REVISTACIENTIFICAMULTIDISCIPLINARNUCLEODOCONHECIMENTO

Revista Científica Multidisciplinar

Pesquisar nos:
Filter by Categorias
Administração
Administração Naval
Agronomia
Arquitetura
Arte
Biologia
Ciência da Computação
Ciência da Religião
Ciências Aeronáuticas
Ciências Sociais
Comunicação
Contabilidade
Educação
Educação Física
Engenharia Agrícola
Engenharia Ambiental
Engenharia Civil
Engenharia da Computação
Engenharia de Produção
Engenharia Elétrica
Engenharia Mecânica
Engenharia Química
Ética
Filosofia
Física
Gastronomia
Geografia
História
Lei
Letras
Literatura
Marketing
Matemática
Meio Ambiente
Meteorologia
Nutrição
Odontologia
Pedagogia
Psicologia
Química
Saúde
Sem categoria
Sociologia
Tecnologia
Teologia
Turismo
Veterinária
Zootecnia
Pesquisar por:
Selecionar todos
Autores
Palavras-Chave
Comentários
Anexos / Arquivos

Avaliação das medidas estáticas aferidas pelo POP-Q em mulheres ribeirinhas e urbanas da Amazônia

RC: 59097
289
5/5 - (1 vote)
DOI: ESTE ARTIGO AINDA NÃO POSSUI DOI
SOLICITAR AGORA!

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

RÊGO, Aljerry Dias do [1], OLIVEIRA, Yasmin Cristina [2], NASCIMENTO, Lucas Corrêa do [3], BATISTA, Thayna Almeida [4]

RÊGO, Aljerry Dias do. Et al. Avaliação das medidas estáticas aferidas pelo POP-Q em mulheres ribeirinhas e urbanas da Amazônia. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 08, Vol. 10, pp. 83-95. Agosto de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/medidas-estaticas

RESUMO

As medidas estáticas são importantes para avaliar o grau de prolapso de órgão pélvico feminino. O objetivo desse trabalho é avaliar o comprimento vaginal total (CVT), hiato genital (HG) e corpo perineal (CP) aferidas pelo Pelvic Organ Prolapse – Quantification (POP-Q) em mulheres das regiões urbana e ribeirinha do Estado do Amapá, Brasil. Foi realizado estudo transversal com 380 mulheres ≥ 20 anos, divididas em 2 grupos: urbano (cidade de Macapá; n = 260) e ribeirinho (arquipélago do Bailique; n = 120). Jovens (< 20 anos), grávidas, portadoras de alterações anatômicas ou de fístulas urinárias foram excluídas. A avaliação dos fatores de risco para prolapso e a aferição de CVT, HG e CP foram realizadas pelo mesmo ginecologista. A idade média foi 37,10 (ribeirinho) e 38,00 (urbano) anos. Multiparidade (75,8% x 53,4%; p < 0,001), parto normal (5,1 x 2,7; p < 0,001) e domiciliar (75,8% x 20,0%; p < 0,001) foram mais prevalentes no grupo ribeirinho. Não houve diferença de HG (2,12±0,90 cm urbanas x 2,10±1,25 em ribeirinhas, p = 0,123) e CP (3,07±0,49 cm urbanas x 3,08±0,49 cm ribeirinhas, p = 0,590), somente o CVT apresentou-se maior na população ribeirinha (10,13±1,57 cm x 8,78±1,68 cm; p < 0,001). Por fim, aspectos demográficos e fatores de risco para prolapso não alteram as medidas estáticas aferidas pelo POP-Q entre mulheres moradoras de comunidades urbana e ribeirinha da Amazônia Brasileira.

Palavras-chave: Períneo, população urbana, saúde da mulher, ecossistema amazônico.

INTRODUÇÃO

O prolapso de órgão pélvico (POP) pode ser definido como a descida da parede vaginal anterior e / ou posterior, bem como do colo do útero ou da cúpula vaginal após histerectomia (HAYLEN et al., 2016; JELOVSEK et al., 2007).

Embora a etiologia do POP seja considerada complexa e multifatorial, alguns fatores de risco classicamente predispõem ao seu surgimento, como multiparidade, parto vaginal, menopausa, distúrbios do tecido conjuntivo, predisposição genética, obesidade ou outros fatores ligados ao aumento da pressão intra-abdominal (DIETZ, 2008; JELOVSEK et al., 2007; VERGELDT et al., 2015).

O POP torna-se cada vez mais frequente à medida que a transição demográfica avança, com o aumento da população idosa (SUBAK et al., 2001). Estima-se que cerca de 75% das mulheres entre 45 e 85 anos de idade apresentem algum grau de prolapso (HOVE et al., 2009) e sabe-se que a incidência durante o exame clínico com o POP-Q pode variar de 14 a 50% (GLAZENER et al., 2013; GYHAGEN et al., 2013; SMITH et al., 2010).

A prevalência de sintomas, porém, é muito menor (3 – 6%) (BARBER; MAHER, 2013). Quando presentes, os sintomas podem se associar às estruturas envolvidas no prolapso, como ver ou sentir uma protuberância vaginal, ou à disfunção do assoalho pélvico, como queixas urinárias, defecatórias ou sexuais (JELOVSEK et al., 2007), e impõem um alto impacto negativo na qualidade de vida das mulheres (SRIKRISHNA et al., 2008).

O grau de prolapso é frequentemente avaliado usando o sistema Pelvic Organ Prolapse – Quantification (POP-Q), conforme recomendado pela International Continence Society (BUMP et al., 1996).

A avaliação do prolapso genital é feita a partir de um ponto anatômico fixo, a carúncula himenal (posição zero). A partir desse ponto, as posições são dadas em centímetros, com números negativos em locais acima do hímen e em números positivos quando distais ao hímen. São avaliados 6 pontos dinâmicos:  parede vaginal anterior (Aa/Ba) e posterior (Ap/Bp), cúpula ou colo uterino (C) fórnice posterior da vagina (D). Os 3 pontos estáticos são:  hiato genital (HG), corpo perineal (CP) e comprimento vaginal total (CVT) (BUMP et al., 1996; HAYLEN et al., 2016).

O objetivo do presente estudo foi comparar as medidas estáticas pelo sistema POP-Q em mulheres moradoras da cidade de Macapá e mulheres moradoras de uma comunidade ribeirinha do estado do Amapá.

MATERIAIS E MÉTODOS

Esse é um estudo transversal comparando duas populações: mulheres moradoras de um centro urbano (cidade de Macapá/AP) e de uma comunidade ribeirinha (Bailique/AP).

O cálculo amostral foi realizado com base na população feminina com mais de 20 anos, sendo 163.759 em Macapá e 2.454 no Bailique. O grupo urbano (Grupo 1) foi selecionado a partir de mulheres que foram à Unidade Básica de Saúde da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP) para coleta de colpocitologia oncótica. O grupo ribeirinho (Grupo 2) foi selecionado a partir de mulheres que foram ao posto de saúde na Vila Progresso, no Arquipélago do Bailique, para coleta de colpocitologia oncótica. O Arquipélago de Bailique é um conjunto de 8 ilhas com 42 comunidades e distante  185 km  de Macapá e com acesso apenas por via fluvial (IBGE, 2012).

Os critérios de inclusão foram: sexo feminino, residência fixa no Arquipélago do Bailique ou mulheres residentes na cidade de Macapá que procuram uma Unidade Básica de Saúde (UBS) para coleta de colpocitologia oncótica e idade maior ou igual a 20 anos. Foram excluídos desta pesquisa: mulheres gestantes, menores que 20 anos, pacientes com restrição anatômica ou física, pacientes com fístulas urinárias e grávidas.

As mulheres foram avaliadas por questionário geral para avaliação clínica e identificação de fatores de risco e exame físico ginecológico para avaliação anatômica dos órgãos pélvicos pela classificação POP-Q. No POP-Q, avaliou-se somente as medidas estáticas: CVT, HG e CP.

Os dados foram coletados no período de fevereiro a novembro de 2013. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Amapá, sob o nº. FR-347446/2011. Todas as mulheres assinaram o Termo de consentimento previamente esclarecido – TCLE.

RESULTADOS

Neste estudo, foram analisados dados clínicos e físicos de 380 mulheres, sendo 260 do grupo 1 e 120 do grupo 2. Ressalta-se, porém, que 3 mulheres do grupo 2 estavam menstruadas durante a coleta de dados no Arquipélago do Bailique e, portanto, não foram submetidas ao POP-Q.

Na investigação clínica relacionada à prevalência de fatores de risco para POP nas mulheres, constatou-se diferença significativa entre os grupos 1 e 2 apenas em paridade, multiparidade, parto normal e parto domiciliar. A presença dos demais fatores de risco, embora quantitativamente diferentes, foram estatisticamente insignificantes. (Tabela 1)

Tabela 1. Fatores de risco do POP nos grupos urbanos e ribeirinho

Fator Urbano N = 260 Ribeirinho N = 120 p
Paridade 3,3 partos 5,2 partos <0,001*
Multiparidade 53,4% 75,8% <0,001***
Idade 38 anos 37,1 anos 0,529**
Parto normal 2,7 partos 5,1 partos <0,001*
Obesidade (IMC ≥ 30) 20,3% 18,4% 0,640***
Parto domiciliar 20,0% 75,8% <0,001***
Parto cesariano 1,4 parto 1,1 parto 0,329*
Peso do maior RN (kg) 3,3 Kg 3,4 Kg 0,117**
Menopausa 12,5% 17,3% 0,232***
Diabetes Mellitus 0% 1,5% 0,313****
Tabagismo 10,0% 7,6% 0,415***
Histerectomia abdominal 2,5% 0,8% 0,183****
Cirurgia vaginal 2,5% 3,5% 0,760****

Mann Whitney (*) T Student (**) Qui-Quadrado (***) Fisher (****)

A curva de distribuição das frequências relativas (FR) de HG foi similar entre os grupos. O grupo 1, entretanto, apresentou menor frequência na medida de 1,5 cm em relação ao grupo 2 (22,69% x 27,79%) e maior frequência na medida de 2,5 cm (28,46%% x 20,51%) e de 3,0 cm (3,08% x 0,85%%). Apenas o grupo 1 apresentou medida de 3,5 cm (0,38%). A moda em ambos os grupos foi de 2,0 cm (45,39% x 53,85%). Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa entre os grupos. (Tabela 2)

Tabela 2. Comparação das medidas do Hiato Genital (HG) entre mulheres do grupo urbano (1) e do grupo ribeirinho (2):

HG Urbano n = 260 Ribeirinho n = 117
1,5 cm 22,69% 27,79%
2,0 cm 45,39% 53,85%
2,5 cm 28,46% 20,51%
3,0 cm 3,08% 0,85%
3,5 cm 0,38%
p = 0,123*

Teste não-paramétrico de Mann-Whitney (*)

Nonparametric test Mann-Whitney (*)

Quanto às medidas do CP, os grupos 1 e 2 apresentaram percentuais similares (5,77% x 4,27%) em relação à medida de 2,0 cm. No grupo 1, as medidas com maior frequência foram as de 3,0 e 4,5 cm (38,08% x 33,08%), enquanto no grupo 2 foram 2,5 cm e de 3,5 cm (25,64% x 46,15%). O grupo 1, embora tenha apresentado a menor frequência na medida de 3,5 cm (33,08% x 46,15%), apresentou frequência maior nas medidas de 4,0 cm (4,61% x 2,57%) e de 4,5 cm (0,38% x 0%). Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa. (Tabela 3)

Tabela 3. Comparação das medidas do Corpo Perineal (CP) entre mulheres do grupo urbano (1) e do grupo ribeirinho (2)

CP Urbano n = 260 Ribeirinho n = 117
2,0 cm 5,77% 4,27%
2,5 cm 18,08% 25,64%
3,0 cm 38,08% 21,37%
3,5 cm 33,08% 46,15%
4,0 cm 4,61% 2,57%
4,5 cm 0,38%
  p = 0,590*  

Teste não-paramétrico de Mann-Whitney (*)

Nonparametric test Mann-Whitney (*)

Mediante análise das medidas de CVT de ambos os grupos, constatou-se diferença estatisticamente significativa (p < 0,001). O grupo 1 apresentou maior amplitude de medidas (6,0 – 14,0 cm) que o grupo 2 (7,5 – 13,0 cm). As medidas do CVT em maior frequência no grupo 1 foram 8,0 (22,70%) e 7,0 cm (18,08%), enquanto no grupo 2 foram 9,5 (14,53%), 10,0 (12,82%) e 11 (12,82%) cm. (Tabela 4)

Tabela 4. Comparação das medidas do Comprimento Vaginal Total (CVT) entre mulheres do grupo urbano (1) e do grupo ribeirinho (2)

CVT Urbano n = 260 Ribeirinho n = 117
6,0 cm 0,38%
6,5 cm 0,38%
7,0 cm 18,08%
7,5 cm 9,62 5,13%
8,0 cm 22,7% 11,11%
8,5 cm 12,30% 10,26%
9,0 cm 7,30% 4,28%
9,5 cm 5,77% 14,53%
10,0 cm 3,46% 2,57%
10,5 cm 3,85% 12,82%
11,0 cm 4,63% 12,82%
11,5 cm 3,46% 6,84%
12,0 cm 2,70% 11,11%
12,5 cm 2,30% 5,13%
13,0 cm 1,92% 3,42%
13,5 cm 0,77%
14,0 cm 0,38%
p < 0,001*

Teste não-paramétrico de Mann-Whitney (*)

Nonparametric test Mann-Whitney (*)

As médias das medidas entre os grupos foram semelhantes quanto ao HG (2,12±0,90 x 2,10±1,25) e CP (3,07±0,49 x 3,08±0,49) porem com diferença estatisticamente significativa no CVT (8,78±1,68 x 10,13±1,57). (Tabela 5)

Tabela 5.  Medidas estáticas do POP-Q em mulheres de população urbana e ribeirinha.

Medida População Média (cm) ± DP Mediana P
HG Urbana 2,12 ± 0,90 2,0 0,123
  Ribeirinha 2,10 ± 1,25 2,0
CP Urbana 3,07 ± 0,49 3,00 0,590
  Ribeirinha 3,08 ± 0,49 3,00
CVT Urbana 8,78 ± 1,68 8,0 <0,001
  Ribeirinha 10,13 ± 1,57 10,5

Teste não-paramétrico de Mann-Whitney

Nonparametric test Mann-Whitney

DISCUSSÃO

Este estudo demonstrou que o HG e CP tiveram a médias iguais entre os grupos 1 e 2 (2,12 x 2,10 e 3,07 x 3,08, respectivamente), apesar de significativa diferença de fatores de risco para prolapso genital no grupo 2 (multiparidade, parto normal e domiciliar). Além disso, o local de moradia (beira dos rios x centro urbano) e estilo de vida são diferentes entre os grupos. Porém, ao avaliarmos o  CVT, notamos diferença significativa entre os grupos, pois entre as ribeirinhas essa medida foi 2,0 cm maior que nas urbanas. Possivelmente, ambiente de residência, paridade e local do parto não constituem fatores determinante para a medida de CVT, e sim fatores constitucionais inerentes ao indivíduo.

Barnhart e colaboradores (2006), ao analisarem imagens por ressonância nuclear magnética (RNM) derivadas de cinco ensaios clínicos, estabeleceram que o comprimento vaginal, aferido do cérvix para o introito, mede aproximadamente de 4,1 a 9,5cm, com média de 6,2 cm, portanto um pouco menor que encontrado em nosso estudo (grupo 1 = 8,7 e grupo 2 = 10,1 cm). Em outro estudo caso-controle com imagens reconstruídas por RNM, com 80 mulheres  assintomáticas quanto ao prolapso genital e com valores para os pontos do POP-Q dentro da normalidade, não submetidas à cirurgia pélvica ou histerectomia, grandes variações no comprimento e na forma da vagina foram descritas, porém com fracas correlações entre dimensão vaginal e características demográficas (LUO et al., 2016).

Poucos artigos demonstram influência de fatores demográficos no CVT. Grupos étnicos diferentes apresentam CVT diferentes, como, por exemplo, em estudo prospectivo realizado em asiáticas a média de CVT foi de 7,0 cm e em ocidentais foi de 10 cm  (SEO; KIM, 2006). Tan e colaboradores (2006) em estudo que analisou os determinantes de comprimento vaginal, destacaram que as etnias hispânica e branca também alteram o CVT, com respectivos aumentos de 0,26 cm e 0,13 cm. Populações ribeirinhas da Amazônia brasileira, compostas de população com menor grau de miscigenação étnica que incluem o componente indígena e o negro, poderiam justificar o achado diferencial quanto à esta medida estática encontrada em nosso estudo.

Fatores como idade, peso, altura, histerectomia, terapia de reposição hormonal, menopausa, atrofia vaginal e história de cirurgia pélvica podem ter influência significativa no valor do CVT (TAN et al., 2006), porém não há consenso na literatura. Pesquisa com 558 pacientes atendidas em clínica uroginecológica, não encontrou correlação entre CVT e idade, paridade e menopausa (KIM et al., 2007). Outro estudo com 185 coreanas, a partir do uso comparativo anatômico com imagens de tomografia computadorizada, concluiu que o CVT e a espessura vaginal não são alterados pela idade, paridade e características físicas, apenas a largura vaginal sofre influência da idade e do modo de parto (KIM; KIM, 2010). Em uma reanálise de estudo retrospectiva com 948 mulheres, notou-se diferença de 1 cm do CVT entre mulheres histerectomizadas e não histerectomizadas (PATNAM et al., 2018).

Não foi encontrada diferença entre a medida do CP e HG entre os grupos 1 e 2, mesmo com importante diferença quanto à paridade, à via e ao local do parto. Pesquisa realizada no Havaí também não encontrou diferença desta medida estática entre grupos étnicos que coabitam o mesmo espaço geográfico, com mulheres primigestas de 18 a 45 anos de seis grupos étnicos (branco, filipino, japonês, chinês, havaiano nativo e micronesiano) (TSAI et al., 2012).

Em estudo retrospectivo com cerca de 1.600 mulheres com idade média de 55,3 anos, demonstrou-se que a paridade aumenta os valores de medidas de hiato genital, sem alterar o corpo perineal dentro de grupos de pacientes com mesma classificação de prolapso genital de acordo com o POP-Q, ao passo que a realização de histerectomia aumenta os valores de medida do corpo perineal em mulheres sem prolapso ou de grau 1 e diminuem os de hiato genital nas pacientes portadores de prolapsos graus 2 e 4 (DUNIVAN et al., 2016). Do mesmo modo, em outro estudo retrospectivo com 780 mulheres de 18 a 85 anos com sintomas do trato urinário inferior ou disfunção do assoalho pélvico, o comprimento do hiato genital é associado positivamente ao parto normal, principalmente ao primeiro (ATAN et al., 2015). Outro trabalho mostrou que a paridade é associada positivamente com o hiato genital e negativamente com o corpo perineal (KIM et al., 2007)

As mulheres ribeirinhas estudadas, mesmo com maiores índices de multiparidade e de parto normal, não obtiveram maiores valores de hiato genital e corpo perineal. O parto é realizado em casa, com ajuda de parteiras e posição do parto é de livre escolha das gestantes. A episiorrafia não é realizada (MURRIETA, 2001). O estilo de vida da população ribeirinha pode justificar um melhor desenvolvimento da musculatura pélvica e perineal. A coleta do açaí escalando altas palmeiras, atividades de pesca e caça exigem coordenação de contrações específicas musculares e tensões perineais, com equilíbrio em superfícies vacilantes e alagadiças nas proximidades dos leitos dos rios e destreza em meio ao ambiente de floresta equatorial, que funcionam como atividades físicas permanentes para o desenvolvimento e manutenção da integridade de tais grupamentos musculares (MURRIETA, 2001; SILVEIRA; BASSALO, 2012).

Limitações desse estudo foram possíveis vieses de seleção das participantes (mulheres que buscaram atendimento primário em unidade básica de saúde para coleta de preventivo do câncer uterino) e de resposta, devido ao grau de dificuldade da aplicação do questionário em mulheres ribeirinhas de baixo nível de escolaridade.  Estudos futuros são necessários para definir qual fator de proteção influenciou nas medidas do corpo perineal e do hiato genital na população ribeirinha.

Aspectos demográficos ligados ao ambiente onde moram as mulheres do presente estudo e fatores de risco para prolapso não se mostraram determinantes para alterar, de forma significativa, as medidas estáticas aferidas pelo POP-Q entre mulheres moradoras de um centro urbano e de uma comunidade ribeirinha da Amazônia Brasileira.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os fatores de risco para prolapso genital, como multiparidade e via de parto normal, não influenciaram em maiores valores de hiato genital e corpo perineal nas mulheres ribeirinhas. O estilo de vida dessas mulheres, baseado em coletas de açaí em palmeiras e atividades de caça e pesca, pode justificar o melhor condicionamento da musculatura pélvica, por exigirem coordenações em contrações musculares específicas. Não obstante, ainda são necessários estudos posteriores para delimitar o fator protetor das medidas de corpo perineal e hiato genital na população ribeirinha.

REFERÊNCIAS

ATAN, Ixora Kamisan.; GERGES, Bassem; SHEK, K. L.; DIETZ, Hans Peter. The association between vaginal parity and hiatal dimensions: a retrospective observational study in a tertiary urogynaecological centre. BJOG: An International Journal of Obstetrics & Gynaecology, v. 122, n. 6, p. 867–872, 2015.

BARBER, Matthew. D.; MAHER, C. Epidemiology and outcome assessment of pelvic organ prolapse. International Urogynecology Journal and Pelvic Floor Dysfunction, v. 24, n. 11, p. 1783–1790, 2013.

BARNHART, Kurt. T.; IZQUIERDO, Adriana; PRETORIUS, E. Scott.; SHERA, David. M.; SHABBOUT, Mayadah; SHAUNIK, Alka. Baseline dimensions of the human vagina. Human Reproduction, v. 21, n. 6, p. 1618–1622, 2006.

BUMP, Richard. C.; MATTIASSON, Anders; BØ, Kari; BRUBAKER, Linda. P.; DELANCEY, John. O. L.; KLASKOV, Peter; SHULL, Bob. L.; SMITH, Anthony. R. B. The standardization of terminology of female pelvic organ prolapse and pelvic floor dysfunction. American Journal of Obstetrics and Gynecology, v. 175, n. 1, p. 10–17, 1996.

DIETZ, Hans Peter. The aetiology of prolapse. International Urogynecology Journal, v. 19, p. 1323–1329, 2008.

DUNIVAN, Gena. C.; LYONS, Katherine E.; JEPPSON, Peter C.; NINIVAGGIO, Cara. S.; KOMESU, Yuko M.; ALBA, Frances M.; ROGERS, Rebecca. G. Pelvic Organ Prolapse Stage and the Relationship to Genital Hiatus and Perineal Body Measurements. Female Pelvic Medicine & Reconstructive Surgery, v. 22, n. 6, p. 497–500, 2016.

GLAZENER, C; ELDERS, A.; MACARTHUR, C.; LANCASHIRE, R, J.; HERBISON, P.; HAGEN, S.; DEAN, N.; BAIN, C.; TOOZS-HOBSON, P.; RICHARDSON, K.; MCDONALD, A.; MCPHERSON, G.; WILSON, D.; Childbirth and prolapse: Long-term associations with the symptoms and objective measurement of pelvic organ prolapse. BJOG: An International Journal of Obstetrics and Gynaecology, v. 120, n. 2, p. 161–168, 2013.

GYHAGEN, Maria; BULLARBO, M.; NIELSEN, T. F.; MILSON, I. Prevalence and risk factors for pelvic organ prolapse 20 years after childbirth: A national cohort study in singleton primiparae after vaginal or caesarean delivery. BJOG: An International Journal of Obstetrics and Gynaecology, v. 120, n. 2, p. 152–160, 2013.

HAYLEN, Bernard T; MAHER, Christopher F.; BARBER, Matthew. D.; CAMARGO, Sérgio; DANDOLU, Vani; DIGESU, Alexx; GOLDMAN, Howard B.; HUSER, Martin; MILANI, Alfredo L.; MORAN, Paul A.; SCHAER, Gabriel N.; WITHAGEN, Mariëllla. I. J. An International Urogynecological Association (IUGA) / International Continence Society (ICS) joint report on the terminology for female pelvic organ prolapse (POP). International Urogynecology Journal, v. 27, n. 2, p. 165–194, 2016.

HOVE, Marikije C. Slieker-Ten; POOL-GOUDZWAARD, Annelies L.; EIJKEMANS, Marinus J. C.; STEEGERS-THEUNISSEN, Regine P. M.; BURGER, Curt W.; VIERHOUT, Mark E. The prevalence of pelvic organ prolapse symptoms and signs and their relation with bladder and bowel disorders in a general female population. International Urogynecology Journal, v. 20, n. 9, p. 1037–1045, 2009.

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Recenseamento Geral da População, 2010. Amapá, 2012.

JELOVSEK, John Erik; MAHER, Christopher; BARBER, Matthew D. Pelvic organ prolapse. The Lancet, v. 369, p. 1027–1038, 2007.

KIM, C. M; JEON, M. J.; CHUNG, D. J.; KIM, S. K.; KIM, J. W.; BAI, S. W. Risk factors for pelvic organ prolapse. International Journal of Gynecology and Obstetrics, v. 98, n. 3, p. 248–251, 2007.

KIM, S.; KIM, M. Determinants of total vaginal length, thickness and width by computed tomography. 20th World Congress on Ultrasound in Obstetric and Finecology, v. 36, p. 206–206, 2010.

LUO, Jiaijia; BETSCHART, Cornelia; ASHTON-MILLER, James A.; DELANCEY, John O. L. Quantitative analyses of variability in normal vaginal shape and dimension on MR images. International Urogynecology Journal, v. 27, n. 7, p. 1087–1095, 2016.

MURRIETA, Rui Sérgio Sereni. Dialética do sabor : alimentação , ecologia e vida cotidiana em comunidades ribeirinhas da Ilha de Ituqui, Baixo Amazonas, Pará. Revista de Antropologia, v. 44, n. 2, p. 39–88, 2001.

PATNAM, Radhika; EDENFIELD, Autumn; SWIFT, Steven. Defining normal apical vaginal support: a relook at the POSST study. International Urogynecology Journal, v. 30, n. 1, p. 47–51, 2018.

SEO, Ju Tae.; KIM, Joo Myung. Pelvic Organ Support and Prevalence by Pelvic Organ Prolapse-Quantification (POP-Q) in Korean Women. Journal of Urology, v. 175, n. 5, p. 1769–1772, 2006.

SILVEIRA, Flávio Leonel Abreu; BASSALO, Terezinha de Fátima Ribeiro. Corpos em equilíbrio : imagens e cotidiano ribeirinho no porto do Açaí e na ilha do Maracujá, Belém (PA). História, Ciência, Saúde – Manguinhos, v. 19, n. 3, p. 1049–1073, 2012.

SMITH, Fiona J.; HOLMAN, C. D’Arcy. J.; MOORIN, Rachael E.; TSOKOS, Nicolas. Lifetime risk of undergoing surgery for pelvic organ prolapse. Obstetrics and Gynecology, v. 116, n. 5, p. 1096–1100, 2010.

SRIKRISHNA, Subramanian; ROBINSON, D.; CARDOZO, L.; CARTWRIGHT, Rufus. Experiences and expectations of women with urogenital prolapse: A quantitative and qualitative exploration. BJOG: An International Journal of Obstetrics and Gynaecology, v. 115, n. 11, p. 1362–1368, 2008.

SUBAK, Leslee L.; WAETJEN, L. Elaine; EEDEN, Stephen van den.; THOM, David H.; VITTIGHOFF, Eric; BROWN, Jeanette S. Cost of pelvic organ prolapse surgery in the United States. Obstetrics and Gynecology, v. 98, n. 4, p. 646–651, 2001.

TAN, Jasmine S.; LUKACZ, Emily S.; MANEFEE, Shawn A.; LUBER, Karl M.; ALBO, Michael E.; NAGER, Charles W. Determinants of vaginal length. American Journal of Obstetrics and Gynecology, v. 195, n. 6, p. 1846–1850, 2006.

TSAI, Pai-Jong Stacy; OYAMA, Ian A.; HIRAOKA, Mark; MINAGLIA, Steven; THOMAS, Jennifer; KANESHIRO, Bliss. Perineal Body Length Among Different Racial Groups in the First Stage of Labor. Female Pelvic Medicine & Reconstructive Surgery, v. 18, n. 3, p. 165–167, 2012.

VERGELDT, Tineke F. M.; WEEMHOFF, Mirjam; INTHOUT, Joanna; KLUIVERS, Kirsten B. Risk factors for pelvic organ prolapse and its recurrence: a systematic review. International Urogynecology Journal, v. 26, n. 11, p. 1559–1573, 2015.

[1] Professor MSc, Docente do Curso de Graduação em Medicina da Universidade Federal do Amapá.

[2] Discente do Curso de Graduação em Medicina da Universidade Federal do Amapá.

[3] Discente do Curso de Graduação em Medicina da Universidade Federal do Amapá.

[4] Discente do Curso de Graduação em Medicina da Universidade Federal do Amapá.

Enviado: Maio, 2020.

Aprovado: Agosto, 2020.

5/5 - (1 vote)
Aljerry Dias do Rêgo

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

POXA QUE TRISTE!😥

Este Artigo ainda não possui registro DOI, sem ele não podemos calcular as Citações!

SOLICITAR REGISTRO
Pesquisar por categoria…
Este anúncio ajuda a manter a Educação gratuita