ARTIGO DE REVISÃO
SILVA, Nívea Moema Moura [1], ALENCAR, Anne Caroline Santana de [2]
SILVA, Nívea Moema Moura. ALENCAR, Anne Caroline Santana de. Avaliação psicológica: Uma revisão sistemática da produção brasileira na última década. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 04, Vol. 02, pp. 62-76. Abril de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/psicologia/avaliacao-psicologica
RESUMO
Este estudo objetivou analisar o campo de publicações sobre Avaliação Psicológica, no Brasil, em período equivalente aos últimos 10 anos, utilizando como método uma revisão sistemática da literatura disponível através do Portal de periódicos CAPES. Para levantados dos dados foram analisados 129 artigos decorrentes de pesquisa utilizando exclusivamente a palavra-chave “avaliação psicológica”. A partir dos dados encontrados foi possível perceber um crescimento significativo de artigos publicados no primeiro quinquênio (2010 a 2014) em comparação ao segundo período (2015 a 2019) no decorrer da última década. No ano de 2013 foi observado um aumento acentuado, sendo que os campos de Psicologia e Saúde foram os que mais publicaram sobre o tema. Na última década o maior número de publicações ocorreu no ano de 2018. Os resultados também indicaram predominância da autoria múltipla e feminina. Através do presente estudo, é possível constatar uma rica multiplicidade literária de temas abordados nos estudos sobre ‘Avaliação Psicológica’ e que a interdisciplinaridade de áreas da Psicologia e Saúde abrangidas nos artigos demonstram uma expansão da aplicação desse processo.
Palavras-chave: Avaliação psicológica, testes psicológicos, satepsi.
1. INTRODUÇÃO
Entende-se avaliação psicológica como um processo, para tal são aplicadas diversas técnicas, sendo estes métodos e instrumentos que possuem o intuito principal de coletar informações valiosas que contribuirão para a compreensão da demanda investigada e que necessita de um embasamento técnico, cientifico e ético, corroborando para diminuir os riscos de interpretação subjetivas do psicólogo.
De acordo com Trevizan (2011) e reafirmando toda a multiplicidade de ferramentas que o compõem o processo, Avaliação Psicológica tem despontado como uma área de atuação dos psicólogos que está em constante desenvolvimento, e para tal, tem deixado de ser visto como procedimento isolado e se tornando cada vez mais um processo que mescla técnicas e métodos diferentes (como observações, entrevistas e testes psicológicos, exemplo, auxiliando no desenvolvimento de estratégias terapêuticas.
Como forma de entender a expansão do campo no Brasil, foi realizada neste trabalho uma pesquisa sistemática da literatura sobre o assunto. De acordo com Witter (1999), se faz pertinente uma revisão e análise da produção científica em todas as áreas do conhecimento. Este método possui relevância frente ao tema deste artigo, visto que a avaliação psicológica pode ser aplicada aos diversos contextos de atuação do profissional em psicologia, dentre eles o a área organizacional, clínica, hospitalar, de modo compulsório, em análises relacionadas ao trânsito entre outros.
Após passados aproximadamente uma década desde a revisão realizada por Barroso (2010) e considerando a importância social e técnico-cientifica de uma análise contínua do tema, o presente estudo teve por objetivo realizar uma revisão sistemática da produção científica em “Avalição Psicológica”, com base em artigos publicados em periódicos nacionais de Psicologia, na língua portuguesa, no período entre 2010 e 2019, no Portal de Periódicos da Capes.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
A Avaliação Psicológica é entendida como um processo composto de métodos, técnicas e instrumentos, abarcando os seguintes tipos: escalas, inventários, questionários e métodos projetivos/expressivos. Este processo passou por marcantes mudanças através da história da Psicologia Brasileira, desde a ampliação de pesquisas científicas como uma avaliação e normatização mais criteriosa da qualidade dos instrumentos avaliativos e engajamento de pesquisas interessadas nos campos do tema, aumentando a credibilidade do uso de avaliações psicológicas no país.
Os instrumentos de avaliações podem ser conduzidos em diversos contextos: educacionais, clínicos, orientações, saúde, hospitalar, jurídico, institucionais/organizacionais, empresariais, militares, governamental, pesquisas, entre outros, desde que exista a necessidade de mensurar uma determinada característica (variável) de forma confiável e com menos interferência subjetiva. Primi (2010) reforça que área de avaliação psicológica carece de um avanço nos estudos sobre metodologia e métodos quantitativos para seu desenvolvimento, sendo relevante que isso aconteça para reforçar a importância da contribuição e a riqueza dos dados que podem ser obtidas quando utilizados métodos de avaliação diversificados, reforçando a relevância social, a necessidade do engajamento de maiores estudos literários e produção técnico-cientifica do tema.
3. METODOLOGIA
Essa revisão foi realizada com base nos artigos encontrados no Portal de periódicos da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, através de busca manual. Acredita-se que esta base contém artigos que ilustrem e representem, de forma relevante, o tema a ser pesquisado. As bases de dados da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e Literatura Latino Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) estão incluídas no Portal Capes.
Dessa forma, foram compreendidos nesta revisão, artigos de pesquisa selecionados, que preencheram os seguintes critérios: a) artigos e artigos de revisão, b) disponibilizados de forma integral no Portal Capes, c) publicados no Brasil e em língua portuguesa, d) entre os anos de 2010 e 2019 e que contivessem o seguinte uni termo em seu resumo: “Avaliação Psicológica”.
Para a análise quantitativa o levantamento realizado no período de dezembro de 2019 incluiu a distribuição das publicações com o descritivo “Avaliação Psicológica” na lacuna de tempo entre 2010 e 2019, procurando identificar os principais assuntos (palavras-chave) abordados nos artigos publicados sobre o tema. Na coleta de dados sobre o assunto, com base nos critérios de Witter (2006), buscou-se explorar e avaliar a publicação quanto à sua autoria e multidisciplinariedade.
Esta pesquisa julga-se relevante primeiramente por compreender as últimas duas décadas de produção sobre o tema, incluindo também a década seguinte ao período abrangido por Barroso em sua análise crítica realizada em 2010. Adicionalmente, a característica sistemática da presente revisão juntamente com o acesso às bases de dados online, disponibilizam um grande número de publicações, o que, em ocasião de comparação, permite busca mais abrangente e compreensão comparativa dos antecedentes e atualidade para a busca de novos estudos sobre o tema.
4. RESULTADOS
A pesquisa das produções permitiu identificar 129 artigos disponíveis na base de dados Scielo (Scientific Eletronic Library Online) que cumpriram os critérios de inserção neste trabalho, sendo que destes, 02 artigos foram eliminados da revisão por não conterem o termo “avaliação psicológica” no resumo ou sequer ao longo do texto. Dessa forma, foram considerados para essa pesquisa, realizada entre dezembro de 2019, o total de 127 artigos que cumpriam os critérios selecionados.
4.1 AUTORIA
Quanto à autoria e gênero dos trabalhos levantados, a maior proporção foram as categorias de autoria múltipla (81,1%) e do gênero feminino (70,2%), sendo as que mais apresentaram publicações com o uni termo pesquisado no levantamento de dados. Em relação ao maior número de autoria feminina, podemos considerar que historicamente a profissão tem o predomínio de mulheres em sua atuação e formação, considerando coerente um maior número de autorias advindas desse gênero.
Tabela 1 – Distribuição dos artigos por autoria.
Tabela 2 – Distribuição dos artigos por gênero (feminino ou masculino).
4.2 PERÍODO DE PUBLICAÇÃO
Nos resultados encontrados, elaborou-se o Gráfico 1, que contém os dados de distribuição de artigos conforme o período de publicação (ano). Assim sendo, é notável que houve um decréscimo do número de publicações no decorrer da última década (2010 a 2019), retornando no ano de 2018 um aumento considerável de trabalhos, se tornando o ano com mais publicações (18%) sobre o assunto no período estudado.
Gráfico 1 – Quantidade de periódicos por ano de publicação.
Considerando os termos investigados, a análise da distribuição das publicações evidencia maior número de publicações com uso do termo “avaliação psicológica”, nos primeiros períodos do levantamento. Cano e Sampaio (2007) sugerem pertinente levar em consideração, ao analisar o aumento de publicações, que durante os últimos anos houve uma expansão da utilização da internet, o que facilitou o acesso aos dados de pesquisa, bem como sua publicação e divulgação. Seguidos dos anos 2010-2013, que são os intitulados de maior representatividade temática sobre avaliação psicológica no Brasil e na profissão.
4.3 ÁREAS TEMÁTICAS
O Portal de Periódicos da Capes dividiu as áreas temáticas de publicação de acordo com a Tabela 3 abaixo. Nele é possível notar uma multiplicidade de temas que incluem também outras áreas da saúde além de psicologia, como enfermagem (n=5) e medicina (n=4), bem como 9 artigos em saúde pública, ambiental e ocupacional. A tabela indica que na área de ciências humanas, a Psicologia apresenta-se forma relevante, possuindo o maior número de periódicos publicando artigos que incluam os termos buscados.
Tabela 3 – Quantidade de periódicos por área temática.
Através da quantidade de periódicos e posterior análise de suas abordagens, é possível evidenciar o interesse de inúmeras áreas do conhecimento pelo tema, assumindo a sua imensa importância na vida e cotidiano das pessoas e assim, a necessidade de compreendê-lo por diversas perspectivas. A coleta e interpretação de dados em um conjunto de procedimentos possibilitam um diagnóstico confiável, ressaltando que se trata dos estudos de investigação e trabalho interdisciplinar, que dentre as áreas, concerne ao psicólogo a realização do processo avaliativo primando como base os aspectos técnicos e teóricos da ciência psicologia.
Com o propósito de investigar quais os principais conteúdos que estão sendo abordados juntamente com o tema “avaliação psicológica”, foi realizado um levantamento das palavras-chave contidas em cada uma das 127 produções. Foi estabelecido o levantamento destas palavras por serem consideradas uma síntese deste estudo, delimitando-o e distinguindo-o dos demais, e por isso, de grande importância para o mesmo. Ao todo, foram encontradas 322 diferentes palavras-chave. A tabela 4 esclarece os termos que apareceram com mais frequência:
Tabela 4 – Palavras-chave mais frequentes nas publicações.
A tabela 5, a seguir, evidencia as áreas da Psicologia citadas nos artigos analisados. Ressaltando áreas da Psicologia Hospitalar (n=3) e Psicologia da Saúde (n=5) que reafirmam os dados contidos na tabela 3, em que a área da saúde é uma das mais representativas e grande adeptas do processo de avaliação psicológica.
É possível inferir que concomitantemente com a expansão da avaliação psicológica, ampliaram-se também os contextos de atuação da psicologia nos últimos anos, com novas possibilidades de exercícios da profissão. Ainda, a Constituição Federal de 1988 inseriu no ordenamento jurídico políticas públicas que ampliaram a concepção da saúde no Brasil, dessa forma, o reconhecimento da psicologia como profissão da área da saúde agregou de forma a considerar a vida em sua totalidade nos processos de saúde e doença.
Tabela 5 – Áreas da Psicologia citadas como palavras-chave nas publicações.
Observa-se na próxima tabela, a quantidade de palavras-chave da área da saúde que aparecem em conjunto com o termo avaliação psicológica, reforçando a aplicação da prática da psicologia no campo da saúde, independente da vertente de conhecimento, técnica ou integração com outras ciências, mas em um exercício amplo e diversificado. O desenvolvimento de normas de avaliação psicológica permite a psicologia na saúde ter evidências e importância científica de resultados práticos e tratamentos mais eficientes, e podem ser considerados guias específicos para especialidades e serviços com características diversas.
Tabela 6 – Palavras-chave da saúde citadas nas publicações.
Na tabela 7 nota-se que a diversidade de áreas que estão sendo abordadas juntamente com o assunto da avaliação psicológica. A despeito do alto número de artigos em que aparecia a palavra-chave “psicologia”, filtrada durante o levantamento, foi possível identificar que várias áreas majoritariamente do campo da saúde estão sendo abordadas concomitantemente com o assunto da avaliação psicológica, não sendo o tema exclusividade nos artigos de Psicologia.
Tabela 7 – Palavras-chave com áreas da saúde que pesquisaram sobre avaliação psicológica.
As abordagens do processo avaliativo juntamente com a abordagem de técnicas extrapolam publicações que falam especificamente de psicologia e vem atravessando diferentes contextos da aplicabilidade dos instrumentos na compreensão integral das características de determinado indivíduo ou grupo.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo possibilitou identificar um crescimento significativo no primeiro quinquênio em comparação ao segundo período referente ao número de publicações no decorrer da última década (2010 a 2019), com aumento acentuado nos anos de 2013 e 2018, provavelmente devido as repercussões documentais de resoluções, sistemas normativos e ações engajadoras sobre avaliação psicológica no Brasil. Os campos da Psicologia e Saúde em geral foram os que mais publicaram as obras analisadas, sendo predominantemente autoria múltipla e feminina. O trabalho possibilitou detectar uma farta multiplicidade de temas abordados nos estudos sobre “avaliação psicológica” e que a multidisciplinariedade abrangida nos artigos demonstra a expansão da utilização do processo de avaliação psicológica em diversos contextos.
A evolução no crescimento de pesquisas relacionadas à testagem evolução indica e reafirma historicamente a necessidade de estudos psicométricos para as avaliações psicológicas, incluindo os testes psicológicos, utilizados para fins profissionais. O Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos (SATEPSI) foi criado para atender a demanda de normatização da qualidade dos instrumentos, sendo necessário constante aprimoramento, reflexão e desenvolvimento sobre estas práticas, de maneira positiva e edificante, com o intuito de consolidar a área e o processo. Neste âmbito, foi possível observar durante a pesquisa dos termos chaves, uma incidência relacionada à validade como “validade e psicometria”, sendo “testes psicológicos” o termo mais frequente depois da palavra chave pesquisada como tema desta pesquisa.
É importante ressaltar que os testes ainda aparecem como parte importantíssima do processo e continuam sendo alvo de interesse dos pesquisadores. Em dezembro de 2019 foi realizado um levantamento onde constavam, no site do Satepsi, 91 testes desfavoráveis (34,6%), sendo destes, 33 estudos de normatização que se encontravam vencidos nos anos de 2018 e 2019. Dos demais testes levantados, havia 164 favoráveis (62,4%), 08 em processo de avaliação (3%) e 16 instrumentos não privativos. Mesmo com a melhoria dos instrumentos e avanços na produção de novos meios avaliativos, ainda são poucos conhecidos, não há qualificação e formação profissional suficiente para a utilização técnica destes, bem como ainda é limitado a aplicabilidade dos serviços psicológicos para a sociedade como um todo.
É possível notar que apesar de algumas áreas de aplicação da avaliação psicológica estarem em amplo desenvolvimento (como saúde), outras áreas como, por exemplo, avaliação psicológica de pessoas no contexto organizacional, ainda são incipientes, não aparecendo esse campo nas buscas. A psicologia hospitalar e do trânsito tem demonstrado interesse no estudo do processo de avaliação psicológica. A despeito disso, a avaliação psicológica pode e deve ser aplicada em diversos contextos, seja no hospital, empresas, políticas públicas, dentre outras e a criação de estudos nessas diversas áreas contribuiria de forma a trazer entendimentos sobre as especificidades de cada ambiente e seus desafios.
Não apenas os psicólogos, mas como os profissionais de diversas áreas possíveis da utilização de avaliação psicológica, devem contribuir com o avanço da produção cientifica sobre as possibilidades de utilização destes recursos avaliativos que contribuem e subsidiam para levantamento de elementos seguros e satisfatórios para a tomada de decisão nos vários contextos, sendo ainda mais promissora as perspectivas futuras de estudos e conhecimentos no tema.
6. REFERÊNCIAS
CANO, Débora Staub; SAMPAIO, Izabela Tissot Antunes. O Método de Observação na Psicologia: Considerações sobre a Produção Científica. Universidade Federal de Santa Catarina. Interação em Psicologia, 11(2), p. 199-210. Curitiba, dez.2007. Disponível em: (https://revistas.ufpr.br/psicologia/article/view/6849/8141). Acesso em: 11/12/2019.
CAPES. Portal de Periódicos. Disponível em: https://www.capes.gov.br/. Acesso em: 02/01/2019.
PRIMI, Ricardo. Avaliação psicológica no Brasil: fundamentos, situação atual e direções para o futuro. Psic.: Teor. e Pesq., v.26, n.spe, p.25-35, Brasília, 2010. Disponível em: (http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-37722010000500003&lng=en&nrm=iso ). Acesso em:19/01/2020.
TREVIZAN, Maria Júlia. Contextos em que a avaliação se insere. In Conselho Federal de Psicologia. Ano da avaliação psicológica: Textos geradores (pp. 121-125). Brasília, 2011. Conselho Federal de Psicologia.
WITTER, Geraldina Porto. Metaciência e leitura. In: Witter, G. P. (Org.), Leitura: textos e pesquisas. Alínea. pp. 13-22. Campinas, SP, 1999.
WITTER, Geraldina Porto. Produção científica: escalas de avaliação. In: Comunicação e Produção Científica. p.261-185. São Paulo: Angellara, 2006.
ANEXOS – TABELAS E GRÁFICO EM INGLÊS
Tabela 1 – Distribuição dos artigos por autoria
Tabela 2 – Distribuição dos artigos por gênero (feminino ou masculino).
Gráfico 1 – Quantidade de periódicos por ano de publicação.
Tabela 3 – Quantidade de periódicos por área temática.
Tabela 4 – Palavras-chave mais frequentes nas publicações.
Tabela 5 – Áreas da Psicologia citadas como palavras-chave nas publicações.
Tabela 6 – Palavras-chave da saúde citadas nas publicações.
Tabela 7 – Palavras-chave com áreas da saúde que pesquisaram sobre avaliação psicológica.
[1] Psicóloga, pós-graduada em Desenvolvimento de Pessoas.
[2] Psicóloga, especialista em Gestão de Pessoas.
Enviado: Fevereiro, 2020.
Aprovado: Abril, 2020.
