hiperplasia tímica, titulação positiva do anticorpo anti-receptor de acetilcolina, e quadro clínico debilitante. Durante os intervalos de entre as infusões de IVIg, notou-se piora da fraqueza muscular, antes do prazo para nova infusão, denotando a necessidade de terapia de manutenção com imunossupressor. Optou-se pelo uso da azatioprina e redução gradual da dose da prednisona. A paciente manteve a resposta parcial dos sintomas miastênicos ao longo do tratamento, e continuou com necessidade de apoio unilateral para deambulação. A timectomia não foi realizada no momento da indicação devido a bradicardia; e a paciente permanece na fila de espera para realização do procedimento.

DISCUSSÃO

O caso mostra uma paciente que apresentou a associação entre patologias de origem autoimune, quadro classicamente encontrado mais no sexo feminino (TÉLLEZ-ZENTENO et al., 2004). A apresentação clínica exibiu padrão ascendente de acometimento muscular, o que é observado com maior frequência nos pacientes com SEL quando comparados àquele dos portadores de MG, a qual tendem a apresentar progressão craniocaudal (KIM et al., 2012; ROOHI et al., 2006; ZHANG et al., 2015). A investigação mostrou a presença de altos títulos de anticorpos anti-receptor de acetilcolina; tal achado é bem associado à forma mais comum de MG, encontrado em 85% dos pacientes com essa condição (OH, 2016; ROOHI et al., 2006). O fato da paciente apresentar eletroneuromiografia com potenciais de ação com amplitude reduzida e incremento ao teste pós esforço superior a 100% demonstrou que essa paciente não só apresentava MG, como também critérios clínicos e eletrofisiológicos para a SEL. Estas alterações no estudo eletrofisiológico possuem sensibilidade entre 84% a 96%, e a presença de incrementos do potencial de ação muscular acima de 100% são praticamente patognomônicos da doença (KIM et al., 2012; MINATO et al., 2015; OH, 2016; ZHANG et al., 2015).

Uma parcela dos pacientes portadores de MG apresentam, assim como nesse caso, hiperplasia tímica, e em pacientes com SEL, é primordial a investigação para neoplasias, que estão presentes em até metade dos pacientes, sobretudo o carcinoma de pequenas células pulmonares (MINATO et al., 2015; OH, 2016; ZHANG et al., 2015). A literatura mostra que pacientes com OMS apresentam maior incidência de outras doenças autoimunes; isso também foi observado em nossa paciente, já que haviam critérios suficientes para o diagnóstico de Síndrome de Sjögren (HUGHES, 1986; MINATO et al., 2015; ROOHI et al., 2006; SHIBOSKI et al., 2016; TÉLLEZ-ZENTENO et al., 2004; ZHANG et al., 2015). Minato et al. (2015) descreveu também uma associação entre hiperplasia tímica e Síndrome de Sjögren mostrando que essas condições podem apresentar um processo fisiopatológico em comum.

A paciente descrita nesse trabalho apresentou resposta insatisfatória com o tratamento sintomático com a piridostigmina. Isto não é comum em pacientes com MG, portanto justifica a investigação para outras morbidades associadas permitindo a continuidade da realização de exames, culminando no achado peculiar da SEL na eletroneuromiografia. Os sintomas musculares da SEL pouco respondem à piridostigmina, mas respondem satisfatoriamente a 3,4-diaminopiridina, droga que não está disponível no Brasil (OH, 2016). A terapia inicial para o controle da atividade das doenças foi realizada com Imunoglobulina Humana Intravenosa mensal por 3 meses, seguida por infusão trimestral, na dose de 400 mg/kg/dia, associado a doses imunossupressoras de prednisona e posterior introdução da azatioprina, com dose alvo entre 2 e 3 mg/kg/dia, como poupador de corticoide; esquemas diferentes de uso desses tratamentos também foram descritas na literatura, porém, devido à raridade dessa associação de doenças, não há evidência científica de qualidade sobre qual seria a melhor opção terapêutica para esses pacientes (ROOHI et al., 2006). Não se sabe ainda quais são os reais mecanismos que levam a associação dessas doenças, porém sabe-se da associação dessas síndromes miastênicas com outras doenças autoimunes conforme observado também nesse caso (KIM et al., 2012; MINATO et al., 2015; ROOHI et al., 2006).

CONCLUSÃO

A paciente aqui relatada apresentou quadro clínico, confirmado em exames complementares, de MG associada a SEL, determinando uma condição conhecida na literatura como Overlap Myasthenic Syndrome; esta condição é bastante rara, conforme demonstrado no trabalho de Oh (2016), que encontrou somente 39 casos que contemplavam os critérios diagnósticos para as duas doenças. Além desta incomum associação de síndromes miastênicas, a paciente relatada também apresentava síndrome de Sjögren, outra condição autoimune associada à MG descrita na literatura.

REFERÊNCIAS

BRASIL NETO, J. P.; TAKAYANAGUI, O. M. Tratado de Neurologia da Academia Brasileira de Neurologia. In: DIAS-TOSTA, E.; LENZI, H. L.; FERNANDEZ, R. M. Miastenia Grave Adquirida e Síndromes Miastênicas Autoimunes. 1. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013. cap. 75.

HAUSER, S. L.; JOSEPHSON, S. A. Neurologia Clínica de Harrison. In: DRACHMAN, D. B. Miastenia Gravis e Outras Doenças da Junção Neuromuscular. 18. ed. Porto Alegre: AMGH, 2015. cap. 47.

HUGHES, R. L.; KATIRJI, B. The Eaton-Lambert (Myasthenic) Syndrome In Association With Systemic Lupus Erythematosus. Arch Neurol, v. 43, p. 1186-1187, 1986.

KIM, J. et al. A Patient with Coexisting Myasthenia Gravis and Lambert-Eaton Myasthenic Syndrome. J Clin Neurol, v. 8, p. 235-237, 2012.

MINATO, H. et al. Thymic Lymphoid Hyperplasia With Multilocular Thymic Cysts Diagnosed Before The Sjögren Syndrome Diagnosis. Diagnostic Pathology, v. 10, n. 103, p 1-6, 2015.

OH, S. J. Myasthenia Gravis Lambert-Eaton Overlap Syndrome. Muscle Nerve, v. 53, p. 20-26, 2016.

OH, S.J.; SHER, E. MG And LEMS Overlap Syndrome: Case Report With Electrophysiological And Immunological Evidence. Clinical Neurophysiology, v. 116, p. 1167-1171, 2005.

ROOHI, F. et al. A Diagnostic And Management Dilemma Combined Paraneoplastic Myasthenia Gravis And Lambert-Eaton Myasthenic Syndrome Presenting As Acute Respiratory Failure. The Neurologist, v. 12, n. 6, p. 322-326, 2006.

ROWLAND, L. P.; PEDLEY, T. A. Merrit Tratado de Neurologia. In: PENN, A. S.; ROWLAND, L. P. Miastenia Gravis. 12. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011. cap. 136.

ROWLAND, L. P.; PEDLEY, T. A. Merrit Tratado de Neurologia. In: PENN, A. S. Síndrome de Lambert-Eaton. 12. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011. cap. 137.

SHIBOSKI, C. H. et al. 2016 American College Of Rheumatology/European League Against Rheumatism Classification Criteria For Primary Sjögren’s Syndrome. Arthritis & Rheumatology, v. 0, n. 0, p 1-11, 2016.

TÉLLEZ-ZENTENO, J. F. et al. Associated Conditions In Myasthenia Gravis: Response To Thymectomy. European Journal of Neurology, v. 11, p. 767-733, 2004.

ZHANG, K. et al. Mediastinal Small Cell Cancer Associated With Lambert-Eaton Myasthenic Syndrome: A Case Report. Experimental And Therapeutic Medicine, v. 10, p. 117-120, 2015.

[1] Médico Residente de Neurologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas

[2] Médico Residente de Neurologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas

[3] Médico Neurologista pelo Hospital Universitário Getúlio Vargas

[4] Médico Neurologista pelo Hospital Universitário Getúlio Vargas

[5] Médica Neurologista supervisora do programa de residência médica em Neurologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas

[6] Médico Neurologista do Hospital Universitário Getúlio Varga

[7] Médico Neurologista do Hospital Universitário Getúlio Varga

[8] Médico Neurologista do Hospital Universitário Getúlio Varga

5/5 - (3 votes)
Felipe Queiroz Portela

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

POXA QUE TRISTE!😥

Este Artigo ainda não possui registro DOI, sem ele não podemos calcular as Citações!

SOLICITAR REGISTRO
Pesquisar por categoria…
Este anúncio ajuda a manter a Educação gratuita