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Transformando A Dor Em Laços De Amor: A Participação De Enlutados Num Grupo De Apoio

RC: 23909
973
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/psicologia/grupo-de-apoio

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

SASSI, Franciele [1]

SASSI, Franciele. Transformando A Dor Em Laços De Amor: A Participação De Enlutados Num Grupo De Apoio. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 03, Ed. 12, Vol. 05, pp. 29-66 Dezembro de 2018. ISSN:2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/psicologia/grupo-de-apoio, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/psicologia/grupo-de-apoio

RESUMO

O ser humano é, naturalmente, um ser relacional. Os grupos existentes nas diferentes esferas da vida social possibilitam o compartilhamento de objetivos, anseios e necessidades, na busca por soluções funcionais por meio do conhecimento gerado no contexto da colaboração dos pares. No que tange aos grupos de apoio, estes configuram-se como suportes sociais de apoio e amparo frente às dificuldades de atravessamento e superação do processo de mudança imposto pelo luto. O presente trabalho pretende, portanto, mapear os estudos sobre grupos de apoio ao luto a fim de investigar os possíveis benefícios da participação de indivíduos enlutados num grupo de apoio, no que tange à facilitação do processo de elaboração do luto. Para tal, foi utilizada a metodologia de estudo denominada Revisão Sistemática da Literatura, a qual possibilitou organizar os materiais coletados durante a pesquisa – delimitada entre 2004 e 2014 – e investigá-los, possibilitando a relação entre o trabalho do psicólogo como aconselhador em situações de luto junto ao contexto dos grupos de apoio a enlutados em sua totalidade e, mais especificamente, tratando-se do grupo denominado Transformando a dor em laços de amor. Articulando a teoria encontrada essencialmente nos autores Silva (2004); Luz et al., (2006); Pinheiro (2010); Pascoal (2012); e Dyregrov et al., (2013) com a experiência prática de coordenação do grupo de apoio ao luto, observou-se que a referida perspectiva de trabalho é possível e se mostra positiva e inspiradora aos seus membros, uma vez que o compartilhamento das emoções num ambiente seguro de trocas mútuas parece promover o desenvolvimento e/ou o aprimoramento de habilidades para o reconhecimento dos sintomas e reações de luto como naturais deste processo, a fim de, ao longo do tempo de cada um, seja possível reinvestir na vida e no viver.

Palavras-chave: grupos de apoio a enlutados, aconselhamento psicológico no luto, grupos de apoio e psicologia.

INTRODUÇÃO

Muitos acreditam que o amor se constitui na mais intensa fonte de prazer na vida, ao passo que a perda é compreendida como a mais profunda fonte de dor e sofrimento. Embora alguns escolham não investir no amor junto às suas diferentes representações, podendo trazer riscos relevantes para o desenvolvimento e manutenção das relações, outros ousam juntar-se aos seus semelhantes para experimentarem as trocas desse encontro. Assim, é a transitoriedade da vida que enaltece o amor, apresentando como componente fundamental o compromisso, que possibilita o estabelecimento de um laço emocional capaz de vincular dois seres por um longo período. Pode-se pensar que a resistência humana frente às rupturas do ciclo vital encontra-se ligada à natureza dos laços anteriormente consolidados, à medida que, uma vez estabelecidos, dificilmente poderão ser afrouxados. Entende-se também que quanto maior o potencial para a perda, tanto mais acentuada é a força do vínculo. Logo, a dor da perda refere-se ao custo do compromisso de amar (Parkes, 2009).

O luto – conjunto de reações normais e esperadas diante do rompimento de uma relação significativa – apresenta efeitos deletérios sobre a saúde física e mental do ser humano em crise, por tratar-se de uma das experiências de estresse mais graves e potencialmente danosas (Parkes, 1998). Bowlby (2006) afirma que o processo de luto envolve duas mudanças psicológicas: (a) reconhecer a realidade da perda; e (b) experimentar e manejar com as mudanças e emoções provindas desta. Costa (2006) reitera que a partir da circunstância da ausência do outro, os enlutados terão de repensar os conceitos sobre o mundo e a vida, sentirão a discrepância entre a realidade e os seus constructos internos e reorganizarão as maneiras de viver depois da perda. Por tais fins, acredita-se que o luto seja um tema muito apropriado para a pesquisa clínica.

Ainda que as separações causadas pela ausência, em vida, da figura amada sejam razão de tamanha dor, o processo inerente à sua elaboração, ao longo da vida, é fundamental para a saúde mental, à medida que promove a reconstrução dos recursos psíquicos e readaptação frente às mudanças. A dor feita presente pelo luto é parte integrante do seu processo de elaboração, porque é a dor da mudança. A experiência da morte do próximo sempre acarretará transformações àquele que permanece em vida (Worden, 2013). O enfrentamento do luto, portanto, possibilita a conquista da confiança para que o indivíduo seja capaz de atravessar as demais perdas e encontrar um novo meio para atribuir significado àquilo que lhe foi amado em vida (Casellato, 2013).

Ao longo dos últimos 20 anos, constatou-se um significativo interesse e envolvimento dos profissionais da saúde mental com o tema das perdas. Parkes (2009) considera que as pessoas têm procurado cuidados em razão de se sentirem presas àquilo que foi perdido e impossibilitadas de voltar a viver. Worden (2013) acrescenta que a busca dos enlutados por ajuda profissional, muitas vezes, advém da crença de que não suportam atravessar a experiência da perda e que o sofrimento provindo do rompimento do vínculo afetivo com a figura de apego não se finda. A perda do objeto que outrora fora investido de amor pelo enlutado, agora ausente, provoca a fragmentação de uma parte de si mesmo enquanto em vida. Assim, é possível dizer que a dor do luto reflete a dor de transformar e ressignificar todos os sentidos anteriormente associados ao vínculo consolidado, além de reatribuir as representações física e simbólica ao objeto perdido.

Não se pode negar que o processo de luto é um percurso complexo, sendo vivenciado de maneiras peculiares, considerando os diferentes estilos de apego estabelecidos ainda na infância e estendidos ao longo da vida adulta (Parkes, 2009). Embora este processo seja individual, a prática clínica demonstra que a rede de apoio do enlutado como, por exemplo, os familiares e demais pessoas próximas, também acabam sendo afetadas, tornando-o um fenômeno social (Casellato, 2013). Tais repercussões, do mesmo modo, podem ser testemunhadas no contexto dos grupos de apoio a enlutados, à medida que sua vivência expõe a complexidade da morte na vida daqueles que permaneceram. Os grupos de apoio, no que diz respeito aos possíveis benefícios da sua participação pelos indivíduos enlutados, será o objeto de estudo a ser investigado na apresentação do presente trabalho.

Há quase dois anos, tive a oportunidade de me integrar à equipe de profissionais da Luspe Clínica Psicológica (Luto, Separações e Perdas), como estagiária de Psicologia, a fim de realizar a coordenação de um grupo de apoio ao luto, denominado Transformando a dor em laços de amor, na cidade de Caxias do Sul, Rio Grande do Sul. O grupo é aberto, no qual cada enlutado se apresenta e expõe a motivação de fazer-se presente, referindo-se à história de sua perda. Acontecem também diferentes atividades dinâmicas relacionadas à educação para a morte, orientação psicológica e acompanhamento no que tange ao processo de luto e sobre o morrer. O grupo é realizado a cada 15 dias, aproximadamente. O trabalho com pessoas enlutadas tem sido uma experiência genuína no que se refere à vivência prática tanto pessoal como profissionalmente, permitindo-me vislumbrar as teorias estudadas, familiarizadas ao contexto da realidade. Além disso, tem se mostrado eficiente, à medida que se constitui uma forma de oferecer apoio emocional, educação às questões de finitude e também apresenta objetivos sociais, possibilitando a integração e socialização entre os membros, conjunto de fatores que os enlutados parecem buscar frente às sensações de solidão e instabilidade emocional.

A continência e o amparo, oferecidos em situações de crise por meio de um suporte psicológico consistente, atuam como agentes facilitadores no fortalecimento de recursos egoicos dos enlutados para a sua reorganização psíquica frente à perda. Além disso, auxiliam na promoção de estratégias funcionais e adaptativas, considerando a reformulação do seu mundo presumido depois da ruptura (Bromberg, 1998). O aconselhamento psicológico, modalidade de intervenção que pode ser feita no contexto dos grupos de apoio, pode ser um importante recurso a serviço do trabalho de elaboração do luto, servindo como facilitador durante a experiência de perda. Do mesmo modo, contribui como abordagem preventiva diante da instauração de um eventual luto complicado e/ou outras reações possíveis, não desconsiderando a psicoterapia, tão necessária e complementar a este trabalho (Costa, 2006).

Dada a experiência prática mencionada, o objetivo geral do presente trabalho encontra-se em mapear os estudos sobre grupos de apoio ao luto, a fim de investigar os possíveis benefícios da participação de indivíduos enlutados num grupo de apoio, no que tange à facilitação do processo de elaboração do luto. Do mesmo modo, pretende-se explorar possibilidade(s) para o uso do aconselhamento psicológico em situações de luto frente à coordenação de um grupo de apoio a enlutados; descrever de que forma(s) as intervenções breves e pontuais previstas no aconselhamento psicológico podem ser benéficas frente às necessidades apresentadas pelo grupo de apoio a enlutados a cada encontro; e investigar possíveis benefícios da participação de indivíduos enlutados num grupo de apoio no que tange à facilitação do processo de elaboração do luto. Tal estudo, portanto, é decorrente da percepção da importância da psicologia nas situações de luto e perdas, bem como da inserção de enlutados em um grupo de apoio – como recurso complementar de auxílio no que tange à recuperação frente ao luto.

Permitir-se fazer parte de um grupo de apoio ao luto significa autorizar-se a si mesmo e ao outro o processo de mudança. Integrar-se como um membro, por sua vez, refere-se à possibilidade de novas construções e de modos de ser e viver diferentes. Coordenar um grupo, neste contexto, diz respeito à transformação e ressignificação de crenças e valores. Grupo também é laço, é a formação e consolidação de novos vínculos. A união de indivíduos que estabelecem uma aliança para auxiliarem uns aos outros, com a finalidade comum de transformar a dor do luto em momentos de lembranças e saudade é, sobretudo, uma proposta de amor.

OBJETIVOS

Objetivo geral

  • O presente trabalho pretende mapear os estudos sobre grupos de apoio ao luto, a fim de investigar os possíveis benefícios da participação de indivíduos enlutados num grupo de apoio, no que tange à facilitação do processo de elaboração do luto.

Objetivos específicos

  • Explorar possibilidade(s) para o uso do aconselhamento psicológico em situações de luto frente à coordenação de um grupo de apoio a enlutados;
  • Descrever de que forma(s) as intervenções breves e pontuais previstas no aconselhamento psicológico podem ser benéficas frente às necessidades apresentadas pelo grupo de apoio a enlutados a cada encontro;
  • Investigar possíveis benefícios da participação de indivíduos enlutados num grupo de apoio no que tange à facilitação do processo de elaboração do luto.

MÉTODO DE ESTUDO:

UMA REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA

DELINEAMENTO

Foi realizada uma pesquisa bibliográfica, cuja modalidade de exploração tratou do levantamento de referenciais já publicados em materiais como livros, artigos, dissertações, periódicos e revistas científicas, relacionados ao tema específico do contexto de trabalho com grupos de apoio a enlutados (Marconi & Lakatos, 2007). De acordo com Gil (1999), este gênero de pesquisa permite ao investigador um amplo compêndio de fenômenos, à medida que são realizados estudos históricos. Portanto, é efetuada quando há a tentativa de compreender os eventos estudados, por meio da resolução de problemas e aquisição de conhecimentos sobre estes (Barros & Lehfeld, 2007).

Para tal, utilizou-se o delineamento qualitativo com caráter exploratório. Godoy (1995) menciona que a pesquisa qualitativa emprega instrumentos na análise dos fatores levantados para a obtenção de dados descritivos frente ao fenômeno estudado, permitindo a melhor compreensão do objeto de análise. Esta classe de estudo está relacionada ao universo dos significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, sendo irredutível à operacionalização de variáveis. Silveira e Córdova (2009) acrescentam que o delineamento qualitativo busca descrever, compreender e explicar os acontecimentos. Assim, caracteriza a complexidade de determinados problemas e interações entre variáveis específicas, além de conceber e classificar os processos dinâmicos envolvidos (Diehl & Tatim, 2004).

O caráter exploratório da presente pesquisa, por sua vez, permitiu maior familiaridade junto ao problema do trabalho (Silveira & Córdova, 2009). Raupp e Beuren (2003) consideram que este gênero de investigação estimula o pensamento científico, por meio de concepções mais profundas de um problema ou mesmo a geração de novas ideias ou hipóteses para o objeto de estudo. Assim, a pesquisa exploratória usualmente é utilizada quando o tema proposto precisa de maiores apurações, em razão de existirem conhecimentos escassos sobre ele, o que pode obstacularizar a formulação de hipóteses precisas e operacionalizáveis (Gil, 1999).

FONTES

As pesquisas debruçaram-se sobre materiais científicos como livros, artigos, monografia, dissertações, periódicos e revistas científicas relacionadas ao tema proposto. Gerhardt, Ramos, Riquinho & Santos (2009) mencionam que a metodologia da coleta de dados, denominada pesquisa bibliográfica, contempla fontes escritas, impressas em editoras, comercializadas em bibliotecas ou livrarias. Além disso, abarca materiais científicos também disponíveis na internet.

Os materiais de pesquisa acerca do aconselhamento psicológico realizado como modalidade de intervenção frente aos grupos de apoio ao luto, bem como a análise sobre os possíveis benefícios da participação de enlutados num grupo de apoio como recurso facilitador para o processo de elaboração do luto foram fundamentados, sobretudo, sob as referências dos seguintes autores: Silva (2004); Luz, Goulart e Benincá (2006); Pinheiro (2010); Dyregrov, Dyregrov e Johnsen (2013); Pascoal (2012); Toseland e Rivas (2005); Yalom e Leszcz (2005) – sendo as cinco primeiras produções utilizadas fundamentalmente durante a discussão do trabalho – além de autores empregados de forma secundária para fins de complementação e ampliação de conceitos, ideias e representações. Os descritores utilizados para a presente busca foram: aconselhamento psicológico no luto/em situações de luto, aconselhamento psicológico em grupos de apoio, trabalho com grupos, grupo de apoio ao luto/aos enlutados/a familiares enlutados e demais variantes.

Considerou-se o espaço de tempo delimitado para a pesquisa dos materiais principais entre 2004 e 2014. Contudo, não significa que publicações mais remotas ou mesmo recentes de outros autores para além dos predominantes não possam apresentar contribuições pertinentes acerca do tema proposto. Ressalta-se que, dos aproximados 1600 materiais encontrados especificamente nas bases de dados pesquisadas até o mês de julho de 2014, foram selecionados cinco artigos, nacionais e de língua inglesa, que abordam sobre o trabalho da psicologia junto aos grupos de apoio a enlutados e que foram essencialmente dispostos durante a discussão do trabalho. Cabe ressaltar que, a partir da leitura dos referidos artigos, alguns conteúdos puderam ser adaptados para que fosse possível abranger questões ligadas ao aconselhamento psicológico em situações de luto frente aos grupos de apoio e quanto aos possíveis efeitos da participação de seus membros ao longo dos meses, durante cada encontro.

O mecanismo de busca empregado para a coleta dos dados de pesquisa foi fundamentalmente o Google Acadêmico. As bases de dados utilizadas para a elaboração da monografia foram Scientific Electronic Library Online (Scielo), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), PsycInfo, PsycArticles, Psychology and Behavioral Sciences Collection, Academic Search Complete (EBSCO), Web of Knowledge, Web of Science, Bireme (Ibecs, Medline, Biblioteca Cochrane), etc. Do mesmo modo, puderam ser utilizados materiais de pesquisa adquiridos pela própria pesquisadora.

INSTRUMENTOS

Os dados coletados foram organizados em formato de fichas de catalogação. Marconi e Lakatos (2007) afirmam que tais fichas permitem ao pesquisador ter em mãos as referências utilizadas, além de auxiliar na ordenação dos assuntos trabalhados. Distinguem-se duas espécies de fichas, as bibliográficas e de catalogação. Para a presente monografia, foram confeccionadas fichas de catalogação, as quais puderam ser construídas a partir de transcrições fiéis dos trechos de cada obra utilizada ou mesmo frases consideradas relevantes, sob as formas de esquema, resumo e/ou anotações pessoais (Gil, 1999). O mesmo processo de elaboração fora adotado para os artigos e demais documentos científicos selecionados para estudo.

PROCEDIMENTOS

Para o levantamento das fontes, foram utilizadas as bases de dados anteriormente citadas, que contemplam publicações em língua portuguesa, originárias do Brasil, bem como em idiomas inglês e espanhol. Estas puderam ser encontradas a partir do mecanismo de pesquisa denominado Google Acadêmico, por meio da utilização dos descritores mencionados nas fontes de pesquisa.

Posteriormente, os materiais de pesquisa coletados foram organizados sob a forma de fichas de catalogação, sendo sistematizados para auxiliar no processo de armazenamento e localização dos tópicos. Assim, mediante classificação em cabeçalho, referências bibliográficas e texto, os assuntos tratados no presente trabalho podem ser acessados de forma prática e rápida (Salvador, 1977). Quanto à elaboração das fichas de catalogação, o cabeçalho pode ser construído a partir do título e subtítulo correspondentes aos itens definidos provisoriamente no trabalho. As referências bibliográficas, por sua vez, construídas a partir das informações necessárias para a identificação das fontes de pesquisa, e o corpo da ficha, construído por meio das transcrições fiéis de trechos das obras pesquisadas, de acordo com esquemas, resumos e/ou anotações pessoais (Gil, 1999). Ou seja, por meio da estruturação de uma tabela, constaram as seguintes informações: autor (es), ano de publicação, título do trabalho, transcrições dos textos e considerações/anotações pessoais. Acredita-se que a Revisão Sistemática da Literatura (Atallah & Castro, 1997; Sampaio & Mancini, 2006), sugerida como referencial de análise para a construção do presente trabalho tenha viabilizado a análise dos dados de pesquisa coletados.

REFERENCIAL DE ANÁLISE

O referencial de análise adotado aos documentos coletados para a elaboração da presente monografia foi a Revisão Sistemática da Literatura, como parte constituinte da pesquisa bibliográfica. De acordo com Atallah e Castro (1997), esta metodologia moderna de pesquisa possibilita ao pesquisador avaliar um conjunto de dados simultaneamente. Frequentemente é utilizada para a obtenção de evidências científicas a respeito de intervenções em saúde, tanto do setor público como do privado. Logo, agregar comprovações que concedam um guia para a prática clínica é uma das principais razões para o desenvolvimento de estudos relacionados à revisão e sintetização da literatura (Sampaio & Mancini, 2006).

As revisões sistemáticas, de modo geral, caracterizam-se por ser metódicas, explícitas e passíveis de reprodução. Reúnem, de forma organizada, larga quantidade de resultados provindos de pesquisas clínicas, tornando-as capazes de auxiliar no esclarecimento de diferenças eventualmente encontradas nos demais materiais de estudo. Esta modalidade de análise permite ao pesquisador nortear o desenvolvimento de projetos, sinalizando novos caminhos para futuras investigações e identificando quais métodos de pesquisa foram empregados em determinada área (Sampaio & Mancini, 2006).

A escolha do referencial de análise justificou-se devido à escassez de documentos científicos nacionais encontrados ao longo do período inicial de pesquisa nas bases de dados. Observou-se que o trabalho do psicólogo junto aos grupos de apoio a enlutados é um campo relativamente desconhecido tanto para a área profissional quanto para a população que poderia se beneficiar deste serviço. Além disso, parece haver preparo e/ou treinamentos insuficientes para atuação dos que se dispõem a trabalhar com a temática do luto e das perdas, sobretudo no Brasil. Por tais razões, acredita-se que a Revisão Sistemática da Literatura tenha oportunizado meios para a elaboração de um resumo que possibilitasse integrar e ordenar todos os possíveis esclarecimentos quanto ao trabalho realizado com grupos de apoio, por meio da utilização do aconselhamento psicológico em situações de luto, e também as eventuais soluções encontradas ou, neste contexto específico, os possíveis benefícios da prática deste serviço aos participantes dos grupos de apoio, no que tange à facilitação do processo de elaboração do luto.

DO INDIVIDUAL AO COLETIVO: A PARTICIPAÇÃO EM GRUPOS NA PROMOÇÃO DE VÍNCULOS E CONTINUIDADE DA VIDA

Grupos de apoio: um contexto de pertencimento, transformações e de busca por significados

Os grupos são considerados uma forma privilegiada de sobrevivência humana e podem ser vislumbrados sob várias esferas da vida social. Quaisquer perspectivas estudadas, referentes à vasta história da evolução da humanidade, consideram o ser humano na matriz de suas relações interpessoais. O homem, por natureza, é um ser relacional. Logo, aprende a se desenvolver quando em sociedade. Pesquisas demonstram que desde o estudo de primatas sub-humanos, tanto em culturas humanas primitivas quanto nas sociedades contemporâneas, os seres humanos encontram-se reunidos em grupos que se caracterizam pelo estabelecimento de intensos, contínuos e recíprocos laços entre seus membros, e que a necessidade de pertencer à junção de outros seres semelhantes a si torna-se motivação poderosa e fundamental para a sobrevivência da espécie (Yalom & Leszcz, 2005). A participação em grupos – estes entendidos como um conjunto de elementos que apresenta comportamentos e condutas análogos, com um objetivo comum capaz de condicionar sua coesão – permite que os indivíduos apreendam normas de procedência sociais, ensina a sedimentar as relações estabelecidas, a identificar objetivos pessoais, criando uma série de benefícios à saúde mental de seus participantes (Pinheiro, 2010).

Toseland e Rivas (2005) demonstram que um aspecto inerente ao grupo é a possibilidade de seus membros unirem-se por finalidades similares, mesmo trazendo consigo seu próprio conjunto de valores. Parece haver uma primordialidade de pertencer aos pares, os quais possibilitam a imersão das sensações de amparo e apoio mesmo frente às divergências do ciclo vital. Entende-se que esta espécie de sistema nutre a cultura dos seus participantes, bem como as tradições e seus interesses pessoais, à medida que os indivíduos tornam-se acessíveis uns aos outros e reforçam mutuamente o objetivo essencial da construção de um grupo, compreendido, neste âmbito, a partir do compartilhamento dos afetos, sentimentos e emoções em suas peculiaridades e semelhanças.

Vista a importância de uma rede de apoio continente frente às vulnerabilidades que as situações limitantes da vida impõem a cada indivíduo, assim como reiterados os possíveis benefícios da proximidade com pessoas que compartilham similitudes na busca por soluções saudáveis e funcionais a partir das mudanças impostas pelas perdas e ganhos vitais, entende-se que a existência de um grupo que permita que seus membros apoiem-se entre si apresente funções terapêuticas (Osório, 2007 em Pascoal, 2012). A partilha entre membros, num grupo de apoio, por exemplo, promove um espaço resguardado para a livre manifestação de uma variedade de condutas e expressões emocionais, assim como podem ser vislumbradas as particularidades e parecenças de cada participante, dada a oportunidade para a mobilização das emoções. Por tais fins, viabilizou-se a ideia de criar um lugar seguro para que a dor do luto, provinda de perdas por morte, pudesse ser sentida, reconhecida e contemplada com maior naturalidade pelos enlutados, e que, a partir das amplas trocas que são possíveis de se realizar quando em conjunto, houvesse o desenvolvimento e/ou o aprimoramento de habilidades e recursos psíquicos para seguir mesmo a partir da perda, considerando o tempo de luto de cada indivíduo.

Toseland e Rivas (2005) ponderam que a inevitabilidade de compartilhar anseios, necessidades e conflitos possibilita a busca pela construção de soluções e significados, estes produzidos por meio do conhecimento gerado no contexto da colaboração dos pares. Embora a reunião de um grupo de pessoas enlutadas aconteça em razão de um sofrimento comum, relacionado ao rompimento de um vínculo outrora estabelecido, a experiência das trocas é fundamental para o desenvolvimento e manutenção destes indivíduos na sociedade. Ademais, a partir do momento em que é disponibilizado um ambiente continente e seguro, que permite que os membros falem sem reservas sobre suas perdas e participem de forma conjunta, refletindo frente aos apontamentos e intervenções psicológicas realizadas por um coordenador, a morte parece mais fácil de integrar (Walsh & McGoldrick, 1998). Logo, o encontro entre seres humanos distintos, possível em razão de um pesar maior – a dor feita presente pelo luto – é o que permite que o grupo se torne real e íntegro, com tamanha sensibilidade e capaz de promover estratégias e recursos funcionais de sobrevivência que acalentam o coração, tão ferido pela ausência do ser amado. E, embora os indivíduos tragam suas histórias de vida carregadas de angústias e ansiedades em razão do pesar, sua participação e as relações positivas, construídas entre pessoas de diferentes credos, raças, idades, naturalidades e etc., auxilia-os no que tange à reorganização de crenças e ideais a respeito de um modo de ser que, inevitavelmente, deparar-se-á com readaptações e mudanças. Ressalta-se, ainda, que quanto mais claros os propósitos e valores em relação a si mesmos frente ao grupo estiverem aos participantes, tanto mais fácil poderá ser para atravessarem os objetivos conflituosos. Além disso, maior a compatibilidade do grupo (Toseland & Rivas, 2005). Entende-se, portanto, que somente é possível um lugar seguro no âmbito externo quando construído o mesmo seguro no que se refere ao íntimo de cada um, por meio do conhecimento e entendimento fundamentalmente internos sobre a complexidade envolta ao processo de enlutamento que cada indivíduo, de forma única e subjetiva, é capaz de experimentar em sua totalidade (Yalom, 2006 em Pascoal, 2012).

Sentir a dor do luto e permitir-se pertencer a um grupo de apoio promove a extensão do indivíduo para espaços de partilha e compartilhamento de informações, orientação emocional e resolução de conflitos. Sua participação num determinado ambiente autoriza a redução de sentimentos de inadequação frente à perda, em virtude de que os demais membros também se fazem presentes pela mesma razão; desenvolve a habilidade de comunicação e expressão das emoções que, por vezes, acabam sendo asfixiadas ou tomadas como absurdas pelo enlutado (por medo, raiva, vergonha, culpa, alívio, dentre outros sentimentos emergentes); oportuniza aprender com os pares o manejo das próprias limitações e a retomada do controle sobre determinadas situações, na medida em que o grupo possibilita voz a cada participante no incentivo às manifestações de pensamentos, sentimentos, sensações e condutas frente ao processo enfrentado numa atmosfera promotora de apoio e compreensão (Pinheiro, 2010). Além disso, a experiência compartilhada da perda e sua colocação em contexto, junto às emoções provindas do luto, sobretudo a tristeza e a saudade da pessoa amada, auxilia na integração da experiência da perda na vida dos enlutados, promovendo um sentido de continuidade e conexão familiar, cultural e humana, possibilitando recursos terapêuticos capazes de fortalecer a cada membro para o resgate do senso de si mesmo como parte de um processo de transformação e ressignificação (Walsh & McGoldrick, 1998).

De modo geral, os grupos apresentam-se semelhantes no que tange ao incentivo de um espaço no qual os indivíduos com adversidades comuns reúnem-se no intuito de buscar auxílio. No caso específico dos grupos de apoio aos enlutados, estes têm, como objetivos essenciais, educar para a morte; apoiar e incentivar a expressão das emoções emergentes de modo a compreendê-las e trabalhá-las; promover orientação psicológica frente a determinadas condutas e formas de pensar e sentir; possibilitar a socialização do grupo para que seja possível a consolidação de uma rede de apoio capaz de fortalecer os seus membros; criar conhecimento a respeito de sintomas e reações normativas e esperadas frente ao processo de luto e transformar práticas de modo que cada membro possa, com o tempo, reinvestir na sua vida e nas demais relações (Pinheiro, 2010). Entende-se, portanto, que a educação e orientação em relação às questões ligadas à morte e ao processo de morrer ampliam caminhos, aos enlutados, quanto à tolerância das suas próprias reações emocionais e as dos outros, bem como os padrões de luto e a passagem a ser percorrida para seguir adiante (Walsh & McGoldrick, 1998).

Yalom e Leszcz (2005) referem que os grupos e, neste contexto, pode-se também pensar nos grupos de apoio aos enlutados, favorecem interações que, com o passar do tempo, podem transformá-los numa espécie de microcosmo social. Estes mesmos autores acreditam, ainda, que com o transcorrer dos encontros realizados, os membros destes grupos permitem-se ser eles mesmos, sem reservas. Neste sentido, compreendem que podem começar a agir com seus pares de forma semelhante como reagem com membros de outras esferas. Este processo de integração, semelhante ao processo do luto, atravessado por cada participante de forma individual e em períodos peculiares, ao mesmo tempo contando com o amparo dos demais membros, possibilita crescimento pessoal e auxílio quanto à resolução de seus conflitos, na medida em que promove conhecimento e oferece segurança. Yalom e Leszcz (2005) creem na possibilidade de um grupo transformar de tal forma seus membros que, de acordo com a frequência da sua participação nos encontros, eles não conseguem mais esconder quem são ou o que pensam. Acredita-se que isto possa acontecer devido ao fato de que o sentimento de pertença, a continência e suporte promovidos tanto pela coordenação como pelos seus participantes promovem um senso de confiança de que suas histórias serão escutadas com atenção, respeito e compreendidas por todos, e que um trabalho conjunto está sendo realizado para a facilitação do luto de forma saudável. A proposta implícita dos grupos de apoio, de que seus membros possam se auxiliar entre si, refere-se à motivação grupal que atua como principal instrumento de ação terapêutica (Osório, 2007 em Pascoal, 2012).

De modo geral, a participação de enlutados em grupos de apoio se mostra satisfatória, à medida que facilita o processo normativo do luto e caracteriza-se por ser um recurso complementar de ajuda, capaz de prevenir o luto complicado. Além disso, favorece a expressão de sentimentos, muitas vezes, confusos e dolorosos, associados ao processo de enlutamento (Lorenz, 1988 em Silva, 2004). Grupos constituídos de membros que apresentam vivências comuns como, por exemplo, a dor sentida por uma perda, podem funcionar como um suplemento de apoio familiar que, por vezes, apresenta dificuldades para se manter após as mudanças. Logo, a proximidade com outros participantes contribui para a diminuição da solidão e do isolamento, bem como promove esperança e a consolidação de novos laços, fortalecendo o apoio social (Silva, 2004).

Entende-se que os grupos de apoio, nesta estruturação, são espaços disponíveis para que os indivíduos tenham a oportunidade de agir como aprendizes e sujeitos do saber, considerando suas adaptações no que tange aos seus conceitos e valores, tabus, fantasias inconscientes, concepções preconcebidas e estereotipadas. Oportunizar-se ao aprendizado em grupo refere-se a uma conduta mental acessível e disponível a novos caminhos de investigação e cientificidade. Contribui, do mesmo modo, para uma nova leitura a respeito da realidade e da (re)apropriação de si mesmo no aqui e agora, no que tange às mudanças impostas pela experiência do luto. Quando há a aproximação com outros que partilham de vivências semelhantes e objetivos comuns, cada sujeito passa de espectador para protagonista da sua história de vida e da história construída pelo seu grupo (Rivière, 1998 em Luz, Goulart & Benincá, 2006).

Os grupos, de modo geral, promovem intensos espaços para a vinculação segura e eficiente frente à condição semelhante pela qual seus membros se fazem presentes. O valor de cada encontro é percebido à medida que é possível vislumbrar os diferentes momentos de enfrentamento da dor; como elas vão se transformando e flexibilizando-se de acordo com o tempo e a partir dos significados atribuídos por cada membro. Ademais, torna-se possível reconhecer que os períodos voltados para a dor da saudade, bem como para a reestruturação das relações e da vida seguem e retornam num processo normal e esperado frente ao luto. O conforto oferecido para e entre os participantes de um grupo, de modo geral, contribuem de forma significativa para a retomada da confiança em si e na vida, bem como para o pensar sobre novas possibilidades, numa perspectiva de futuro (Pascoal, 2012).

ACONSELHAMENTO PSICOLÓGICO COMO MODALIDADE INTERVENTIVA FRENTE AOS GRUPOS DE APOIO AO LUTO

O aconselhamento psicológico voltado para o luto constitui-se num modelo de intervenção psicológica que pretende basicamente auxiliar os enlutados a lidarem com a perda, agindo na prevenção de um eventual luto complicado. Visa o estabelecimento de uma condição de vida saudável a estes, ao contar com os seus recursos psíquicos, além de sua rede de apoio familiar e social (Costa, 2006). Em outras palavras, a abordagem do aconselhamento psicológico no luto se torna fundamental no suporte às pessoas enlutadas, em virtude de facilitar a passagem pelo processo de luto. Assume caráter preventivo, à medida que se caracteriza por ser uma intervenção psicológica possível de ser feita antes da instauração de um luto complicado. Objetiva, de modo geral, auxiliar o indivíduo na adaptação da perda para que este se torne capaz de ajustar-se à nova realidade de forma saudável e funcional mesmo na ausência da pessoa amada. Trata-se de acreditar e ajudar o enlutado a encontrar meios para que este possa reinvestir suas emoções na vida e no viver (Parkes, 1998 em Pascoal, 2012).

No que se refere aos grupos de apoio aos enlutados, contexto de pesquisa do presente trabalho, acredita-se que o aconselhamento psicológico permite que o profissional esteja instrumentalizado de forma a efetuar intervenções breves e apontamentos capazes de promover reflexões frente aos conteúdos de luto emergentes nos grupos. Segundo Parkes, 1998 (em Pascoal, 2012), o aconselhamento no luto é desenvolvido por pessoas especializadas como psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais ou mesmo voluntários, e oferecido a enlutados após uma perda, de forma individual ou coletiva. É possível dizer que a eficácia da participação dos enlutados em grupos de apoio no que tange à facilitação do processo de luto ocorre em razão de que tanto o profissional – considerando, neste contexto, uma formação específica em luto e perdas – como a rede de apoio construída pelos e entre os membros de um grupo, cuja dor advém de uma perda por morte, acabam sendo fatores fortalecedores na adoção de estratégias funcionais para melhorar a qualidade de vida e o bem-estar mesmo diante das mudanças impostas pela perda. A partir da experiência de coordenação do grupo de apoio Transformando a dor em laços de amor – grupo modelo utilizado para análise e estudo no presente trabalho – o aconselhamento psicológico tem se mostrado eficiente, em virtude de que as intervenções breves e, ao mesmo tempo, continentes parecem atenuar as emoções emergentes e cuidar das necessidades precisas de seus membros. A participação destes no grupo permite a contemplação sobre formas de lidar com a dor da perda e os desafios que surgem a partir desta, bem como a promoção do bem-estar e maior conhecimento sobre a sua condição, numa proposta que abrange o reconhecimento a despeito da naturalidade da morte e a normatização das reações e sintomas provindos desta.

Levando em conta os diferentes momentos do luto, pode-se dizer que o aconselhamento funciona como (1) um reforço para a concretização da perda, ou seja, a realidade da sua ocorrência; (2) um suporte ao enlutado no que se refere ao sofrimento emocional e às eventuais condutas provindas deste; (3) um facilitador no atravessamento dos desafios impostos pelos reajustes pós-perda; (4) promotor das reflexões do enlutado para que possam ser encontradas maneiras saudáveis de manter o vínculo com a pessoa perdida e, ao mesmo tempo sentir-se confortável e reinvestir no processo de viver (Parkes, 1998; Worden, 1998 em Luz et al., 2006). Esta modalidade de intervenção, quando realizada em grupos de apoio, parece facilitar o processo de luto, à medida que busca compreender as possíveis representações intrínsecas ao vínculo outrora consolidado entre enlutado e falecido numa perspectiva de ressignificação das relações e, por intermédio desta concepção, promover meios capazes de transformar o sentido inicialmente atribuído ao rompimento do laço afetivo. A abordagem empregada no aconselhamento psicológico tem por finalidade possibilitar o reconhecimento da realidade pós-perda e promover continência a cada enlutado frente aos sentimentos e expressões de dor.

Tem-se encontrado, mais recentemente, fundamento na concepção teórica de um novo modelo para a compreensão dos fenômenos decorrentes do processo de luto, com respaldo tanto na pesquisa quanto na prática clínica. O Modelo do Processo Dual, segundo Franco (2009), questiona aspectos visualizados como ultrapassados nas teorias tradicionais que propõem formas de resolução eficientes frente ao luto. Nele, existem dois tipos de fatores estressores, sendo um orientado para a perda e o outro direcionado à restauração, considerando “a existência de um processo dinâmico e regulador do enfrentamento, pela oscilação por meio da qual o enlutado pode às vezes confrontar, às vezes evitar as diferentes tarefas do luto” (p. 2). Deste modo, propõe-se que o enfrentamento adaptativo do luto encontra-se amparado pela confrontação/evitação da perda, concomitante às necessidades de restauração.

O trabalho com grupos de apoio a enlutados faz-se importante, à medida que pode abranger membros que se encontram em diferentes momentos do luto. Pinheiro (2010) refere que a constituição de um grupo, na qual reúnem-se diferentes indivíduos com objetivos semelhantes, permite que aconteça a variação das conversações. Durante os encontros do grupo modelo Transformando a dor em laços de amor, por exemplo, é possível observar que aqueles que se encontram mais fortalecidos para a reatribuição de sentido às suas vidas relatam a experiência inicial do luto de modo a permitir que os que se encontram em momentos iniciais de enlutamento percebam as possibilidades de reinvestir no outro e na vida ao longo do tempo; e que o luto, que tanto faz doer nos períodos iniciais, pode ser transformado em lembrança e saudade. Do mesmo modo, os que ressignificam o luto ao longo do seu tempo, percebem que os sintomas e as reações pelos quais passaram nos primeiros momentos são normativas e esperados frente às mudanças impostas pela perda, podendo compartilhar de tal experiência com os novos membros. Logo, é possível pensar que é o ambiente grupal que permite tamanha riqueza frente às trocas de identificação, amparo e apoio realizadas entre seus participantes. A compreensão quanto ao modelo do processo dual faz-se presente, à medida que, em meio às trocas grupais, cada indivíduo relata reservar um momento específico, diariamente, para permitir-se emocionar-se ao lembrar da pessoa amada, concomitante ao tempo de retomar as atividades de vida diárias e seguir a partir das mudanças desta perda em vida. Nesta ocasião, parece que o grupo também assente a realização deste movimento àqueles que não se permitem reinvestir na vida e no viver. Acredita-se, portanto, que o suporte e apoio facilitados pelo grupo promovem a metamorfose de seus membros ao longo do tempo de cada participante.

Considerando que os momentos iniciais da perda estão permeados por um certo senso de que o evento da morte não aconteceu, o primeiro passo do profissional enquanto aconselhador se refere a (1) Ajudar o indivíduo a efetivar a perda (Worden, 1991 em Melo, 2004). Trata-se de encontrar maneiras de ajudar o enlutado a chegar à consciência de que houve a morte da pessoa amada e que não lhe será possível retornar. Falar sobre a perda é um recurso facilitador para o reconhecimento e/ou aceitação, quando encorajado pelo aconselhador. No contexto dos grupos de apoio ao luto em sua totalidade, os questionamentos direcionados aos enlutados sobre as circunstâncias da perda também se tornam ferramentas indispensáveis – quando e onde ocorreu a morte? Há quanto tempo? De que forma aconteceu? Como cada familiar ficou sabendo? Como foi o funeral ou os preparativos para o cerimonial? O que foi dito ou pensado no momento? Que sensações e/ou emoções emergiram?. Muitos enlutados precisam passar e repassar, em suas mentes, a ocasião da morte, para que estejam capacitados a alcançar, de forma integral, o discernimento a respeito da perda sofrida. A participação em grupos de apoio, neste sentido, torna-se um recurso facilitador para o trabalho de elaboração do luto, à medida que o relato de cada membro é capaz de provocar questionamentos internos e pontos de reflexão para os demais. Worden, 1998 (em Melo, 2004) refere, porém, que, às vezes, isso leva um período de tempo mais longo. É preciso paciência por parte do aconselhador, no que tange à facilitação da gradual consciência da perda e o impacto causado por ela, num processo de encorajamento, ao enlutado, para sua verbalização quanto às memórias a respeito da pessoa perdida, tanto recentes quanto passadas. Pinheiro (2010) propõe que imersos em um grupo de pessoas que apresenta dores de cunho semelhante entre si, os enlutados podem sentir-se acolhidos e compreendidos ao relatarem suas lembranças, sensações e sentimentos associados ao evento da morte. O discurso livre, por sua vez, possibilita a organização de ideias, crenças e valores, além de favorecer maior clareza quanto ao acontecimento.

Durante a experiência prática de coordenação do grupo modelo, é possível perceber que, por vezes, os enlutados permanecem receosos quanto à exposição pública ou mesmo privada dos sintomas e reações decorrentes da perda, rotulando estas expressões, sobretudo, como disfóricas. Em função da dor e desconforto que geram, muitas emoções acabam sendo trancafiadas, impedindo-os de reconhecê-las como naturais para que uma possível solução seja contemplada num momento posterior. Muitos indivíduos também buscam alívio imediato do sofrimento por meio de tratamentos medicamentosos capazes de atenuar a dor (Worden, 1991 em Melo, 2004). O trabalho realizado pela perspectiva do aconselhamento psicológico no luto, neste contexto, é o de (2) Ajudar o indivíduo a identificar e vivenciar sentimentos. Em outras palavras, trata-se de auxiliar o enlutado a distinguir os sentimentos presentes para que ele se permita experimentá-los no grau que se faz necessário. Os questionamentos referentes àquilo que pode ser considerado normativo ou fator complicador em situações de luto frequentemente se fazem presentes durante os encontros dos grupos de apoio. Observa-se também que emergem sentimentos de vergonha, alívio e/ou culpa em seus membros, em função de sentirem-se de tal maneira. Logo, os membros de um grupo como um todo se deparam com as angústias provindas tanto das questões internas, quanto dos fatores externos. O referido autor acrescenta que, por tais razões, auxiliá-los a reconhecer e trabalhar para atravessar o pesar é parte fundamental da proposta de intervenção, quer seja na identificação das emoções não possíveis de serem nomeadas, quer seja na aceitação da existência de eventuais sentimentos de raiva, responsabilidade, ansiedade, tristeza, desamparo e solidão, feitos tão presentes diante da perda, mas considerados tão dificultosos aos enlutados.

O aconselhador também visa (3) Ajudar a viver sem a pessoa falecida. Em outras palavras, é preciso aprender a adaptar-se à perda sofrida, a fim de que o enlutado adquira a habilidade de viver sem o falecido e possa tomar decisões de forma independente. Considerando que a pessoa que morreu ocupava diferentes papeis em vida, a capacidade do enlutado para ajustar-se a uma nova função na ausência do ente querido é parte da resolução de problemas. O aconselhador, neste sentido, pode auxiliar o enlutado a adquirir essa habilidade para o enfrentamento, bem como para a tomada de decisões, a fim de que o papel anteriormente ocupado pelo falecido possa ser reassumido pelo enlutado com uma redução na carga de estresse emocional (Worden, 1998 em Genezini, 2009). Acredita-se que os grupos de apoio ao luto, neste sentido, podem servir como recurso complementar e facilitador deste processo, à medida que a integração entre os membros promove motivação e a criação de possibilidades de ser e estar de um modo diferente, permanecendo sustentado pelas próprias ideias dos participantes do grupo e pelo auxílio promovido entre ambos. A frequência dos participantes no grupo de apoio modelo, por exemplo, tem-se mostrado favorecedora da maior capacidade de autonomia de cada participante, à medida que o compartilhamento das vivências possibilita o posicionamento de cada pessoa em relação ao seu processo de luto, bem como a disponibilidade para escuta de estratégias que cada um, particularmente, desenvolve para o manejo dos desafios decorrentes da perda e, a partir das trocas subsequentes e da atribuição de significado, o aprimoramento das capacidades individuais de forma saudável.

Embora o trabalho do aconselhador seja encorajar o enlutado a entrar em contato com a realidade da perda e os sentimentos experimentados em virtude desta, ocupando papel de ouvinte paciente e, além disso, incentivar o enlutado a adotar novos papeis sem culpa depois do evento da morte, Worden, 1991 (em Melo, 2004) menciona que é preciso que o aconselhador também desestimule o enlutado, sem fazê-lo sentir-se desamparado, a tomar grandes decisões de mudança de vida – como, por exemplo, vender propriedades, trocar de emprego ou adotar crianças. Logo, fazer bons julgamentos durante o período de luto agudo se torna arriscado, em função das respostas mal adaptativas. Os membros do grupo de apoio modelo frequentemente apresentam dúvidas semelhantes quanto ao desfazer-se dos objetos da pessoa falecida ou deixar que permaneçam estáveis durante um período determinado de tempo. Junto a estas incertezas, também surge o medo do seu esquecimento, como se o desfazer-se de seus pertences implicasse no resguardo das memórias de quem permaneceu em vida. Salienta-se que mudanças importantes tornam-se funcionais no momento em que o enlutado está totalmente capacitado a tomar decisões seguras, não somente para atenuar o seu sofrimento, mas executá-las logo que se sentir preparado. Assim, a orientação de cunho psicológico promovido nas reuniões possibilita aos enlutados a compreensão de que podem modificar a rotina e retirar (doar, vender, encaminhar) os pertences envolvidos de forma a transformar e reatribuir significado ao vínculo anteriormente consolidado, sem que o estresse e a culpa se façam presentes de modo a dificultar o processo de mudança. E o mais importante, percebem que cada indivíduo apresenta um período diferente de tempo para preparar-se frente às mudanças. Tal percepção parece permitir que não se sintam pressionados ou obrigados a cumprirem determinadas ordens de cunho externo.

Aconselhadores também podem ser facilitadores ao (4) Auxiliar o enlutado a encontrar um sentido para a sua perda sofrida (Worden, 1998 em Genezini, 2009). O processo pode ser tão relevante quanto a habilidade de reatribuir significado a um mundo transformado posteriormente ao pesar (Schwartzberg & Halgin, 1991). Os enlutados cuja perda não conseguem encontrar uma resposta consistente para justificá-la, envolvem-se, geralmente, em atividades filantrópicas, políticas ou assistenciais associadas à maneira da morte da pessoa amada. No grupo modelo, muitos enlutados envolvem-se com atividades voluntárias que contemplam o cuidado com o próximo, numa tentativa de auxiliar os que estão em sofrimento por quaisquer razões e, assim, encontrar uma forma de atribuir um sentido às suas próprias dores. Os que ainda não estão engajados em quaisquer atividades com objetivos semelhantes, por vezes, demonstram interesse. A melhor intervenção do aconselhador, segundo Worden, 1991 (em Melo, 2004), quando diante de situações como esta, é auxiliar a pessoa enlutada a buscar estratégias para reestabelecer controle sobre aquilo que é bem-sucedido em sua vida e que pode ser mantido. Afinal, encontrar um significado para a perda sofrida, quando saudável, torna-se um fator facilitador para o enfrentamento do luto.

(5) Facilitar a relocalização emocional da pessoa morta também é um princípio praticado pelo conselheiro, à medida que este promove suporte ao enlutado para que ele encontre um novo lugar em sua vida para as memórias e lembranças relativas ao ente querido. Trata-se da ressignificação de um sentido que permite ao enlutado seguir em frente e investir em novos relacionamentos, mesmo estando ciente de que o lugar ocupado pela pessoa perdida nunca será substituído (Worden, 1991 em Melo, 2004). A identidade atribuída ao grupo Transformando a dor em laços de amor, por sua vez, objetiva justamente a ressignificação do espaço do pesar para o espaço da lembrança. Os membros, cada um em seu tempo, têm a possibilidade de criar, entre si e por meio de um movimento coletivo, estratégias funcionais que apresentem um novo significado à relação rompida na sua concretude, que não seja tanto de dor, mas de recordações e saudade, numa perspectiva de que há um laço de amor que não se rompe, mesmo na distância física imposta pela finitude humana.

Melo (2004) e Genezini (2009) salientam, contudo, que o processo de ajustamento a um mundo sem o falecido acontece de forma gradual. Logo, é preciso (6) Dar tempo ao luto. O conselheiro tem a função de informar e ajudar a interpretar para os grupos de apoio que o enlutamento requer um período de tempo e que suas reações não precisam ser impedidas, levando em conta o modelo do processo dual do luto, em que as emoções emergem e retornam a um estado de “descanso” aleatoriamente, num movimento espiral que permite que o enlutado entre em contato com a perda, mas reinvista no viver (Franco, 2009). Também é preciso cuidado por parte do profissional, que ajudará cada membro do grupo a refletir sobre as datas comemorativas próximas, a fim de que estejam cientes para quando chegarem sem mais a presença da pessoa amada. E, embora seja necessário dar tempo ao luto como um dos princípios do aconselhamento, torna-se necessário (7) Interpretar o comportamento normal, ou seja, até que ponto as reações do enlutado podem ser consideradas normativas do processo de luto. Pinheiro (2010) afirma que, depois da perda, muitos indivíduos que se fazem presentes nos grupos de luto têm a sensação de que estão ficando loucos. Inicialmente, é até esperado que se sintam de tal forma, levando em conta que estão atordoadas, em função de estarem vivenciando algo que não faz parte da rotina de suas vidas. Se, para o aconselhador, há clareza no que tange aos comportamentos normativos frente à perda, também podem ser fornecidas garantias sobre a normalidade dessas experiências (Worden, 1998 em Genezini, 2009). É possível pensar que a vivência ocorrida nos grupos de luto possibilita que os membros reflitam entre si sobre os sintomas e as reações pelos quais já atravessaram e estiveram capacitados a modificá-los. A reflexão grupal, neste sentido, permite que cada participante atenue suas angústias sobre o que pode ser considerado normativo e o que, eventualmente, requer maiores cuidados.

Embora se tenha utilizado a perspectiva de Worden (1991; 1998) para a compreensão do trabalho com o luto, Melo (2004) e Genezini (2009) concordam que há uma variada gama de condutas do enlutado frente à perda. Por tal razão, não se pode esperar que os padrões comportamentais dos vitimados pela perda de alguém amado passem pelo processo de luto da mesma forma. Nos grupos de apoio a enlutados sempre se fazem presentes pessoas que divergem quanto às formas de expressar o seu pesar. Provavelmente, isto ocorre em razão de que os padrões e estilos de apego estabelecidos por cada ser humano ao longo da vida, frente à consolidação de laços afetivos, também são aprendidos de maneiras peculiares. Trata-se da representação atribuída aos vínculos por cada um de seus participantes, consonante às distintas formas de criar alianças e os significados do seu rompimento. Schwartzberg & Halgin (1991) referem que “o luto é um fenômeno com variabilidade interpessoal enorme e fortes diferenças individuais na intensidade das relações afetivas, no grau de prejuízo e na extensão do tempo em que a pessoa vivencia o efeito doloroso da perda” (p. 69). Por tais fins, os autores concordam que o aconselhador pode auxiliar os enlutados a interpretarem a oscilação de reações ocorridas entre eles próprios, já que podem diferir entre si, para que não esperem que emerjam igualmente nos demais (Melo, 2004; Franco, 2009; Genezini, 2009).

Intrínsecos à versatilidade de maneiras de reagir frente ao luto, encontram-se também os modelos particulares de proteger-se e defrontar-se. Um dos princípios do aconselhamento consiste em (9) Examinar estilos de defesa e enfrentamento, que podem estar intensificados devido à perda significativa. Genezini (2009) acredita que o atravessamento do processo de elaboração da perda pelo viés emocional ativo tende a ser a maneira mais eficiente para o manejo de problemas provenientes do enlutamento. Logo, a utilização de estratégias como o humor, “a habilidade para reestruturar ou redefinir situação difícil, adequar características de regulação emocional e a habilidade de aceitar o suporte social” (Worden, 2013, p. 70), constituem-se recursos eficazes para a resolução de problemas. O espaço disponibilizado para as reuniões grupais, por exemplo, promove momentos para sentir, falar, expressar, compartilhar e fortalecer aquilo que nunca morre, mas que permanece eternamente junto de cada enlutado. Assim como a tristeza, expressa por meio da angústia, choro ou raiva; o riso e a partilha de lembranças engraçadas ou recordações afáveis também surgem como recurso facilitador do processo de luto, possibilitando o equilíbrio das sensações e emoções aos membros de um grupo (Pinheiro, 2010). Estes permitem observar a si mesmos de forma metafórica, semelhantemente ao mar, cujas ondas menores e mais calmas possibilitam o reabastecimento das energias, a fim de que cada enlutado possa se fortalecer para o momento em que as maiores e mais turbulentas emergirem, fazendo-os mergulhar em intensidade. O luto pode ser vislumbrado de tal forma, como as ondas do mar, produzidas pela brisa e rajadas de vento. O aconselhador também pode enfatizar ao enlutado os estilos de defesa e enfrentamento que eventualmente estão sendo, por ele, utilizados e, a partir daí, refletir, em conjunto, sobre a sua eficácia. Posteriormente, podem explorar outras possibilidades de confrontação eventualmente mais efetivas com a finalidade de reduzir sentimentos de angústia e aflição (Worden, 1998 em Genezini, 2009).

Por fim, mas igualmente importante, Worden (2013) refere que o aconselhador pode (10) Identificar eventuais patologias e fazer o encaminhamento dos enlutados cujo estado psíquico tenha ficado comprometido devido ao desencadeamento de uma perda e luto subsequentes. Isso acontece porque, às vezes, o aconselhamento e/ou as técnicas empregadas na facilitação do luto não são suficientes, e a perda – ou a forma como o enlutado está manejando com ela – pode fazer com que surjam problemas mais complexos, cuja resolução também se torna mais difícil. “Em função de que essas dificuldades exigem técnicas e intervenções especiais, além do entendimento sobre a psicodinâmica, lidar com elas pode não ser algo que esteja dentro das atribuições e capacidades do conselheiro do luto” (Worden, 2013, p. 71).

Pascoal (2012) compreende que, diante da perda sofrida, os enlutados precisam de um suporte que lhes possibilitem falar sobre o seu pesar e a experiência vivenciada pela morte da pessoa amada, sobre o seu funeral, suas lembranças e demais vivências. O profissional aconselhador deve ser continente e permitir que cada membro do grupo sinta que suas expressões de dor estejam sendo escutadas e aceitas; saber que algum grau de culpa e raiva se fazem presentes, mas que todos podem conversar sobre isso com tranquilidade. Do mesmo modo, o aconselhador deve possibilitar que os enlutados experimentem-se diante do primeiro aniversário de morte com acompanhamento; reconhecer, compreender e atender as necessidades do grupo quando visualizar maior indisponibilidade por parte de seus participantes. Além disso, permitir que o grupo finalize o processo de luto por meio da readaptação do mundo presumido e da apropriação de novos papeis e uma identidade diferente da anterior; ter quaisquer pontos de conexão com a vida, sejam eles por número de telefone ou outros meios de contato (Costa, 2006).

O aconselhamento psicológico em situações de luto é fundamental no que tange ao asseguramento de estímulos para que os enlutados possam fechar questões que, eventualmente, ficaram inacabadas com o ente querido e finalmente se sintam preparados para despedir-se. Do mesmo modo, para aumentar sua percepção quanto à realidade da perda sofrida e, a partir daí, potencializar capacidades de confrontação com o evento da morte, a fim de possibilitar a expressão e administração das emoções e afetos intensos e latentes frente ao luto. Quando da estruturação e maior senso de controle frente à perda, os membros de um grupo, numa perspectiva de trabalho conjunto, podem construir maneiras de ajustar-se às novas etapas de transição, atravessando os obstáculos impostos; bem como de estimularem e autorizarem a si mesmos a sentirem-se confortáveis para tornarem a reinvestir no viver e em relacionamentos posteriores. A proposta inicial de estudos em luto, que parecia levar em conta o desligamento da pessoa falecida, passou a ser compreendida a partir de uma perspectiva de construção de significado no mantimento de vínculos contínuo no que tange às transformações a partir das perdas (Franco, 2009). Logo, é possível pensar que a proposta do grupo de apoio modelo – e que pode ser estendida aos demais grupos de apoio – tem como finalidade ressignificar as relações rompidas em vida, possibilitando um lugar seguro para as expressões de dor e sofrimento, mas também impulsionando movimentos para a consolidação de um laço de lembrança e saudade, encorajando cada enlutado a reinvestir na vida e apropriar-se do viver no cuidado consigo mesmo e amor pelo outro.

A PARTICIPAÇÃO DE ENLUTADOS EM GRUPOS DE APOIO AO LUTO: ESTUDOS E CORRELAÇÕES

A participação de pessoas enlutadas num grupo de apoio ao luto parece mostrar-se eficiente, à medida que proporciona benefícios individuais frente aos compartilhamentos e trocas realizadas em conjunto. Yalom, 2006 (em Pascoal, 2012) refere que o maior objetivo da promoção de um espaço para um grupo de apoio está nos resultados terapêuticos quando da mobilização das emoções de cada membro. Silva (2004) ressalta que os grupos de apoio aos enlutados funcionam positivamente de duas formas, sendo a primeira como facilitador do processo natural do luto, prevenindo o surgimento e estabelecimento de eventuais fatores complicadores no luto; e facilitando as expressões de dor e sentimentos confusos que geralmente fazem-se presentes ao enlutado. Os autores concordam que o ambiente favorecido pelas trocas grupais é promotor de laços consistentes de amizade, os quais oportunizam apoio mútuo mesmo fora dos encontros. Concomitante a estes, Pinheiro (2010) declara que esta espécie de sistema possibilita o surgimento de diferentes vozes e pontos de vista, nutrindo a cultura dos membros do grupo, bem como as tradições e interesses pessoais. Além disso, à medida que há a participação em um grupo, cada membro resolve, gradualmente, o seu luto, ao mesmo tempo em que suas necessidades vão sendo modificadas (Pascoal, 2012; Silva, 2004).

É possível dizer também que a eficácia dos grupos de apoio, sobretudo no que diz respeito ao grupo modelo Transformando a dor em laços de amor, encontra-se na perspectiva educacional, em que são trabalhados diferentes tópicos referentes ao processo de luto, à construção de sistemas de apoio, o manejo com datas comemorativas ou que tenham determinadas representações ao enlutado, bem como emoções e sentimentos emergentes. Logo, o cuidado de cunho psicológico, no grupo, estende-se de maneira a favorecer o amadurecimento emocional de seus membros na construção de novas significações nas relações para a ampliação de possibilidades diante do reinvestimento na vida e no viver (Pascoal, 2012). Luz et al. (2006) acrescem que, do ponto de vista psicossocial, é possível atingir o objetivo proposto inicialmente, considerando a facilitação de orientações e informações a respeito dos processos intrínsecos à vida, ademais da educação para a morte configurar-se como um suporte de apoio eficaz aos enlutados. Acredita-se, portanto, que cada membro, como um ser social, constrói a si mesmo e se transforma com os demais, a partir da possibilidade de estabelecer trocas consistentes num grupo, levando em conta a história da sociedade.

O clima em grupos de pessoas que se unem por perspectivas semelhantes tende a favorecer o desenvolvimento das ações que concretizam os objetivos propostos. No grupo de apoio modelo, por exemplo, os membros reconhecem que o ambiente oportuniza meios para que suas ações sejam bem sucedidas. Alguns, inclusive, referem sentir-se bem com seus pares. Pinheiro (2010) concorda, neste sentido, que as pessoas acabam se tornando mais abertas umas com as outras, tornando o clima grupal confortável, mesmo diante da dor do luto. Os estudos de Silva (2004), da mesma forma, apontam para a eficácia do apoio nos processos de luto, uma vez que os participantes desta modalidade grupal mostram-se satisfeitos no que diz respeito à sua dor. Levando em conta que os grupos podem funcionar como um apoio a nível familiar, acredita-se que há impacto positivo frente às sensações de solidão e isolamento, na diminuição da tristeza, bem como o aumento da confiança e esperança. Também de acordo com Yalom, 2006 (em Pascoal, 2012), as afirmações solidárias e construtivas enfatizam, sobretudo, o conhecimento interno de cada membro. Ademais, os participantes do grupo, por meio das histórias parecidas de perda, sentem-se compassivos no compartilhamento das angústias e tristezas. Por tal razão, o contato com pessoas que atravessam conflitos semelhantes transmite esperança.

Na literatura estrangeira, foi possível encontrar um estudo qualitativo realizado a partir das experiências tanto positivas como negativas da participação de enlutados em grupos de apoio (Dyregrov, Dyregrov & Johnsen, 2013). Embora se acredite que, no Brasil, pesquisas semelhantes ainda precisam ser desenvolvidas de forma consistente, é possível afirmar que os grupos de apoio podem ser recursos benéficos no auxílio rumo à elaboração do processo de luto de seus membros. De acordo com os autores, os aspectos facilitadores encontrados no campo grupal dizem respeito à aproximação com pessoas semelhantes que se unem devido a situações passíveis de serem compreendidas também pelas demais; além de ser um espaço seguro e confortável para o compartilhamento das emoções, à medida que os demais mostram-se compassivos e solidários frente à dor do outro; possibilita reflexões quanto à normatização dos sintomas e reações provindos do luto; promove a troca de informações e orientações de cunho psicológico a despeito do processo de enlutamento, além da educação frente à morte e o morrer. Tais aspectos asseguram o mantimento da esperança frente à continuidade da vida e reinvestimento nas relações. Embora o presente trabalho tenha demonstrado teoricamente e, de acordo com a prática de coordenação de grupo realizada, os benefícios da participação de enlutados em grupos de apoio ao luto, torna-se necessário refletir sobre a existência de eventuais fatores negativos que também podem se fazer presentes neste contexto. Dyregrov et al., (2013) referem que, às vezes, há necessidades específicas de algum membro que, mesmo depois da participação em grupos, podem não ser resolvidas. Além disso, um grupo poder ser visualizado sob uma perspectiva de estresse adicional, à medida que, ademais do próprio sofrimento, há a carga emocional intensa provinda dos demais participantes que também perderam alguém. É importante destacar também que, às vezes, os objetivos dos grupos de apoio podem não ser atendidos devido à insuficiência de estrutura no que tange à organização da coordenação, impossibilitando a função terapêutica que o espaço deveria apresentar e frustrando as expectativas de seus membros, depositadas na funcionalidade do grupo e no auxílio quanto à elaboração do luto em seus diferentes momentos.

No que tange aos aspectos positivos da participação de enlutados em grupos de apoio ao luto, observa-se que Dyregrov et al., (2013) parecem concordar com os autores nacionais anteriormente citados no trabalho (Silva, 2004; Luz et al., 2006; Pascoal, 2009; Pinheiro, 2010). É possível relacionar as ideias apresentadas em cada artigo de forma a complementar os estudos já realizados com grupos de pessoas enlutadas. Neste contexto, também Dyregrov et al., (2013) referem que o encontro com pessoas que estejam passando pela mesma experiência de luto numa perda similar é de extrema importância para restaurar sentimentos de normalidade mesmo frente às sensações estranhas e de loucura que emergem diante das mudanças que o luto impõe. Logo, a normatização do processo de luto é fundamental quando de uma situação vista como desestruturante. A fala como forma de expressão, neste sentido, mostra-se como recurso facilitador do processo de reconhecimento da perda, à medida que o conforto provindo da participação de um grupo de apoio a enlutados resulta, sobretudo, do compartilhamento, da manifestação de choro e falar sobre o que aconteceu, num ambiente em que há empatia e apoio entre os membros. Nos grupos de apoio há também a autorização para a exposição da raiva sem que seus participantes se sintam receosos em relação a estranhamentos de outrem – em razão de que tal sentimento é passível de apresentar-se aos demais. Logo, facilitados pelo grupo no qual participam, alguns enlutados podem manifestar diferentes emoções que talvez nunca tenham se permitido sentir.

Pinheiro (2010) e Dyregrov et al., (2013) consideram que um grupo de apoio se torna autorizador para o reconhecimento da nova realidade junto às mudanças, rumo aos rearranjos e reinvestimentos nas demais relações e na vida, ao passo que alguns enlutados parecem aprender sobre o seu próprio luto quando se deparam com as vivências de luto dos demais. Logo, há concordância com Pascoal (2012), que refere que a fala de um participante ressoa aos demais, podendo estes identificarem-se como modelos ou mesmo refletirem a respeito da funcionalidade deste processo de forma interna e repensarem sobre formas as quais podem se beneficiar na elaboração do luto. Ressalta-se a importância da partilha grupal, à medida que há a experiência de ser ajudado e entendido sem precisar justificar-se de forma obrigatória quanto aos sintomas e reações provindos do seu luto. Ademais, possibilita ao enlutado a sensação de que está sendo verdadeira e inteiramente escutado pelos demais membros quantas vezes forem necessárias. Há, portanto, o que Dyregrov et al., (2013) consideram uma doação e um ganho que acontecem na reciprocidade.

Os grupos de apoio ao luto, sobretudo na modalidade aberta, facilitam questões ligadas à esperança, recurso importante na facilitação do processo e elaboração do luto. À medida que Pascoal (2012) relaciona o conhecimento interno de cada membro concomitante ao contato com os demais participantes como transmissor de esperança, Dyregrov et al., (2013) acrescem que esta dimensão pode ser vislumbrada, sobretudo, nos espaços em que novos membros podem aderir e sentirem-se bem-vindos. O grupo aberto, como é o caso do grupo modelo utilizado para análise e estudo do presente trabalho permite a participação de pessoas que se encontram em diferentes momentos do luto. Neste sentido, quando um enlutado de perda recente comparece ao grupo, deparando-se com pessoas cujas perdas são provenientes de um tempo maior, geralmente, esta característica promove uma forma de esperança. Há uma espécie de impacto ao recente enlutado, ao vislumbrar que é possível movimentar-se e reinvestir na vida mesmo frente a uma perda. Alguns membros mencionam, inclusive, que as diferentes estratégias utilizadas pelos demais na facilitação do processo de luto, às vezes, fazem sentido mesmo para quem as escuta, possibilitando a reflexão de que mesmo na dor, há caminhos para seguir e viver rumo ao encontro de uma nova perspectiva na vida. A fé e a esperança são, portanto, fatores capazes de favorecer a transformação do grupo ao longo dos encontros.

O trabalho com grupos de enlutados, de forma geral, demonstra ser uma alternativa positiva como recurso complementar de busca na facilitação do processo de luto. Pascoal (2012) acredita que o sofrimento trazido pela morte da pessoa amada pode ser o início de um amadurecimento pessoal, sobretudo quando compartilhado em grupos que se unem no intuito de auxiliarem-se por meio do apoio e amparo. O trabalho psicológico, por sua vez, torna-se eficiente, à medida que atua na mediação frente à construção de uma nova realidade a partir das perdas. A construção de relações entre os autores Silva (2004), Luz et al. (2006), Pinheiro (2010), Pascoal (2012), Dyregrov et al. (2013) torna-se possível, ao passo que parecem concordar quanto a um grupo ser o início de uma espécie de fio condutor, o qual permite que as relações seguras possam se estender para além do ambiente grupal, enriquecendo amplamente os vínculos estabelecidos e favorecendo a elaboração do luto de uma maneira funcional, por meio de estratégias e recursos que possibilitam o reinvestimento na vida em sua totalidade.

A partir da busca realizada, foi possível encontrar evidências que comprovam os possíveis benefícios da participação de indivíduos enlutados num grupo de apoio, no que tange à facilitação do processo de elaboração do luto. De modo concomitante, há também aspectos eventualmente negativos que podem implicar na funcionalidade do grupo, impossibilitando o alcance das suas funções primordialmente terapêuticas. Por tal razão, cabe, à coordenação, manter-se atenta às diferentes formas de expressão de luto, além de permanecer atualizada, tanto por intermédio de estudos gerais como pelas supervisões e grupos de estudo com outros profissionais, meios capazes de aprofundar as avaliações quanto ao andamento dos trabalhos realizados com grupos de apoio a enlutados. Considera-se este tema ainda recente no Brasil, o que também pode justificar o reduzido número de trabalhos nacionais encontrados durante a pesquisa realizada para esta produção. Há um amplo caminho a ser desvendado, o que sugere a extensão das buscas e mesmo o aprofundamento do presente trabalho para produções futuras. O trabalho realizado com grupo de enlutados autoriza, em primeira mão, o processo de mudança que acontece em si e no outro. Enquanto que a integração de um membro refere-se à possibilidade de novas construções e de modos de ser e viver diferentes, coordenar um grupo diz respeito à transformação e ressignificação de crenças e valores. Um grupo constitui uma aliança pela formação e consolidação de novos vínculos que se fortalecem no apoio. A união de indivíduos que estabelecem um elo com a finalidade comum de transformar a dor do luto em momentos de lembranças e saudade é, sobretudo, uma proposta de amor.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como área de pesquisa e intervenção no Brasil, os estudos relacionados ao luto têm sido desenvolvidos recentemente, diferentemente dos países do Hemisfério Norte e naqueles de língua inglesa. Contudo, fontes de pesquisa diversas (Parkes, 1998, 2009; Franco, 2010; Worden, 1998, 2013) entendem o luto, semelhantemente, como uma reação normal e esperada diante do rompimento de uma relação significativa, apresentando impacto sobre o indivíduo e a família e, muitas vezes, estendendo-se a longo prazo. Por tais razões, torna-se fundamental avaliar adequadamente o choque sofrido em função da perda, a fim de que sejam identificadas as medidas de intervenção a serem propostas posteriormente. Estudar o luto requer uma visão que não se restrinja ao psiquismo, mas traz a necessidade de contemplá-lo como uma experiência humana com raízes em diferentes áreas do conhecimento (Parkes, 1998). No que tange ao conteúdo específico tratado no presente trabalho, também foi possível observar que há um reduzido número de estudos realizados a partir de experiências com grupos de enlutados. A limitação quanto às buscas para a pesquisa constitui-se num dado relevante, à medida que há materiais, em grande parte, na língua inglesa, o que sugere maiores investigações em grau nacional a respeito das possíveis implicações de um trabalho de cunho psicológico efetuado com grupos de apoio a pessoas enlutadas semelhantemente ao abordado nesta construção.

Enquanto profissionais instrumentalizados a manejar com as situações de luto e perdas, ressalta-se a importância de estender os estudos para ampliar os conhecimentos a respeito do que os indivíduos vivenciam depois de uma perda. Isto requer compreensão sobre o motivo de experimentarem determinadas sensações e reações, os objetivos principais do processo de luto, bem como sobre eventuais formas de auxiliá-los com as diversas fases e tarefas que o luto propõe, sobretudo contemplando a recente perspectiva do modelo dual do processo de luto. Além disso, como saber quando o luto chegou ao fim ou como identificar um luto-complicado, de que forma promover assistência à família enlutada e também em situações especiais de perda. Portanto, é fundamental que este assunto seja examinado mais detalhadamente, considerando suas constantes atualizações, de modo que se constituem aspectos trabalhados também nos grupos de apoio aos enlutados. Neste sentido, são necessárias sensibilidade e atividade por parte dos grupos que existem e se dispõem a oferecer disponibilidade física e emocional no suporte psicológico e acompanhamento aos enlutados (Worden, 2013).

A partir da experiência de coordenação do grupo de apoio ao luto Transformando a dor em laços de amor, durante o período de setembro de 2013 a junho de 2015 (as atividades seguem em andamento), observou-se a importância de existir um trabalho voluntário e, ao mesmo tempo, adequadamente preparado, considerando uma formação específica em luto e perdas capaz de abranger a temática e romper com muitos de seus dogmas e tabus impostos pelos próprios membros do grupo. Percebeu-se, do mesmo modo, a necessidade de existir um serviço que pudesse acolher aqueles que estiveram expostos a uma perda e que sofrem por tal razão; indivíduos que, por vezes, são incapazes de reconhecer a dor do luto como parte integrante do processo de mudança, impedindo-os de senti-la e expressá-la nos momentos necessários. Acredita-se que, ao longo do tempo, a prática desta atividade – realizada sob a forma de aconselhamento psicológico em situações de luto, por meio de intervenções breves e focais – tenha possibilitado a maior aderência dos enlutados a um caminho rumo ao cuidado com eles mesmos e de bem-estar, e a criação de estratégias funcionais para o manejo frente às adversidades impostas pelo luto. Ademais, foi possível perceber a extensão de um grupo que se mantém para além dos encontros, em que a amizade e confiança constituem-se fatores fortalecedores e capazes de promover a autonomia de seus membros.

Por meio da vivência de coordenação, e levando em conta o progresso alcançado por cada participante ao longo dos encontros grupais, de acordo com as próprias percepções e relatos, optou-se por realizar o presente trabalho, acreditando-se ter alcançado o objetivo geral de mapear os estudos sobre grupos de apoio ao luto, com a finalidade de investigar os possíveis benefícios da participação de indivíduos enlutados num grupo de apoio, no que tange à facilitação do processo de elaboração do luto.

Contudo, ressalta-se a importância de prosseguir com os estudos, a fim de investigar mais profundamente as experiências da participação de indivíduos enlutados em um grupo de apoio, dado que podem ser positivas, como mostraram-se durante grande parte da presente produção, mas também podem abranger aspectos complexos, uma vez que a participação é livre e conteúdos diversos podem emergir, mobilizando seus membros junto às suas crenças, valores, tradições e cultura. Em razão da limitação de materiais de pesquisa encontrados para a elaboração do trabalho, sugere-se a ampliação de estudos nacionais, levando em conta que o trabalho com grupos de apoio a pessoas enlutadas é uma proposta que vem sendo adotada por diferentes profissionais que tenham formação em luto e perdas em diferentes contextos.

Quanto à presente produção, foi possível analisar como o grupo de apoio Transformando a dor em laços de amor tem se mostrado eficiente e útil no que diz respeito ao reconhecimento dos sintomas e reações do luto como parte natural deste processo pelos enlutados, bem como promove um espaço seguro para o reinvestimento no viver. Pode-se dizer que a participação de indivíduos enlutados em um grupo de apoio assegura pontos de ligação com a vida por meio da ressignificação das relações rompidas, numa perspectiva de lembrança e saudade, perpetuada pelo laço de amor que nunca morre.

ANEXOS

Tabela 1

AUTOR (ES) ANO DE PUBLI-

CAÇÃO

TÍTULO DO TRABALHO TRANSCRIÇÕES DE TEXTO IDEIAS PRINCIPAIS/ANOTAÇÕESPESSOAIS
Silva, M. D. F. 2004 Processos de luto e educação 1.Os grupos de apoio actuam de duas formas: 1) they easy the normal processo f grieving and prevent abnormal or pathological grieving patterns from beginning or becoming established; 2) they facilitate expression of the many painful and confusing feelings associated with the normal grieving process (p. 162);

2.Os membros que frequentam estes grupos desenvolvem laços de amizade muito fortes, chegando a apoiar-se, mutuamente, fora das sessões. À medida que o tempo passa, muitos dos seus membros vão resolvendo o seu processo de luto, ao mesmo tempo que as suas necessidades também vão mudando (p. 104);

1.Membros dos grupos de apoio a enlutados sentem-se satisfeitos com a sua participação e consideram o grupo útil no que tange à sua dor;

2.Autoajuda funciona como um apoio familiar, muitas vezes difícil de se manter quando das mudanças impostas pelo luto;

3.Diminuição da solidão e isolamento, bem como aumento da esperança e o surgimento de novas amizades;

4.Importância que o grupo de apoio exerce na adaptação, no que tange ao apoio social;

5.Oferecimento de uma perspectiva diferente sobre morte e vida para os enlutados, considerando seus valores e crenças.

Luz, L. P.; Goulart, P. M. & Benincá, S. 2006 Trabalho em grupo com enlutados 1.Importância da funcionalidade dos grupos de apoio aos enlutados na socialização dos pensamentos acerca do luto, que serviram de multiplicador de conhecimento e intervenção (s.p);

2.O indivíduo age como aprendiz e como sujeito do saber, pressupondo ajustes e correções de conceitos, preconceitos, tabus, fantasias inconscientes, ideias preconcebidas e estereotipadas. Assim, pode-se sustentar a máxima de que aprender em um grupo constitui uma atitude mental aberta, investigatória e científica (s.p).

1.Sujeito como protagonista e espectador da sua história e da história do grupo no qual participa;

2.Partilhas de informações e experiências entre os membros do grupo ocasiona evolução saudável do processo de luto, esbarrando nos aspectos culturais que resguardam falar sobre o tema morte;

3.Grupo visualizado como suporte social de apoio para as pessoas que perderam alguém e encontram dificuldades em atravessar este processo sozinhas;

4.Grupo como construtor e transformador de si e do outro.

Pinheiro, S. R. P. G. 2010 Formação de grupo de apoio na escola: ferramenta para mudanças e transformações nas práticas educacionais 1.Algumas pessoas sentem necessidade de compartilhar objetivos, anseios e necessidades – procuram formas de criar coletivamente soluções através de conhecimento gerado em contextos de colaboração: grupos (p. 46);

2.Um aspecto do grupo é a possibilidade de diminuir a ignorância, o desentendimento e o preconceito entre pessoas, devido ao fato de que também essas pessoas trabalham por objetivos partilhados (p. 48);

3.Os grupos de apoio possibilitam voz a todos, incentivando os participantes a manifestarem seus pensamentos em relação ao seu problema, podendo presenciar uma atmosfera de apoio e compreensão (p. 51).

1.Ser humano como ser relacional que aprende a se desenvolver em sociedade;

2.O valor dos grupos está na participação e as relações positivas estabelecidas entre indivíduos de diferentes credos, raças, naturalidades, opiniões, idades;

3.Há necessidade de buscar no grupo de apoio um suporte para a solução dos conflitos internos;

4.Objetivos principais de um grupo de apoio está em educar para a morte, apoiar, orientar quanto ao processo de luto, sociabilizar com o intuito de minimizar o isolamento e sensação de solidão, criar conhecimento sobre a condição de luto e transformar práticas para o reinvestimento na vida.

Pascoal, M. 2012 Trabalho em grupo com enlutados 1.A força da motivação grupal é o principal instrumento de ação terapêutica (p. 727);

2.Os membros valorizam muito o grupo e relatam ter mais capacidade de lidar com seus problemas, maior bem-estar e maior conhecimento sobre sua condição (p. 727);

3.No decorrer do trabalho, os participantes expressavam o quanto era importante ter com quem dividir a angústia e, além disso, saber que existem outras pessoas com sentimentos e questionamentos parecidos (p. 728);

1.Participação nos grupos de apoio tem a capacidade de mobilizar emoções e proporcionar benefícios significativos;

2.Mudança dos momentos de luto perceptíveis aos enlutados;

3.Trabalho em grupo ainda pouco divulgado no Brasil, mas viável e que traz resultados positivos e benéficos aos enlutados;

4.Trabalho psicológico no amadurecimento pessoal e construção de novos significados, ampliando possibilidades de reinvestimento na vida.

Dyregrov, K.; Dyregrov, A. & Johnsen, I. 2013 Positive and negative experiences from grief group participation: a qualitative study 1.The aim of this part of the study was to investigate grief group participant’s experiences, benefits and satisfaction with the group. Positive aspects were to meet with peers, share thoughts and feelings, normalization, exchange advice and information, and share hope. On the negative side were unfulfilled needs or expectations, additional person stress and unsatisfactory structure, organization and leadership (p. 45);

2.A great deal of comfort resulted from sharing, crying, and talking about what had happened, and there was a lot of emphaty and support among the participants (p. 51);

1.Aprendizagem conjunta no falar e escutar sobre o seu luto e o processo de luto vivenciado por outrem;

2.Os participantes reconhecem que não precisam ficar se explicando para os demais membros, e mesmo assim parecem sentir-se compreendidos e verdadeiramente escutados durante as repetidas vezes em que contaram a história de suas perdas;

3.Embora a experiência prática de grupos seja benéfica, há aspectos negativos que também devem ser considerados frente aos casos que abordam, além de perdas, uma doença por parte do enlutado ou algum outro critério médico (como Transtorno de Estresse Pós-Traumático), cujo funcionamento do grupo não dá conta de abranger;

 

REFERÊNCIAS

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[1] mestranda em psicologia clínica pela puc-sp, especialista em teoria, pesquisa e intervenção em luto, especialista em prevenção e tratamento de dinâmicas vinculares pela teoria do apego, ambas pelo 4 estações instituto de psicologia de são paulo-sp. Psicóloga clínica.

Enviado: Outubro, 2018

Aprovado: Dezembro, 2018

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Franciele Sassi

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