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Espectro de manifestações da doença relacionada a igG4: uma revisão da literatura

RC: 151488
315
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/doenca-relacionada-a-igg4

CONTEÚDO

ARTIGO DE REVISÃO

MOREIRA, Danilo José Silva [1], OLIVEIRA, Vinicius Faustino Lima de [2], FONSECA, Juliana Brito da [3], ROSSI, Karoline [4], VASCONCELOS, Suzana dos Santos [5], FECURY, Amanda Alves [6], DENDASCK, Carla Viana [7], DIAS, Claudio Alberto Gellis de Mattos [8], OLIVEIRA, Euzébio de [9], ARAÚJO, Maria Helena Mendonça de [10]

MOREIRA, Danilo José Silva et al. Espectro de manifestações da doença relacionada a igG4: uma revisão da literatura. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 09, Ed. 01, Vol. 03, pp. 107-121. Janeiro de 2024. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/doenca-relacionada-a-igg4, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/doenca-relacionada-a-igg4

RESUMO

A Doença Relacionada a IgG4 é uma condição linfoproliferativa de plasmócitos, associada a níveis aumentados de IgG4 e infiltração de células IgG4 positivas nas estruturas acometidas. Devido ao seu amplo espectro de manifestações, ainda há dificuldades para o seu diagnóstico. Este estudo busca pontuar as principais manifestações clínicas que integram o seu espectro. Trata-se de uma revisão de literatura integrativa, descritiva e com abordagem qualitativa, realizada nas bases de dados Embase, PubMed, SCIELO e Web of Science. Foram incluídos 38 artigos nesta revisão. Observa-se que a Doença Relacionada a IgG4 possui uma apresentação clínica variável, havendo relatos na literatura de acometimentos em todos os órgãos e sistemas do organismo. Os órgãos mais acometidos são pâncreas, órbitas oculares, glândulas salivares e lacrimais. Nota-se que essa variedade de manifestações acarretam em diferentes repercussões clínicas, podendo gerar quadros complicados devido a possibilidade de acometer órgãos nobres.

Palavras-chave: DR-IgG4, Autoimunidade, Imunoglobulina G.

1. INTRODUÇÃO

As Imunoglobulinas (Ig), também denominadas anticorpos, são proteínas sintetizadas pelo sistema imunológico com a finalidade de promover proteção ao organismo. Elas podem ser divididas em 5 classes: IgA, IgD, IgE, IgG e IgM. As imunoglobulinas do tipo IgG ainda podem ser separadas em 4 subclasses: IgG1, IgG2, IgG3 e IgG4 (Araújo et al., 2003; Fiocruz, 2022). A IgG4, em condições normais, corresponde a menos de 5% do total de IgG, sendo a menos frequente (Suarez; Abril; Puerta, 2017).

A Doença Relacionada a IgG4 (DR-IgG4) é uma condição linfoproliferativa plasmocitária, associada a níveis aumentados de IgG4 e infiltração de células IgG4 positivas nas estruturas acometidas. A progressão do processo inflamatório acarreta, em geral, no desenvolvimento de fibrose estoriforme, formada por células fusiformes (Suarez; Abril; Puerta, 2017; Ito et al., 2019; Kawanami et al., 2021). A infiltração observada caracteriza-se pela formação de centros germinativos que aumentam a produção de IgG4, e consequentemente, elevam desproporcionalmente seus níveis séricos em relação às demais classes de IgG (Perugino et al., 2018; Ito et al., 2019).

Desde 1892, tem-se conhecimento de pacientes com distúrbios compatíveis aos achados patológicos da DR-IgG4. Entretanto, este conceito foi proposto e aceito somente no início da segunda década do século 21 em Boston, vigorando até os dias atuais (Suarez; Abril; Puerta, 2017).

Por se tratar de uma condição descoberta recentemente, ainda não há estudos suficientes para estimar sua real incidência e prevalência. A maior parte do que se sabe sobre a epidemiologia da doença advém da avaliação de séries de casos, as quais sugerem uma maior frequência de acometimento em homens, abrangendo principalmente indivíduos da meia idade e idosos. Não há um consenso sobre predileção em determinadas etnias, embora os primeiros relatos de pancreatite autoimune tenham sido relatados em asiáticos (Suarez; Abril; Puerta, 2017; Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018; Wallace et al. 2019b).

Os mecanismos envolvidos com a fisiopatologia da DR-IgG4 não são totalmente esclarecidos. Propõe-se que um fator ainda desconhecido agiria como gatilho para o desenvolvimento de uma resposta imunológica adaptativa, e esta promoveria infiltração de plasmócitos no órgão atingido. A proteína galectina-3 tem sido estudada nesse contexto por se acreditar que ela atua como alvo antigênico. Alguns autoanticorpos associados à patogênese incluem: inibidor de tripsina anti-pancreática, lactotransferrina e anticorpos de anidrase carbônica (Suarez; Abril; Puerta, 2017; Perugino et al., 2019; Tsuboi et al., 2020; Kawanami et al., 2021).

As células T CD4+, em alguns modelos, também estariam implicadas na patogênese da doença por produzirem mediadores que estimulariam o desenvolvimento de fibrose (Suarez; Abril; Puerta, 2017; Perugino et al., 2019; Ito et al., 2019). Resultados de um estudo conduzido por Ito et al. (2019) mostraram níveis aumentados de células T foliculares reguladoras (Tfr) em pacientes com IgG4-RD quando comparados a pacientes saudáveis, assim como associaram positivamente esse aumento com níveis séricos de IgG4 e número de órgãos envolvidos.

Encontram-se ainda grandes dificuldades para o diagnóstico da DR-IgG4, devido em parte aos variados padrões de acometimento que podemos observar (Wallace et al., 2019a). Este estudo tem por objetivo pontuar as principais manifestações clínicas que integram o espectro da DR-IgG4.

2. MÉTODOS

Trata-se de uma revisão de literatura integrativa do tipo descritiva e com abordagem qualitativa, realizada nas bases de dados Embase, PubMed, Science Direct e Scientific Electronic Library Online (SCIELO) e Web of Science.

Foram utilizados quatro descritores para a busca na literatura, obtidos nas plataformas MeSH (Medical Subject Headings) e DeCS (Descritores em Ciências da Saúde). Na primeira, foram selecionados “Immunoglobulin G4-Related Disease” e “Immunoglobulin G”, enquanto na segunda foram “Doença Relacionada a Imunoglobulina G4” e “Imunoglobulina G”. A pesquisa nas bases de dados listadas ocorreu pela combinação ou uso isolado destes descritores.

A inclusão de artigos para compor essa revisão se baseou na aplicação dos seguintes critérios: produção realizada nos últimos 6 anos e abordagem voltada para a Doença Relacionada a IgG4. Foram descartados artigos cuja língua fosse diferente do português, inglês ou espanhol.

A escolha das produções que integram essa revisão ocorreu em duas etapas. Primeiramente, realizou-se a busca e posterior leitura dos títulos e resumos das produções científicas encontradas, selecionando aquelas que se enquadraram nos critérios de inclusão. Posteriormente, foi realizada uma leitura do texto completo, destinada a selecionar os artigos que seriam incluídos nesta revisão.

Na Pubmed, foram utilizados os descritores “Immunoglobulin G4-Related Disease” e “Immunoglobulin G”, obtendo-se 239 resultados. Após aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, 42 produções foram selecionadas para uma revisão pormenorizada, e destas, 29 foram incluídas nessa revisão. Na Science Direct, foram utilizados os descritores “Immunoglobulin G4-Related Disease” e “Immunoglobulin G”, obtendo-se 9 resultados. Destes, 4 foram selecionados para uma leitura pormenorizada e, ao final, todos foram incluídos. A busca na Scielo com os descritores “Doença Relacionada a Imunoglobulina G4” e “Imunoglobulina G” gerou 1 resultado, que foi selecionado para uma leitura pormenorizada, não sendo incluído nesta revisão. Na Web of Science, foram utilizados os descritores “Immunoglobulin G4-Related Disease” e “Immunoglobulin G”, obtendo-se 1 resultado, sendo este selecionado para uma leitura pormenorizada e, ao final, incluído no estudo. Por fim, a busca na plataforma Embase com os descritores “Immunoglobulin G4-Related Disease” e “Immunoglobulin G” gerou 820 resultados, dos quais 7 foram selecionados para leitura pormenorizada e 4 incluídos ao final.

A análise dos estudos incluídos foi feita por meio da tabulação dos seguintes dados de cada artigo em uma planilha do programa Microsoft Excel: autor(es), sistemas acometidos e manifestações. Ao final, foi feita uma síntese dos dados obtidos de forma descritiva e qualitativa.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Após aplicação do método, foram incluídos neste estudo 38 artigos. No QUADRO 1, pode ser visualizada a relação dos tipos de acometimentos em sistemas orgânicos específicos.

QUADRO 1 – Principais órgãos e sistemas acometidos dentro do espectro da DR-IgG4 e suas respectivas manifestações clínicas

Localização Manifestações Referência
Rins Nefrite tubulointersticial em DR-IgG4 Al-Mujaini et al., 2018; Bhattad, Joseph e Peterson, 2020; Gou et al., 2018; Zheng, Teng e Li, 2017
Sistema Nervoso Meningite hipertrófica por DR-IgG4

Paquimeningite espinhal por DR-IgG4

Paquimeningite hipertrófica com higroma subdural policístico e hematoma em DR-IgG4

Hipofisite relacionada por DR-IgG4

Alrashdi, 2020; Al-Mujaini et al., 2018; Bong et al., 2021; Boban, Ardal e Thurnher, 2018; Gersey et al., 2021; Ota et al. ,2020; Levraut et al., 2019.
Pulmões Pleurite por DR-IgG4

DR-IgG4 pulmonar

DR-IgG4 pulmonar com nódulos traqueobrônquicos

Derrame pleural causado por DR-IgG4

Al-Mujaini et al., 2018; Kang et al., 2020; Lv et al., 2018; Makimoto et al., 2019; Shimada et al., 2021; Wand et al., 2020; Wang et al., 2019.

 

Órbita ocular Doença oftálmica em saco lacrimal por DR-IgG4

DR-IgG4 oftálmica

DR-IgG4 associado a Doença ocular da tireoide

Aryasit et al., 2021; Au et al., 2020; Ye et al., 2020.
Fígado Atrofia Hepática por DR-IgG4

Hepatite autoimune por DR-IgG4

Colangite esclerosante por DR-IgG4

Al-Mujaini et al., 2018; Chang et al., 2020; Fujita e Hatta, 2020; Goodchild, Pereira e Webster, 2018; Matsumoto et al., 2019; Minaga et al., 2019.
Pâncreas

 

Pancreatite autoimune por DR-IgG4 Al-Mujaini et al., 2018; Matsumoto et al., 2019.
Estômago DR-IgG4 gastresofágica

DR-IgG4 gástrica

Gastrite linfoplasmocítica em DR-IgG4

Al-Mujaini et al., 2018; Khan et al., 2020; Seo et al., 2018; Skorus, Kenig e Mastalerz, 2018.
Sistema vascular Aneurisma de aorta abdominal

Aortite

Periaortite

Arterite

Al-Mujaini et al., 2018; Peng et al., 2020; Prucha et al., 2019.
Ovário DR-IgG4 ovariana Akyol et al., 2020; Alorjani et al., 2020.
Testículo DR-IgG4 testicular Shams et al., 2021.
Próstata Prostatite relacionada a IgG4 Al-Mujaini et al., 2018.
Cavidade oral DR-IgG4 envolvendo a mandíbula Tong, Ng e Lo, 2017.
Cabeça e pescoço Fibrose angiocêntrica eosinofílica Ahn e Flanagan, 2018.
Musculatura esquelética DR-IgG4 em bíceps Özdel et al., 2020.
Abdome Massa abdominal

Fibrose retroperitoneal

Mesenterite esclerosante

Al-Mujaini et al., 2018; Olmos et al., 2021.
Pele DR-IgG4 cutâneo

Pseudolinfoma cutâneo em DR-IgG4

Al-Mujaini et al., 2018; Ishimoto et al., 2021.
Tórax Mediastinite esclerosante em DR-IgG4

Mastite esclerosante por DR-IgG4

Pseudotumores inflamatórios da mama por DR-IgG4

Pericardite constritiva relacionada a IgG4

Al-Mujaini et al., 2018.
Tireoide Doença da tireoide relacionada a IgG4 e

Tireoidite de Hashimoto fibrosa

Al-Mujaini et al., 2018.

Fonte: Elaborado pelos autores (2023).

3.1 ASPECTOS CLÍNICOS

A DR-IgG4 possui apresentação clínica variável, podendo acometer um órgão específico ou diversos, de maneira síncrona ou metacrônica. A evolução normalmente não é aguda, logo, sintomas como febre, prostração, sensação de mal-estar, sudorese noturna e até perda de peso são incomuns (Al-Mujaini et al., 2018; Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018).

Na clínica, ocorre sintomas relacionados a alergia, linfadenopatia e tumorações em parte considerável dos pacientes, que podem apresentar níveis elevados de IgE e eosinofilia em sangue periférico (Al-Mujaini et al., 2018; Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018). Várias das manifestações clínicas que são apresentadas por pacientes com DR-IgG4 estão associadas ao efeito compressivo da massa tumoral sobre estruturas adjacentes, bem como no próprio órgão acometido (Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018).

3.2 PRINCIPAIS ÓRGÃOS ACOMETIDOS

No geral, os acometimentos mais frequentes são pancreáticos, orbitário, glândulas salivares e glândulas lacrimais (Al-Mujaini et al., 2018). Contudo, acometimentos em outros sítios, como os citados no QUADRO 1, podem ser descobertos, considerando que a DR-IgG4 pode ocorrer virtualmente em qualquer órgão e que quadros anteriormente considerados como dentro de outras doenças, estão hoje, sendo classificadas dentro do espectro da DR-IgG4 (AL-Mujaini et al., 2018; Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018).

A DR-IgG4 foi relatada primeiramente em acometimentos pancreáticos, na Pancreatite Autoimune (PAI) do tipo 1, cujo as evidências histopatológicas indicam pancreatite esclerosante linfoplasmocítica. Uma característica de PAI associada a DR-IgG4 é o envolvimento de outras estruturas como rins, ductos biliares, fibrose peritoneal, linfonodos e órbita ocular. O acometimento hepático por DR-IgG4 e do sistema de ductos biliares, em grande parte dos casos, está associado com PAI tipo 1 (Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018; Cargill et al., 2019).

O sistema nervoso possui uma maior ocorrência dos casos em estruturas específicas. Quando ocorre nas meninges, o quadro é de uma paquimeningite hipertrófica, que pode gerar sintomas como cefaleia, convulsões ou sintomas relacionados a NC específicos, tais como déficits na visão, motores, sensitivos entre outros. Nos casos em que existe uma DR-IgG4 na hipófise, os sintomas dependem de algumas características da massa como sua localização e tamanho, mas de modo geral, ocorre deficiências hormonais hipofisárias (Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018).

Com relação ao acometimento de glândulas lacrimais e salivares, antiga doença de Mikulicz, ocorreu uma atualização da nomenclatura, sendo que, quando o sítio é a glândula lacrimal, tem-se uma dacrioadenite por DR-IgG4, enquanto, no caso de inflamação das glândulas salivares, a nomenclatura se tornou sialoadenite por DR-IgG4. Com relação a clínica, ocorre geralmente nesses casos, a coexistência de PAI do tipo I, nefrite intersticial e anticorpos negativos como o anti RO, anti LA, antinuclear e fator reumatoide (Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018).

Ainda em topografia craniana, mesmo em raros casos descritos, acometimentos otológicos, nasais e na região da garganta foram relatados. A manifestação da DR-IgG4 nasal pode se apresentar como uma massa invasiva de caráter destrutivo, inclusive em estruturas ósseas próximas, ou cursar com um padrão infiltrativo plasmocitário (Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018).

No envolvimento orbital da DR-IgG4, geralmente a manifestação é uma doença em ambas as órbitas, indolor, com sintomatologia associada a presença da massa na região. Pode envolver estruturas como glândulas e ductos lacrimais, esclera, musculatura extraocular, tecidos moles locais e estruturas nervosas como o nervo trigêmeo (Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018; Au et al., 2020).

Quando se trata de acometimento tireoidiano na DR-IgG4, atualmente, se trata da tireoidite de Reidel e da tireoidite de Hashimoto fibrosante. A tireoidite de Reidel consiste em doença infiltrativa fibroesclerótica crônica, que deixa o paciente com a tireoide com aspecto endurecido, enquanto na tireoidite de Hashimoto fibrosante, é caracterizada por camadas de fibrose e infiltrações plasmocíticas IgG4 positivas (Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018; Wu; Sun, 2019).

Nos rins, no contexto da DR-IgG4, existem dois achados mais comuns que são a nefrite tubulointersticial e glomerulonefrite membranosa, que se manifestam clinicamente devido à disfunção dos rins. Na DR-IgG4 renal, ocorre destruição tubular e atrofia. O padrão histológico estoriforme de fibrose com boa delimitação de margens auxilia na diferenciação entre a DR-IgG4 e outras formas primárias de acometimento renal (Zheng; Teng; Li, 2017; Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018).

Nos pulmões, a DR-IgG4 se manifesta com sintomatologia inespecífica e o paciente apresenta dor torácica, dispneia e tosse. A DR-IgG4 pode se apresentar como doença intersticial ou como um pseudotumor, que pode ser verificado em exames de imagem (Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018).

Os acometimentos da DR-IgG4 no Trato Gastrointestinal (TGI) apresentam-se com fibrose infiltrativa e espessamento da parede do TGI, bem como pseudotumores. A esofagite e a gastrite em DR-IgG4 são citadas na literatura com ocorrência maiores, embora no caso do esôfago seja considerado raro. A presença de neoplasia deve ser descartada (Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018).

A DR-IgG4 pode ainda acometer estruturas retroperitoneais, na maioria dos casos com características de inflamação crônica e infiltrativa. A sintomatologia está associada com a estrutura anatômica acometida, bem como sua expansão para as adjacências, atingindo rins e veia cava inferior por compressão. Periaortites e periarterites na DR-IgG4 ocorrem mais em aorta abdominal, artérias ilíacas, renais e mesentéricas, podendo evoluir para uma complicação comum nesses casos, que é o aneurisma inflamatório (Al-Mujaini et al., 2017; Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018).

No caso de linfonodopatia na DR-IgG4, pode ocorrer em topografia específica ou de forma generalizada, sendo indolores e de tamanho variável até 5 centímetros. DR-IgG4 em linfonodos possui diagnósticos diferenciais como linfoma, infecções, neoplasias entre outros (Al-Mujaini et al., 2018; Obiorah; Velasquez; Özdemirli, 2018).

Outros acometimentos listados no QUADRO 1 como DR-IgG4 em gônadas, próstata, pele, cavidade oral e musculatura esquelética, tiveram poucos estudos e casos relatados na literatura pesquisada. Com relação à musculatura esquelética, uma publicação turca de Özdel et al. (2020), foi ressaltado que o caso relatado por eles é o primeiro em pacientes pediátricos. Em mais um estudo turco, Akyol et al. (2020) relataram um acometimento ovariano bilateral, com envolvimento peritoneal em uma paciente de 58 anos. Tong, Ng e Lo (2017), relataram um caso de envolvimento mandibular em uma mulher de 46 anos em Hong Kong.

4. CONCLUSÃO

Nota-se a vasta gama de manifestações da DR-IgG4, as quais variam quanto à repercussão clínica associada, mas que podem caracterizar quadros complicados em virtude da possibilidade de acometimento de órgãos nobres do corpo humano, incluindo estruturas do SNC, fígado e rins. Somado a isso, o grande espectro de condições relatadas na literatura pode sugerir que, virtualmente, todos os sistemas orgânicos são suscetíveis, embora tenha se observado, a partir da avaliação da literatura, o maior acometimento de tecidos glandulares, especialmente o pâncreas que, inclusive, foi o primeiro órgão implicado no espectro de manifestações da DR-IgG4.

Dessa forma, torna-se necessário a inclusão do diagnóstico diferencial da DR-IgG4 na avaliação de todo paciente com doenças cujo a proliferação no sítio primário, cause compressão de estruturas adjacentes, bem como quadros muito inespecíficos em que se foi descartado hipóteses mais comuns. Mais estudos são necessários para uma melhor caracterização da DR-IgG4, visto que outrora manifestações que eram consideradas outras doenças, se encontram hoje, dentro do espectro da DR-IgG4.

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[1] Graduando em Medicina pela Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). ORCID: 0000-0001-5366-663X. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/1083418332031478.

[2] Graduando em Medicina pela Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). ORCID: 0000-0002-3797-8200. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/9535921049442818.

[3] Graduanda em Medicina pela Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). ORCID: 0000-0002-4293-2821. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/2957457330917059.

[4] Graduanda em Medicina pela Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). ORCID: 0000-0003-4518-2920. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8169447371427223.

[5] Graduanda em Medicina pela Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). ORCID: 0000-0003-4751-7712. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/6911069085442715.

[6] Orientadora. Biomédica, Doutora em Doenças Tropicais, Professora e pesquisadora do Curso de Medicina do Campus Macapá, Universidade Federal do Amapá (UNIFAP), e do Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde (PPGCS UNIFAP), Pró-reitora de Pesquisa e Pós-Graduação (PROPESPG) da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). ORCID: 0000-0001-5128-8903. Currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/9314252766209613.

[7] Doutorado em Psicologia e Psicanálise Clínica. Doutorado em andamento em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Mestrado em Ciências da Religião pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestrado em Psicanálise Clínica. Graduação em Ciências Biológicas. Graduação em Teologia. Atua há mais de 15 anos com Metodologia Científica (Método de Pesquisa) na Orientação de Produção Científica de Mestrandos e Doutorandos. Especialista em Pesquisas de Mercado e Pesquisas voltadas a área da Saúde. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2952-4337. Lattes: https://lattes.cnpq.br/2008995647080248.

[8] Biólogo, Doutor em Teoria e Pesquisa do Comportamento, Professor e pesquisador do do Instituto de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico do Amapá (IFAP), do Programa de Pós Graduação em Educação Profissional e Tecnológica (PROFEPT IFAP) e do Programa de Pós Graduação em Biodiversidade e Biotecnologia da Rede BIONORTE (PPG-BIONORTE), polo Amapá. ORCID: 0000-0003-0840-6307. Currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/8303202339219096.

[9] Biólogo, Doutor em Doenças Tropicais, Professor e pesquisador do Curso de Educação Física da Universidade Federal do Pará (UFPA). ORCID: 0000-0001-8059-5902. Currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/1807260041420782.

[10] Doutoranda em Ciências do Cuidado em Saúde pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP); Especialista em Saúde da Família pela Universidade Estadual do Ceará, UECE, Brasil; Especialista em Medicina do Trabalho Universidade Gama Filho, UGF, Brasil; Especialista em Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana pela Fundação Oswaldo Cruz, FIOCRUZ, Brasil; Especialista em Clínica Médica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Pará; Médica pela Universidade do Estado do Pará (UEAP). ORCID: 0000-0002-7742-144X. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8427706088023830.

Material recebido: 03 de agosto de 2023.

Material aprovado pelos pares: 26 de dezembro de 2023.

Material editado aprovado pelos autores: 31 de janeiro de 2024.

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Carla Dendasck

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