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Saúde urbana e qualidade de vida nas cidades brasileiras: a sobrevivência em meio a desigualdades socioespaciais

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CONTEÚDO

REVISÃO INTEGRATIVA

BISPO, Janaina Eduarda Amarante Gonçalves [1], ROSA, Vanessa Passos [2], Juliana de Oliveira Musse [3]

BISPO, Janaina Eduarda Amarante Gonçalves. ROSA, Vanessa Passos. Juliana de Oliveira Musse. Saúde urbana e qualidade de vida nas cidades brasileiras: a sobrevivência em meio a desigualdades socioespaciais. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 06, Ed. 06, Vol. 15, pp. 89-105. Junho de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/cidades-brasileiras

RESUMO

As cidades brasileiras estão diante de diversos desafios em decorrência do processo de urbanização. São percebidas, para além das transformações urbanas, o desenvolvimento de desigualdades socioespaciais que acompanham as transformações demográficas, o crescimento das cidades e consequentemente, a expansão populacional. Diante desse cenário, são observadas situações características com relação à saúde dos indivíduos que residem no ambiente urbano, um fenômeno que ocorre em diversos países latino-americanos. A presente pesquisa  tem como objetivo discutir acerca da relação entre a saúde urbana no Brasil, a qualidade de vida nas cidades brasileiras e a determinação social da saúde, a partir de uma revisão integrativa com base em diferentes recortes científicos. Conclui-se que o cumprimento de políticas públicas no setor urbano é necessário para a garantia da qualidade de vida nas cidades, o que também é positivo para os processos saúde-doença dos indivíduos, sobretudo devido à determinação social da saúde.

Palavras-chave: Saúde Urbana, Políticas Públicas, Qualidade de Vida, Determinantes Sociais da Saúde.

1. INTRODUÇÃO

O processo de urbanização do Brasil durante o século XX é tido como responsável por diversas transformações no seio da sociedade brasileira, seguindo assim, o padrão de países em desenvolvimento que diante da industrialização e globalização impulsionaram suas capacidades econômicas em direção ao capitalismo. A análise desse processo mostra que o território brasileiro deixou de ser basicamente rural e adotou uma economia urbana-industrial sem planejamento quanto ao adensamento populacional (BRITO, 2012). Apenas nas décadas de 70 e 80 mais de 15,6 milhões de pessoas deixaram as áreas rurais (BAENINGER, 2012).

O modelo de urbanização adotado no Brasil trouxe consigo algumas consequências. As transformações demográficas ocorridas devido aos movimentos migratórios geraram novas demandas sociais de saneamento básico, educação, emprego, segurança, lazer, mobilidade urbana, acessibilidade, saúde e o direito à moradia (determinantes sociais da saúde), elementos básicos e objetivos para a qualidade de vida, ofertados à população de forma diversa segundo o espaço que esta ocupa (MARQUES, 2012). Um fenômeno que pode ser observado é a formação de aglomerados urbanos nas partes periféricas das cidades que exigem mais dessas demandas sociais descritas e de intervenções a partir de políticas públicas (BAENINGER, 2012).

A discrepância existente entre o crescimento populacional e o acesso a serviços e oportunidades por limites dos recursos naturais e econômicos contribuem para a destruição do ambiente natural e à deterioração das relações sociais (RIBEIRO; VARGAS, 2015).

A relação entre saúde e ambiente foi categoricamente tratada já na VIII Conferência Nacional de Saúde, uma vez há a tênue aproximação entre o organismo e o ambiente em que ele se encontra. Saúde não é ausência de doença (FERLA et al, 2015).  Chega-se assim à conclusão que o estado do ambiente reflete na qualidade de vida e dos processos de adoecimento que são diretamente relacionados aos determinantes sociais da saúde (FONSECA et al, 2014).

Nesse sentido é importante discutir acerca da relação entre a saúde urbana no Brasil, a qualidade de vida nas cidades e a determinação social da saúde, principalmente para o entendimento das condições de vida de uma parte da população brasileira que ainda continua às margens das cidades.

Esses elementos podem ser tratados a partir de uma visão social e de saúde urbana ressaltando o significado da saúde urbana e o paradigma nas cidades brasileiras, a caracterização do processo de urbanização no Brasil e o discernimento acerca do fenômeno de formação de espaços de aglomerados urbanos periféricos, a determinação social da saúde e qualidade de vida urbana.

2. SAÚDE URBANA: CONCEITO E PARADIGMA NAS CIDADES BRASILEIRAS

Saúde Urbana é a área do conhecimento que, atrelada à saúde pública, nos permite considerar o impacto na saúde das intervenções do setor público nas cidades, acrescendo aquelas que não têm origem no setor saúde. O conceito de Saúde Urbana acrescenta que para populações que vivem em ambientes urbanos, a saúde pode ser influenciada por determinantes globais, nacionais e locais (CAIAFFA, 2015).

A saúde urbana pode ser sistematizada e explicada através de três pontos: a urbanização, além de produzir efeitos benéficos, as vantagens urbanas, pode acarretar também em danos sociais, econômicos e ambientais. Os atributos físicos e sociais da cidade e seus bairros podem afetar a saúde dos indivíduos. E, que há ocorrência dos eventos relacionados à saúde no meio urbano (CAIAFFA et al, 2008).

A saúde urbana está  de forma bastante intrínseca relacionada aos conceitos de qualidade de vida e do ambiente. Os autores Ribeiro e Vargas (2015) sugerem quatro aspectos da qualidade do ambiente urbano: espacial, biológico, social e econômico. Cada elemento afeta tanto o indivíduo, como frequentemente o todo da imagem coletiva.

Tabela 1 – Qualidade Ambiental Urbana.

Fonte: Modificado a partir de Ribeiro e Vargas (2015)

O viver nas cidades urbanizadas tem significado estar em um ambiente não saudável por inúmeras razões.  Outros autores também afirmam o espaço urbano enquanto é aquele a oferecer oportunidades e um maior número de serviços, esse mesmo espaço gera impactos negativos como a desorganização social comprometedora do bem-estar e diversos agravantes para a saúde num sentido amplo (MORAES GOMES et al, 2014). Em se tratando das populações que ocupam áreas mais vulneráveis do espaço urbano, existem razões agravantes, em que se deve considerar um maior risco de adoecimento associado ao meio urbano (VIANNA; OLIVEIRA, 2011).

De acordo com Rolnik (2013), as cidades brasileiras estão diante de desafios em decorrência da urbanização que gerou relevantes desigualdades socioespaciais e com elas, inúmeros problemas de saúde – um fenômeno também de outros países latino-americanos.

É destaque no território brasileiro, segundo Zancan et al (2015), a falta de saneamento básico, a poluição, a violência urbana, a habitação precária, problemas de saúde associados e as deficiências quanto ao acesso aos serviços de saúde. Ou seja, há iniquidades sociais que perduram nas cidades, fazendo-se necessária a insurgência de uma política sanitária adaptada às atuais configurações sociais.

A afirmação de Zancan et al (2015) é a de que a crescente vulnerabilidade e segregação social são responsáveis por modificações no padrão de distribuição das doenças, como as respiratórias e as antigas endemias.

3. A URBANIZAÇÃO NO BRASIL E OS EFEITOS DA GLOBALIZAÇÃO

O acelerado processo de urbanização no Brasil foi determinante desse panorama alicerçado na incipiente industrialização no início do século XX e o crescimento da economia urbano-industrial na segunda metade, muito impulsionado pelo Plano de Metas do ex-presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961). Nesse período foram iniciados movimentos consideráveis de migrações internas, além das externas. Apesar de serem poucas as cidades conhecidas nessa época na região Sudeste, São Paulo e Rio de Janeiro já abrigavam mais da metade da população residente nas capitais. Ainda na segunda metade do século, a população urbana passou de 19 milhões para 138 milhões (BRITO; PINHO, 2012).

O processo de globalização foi universal, segundo Fortes e Ribeiro (2014). Ainda para esses autores, qualquer pessoa e espaço do planeta são atingidos, direta ou indiretamente pela globalização. A partir da globalização houve a abertura das fronteiras ao comércio e aos fluxos de capital econômico, a crescente incorporação tecnológica, a ampliação dos meios de comunicação, a migração de populações em busca de melhores condições de vida e trabalho e transformações ambientais, a exemplo da urbanização. No entanto, seus reflexos e consequências não atingem a todos, e nem a todas as regiões da mesma forma.

4. OS AGLOMERADOS URBANOS PERIFÉRICOS ENQUANTO UM FENÔMENO DA URBANIZAÇÃO

Durante o desenvolvimento econômico do Brasil no século XX, a assistência ao contingencial populacional proletário foi diminuta, aumentando-se ainda mais o custo para se viver nos centros urbanos, o que impulsionou outro tipo de migração, a urbana-urbana, como demonstra Fernandes e Gama-Rosa (2013, p. 120):

A valorização do solo urbano induziu ao crescimento das características, não somente do espaço como também da própria sociedade. As políticas econômica e social brasileiras e a carência de planejamento urbano e habitacional, além da organização da própria sociedade, contribuíram para estimular os processos de ocupação, caracterizados tipologicamente como favelas, em espaços diferenciados, colocados à margem da cidade como zonas de exclusão, marcados pela desigualdade social […].

Ao estudar e discutir a urbanização no Brasil é primordial para o entendimento das condições de vida de uma parte da população brasileira que ainda continua as margens das cidades. A situação se torna mais crítica ainda quando vemos crescer os contingentes de aglomerados urbanos periféricos ou subnormais  em todas as cidades. Esse não é mais um problema do eixo Rio de Janeiro – São Paulo. Segundo o IBGE (2010), 77,1 % dos domicílios em aglomerados subnormais se encontram em municípios com mais de 2 milhões de habitantes.

O termo ‘aglomerado subnormal’ foi conceituado pela primeira vez em 1987, sendo mais bem elaborado em 2006 pelo IBGE, de forma a ampliar o conhecimento acerca desses setores censitários: “ […] áreas conhecidas ao longo do país por diversos nomes, como favela, comunidade, grotão, vila, mocambo, entre outros’’ (IBGE, 2010, p. 2).  Acrescenta-se ainda:

É o conjunto constituído por 51 ou mais unidades habitacionais caracterizadas por ausência de título de propriedade, irregularidade das vias de circulação e do tamanho e forma dos lotes. E/ou carência de serviços públicos essenciais (como coleta de lixo, rede de esgoto, rede de água, energia elétrica e iluminação pública). […] Sua existência está relacionada à forte especulação imobiliária e fundiária e ao decorrente espraiamento territorial do tecido urbano (IBGE, 2011, p. 3).

Figura 1 Distribuição de domicílios em aglomerados subnormais por regiões

Fonte: Modificado a partir de IBGE (2010).

A discrepância existente entre o crescimento populacional e o acesso a serviços e oportunidades, por limites dos recursos naturais e econômicos, leva a destruição do ambiente natural e à deterioração das relações sociais. A insuficiência em gestão e ocupação do solo urbano junto ao aumento das necessidades básicas, respondem, em sua maioria, por essa degradação e deterioração de relações (RIBEIRO; VARGAS, 2015).

No modelo de desenvolvimento urbano adotado no Brasil há predominância da degradação ambiental associada à falta de infraestrutura, a exemplo da falha no escoamento das águas, de saneamento básico e as inundações nos períodos chuvosos. Na degradação do ambiente estão inclusos: a ausência de coleta regular de lixo e moradias insalubres que associados às vulnerabilidades sociais influenciam diretamente a díade saúde/doença, pois, a produção de saúde depende das condições de vida, dos estilos de viver, de se relacionar com os outros e com o ambiente (FONSECA et al, 2014).

A relação entre saúde e ambiente foi categoricamente tratada na VIII Conferencia Nacional de Saúde, uma vez que os estudos apontavam a tênue aproximação entre o organismo e o ambiente em que ele se encontra. Chega-se assim a conclusão que o estado do ambiente reflete na qualidade de vida (FERLA et al, 2015). Afirmou-se também a relação direta entre determinantes sociais da saúde e os processos de adoecimento (FONSECA et al, 2014).

5. DETERMINANTES SOCIAIS DA SAÚDE: DIFERENCIAIS QUE IMPACTAM A QUALIDADE DE VIDA

Somente conceituar o que é saúde ou o direito a mesma, não é o bastante, é necessário estabelecer os elementos que irão prover com que a saúde seja alcançada ou não. Esses elementos são denominados Determinantes Sociais da Saúde (DSS), os quais, segundo a Comissão Nacional sobre os Determinantes Sociais da Saúde (2008, p. 3) compreendem:

[…] os determinantes vinculados aos comportamentos individuais e às condições de vida e trabalho, bem como os relacionados com a macroestrutura econômica, social e cultural. […] São produto da ação humana e portanto, podem e devem ser transformados pela ação humana.

A Comissão Nacional sobre os Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS) trabalhou com o conceito de saúde definido pela OMS adotando como referência o modelo conceitual de Dahlgren e Whitehead sobre os determinantes sociais da saúde (BRASIL, 2006). Segundo esse modelo, os determinantes sociais da saúde ficam estabelecidos em camadas distintas: A que expressa as características individuais; que representam os comportamentos e estilos de vida individuais e a camada intermediária representada pelas redes comunitárias e de apoio (GARBOIS; SODRÉ; DALBELLO-ARAUJO, 2014).

Figura 2 – Modelo de determinação social da saúde proposto por Dahlgren e Whitehead

Fonte: Relatório final da Comissão Nacional sobre DSS (2008).

Anterior ao modelo baseado nos determinantes sociais de saúde, a teoria miasmática predominava em meados do século XIX. Dentre as inúmeras explicações para os problemas de saúde, esta teoria relacionava ambiente x saúde. A partir dessa relação já é possível responder como as mudanças sociais influenciam os processos de saúde observados no âmbito da urbanização e industrialização (PELLEGRINI; BUSS, 2007).

Compreender a relação entre saúde e DSS não é uma simples relação de causa e efeito, como também a relação de determinação não é constante, por exemplo: uma sociedade com um maior Produto Interno Bruto (PIB) não terá, necessariamente, melhores indicadores de saúde. De uma mesma forma, determinantes de saúde individuais não podem ser utilizados para explicar discrepâncias em níveis de saúde entre as várias sociedades ou entre os diferentes grupos de uma mesma sociedade (BADZIAK; MOURA, 2010).

O campo da determinação social na saúde dos indivíduos começou a tomar corpo no Brasil durante o processo da Reforma Sanitária Brasileira na segunda metade da década de 1970, quando as discussões se voltaram para o sentido de uma saúde ampla, com base social paralelamente a todas as transformações que estavam ocorrendo naquele período, como por exemplo, a Ditadura Militar (FLEURY, 1988). O pensamento em torno da determinação é reafirmado em 1990 com a elaboração da Lei Orgânica 8.080/90 no Art 3º (BRASIL, 1990):

Os níveis de saúde expressam a organização social e econômica do País, tendo a saúde como determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, a atividade física, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais.

Porém, mesmo tendo essas considerações na legislação brasileira, uma parte da população não tem acesso a nenhum desses elementos nas cidades, tendo apenas o adoecimento constante, crianças ainda em desnutrição, uma população afetada por doenças crônicas, sem acesso aos direitos básicos das necessidades humanas, ou seja, sem saúde. Existem assim diferenciais de saúde intimamente ligados à posição social (CNDSS, 2008).

O panorama considerado é vivenciado nas grandes cidades, atenuado pela urbanização sem planejamento e o adensamento populacional. Parte das aglomerações são fontes de pobreza e desigualdade, além de riscos para a saúde dos indivíduos numa relação direta com o ambiente. É necessário o reconhecimento urgente dessas vulnerabilidades, a serem resolvidas e consideradas pelas políticas públicas que devem ter foco na resolução dos problemas oriundos da expansão urbana (JULIANO et al, 2016).

6. INDICADORES DE QUALIDADE DE VIDA NOS CENTROS URBANOS

A qualidade de vida é a percepção do indivíduo da sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações. Assim, o termo qualidade de vida é abordado por muitos autores como sinônimo de saúde, enquanto por outros, como um conceito mais abrangente, em que as condições de saúde seriam um dos aspectos a serem considerados (FLECK et al, 1999).

A abordagem socioeconômica para qualidade de vida considera os indicadores sociais como elemento principal, associando assim qualidade ao sucesso administrativo. No âmbito da abordagem psicológica, qualidade está associada às reações subjetivas do sujeito diante de suas vivências, dependendo assim da experiência pessoal e direta de cada indivíduo (PEREIRA; TEXEIRA; SANTOS, 2012).

Apesar das palavras saúde e qualidade de vida quase sempre serem utilizadas como sinônimos, estes são conceitos que apresentam especificidades, mas ao mesmo tempo uma grande relação entre si. Existem evidências científicas abundantes, conforme é abordado por Buss et al (2000).

É importante analisar a qualidade de vida de uma forma mais ampla e saindo do modelo biomédico. Buss et al (2000) aborda a qualidade de vida como uma representação social criada a partir de parâmetros subjetivos (bem-estar, felicidade, amor, prazer, realização pessoal). Como também objetivos, cujas referências são a satisfação das necessidades básicas e das necessidades criadas pelo grau de desenvolvimento econômico e social de determinada sociedade.

Os estudos sobre qualidade de vida têm focado cada vez mais na realidade urbana, devido à tendência de aglomerações populacionais nas cidades. Reconhece-se, como afirma Fael (2015) que o processo desordenado de urbanização gera problemas e disfunções. Os efeitos devem ser reconhecidos e avaliados. Certos conceitos, indicadores e metodologias devem ser empregados para avaliar a qualidade de vida urbana da população.

Existem assim tanto estudos teóricos como empíricos sobre a qualidade de vida. Os teóricos são normalmente relacionados aos conceitos e os empíricos baseados indicadores quantitativos e qualitativos, segundo Pacione (2003). Por exemplo: a relação entre o meio ambiente, economia ou condições sociais de um centro urbano ou através de perguntas aos cidadãos acerca dos elementos que interferem na qualidade de vida, segundo suas percepções.

Nesse aspecto, diversas variáveis podem ser analisadas, estabelecendo-se relações entre elas. Como no caso da Regressão Logística Ordenada Multinível: um método que faz associação entre informações subjetivas e indicadores quantitativos que demonstra ser enriquecedor para a compreensão da qualidade de vida urbana, considerando variáveis respostas e variáveis explicativas (FAEL, 2015).

Segundo a autora, enquanto pode-se colher dados junto à população quanto à renda, condições de acessibilidade a serviços no local (por exemplo, posto de saúde), de moradia, disponibilidade de serviços na área da residência (pavimentação das ruas, transporte público, fornecimento de energia elétrica), podem-se também avaliar as condições ambientais e riscos na área da residência (criminalidade, violência, ruídos, qualidade do ar, áreas verdes), a distribuição dos serviços por área ou o fornecimento destes são analisados paralelamente.

Ou seja, essas análises são imprescindíveis devido às configurações sociais vigentes de transição demográfica acelerada, mudança nos padrões de morbidades e distribuição das doenças, distribuição de renda desigual, entre outros aspectos que devem ter atenção e resolubilidade a partir das políticas públicas.

Devido à predominância de ocupações urbanas (aglomerações periféricas e residências subnormais) nas cidades, são grandes os desafios, pois envolvem a propriedade privada, o urbano, o ambiental e a promoção de qualidade de vida em um contexto social diferenciado.

7. OCUPAÇÕES URBANAS E O DIREITO À MORADIA

A concentração de pobreza encontrada nas metrópoles brasileiras tem como expressão uma dicotomia espacial, onde de um lado é encontrada uma cidade formal, onde se concentram os investimentos públicos, e do outro, seu oposto, uma cidade informal negligenciada e que cresce de forma espontânea com intensificadas  diferenças socioambientais e socioeconômicas (GROSTEIN, 2001).

O direito à moradia remete imediatamente ao questionamento do que vem a ser moradia, segundo Azevedo (2012). Esse conceito é de percepção. É consenso de que moradia ou morada é a casa onde se mora, residência em que vive, habitação. E logo conceitos próximos também o completam como lar, abrigo, proteção, refúgio, família.

A partir dos processos de urbanização dos maiores centros urbanos do Brasil, foi verificado que existe informalidade na ocupação habitacional. Essas ocupações trazem diferenças em sua constituição, com resultados espaciais similares, mas distintos em cada cidade (SOUZA, 2001).

A ação de ocupar o urbano ou um território ocorre relacionada a fatores imediatos e necessários, como o da falta de moradia. As ocupações são impulsionadas através da perspectiva de classe social, experiências de vida, os valores e o dia a dia dos moradores (SORDI, 2014).

É necessário reconhecer que existem movimentos de resistência que contrariam o modelo hegemônico neoliberal de ocupação do solo urbano, com práticas políticas próprias pelo direito à moradia e à cidade. Não há como dissociar as razões (objetivas ou subjetivas) dos movimentos de resistência das condições das cidades (MARICATO, 2013).

O primeiro momento de intensa demanda por novas formas de ocupação do solo urbano e habitações aconteceu diante do aumento dos aluguéis e cirurgias urbanas nos velhos centros, que resultaram no direcionamento de populações proletárias para periferias imediatas, segundo Souza (2001).

Ainda segundo o autor, as ocupações populares localizadas próximas aos centros urbanos eram caracterizadas por altas densidades e condições sanitárias precárias. Assim, culminaram diversas e intensas discussões de cunho higienista, de combate às áreas insalubres e aos casebres, como também emergiram políticas de saúde pública, saneamento e embelezamento. Combatendo, dessa forma, ao que era chamada de desordem aparente.

A sociedade está imersa em uma crise urbana, como explica Nascimento (2016), devido à estática política para a reforma urbana. Tem-se ainda a imposição da propriedade privada condominial nas cidades.

As cidades modernas representam esquemas bastante complexos que culminam em relevantes implicações na saúde, incluindo agravos dos problemas sociais como a violência, os acidentes de trânsito, a presença de doenças emergentes e ré-emergentes, transmissíveis ou não. De forma que, o viver na cidade pode ser benéfico ou não. Na cidade moderna seus moradores estão constantemente sendo afetados por sua dinâmica. (CAIAFFA et al, 2008).

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É de extrema necessidade a elaboração de uma reforma urbana baseada na resolução das desigualdades sociais vigentes nas cidades. Tendo em vista o exponencial crescimento populacional e o padrão periférico das cidades que, continuaram se intensificando a cada período.

São percebidos eventos de saúde relacionados aos determinantes sociais dos espaços urbanos. Nas cidades urbanas existem dicotomias que influenciam na saúde dos indivíduos, ainda mais aos que vivem em situação de vulnerabilidade e vivem em suas moradias nas áreas mais periféricas. É imprescindível pôr em prática políticas públicas eficientes que satisfaçam a promoção de qualidade de vida da população brasileira e saúde urbana com menos malefícios envolvidos.

REFERÊNCIAS

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[1] Mestre em Saúde e Ambiente (UNIT). Pós-Graduada em Gestão em Saúde Coletiva, com ênfase em Saúde da Família (FANESE). Graduada em Enfermagem (UNIT). Graduada em Jornalismo (UNIT).

[2] Graduada em Enfermagem (UNIT). Graduada em Publicidade (UNIT).

[3] Orientadora. Doutorado em Saúde e Ambiente.

Enviado: Junho, 2021.

Aprovado: Junho, 2021.

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Janaina Eduarda Amarante Gonçalves Bispo

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