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A história local como contribuição para a formação dos discentes

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CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

SANTANA, Maria Aparecida Teixeira [1], GUISSO, Luana Frigulha [2]

SANTANA, Maria Aparecida Teixeira. GUISSO, Luana Frigulha. A história local como contribuição para a formação dos discentes. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 10, Vol. 13, pp. 56-89. Outubro de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/historia/formacao-dos-discentes

RESUMO

Este estudo teve como objetivo apontar a contribuição da História Local no processo de ensino/aprendizagem na disciplina de História para a formação dos discentes do Ensino Fundamental da rede municipal de São Mateus/ES. Para tanto, buscou-se investigar como a História Local pode contribuir para o processo de ensino/aprendizagem na disciplina de História nos anos finais do Ensino Fundamental da rede municipal de São Mateus/ES. Na intenção de produzir argumentos teóricos e empíricos, utilizaram-se como procedimentos metodológicos, a pesquisa-ação, pesquisa documental e a entrevista que foi direcionada aos docentes do Ensino Fundamental da rede municipal de São Mateus/ES. Na fase inicial da pesquisa foi realizada a pesquisa bibliográfica onde foi abordada a relação entre a História enquanto ciência e disciplina escolar, abordando também o ensino da História Local no processo de aprendizagem, no currículo brasileiro e no Espírito Santo, bem como, a formação da consciência histórica e a aprendizagem nos anos finais do ensino fundamental e a relação entre a história local e o ensino de história. Os resultados da pesquisa indicaram como base na percepção dos docentes de História do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental frente à temática, a necessidade de investimentos em estratégias educativas que orientem melhor os docentes e os ofereçam apoio pedagógico em relação aos conteúdos a serem trabalhados. Por fim, as considerações finais apontam que aperfeiçoar a ação pedagógica e o processo ensino aprendizagem, requer o compartilhamento de responsabilidades entre todos os agentes envolvidos nesse processo, tanto de forma direta como indireta. Desse modo, o ensino aprendizagem da história global e/ou de uma comunidade local, não é apenas um mero ato de relatar eventos passados, mas sim de resgatar os valores morais e culturais que trazem informações significativas tanto para a comunidade quanto para a própria formação da identidade do sujeito.

Palavras-chave: Ensino de História, História Local, formação discente.

1. INTRODUÇÃO

Nesta pesquisa abordamos o ensino da História Local como fundamental para a formação do discente das Séries Finais do Ensino Fundamental no município de São Mateus-ES, uma vez que a consideramos uma ferramenta importante para construção da identidade do indivíduo, possibilitando uma melhor compreensão do processo de formação do seu espaço de vivência e das múltiplas relações existentes no seu entorno, além de importante para a formação do sujeito.

A História como disciplina ensinada nas escolas ganhou novos rumos, através da aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) – Lei nº 9394/96, da elaboração e aplicação do Plano Nacional de Educação (2001), dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino fundamental e médio (a partir de 1997); dos Referenciais Nacionais para Formação do Professores (1999) e no final do século XX por meio da inserção no currículo das universidades brasileiras.

Debates no campo de pesquisa geram discussões referentes aos conteúdos curriculares, reflexões sobre o sentido do reconhecimento da história ensinada por conter um aglomerado de informações para o desenvolvimento da identidade cultural, social e econômica de uma nação ao longo do tempo, trouxeram possibilidades de novas reflexões referentes às propostas curriculares para o ensino da História, sobretudo, em relação à formação dos alunos como sujeito histórico, tendo assim, conhecimento da realidade local, preservação da memória e do patrimônio histórico cultural.

Dentro desse contexto, o ensino de História Local carrega consigo a importância de proporcionar ao indivíduo reflexões sobre a sociedade na qual ele faz parte, além de subsidiar novas possibilidades de leituras do espaço imediato. Tendo como referências as Leis de Diretrizes e Bases (LDB), no qual surgem propostas da inclusão da História Local apontados nos princípios dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) ou orientadas nas Bases Curriculares indicadas pelas Secretarias de Educação dos Estados, Distrito Federal e municípios do Brasil, evidenciando sua importância.

De acordo com Figueira e Miranda (2012, p. 115), “História local refere-se ao conhecimento histórico da perspectiva local enquanto objeto de conhecimento e como espaço de referência para o conhecimento”.  Assim sendo, o foco do problema a ser estudado parte do seguinte questionamento: Como a História Local pode contribuir para o processo de ensino/aprendizagem na disciplina de História nos anos finais do Ensino Fundamental da rede municipal de São Mateus/ES?

Para responder à problemática, o objetivo geral consiste em apontar a contribuição da História Local no processo de ensino/aprendizagem na disciplina História para a formação dos discentes do Ensino Fundamental da rede municipal de São Mateus/ES. Propõe-se como objetivos específicos, identificar como o docente possibilita o aluno o ensino da História Local; Verificar as estratégias utilizadas no desenvolvimento das aulas e a participação dos alunos nas atividades; Elaborar uma proposta para formação pedagógica “História Local” levando em conta a formação para professores sobre a inserção da História Local na Educação Básica Séries Finais do Fundamental da Rede de Ensino de São Mateus/ES.

Os critérios metodológicos empregados nessa pesquisa, levam em conta a técnica qualitativa e quantitativa pautada na abordagem da Pesquisa-ação que se baseia na investigação coletiva e auto reflexiva entre pesquisador e participantes. No caso desse estudo, docentes de História da Rede Municipal de Ensino de São Mateus-ES, para compreender as práticas educacionais implantadas nas aulas de História Local, na tentativa de analisá-las criticamente e diante dos dados coletados, propor melhorias e gerar novas perspectivas de aprendizagem.

2. A HISTÓRIA COMO DISCIPLINA ESCOLAR

A História “[…] muda de acordo com as diferentes formas do homem de se relacionar com o espaço, com o tempo e consigo em sua vivência em sociedade” (FAGUNDES; ANDRADE, 2017). Conforme Fonseca (2009), “História é vida e conhecimento. As pessoas fazem histórias o tempo todo e em todos os lugares”. Neste ínterim, é preciso considerar que o conhecimento histórico produzido nas aulas de História, advém das diferentes maneiras de se conceber a História surgida ao longo dos tempos.

Diante dessa concepção, a História enquanto disciplina escolar sucede da ciência, da memória coletiva, da forma de produzir conhecimento histórico e contribuir para a formação da consciência histórica dos educandos. No Brasil, a História como disciplina escolar advém do século XIX, quando passou a ser considerada como um saber institucionalizado. Implantada inicialmente em 1837 no Colégio Dom Pedro II no Rio de Janeiro, foi sustentada por diversas concepções e tendências historiográficas. Apesar da Europa ser referência quando o assunto é História como disciplina escolar, as escolas primárias e secundárias[3] brasileiras passaram também a incorporar em seus projetos pedagógicos a História nacional onde os conteúdos focavam a nacionalidade, marcos históricos e seus respectivos personagens, sendo a pátria, o foco do ensino (SCHMIDT; CAINELLI, 2009).

Contudo, a inclusão da História nos documentos relacionados às práticas pedagógicas advém da década de 1930, quando o educador Anísio Teixeira publicou uma proposta de ensino de Estudos Sociais inspirada no modelo americano. A partir daí, a possibilidade de implantação de Estudos Sociais nos currículos tornou-se parte do debate educacional (FONSECA, 2009).

A legislação educativa passou a ser regulamentada pelas Referências Curriculares e Instruções Metodológicas, tornando obrigatória a inserção da História como disciplina escolar na escola primária e disciplina optativa no ensino médio, conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 4024/61 de 20 de dezembro de 1961. Nessa época, os principais conteúdos da disciplina eram focados na nacionalidade com seus respectivos “personagens” e marcos históricos, sendo o patriotismo o elemento central do ensino.

Em 1971 foi aprovada a Lei nº 5.692/71 sendo estabelecido o Núcleo Comum para os currículos de 1º e 2º graus, bem como, a Integração Social para as séries iniciais do 1º grau (atual Ensino Fundamental), que tinha como propósito promover de forma gradativa à inserção do aluno ao meio. Nas demais séries, o componente curricular passou a ser denominado Estudos Sociais e os conteúdos de História ficaram limitados ao 2º grau, atual Ensino Médio (GERMINARI, 2014).

Após a década de 1970 o governo brasileiro foi impulsionado a criar leis, decretos e resoluções, regulamentando as diretrizes sobre a reforma educacional que ocorreu após a década de 1988, momento em que no país foi promulgada a Constituição Brasileira que especificamente no Art. 206, estabelece “a gratuidade do ensino público, a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber” (BRASIL, 1998). Enquanto no Art. 242, § 1º, a Constituição Federal (BRASIL, 1988), disponibiliza que “o ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro”. Neste período foram aprovadas também as Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (DCNs) – normas obrigatórias que passaram a regulamentar e orientar o planejamento curricular dos sistemas de ensino.

Paralelamente a necessidade de adequar os currículos escolares, o governo federal aprovou a Lei Federal 9394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação, atualmente em vigor, que dentre suas atribuições, evidencia a necessidade de um currículo comum, para todo território nacional, e uma parte diversificada. Assim sendo, o Ministério da Educação criou entre 1997 e 1999 os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para o Ensino Fundamental e Médio, com o propósito de construir um currículo único que deve ser seguido pelas instituições de todo o país.

No Ensino Fundamental, as disciplinas escolares foram estabelecidas como áreas do conhecimento, mantendo assim a especificidade da História que também passou a ser trabalhada com as demais disciplinas através da transversalidade.

No Ensino Médio os PCN’s (BRASIL, 1998) preconizam a organização curricular por áreas do conhecimento e a História integrada as disciplinas das Ciências Humanas e suas tecnologias, bem como, Geografia, Sociologia e Filosofia (GHIRALDELLI JÚNIOR, 2009). O caráter filosófico no ensino de História voltou a se manifestar nos chamados “eixos-temáticos” e a construção do mundo do cidadão passou novamente a ter centralidade (SCHMIDT; CAINELLI, 2009). Dessa forma, a disciplina de História ganhou espaço, dialogando com outras disciplinas de forma interdisciplinar.

Na reformulação da Escola Secundária Brasileira, a História enquanto disciplina buscou focalizar no ensino “[…] a valorização dos fatos do presente e a partir deles, estudar o passado; desenvolver um ensino intuitivo e crítico; enfocar os indivíduos como expressões do meio social” (SCHMIDT, 2012). Os PCNs acrescentam que a disciplina de História tem como propósito “contribuir para o desenvolvimento dos alunos como sujeitos conscientes, capazes de entender a História como conhecimento, experiência e prática de cidadania” (BRASIL, 1997).

O ensino da História é, portanto, global e local em consonância com os Parâmetros Curriculares Nacionais – História e Geografia. A história local é concebida como a história dos acontecimentos mais próximos do estudante e da localidade onde ele vive. Por isso, torna-se fundamental refletir sobre o ensino da História Local no processo de aprendizagem, bem como, a sua inserção no currículo escolar do Espírito Santo, especificamente em relação ao município de São Mateus-ES.

2.1 SÃO MATEUS-ES: HISTÓRIA E HISTÓRIA LOCAL

O município de São Mateus-ES, localiza-se ao norte do Estado do Espírito Santo, possui área total é de 2 338,727 km², equivalente a 5,12% do território capixaba. Limita-se ao norte com os municípios de Boa Esperança, Pinheiros e Conceição da Barra; ao sul com São Gabriel da Palha, Vila Valério, Jaguaré e Linhares; a Leste com o oceano Atlântico e a Oeste com Nova Venécia.

Abriga no seu trajeto histórico, relevantes fatos para a sua formação. A cidade de São Mateus, às margens do rio Cricaré foi fundada por volta de 1554 e além de ser reconhecida como berço cultural do solo espírito-santense, é considerada uma das cidades mais antigas do Estado. Os primeiros habitantes da região foram os índios Aymorés que contribuíram para o processo de formação cultural, somados aos negros africanos e europeus que desenvolveram papel importante nesse processo de construção da identidade do povo mateense.

Com base nos dados do “Dicionário Histórico, Geográfico e Estatístico da Província do Espírito Santo”, editado em 1879, a população de São Mateus em 1827, era composta por 783 índios, 947 brancos e 4.525 negros, e a maioria desses trabalhava na produção de farinha de mandioca nas inúmeras fazendas existentes (DICIONÁRIO GEOGRÁFICO E ESTÁTICO DO ESPÍRITO SANTO, 1979).

A ocupação do território da cidade de São Mateus-ES ocorreu por meio do desbravamento, ou seja, desmatamento e ocupação das terras por parte dos ex-escravos fugidos e mais tarde pelos negros libertos pela Lei Áurea, que gradativamente e de maneira coletiva foram se apossando de terras ainda não ocupadas. O negro escravo proporcionou ao Porto de São Mateus um período de grande movimento econômico, contribuindo com a mão-de-obra civil para a construção das Igrejas Matriz de São Mateus, São Benedito, Igreja Velha, bem como de novas residências.  Posteriormente, vieram os imigrantes italianos que diferente dos negros contaram com o apoio e financiamento do governo para desmatar e plantar, como afirma Nardoto (2005, p. 26):

Toda a região situada no lado norte do rio São Mateus, na medida em que ia perdendo a cobertura de florestas naturais, seja pela ação dos madeireiros, seja pela ação de pequenos posseiros que plantavam mandioca, era tomada pelo sapê que tem a característica de inibir o surgimento de outras espécies em sua volta. Por isso, essa região ficou conhecida com o nome de Sapê do Norte.

Os negros do Sapê do Norte, descendentes de escravos, viviam isolados, sem voz, sem vez, abandonados à própria sorte, viviam da fabricação de farinha, da caça e da pesca.

Os imigrantes e seus descendentes, pouco a pouco, foram conquistando as terras no lado sul do rio São Mateus, em direção a Nova Venécia. A mão-de-obra dos italianos era utilizada na derrubada da mata para extração da madeira e implantação das lavouras de café. Também eram contratados para os serviços de construção civil, pois muitos eram pedreiros e carpinteiros.

Os italianos conseguiram conquistar suas terras e legitimá-las, enquanto os negros detinham apenas a posse.

De acordo com a citação acima, convém destacar que ocorreu uma diferença por parte do governo da época quanto aos moradores da cidade, na qual os imigrantes italianos obtiveram alguns privilégios quanto ao direito à posse da terra, enquanto os negros continuavam abandonados, ou seja, não existia por parte do governo uma preocupação quanto à legalidade das terras a essa população, que continuou a trabalhar no campo, desenvolvendo atividades econômicas de subsistência e propagando para as novas gerações sua identidade cultural; traços de origem africanos, onde as condições de vida de seus antepassados sempre estão presentes em suas manifestações culturais.

Os primeiros africanos foram tirados de sua terra natal, e foram submetidos a viajarem em embarcações precárias atravessando o Oceano Atlântico. E em terras brasileiras tiveram que se submeter ao trabalho escravo, sem ao menos levar em consideração as atividades desenvolvidas em seu país de origem.  No Brasil, desenvolveram as mais variadas atividades, em especial o seu trabalho impulsionou o desenvolvimento econômico a partir de atividades agrícolas. Mas não foi apenas no campo econômico que se destacaram, pois conseguiram reinventar uma forma de organização social e política, como forma de manter viva, suas culturas e tradições, contudo resistindo ao trabalho forçado.

Como forma de resistência à escravidão, surgiram os agrupamentos de africanos, que foram criando comunidades altamente organizadas e autônomas, que passaram a ter uma liderança que contava com uma divisão do trabalho e organização das festas. Atualmente essas comunidades são denominadas quilombola, segundo Osvaldo (2009), a palavra quilombo tem como significado:

[…] kilombo (da língua quibundo) já era usada por povos africanos que viviam nas regiões do Congo e Angola. Seus significados faziam referências às diversas formas de organização, entre elas econômicas (mercados e feiras), militares (acampamentos guerreiros), sociais e políticos (nas vilas e povoados).

Já no Brasil, até quase o final do século XIX (até 1888), a palavra quilombo era usada para se referir aos africanos e seus descendentes que resistiam à escravização por meio da formação de agrupamentos autônomos que escapavam aos domínios dos colonizadores portugueses.

De acordo com o pesquisador Osvaldo, em sua “cultura quilombolas do Sapê do Norte”, existem aproximadamente vinte e cinco comunidades quilombolas, localizados nos municípios de São Mateus e Conceição da Barra-ES. Alguns negros do norte do estado do Espírito Santo se destacaram como líderes de quilombo, como por exemplo, Benedito (conhecido como Benedito Meia-légua), Silvestre (o Nagô) e Rogério (popularmente conhecido como Negro Rugério, o rei da farinha); são destaques na luta contra a escravidão.

Atualmente as lideranças quilombolas tem se unido para lutar pelos direitos à terra, à uma educação de qualidade e à cultura, fatores que tem gerado atritos em algumas regiões do município, principalmente no que diz respeito ao reconhecimento da propriedade prescrita na legislação em vigor.

De acordo com a legislação, da Constituição Federal de 1988, que regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Onde o 2º artigo merece ser destacado, para reafirmar a hipótese deste trabalho. Que consiste na importância do território para a propagação da identidade quilombola na região norte da cidade. Estabelece o artigo 2:

Art. 2o Consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos, para os fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto-atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida.

§ 1o Para os fins deste Decreto, a caracterização dos remanescentes das comunidades dos quilombos será atestada mediante autodefinição da própria comunidade.

§ 2o São terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos as utilizadas para a garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural.

§3o Para a medição e demarcação das terras, serão levados em consideração critérios de territorialidade indicados pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, sendo facultado à comunidade interessada apresentar as peças técnicas para a instrução procedimental (BRASIL, 2003, p. 3).

São Mateus possui aproximadamente treze áreas onde são encontrados remanescentes quilombolas, desenvolvendo atividades econômicas e culturais de seus antepassados, são elas: São Cristóvão, Mata Sede, Beira Rio, São Jorge, Morro da Arara, Nova Vista I, Nova Vista II, Dilo Barbosa, Chiado, São Domingos de Itauninhas, Divino Espírito Santo, Rio Preto/Bom Pastor, Palmitinho. No entanto, essas comunidades ainda não foram todas reconhecidas.

2.2 O ENSINO DA HISTÓRIA LOCAL NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM

A História Local é o estudo da História em um contexto geográfico e muitas vezes se concentra em determinada comunidade. Incorpora aspectos culturais e sociais da História. Para Bittencourt (2011), a História local geralmente se liga a história do cotidiano “[…] ao fazer das pessoas comuns participantes de uma história aparentemente desprovida de importância e estabelecer relações entre os grupos sociais de condições diversas que participaram desse entrecruzamento de histórias”.

Embora o termo local seja autoexplicativo, mas no ensino da História não significa apenas estudar a História de uma cidade ou bairro em que o aluno vive. O foco da História local pode ser o lugar em si, as pessoas que viveram ali ou os eventos que ocorreram em um determinado local. Essa proposta de ensino da História local emergiu do movimento norte-americano denominado Escola Nova que discordava do fato de superestimar o estudo do passado em relação às sociedades contemporâneas, bem como, questionava o ensino técnico pautado na mecanização e memorização de fatos e datas (BITTENCOURT, 2011).

No período que sucedeu entre 1940 e 1950, as mudanças na política educacional que ficaram conhecidas como “reforma Gustavo Capanema” reforçaram a importância de possibilitar ao discente o desenvolvimento do conhecimento histórico local e crítico, bem como, defendiam que os professores precisavam ter autonomia didática para desenvolver a metodologia de ensino da História Local no processo de aprendizagem (VIANA, 2016).

Da década de 1960 conforme destaca Schimdt (2012) a História local, “[…] era entendida como sinônimo de comunidade e como referência para o ensino de Integração Social, articulando atividades de História e Geografia. Esse ensino privilegiava o estudo do meio mais próximo”. No entanto, de 1964 a 1985 o referido estudo deu espaço para conteúdos políticos, uma vez que o país estava vivenciando o período da Ditadura Militar.

A partir de então, foi retomada a discussão sobre inserção da História Local no processo de aprendizagem, sobretudo, por professores que passaram a questionar a “impossibilidade de transmitir o conhecimento de toda a História da humanidade em todos os tempos. Criticando essa abordagem eurocêntrica, alguns começaram a introduzir conteúdos da história local e regional” (PCN, 1997).

No entanto, a inclusão da História Local como eixo temático e conteúdo curricular deu-se somente com a efetivação da proposta dos Parâmetros Curriculares de História na década de 1990 elaborados pelo Ministério da Educação onde reforçam que desde os anos iniciais, o ensino de História deve possibilitar ao discente “[…] identificar relações sociais no seu próprio grupo de convívio, na localidade, na região e no país, e outras manifestações estabelecidas em outros tempos e espaços” (BRASIL, 1997).

As diretrizes curriculares incluíram a História local como eixo temático das séries iniciais do Ensino Fundamental e como metodologia de ensino para as demais séries da educação básica. A proposta de ensino é desenvolver no discente a noção de identidade, bem como, evidenciar que o mesmo pertence a um grupo sociocultural.

Segundo Mattozzi (1998, p. 40) “[…] histórias locais permitem a investigação da região ou dos lugares onde os alunos vivem, mas também das histórias de outras regiões ou cidades”. Desse modo, o ensino da História Local é como um “microcosmo” ou representação de grandes padrões em pequena escala que refletem a herança de gerações passadas em relação ao ambiente em que os alunos estão inseridos, possibilitando-os uma reflexão sobre questões da realidade e da vida cotidiana de forma significativa.

Como conteúdo curricular, permite ao discente reconhecer como eventos e ações do passado e do presente são significativos dentro do contexto onde ele vive. Para tanto, a historiadora Bittencourt (2011) afirma que é preciso superar a forma tradicional do ensino de História vista de forma conteudista e mecanizada, onde muitas vezes, tanto os professores e os alunos, subestimam a importância de associar a História local ao conteúdo da História.  Nesse sentido, é preciso problematizar e significar a História local levando em conta tudo o que está no entorno, o que é familiar e próximo do aluno.

2.3 A HISTÓRIA LOCAL NO CURRÍCULO BRASILEIRO E NO ESPÍRITO SANTO

As diretrizes atuais sobre a História local encontram raízes no texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 9394/96 – documento curricular oficial, destaca o que é pertinente a ser transmitido aos discentes em relação ao processo de ensino da História, conforme destaca em seu artigo 26, § 4º:

Art. 26.  Os currículos da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio devem ter base nacional comum, a ser complementada, em cada sistema de ensino e em cada estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e dos educandos.

§ 4º O ensino da História do Brasil levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes indígena, africana e europeia (BRASIL, 1996, p. 19).

Com a nova redação de alguns artigos da LDB 9394/96 regulamentados pela Resolução nº 1 do Conselho Nacional de Educação (CNE) publicada em 2004, foram introduzidos nos temas no estudo da História e acrescida uma nova redação ao Art. 26-A.

Art. 26-A.  Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena.

§ 1o O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil (BRASIL, 2004, p. 21).

Partindo dessa concepção, o texto dos PCNs reconhece que “[…] é no dia-a-dia das escolas e das salas de aula, a partir das condições, contradições e recursos inerentes à realidade local, que são construídos os currículos reais” (BRASIL, 1997, p. 15), e acrescenta que no percurso do Ensino Fundamental os alunos devem ser capazes de:

Situar acontecimentos históricos e localizá-los em uma multiplicidade de tempos;

Reconhecer que o conhecimento histórico é parte de um conhecimento interdisciplinar;

Compreender que as histórias individuais são partes integrantes de histórias coletivas;

Conhecer e respeitar o modo de vida de diferentes grupos, em diversos tempos e espaços, em suas manifestações culturais, econômicas, políticas e sociais, reconhecendo semelhanças e diferenças entre eles, continuidades e descontinuidades, conflitos e contradições sociais;

Questionar sua realidade, identificando problemas e possíveis soluções, conhecendo formas político-institucionais e organizações da sociedade civil que possibilitem modos de atuação;

Dominar procedimentos de pesquisa escolar e de produção de texto, aprendendo a observar e colher informações de diferentes paisagens e registros escritos, iconográficos, sonoros e materiais (BRASIL, 1997, p. 121).

As diretrizes curriculares para o ensino da História são caracterizadas como recomendações pedagógicas que visam nortear o papel da escola e dos professores em relação à construção do saber histórico. Nesse sentido, os PCNs (BRASIL, 1998) propõem que os conteúdos curriculares sejam organizados em dois eixos temáticos. O primeiro refere-se a História Local e do Cotidiano, que se encontra subdividido em conteúdos que abordam a Localidade e as Comunidades Indígenas. O segundo eixo temático referente ao segundo ciclo traz a História das Organizações Populacionais contextualizada nos seguintes conteúdos: Deslocamentos Populacionais, Organizações e Lutas de Grupos Sociais e Étnicos, Organizações Políticas e Administrações Urbanas, Organização Histórica e Temporal. Somam-se aos eixos temáticos o estudo com ênfase nos temas transversas, especificamente quanto a Ética, Cidadania, Pluralidade Cultural e Meio Ambiente. Tal proposta curricular é direcionada para as instituições públicas e privadas de todo território nacional, bem como, em relação aos conteúdos abordados nos livros didáticos.

No Currículo Básico do Espírito Santo, a História local faz parte do Conteúdo Básico Comum de História dentro dos Tópicos/Conteúdos, em todo o Ensino Fundamental até o Ensino Médio (MACHADO, 2018). No entanto, Simões et al. (2006) indicam que o problema envolve a relação com a memória histórica do País e especificamente com o nosso Estado que é comumente apresentado no ensino de História a partir da imagem do atraso, da capitania que fracassou, do Estado que se diferencia dos demais Estados da Região Sudeste.

O aparente distanciamento e insignificância do ensino da História e o ensino da História local no Espírito Santo também é revelado na opinião de Ribeiro; Gonçalves (2017, p. 20):

[…] quando estudamos a história do Espírito Santo, notamos o silêncio com que a historiografia brasileira tratou a história capixaba – como se ela não contasse como componente da narrativa da nação. Isso causa aos capixabas um sentimento difuso de alteridade, ou seja, os capixabas não se veem pertencentes aos grupos que normalmente são apresentados como formadores da história do Brasil, como o foram os bandeirantes, os mineiros, os pampas, os nordestinos, os gaúchos.

Essa realidade releva a necessidade de romper com essa visão arraigada sobre a História local, e projetar um novo olhar sobre a especificidade histórica, social e cultural (SIMÕES et. al., 2006), tendo em vista que, a fragmentação não possibilita que os discentes estabeleçam relações locais, seja no bairro, na comunidade, espaços estes considerados, na maioria das vezes, como distanciados da realidade do país e também do mundo (FONSECA, 2009). “Trata-se, portanto, de formular uma história local com as referências do processo histórico local e regional de forma a perceber, tomar consciência e valorizar os seus traços distintivos” (RIBEIRO; GONÇALVES, 2017, p. 20).

Diante dos desafios impostos ao ensino da História local no Espírito Santo, sobretudo em função da escassez de materiais publicados sobre o assunto, concorda-se com Machado (2018), que o livro Territorialidades e Identidades Capixabas: guia para estudos transversais e História do Espírito Santo, dos autores Luiz Carlos Ribeiro e Aline Gonçalves, pode auxiliar o trabalho docente, pois os conteúdos mesclam conceitos historiográficos a Geografia Crítica e a História Ambiental.

Ainda no Espírito Santo, destacam-se também as publicações do historiador Eliezer Orlandi Nardoto, autor da obra “História e Geografia de São Mateus”, que relata em detalhes a história municipal desde a Antiguidade baseada em dados geológicos, arqueológicos e econômicos, intercalados aos fatos da cidade vizinha de Nova Venécia – ES que naquela época era distrito do município mateense. Dentre outras obras de Nardoto, destacam-se: História de São Mateus, Contos de Minha Cidade, Contos de El Rey Outros Contos; São Mateus História Turismo e Cultura (NARDOTO, 2001).

2.4 A HISTÓRIA LOCAL NOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL DA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE SÃO MATEUS-ES

O ensino da História para os anos finais do ensino fundamental visa auxiliar o estudante a entender os fatos e acontecimentos também em termos de suas raízes históricas e suas implicações no presente e futuro. Para tanto, de acordo com a LDB nº 9394/96, o ensino da História “[…] levará em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a formação do povo brasileiro, especialmente das matrizes indígena, africana e europeia” (Art. 26, §4) (BRASIL, 1996, p. 19).

As Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica complementam de acordo com a Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010:

Art. 15. Em sua Parte Diversificada: Cada sistema de ensino e estabelecimento escolar complementa a base nacional comum, prevendo o estudo das características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da comunidade escolar, perpassando todos os tempos e espaços curriculares constituintes do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, independentemente do ciclo da vida no qual os sujeitos tenham acesso à escola. (BRASIL, 2010, p. 6).

Então, fica notório que no ensino da História, elementos da História local devem ser contextualizados na prática escolar para que o estudante conheça a sua história. As Diretrizes Curriculares Nacionais, assim como os Parâmetros Curriculares corroboram sobre a aprendizagem dos saberes da história enquanto disciplina escolar correlacionando-a com a História Local.

Considerando a importância de se trabalhar a História Local na disciplina de História do 6º ao 9º ano – Ensino Fundamental II na Rede Municipal de Ensino de São Mateus-ES, objeto do presente estudo, estando contido no Programa de Ensino do Município a disciplina de História do 6º ao 9º os conteúdos e as respectivas habilidades a serem trabalhadas pelos professores.

Sobre a História Local, o programa faz menção aos primeiros habitantes do norte do Espírito Santo, cujo objetivo é caracterizar o modo de vida primitiva do norte do ES, valorizando os sítios arqueológicos locais, bem como, a contribuição dos estudos e pesquisas para compreensão da cultura do nosso povo. O plano de ensino trata dos primeiros colonizadores do Espírito Santo e de São Mateus e da Batalha do Cricaré, visando analisar as circunstâncias que favorecem a chegada dos primeiros colonizadores no Espírito Santo e em São Mateus. Analisar e discutir as principais razões da Batalha do Rio Cricaré e a consequente redução ou desaparecimento completo dos povos indígenas que vivem no Norte do Espírito Santo.

Dentre outros conteúdos, o plano enfatiza sobre os africanos no Brasil, onde os professores devem possibilitar que os alunos conheçam a trajetória dos africanos e seus descendentes no Brasil, especificamente no Espírito Santo e São Mateus. Caracterizar a escravidão e os vários trabalhos desenvolvidos pelos negros escravizados. Conhecer as diferentes formas de resistência dos escravizados, dentre elas a formação dos quilombos, a Insurreição de Queimados no Espírito Santo e as Insurreições em São Mateus. Mapear os remanescentes de quilombos no Brasil especialmente no Espírito Santo e em São Mateus. Quanto à expansão colonial portuguesa na América, o Programa destaca sobre a importância de conhecer a Povoação do Rio São Mateus e analisar a resistência indígena ao avanço da colonização.

Partindo desse cenário, a História Local torna-se instrumento fundamental na compreensão de diversos acontecimentos que ocorreram no município de São Mateus-ES. Portanto é necessário estabelecer relações a partir do processo de colonização e de exploração de toda a América Latina, assim como no Brasil, para que os alunos consigam relacionar dentro do Ensino Fundamental ll, todo e qualquer interferência no desenvolvimento da estrutura e fundamentação da História do município de São Mateus.

3. METODOLOGIA

Num primeiro momento foi realizada a pesquisa bibliográfica que de acordo com Marconi; Lakatos (2011, p. 43):

Trata-se do levantamento de toda a bibliografia já publicada em forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita. Sua finalidade é colocar o pesquisador em contato direto com tudo aquilo que foi escrito sobre determinado assunto.

A segunda etapa da pesquisa estruturou-se em pesquisa de campo, tendo como sujeitos participantes docentes que atuam na disciplina de História, nos anos finais do Ensino Fundamental do município de São Mateus-ES, que possuem contrato de trabalho vinculado à Secretaria Municipal de Educação em designação temporária ou em caráter efetivo, que lecionam no turno matutino e/ou vespertino.

A coleta de dados foi realizada por meio de pesquisa documental e questionário semiestruturado composto por 12 (doze) perguntas fechadas e abertas acerca da relação pedagógica nas aulas de História nos anos finais do Ensino Fundamental e a História Local, permitindo a cada participante opinar e descrever sobre práticas, metodologias, recursos e materiais utilizados no cotidiano escolar frente aos desafios do tema pesquisado.

Foi utilizada também uma pesquisa-ação junto aos docentes de História dos Anos Finais do Ensino Fundamental.

O método de pesquisa-ação consiste essencialmente em elucidar problemas sociais e técnicos, cientificamente relevantes, por intermédio de grupos em que se encontram reunidos pesquisadores, membros da situação problemas de outros atores e parceiros interessados na resolução dos problemas levantados ou, pelo menos, no avanço a ser dado para que sejam formuladas adequadas respostas sociais, educacionais, técnicas e/ou políticas (THIOLLENT, 2011, p. 7).

Para tanto, foi apresentada uma proposta voltada para a Formação Pedagógica “História Local”: formação para professores sobre a inserção da História Local na Educação Básica Séries Finais do Fundamental da Rede de Ensino de São Mateus/ES, cujo objetivo consiste em implementar e desenvolver estratégias que sirvam de suporte a fim de orientar os professores da Rede de Ensino de São Mateus/ES nas aulas de História e História Local.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

O presente capítulo apresenta as opiniões dos professores de História dos anos finais do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) acerca da importância do ensino de História Local na rede municipal de ensino de São Mateus-ES.  Vinte e dois docentes (22) foram convidados livremente a participarem da pesquisa, sendo que do total, dezessete (17) se dispuseram a responder o questionário.

Na pergunta 1 a identificação pessoal foi um quesito opcional da pesquisa.  Na pergunta 2 foi solicitada a identificação da escola, sendo que, das 29 escolas de Ensino Fundamental da Rede Municipal de Ensino de São Mateus-ES, foram citadas nessa pesquisa 11(onze) escolas localizadas no meio urbano (região 1). A escolha dessas escolas deu-se devido ao acesso, pela localização na mesma região onde resido, já que precisaria voltar às escolas várias vezes principalmente porque os professores só poderiam me receber nos horários de planejamento. Outro motivo foi porque trabalhei como docente em algumas dessas escolas e por serem escolas grandes que recebe um número de alunos superior as escolas do meio rural.

Quanto às turmas/ano que os docentes trabalham atualmente, 47% responderam do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental II, 18% responderam 8º e 9º ano do Ensino Fundamental II, 12% disseram 7º e 8º ano, 6% no 6º ano, 6% no 7º ano, 6% no 7º e 9º ano, 6% no 6º e 7º ano, conforme destaca-se no Gráfico 1.

Gráfico 1 – Turma/Ano que os docentes lecionam

Fonte: Autoria própria.

Conforme se observa a maioria dos docentes participantes da pesquisa lecionam do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental, o que indica a relevância da formação pedagógica uma vez que o Ensino de História e o Ensino de História Local deve contemplar para as turmas do 6º e 7º anos conteúdos direcionados para a formação sócio cultural do município de São Mateus-ES, enquanto que a formação política e econômica deve contemplar os discentes do 8º e 9º ano do Ensino Fundamental.

Ao indagar os docentes sobre o nível de escolaridade, verificou-se que 12% são graduados, 65% especialistas e 25% mestres, conforme demonstração no Gráfico 2.

Gráfico 2 – Nível de Escolaridade dos Docentes

Fonte: Autoria própria.

A partir dos dados do gráfico 2 verifica-se que a maioria dos docentes entrevistados é especialista. Ressalta-se que na atuação pedagógica do professor de História, a formação continuada é considerada ferramenta necessária que visa à qualificação dos profissionais, mediante práticas formativas e educativas que contribuem para o aperfeiçoamento e a melhoria das práticas de ensino.

Demo (1998, p. 69) afirma que “a competência profissional está atrelada à capacidade permanente de inovação, de saber pensar, e ao “aprender a aprender”. Diplomar-se e voltar sempre a estudar é hoje requisito indispensável a qualquer profissional”. Outrora, sabe-se que os desafios pedagógicos podem ser minimizados quando os docentes são profissionais capacitados que reconhecem a importância e a responsabilidade individual de contribuir para a melhoria do processo ensino aprendizagem, sendo necessário para tanto, manter-se em constante atualização de conhecimento.

Quanto ao tempo de atuação na Rede Municipal de Educação, o Gráfico 3 indica que, 47% dos professores responderam entre 2 e 5 anos, 29% atuam há mais de 15 anos, 18% entre 11 e 15 anos e 6% entre 6 e 10 anos. Acredita-se que pelo tempo significativo de atuação, os docentes já conhecem bem o Plano de Ensino em relação a História local proposto pela Rede Municipal de Educação, assim como, devem também buscar levar para a sala de aula metodologias e recursos didáticos que possam minimizar as lacunas que porventura ainda existem no Plano.

Gráfico 3 – Tempo que atua como Docente de História na Rede Municipal de Educação de São Mateus-ES

Fonte: Autoria própria.

Quando indagados sobre a relevância de que no processo ensino aprendizagem de História no Ensino Fundamental II, seja abordada também a História Local do município de São Mateus-ES, os docentes foram unânimes em concordar com essa afirmativa conforme se observa na transcrição de algumas falas:

“- Sim, a escola abarca e facilita os conhecimentos necessários para o progresso e desenvolvimento do aluno. Portanto, se o aluno não conhece a história de sua cidade como irá conhecer a sua própria história, tendo em vista que a história de alguns alunos começa no próprio município”;

“- Porque o povo mateense possui a sua história, logo precisamos definir a sua identidade”;

“- Porque é essencial que se conheça a própria história antes de qualquer coisa”;

“- Pois, é imprescindível ao professor ensinar sobre seu lugar de pertencimento, fazendo o aluno se sentir sujeito atuante e autor de sua própria formação”.

“- É fundamental ensinar História Local em sala de aula, pois assim ocorre a aproximação da disciplina de História com a realidade do aluno. Aprendendo sobre seu entorno, o educando percebe que também faz parte da história e que se constitui como sujeito e agente histórico. Deste modo, a disciplina de História se torna mais atrativa para os educandos”.

Nesse sentido, observa-se que os docentes associaram a relevância da História Local a possibilidade do educando conhecer a sua própria história, o seu entorno e construir a sua identidade social. Logo, o docente deve considerar que o processo de ensino da História local não visa formar historiadores, mas, acima de tudo, contribuir para a formação de cidadãos conscientes e interessados pelo conhecimento histórico e que também conheçam a História de sua própria comunidade e vejam a si mesmos como parte desse processo.

Quando indagados se existe relação entre o Ensino de História nos anos Finais do Ensino Fundamental e o Ensino de História Local de São Mateus – ES, 94% dos professores entrevistados responderam sim e somente 6% não, de acordo com o Gráfico 4. Nota-se que não tem como dissociar a História Local do ensino da História. Logo, conforme ressalta Schmidt (2012), o trabalho com a História local deve possibilitar a inserção do aluno na comunidade da qual faz parte, criar a historicidade e a identidade dele. A relação entre o ensino da História com a História local ajuda a gerar atitudes investigativas, criadas com base no cotidiano do aluno, além de ajudá-lo a refletir acerca do sentido da realidade social. Como estratégia pedagógica as atividades com a história local ajudam o aluno na análise dos diferentes níveis da realidade: econômico, político, social e cultural.

Gráfico 4 – Existe relação entre o Ensino de História nos anos Finais do Ensino Fundamental e o Ensino de História Local de São Mateus – ES?

Fonte: Autoria própria

De acordo com a opinião da maioria dos entrevistados (94%) destacada no Gráfico 4, algumas falas justificaram que:

“- O professor pode relacionar a História do Município de São Mateus à História do Brasil e Geral durante as suas aulas. No entanto, a história local deve se caracterizar pela valorização dos particulares, das diversidades; ela é um ponto de partida para a formação de uma identidade regional”.

“- Porque são nessas turmas de Ensino Fundamental II que buscamos trabalhar a identidade local e por isso cabe lecionarmos com conteúdos do Brasil Colônia, por exemplo”.

“- O currículo do município aborda temas locais, além disso, o município possui legislação municipal que garante o ensino de história local ao longo de todo o ensino fundamental. É importante mencionar que a disciplina de História tem 1hora/aula a mais por semana para trabalhar a História Local”.

“-Eu vejo que não tem como ensinar História Geral sem incluir a História Local”.

“- Moramos em um município privilegiado de riqueza na história. São 474 anos. Como professor de história, temos que explorar o esplendor de maravilhas”.

Observa-se pelas falas que os professores em sua maioria mostraram concordância quanto a relação entre a História Geral e Local, sendo que o próprio município disponibiliza um Programa de Ensino direcionado ao Ensino Fundamental II abordando os conteúdos e habilidades a serem trabalhadas pelos professores em sala de aula. Acrescenta-se ainda que o docente ao abordar questões sobre a população indígena ou sobre os africanos que foram escravizados e trazidos para o Brasil, paralelamente também poderá abordar a História Local.

Em contrapartida, um docente respondeu que não é possível fazer essa associação, conforme especificado na transcrição de sua fala:

“-Existem tentativas que não se concretizam. Alguns fatores contribuem com esse cenário, sendo os principais: o despreparo dos profissionais atuantes e a carência de bons materiais que se adéquem ao programa de ensino”.

No entanto, percebe-se que o docente precisar também ter consciência que ele é responsável pelo seu crescimento profissional e, para tanto, precisa investir em sua carreira para possa estar apto e preparado para lidar com as questões pedagógicas relacionadas à disciplina que ele leciona.

Quanto aos materiais pedagógicos, os PCNs (BRASIL, 1998) dos anos finais do ensino fundamental, acrescentam que o conhecimento histórico é sempre fruto de seu tempo e orienta que os professores busquem também outros meios para o processo ensino aprendizagem da História local:

[…] as obras de cunho histórico textos historiográficos, artigos de jornais e revistas, livros didáticos são estudadas como versões históricas que não podem ser ensinadas como prontas e acabadas nem confundidas com a realidade vivida pelos homens no passado. Considera-se, por exemplo, a importância da identificação e da análise de valores, intencionalidades e contextos dos autores; a seleção dos eventos e a relevância histórica atribuída a eles; a escolha dos personagens que são valorizados como protagonistas da história narrada; e a estrutura temporal que organiza os eventos e que revela o tempo da problemática inicial e dos contextos históricos estudados. Trabalhos nessa linha possibilitam para o docente, entre outras coisas, reconhecer sua atuação na construção do saber histórico escolar, na medida em que é ele que seleciona, avalia e insere a obra em uma situação didática e tal obra adquire novos significados ao ser submetida aos novos interlocutores (ele e alunos) (BRASIL, 1998, p. 33).

Essas considerações e diferentes percepções revelam que o ensino da História local é um debate ainda em curso, uma vez que os conteúdos locais precisam ser abordados de forma mais expressiva, ampla e significativa dentro do currículo escolar e também pelos próprios docentes, para que de fato os objetivos e finalidades propostos possam ser concretizados.

Sobre isto, Fonseca (2009, p. 125) reitera:

A história das pessoas, da localidade, dos trabalhos, das profissões, das festas, dos costumes, da cultura, das práticas políticas está viva entre nós. Nós, professores, temos o papel de junto com os alunos auscultar o pulsar da comunidade, registrá-lo, produzir reflexões e transmiti-lo a outros. A escola e as aulas de História são lugares da história recente, local, imediata e distante.

Ao serem questionados se ao ministrar as aulas, relacionam discussões associadas à História Local, todos confirmaram essa questão conforme destacado em algumas falas:

“– A História é trabalhada fazendo paralelo com o presente, não tem como falar do presente se não falar da história local”;

“– Participação de São Mateus no processo de colonização, povos indígenas, povos africanos e suas influências na cidade; política no Espírito Santo e em São Mateus”;

“– Sempre, seguindo e respeitando o que o programa de ensino propõe e intervindo quando não há a implementação do intercâmbio da história mundial/nacional/regional/local”;

“– Sempre que cabe e que existe qualquer relação com o tema explorado, a história local é inserida nas discussões”;

“- Em diversas situações – ao trabalhar indígenas: semelhanças e diferenças; resistência, escravidão e tráfico, a colonização, sociedade e economia”;

“– Formando a ideia de identidade local relacionada a formação da cultura brasileira, tal como relacionando essa ideia de resistência dos negros durante o Brasil colônia, o Brasil República nos dias atuais”.

“- Geralmente trabalho com o 6º ano (antigo e pré-história), e nesse caso trabalho mais na época do aniversário de São Mateus, mas nos outros anos sim, dá para trazer mais conteúdo local”;

Diante das falas acima, percebe-se que:

O trabalho com a História local pode produzir a inserção do aluno na comunidade da qual faz parte, criar a historicidade e a identidade dele. O estudo com a história local ajuda a gerar atitudes investigativas, criadas com base no cotidiano do aluno, além de ajudá-lo a refletir acerca do sentido da realidade social. Como estratégia pedagógica as atividades com a história local ajudam o aluno na análise dos diferentes níveis da realidade: econômico, político, social e cultural (SCHMIDT, 2009, p. 139)

Portanto, as discussões da História Local devem ocorrer durante o decorrer do ano letivo, como atividade de sala e de casa, aqui de forma especial nas turmas do 6º ano, de forma a integrar a vivência dos alunos, e não apenas no período de datas comemorativas. Assim é importante pensarmos na inserção da História Local no decorrer de todo o currículo escolar, pois ao abordarmos a História da localidade, debatemos com a memória coletiva.

Ressalta-se que o Ensino da História Local na rede municipal de ensino de São Mateus-ES é trabalhado dentro do Programa de Ensino Fundamental como conteúdo a ser seguido respeitando a temporalidade dos fatos. No entanto, todos os professores concordaram que o trabalho como tema transversal no processo ensino aprendizagem, contribui para o conhecimento histórico, conforme destacado em algumas falas:

“-Sim, pois contribui para a formação da identidade cultural local”.

“-Sim, um dos objetivos atuais do ensino de História Local é a compreensão entorno da realidade do aluno”.

“- Sim, se transversal ou incluído no currículo, faz o mesmo efeito”.

“-Sim. Assim os alunos podem fazer a ligação entre o passado e o presente de onde vieram”.

“- Sim, pois a História começa no seu cotidiano, vivenciando a sua própria”.

“- Sim. Eu vejo que o conhecimento como ensino teórico sempre haverá essa transversalidade que irá contribuir para o conhecimento e aprendizado do aluno sempre quando discutimos qualquer tema, transversalizamos no conteúdo histórico ou outro”.

Diante dessas percepções, relevante mencionar Gatti Júnior et al. (2010), que também concordam que inserir a história local no processo ensino aprendizagem de História pode contribuir para estabelecer diferentes formas de resistência aos processos de padronização e homogeneização culturais, promovidos pela dinâmica da globalização.  Ademais, constituem o ponto de partida da aprendizagem histórica, uma vez que permitem a abordagem dos contextos mais próximos em que se inserem as relações sociais entre os professores, os estudantes e o meio. Nessa perspectiva, o ensino-aprendizagem da história local configura-se como um espaço-tempo de reflexão crítica acerca da realidade social e, sobretudo, referência para o processo de construção das identidades destes sujeitos e de seus grupos de pertença.

Nesse mesmo sentido, Viana (2016, p. 21) destaca que:

Um dos princípios constitutivos da História local é possibilitar um olhar indagador sobre o mundo do qual fazemos parte, no intuito de sabermos mais sobre o sentido das coisas. Tanto como conteúdo, quanto como recurso didático, a temática da dimensão local na construção do conhecimento histórico contribui para o desenvolvimento de uma postura investigativa que começa a ser construída no espaço familiar e vai-se ampliando aos poucos. O ponto de partida desse tipo de história são as próprias histórias que integram o nosso cotidiano.

Quando indagados sobre quais os métodos e recursos que utilizam para construção da consciência Histórica Local dos discentes do Ensino Fundamental II da Rede Municipal, os docentes destacaram:

“- Pesquisas, estudos, leituras, recortes, debates, questionários, slides, filmes, trabalhos escritos, aulas expositivas e outros meios que tiverem acesso”.

“- Tecnológicos – Datashow (Powerpoint”), livro da História de São Mateus (Herinéia Lima e Elizer Nardoto), contos de Maciel de Aguiar, músicas”.

“- Pesquisas, depoimentos vivos, visitas de estudos nos pontos turísticos, músicas”.

“- Aulas expositivas com imagens e textos. Visitas ao museu da história de São Mateus e bairro Porto”.

“– Textos informativos e narrativos, pesquisas, releitura de contos de Maciel de Aguiar”.

“– Resumo no quadro, cartazes, maquetes, visitas aos pontos turísticos locais, produção textual sobre a temática, seminários”.

“- Utilizo textos complementares e slides com os conteúdos relacionados a história de São Mateus, reportagens escritas extraídas de jornais e trechos de vídeos de telejornais, elaboro museus temporários com acervo de fontes familiares, confecciono murais e realizado visitas técnicas aos patrimônios históricos do município, para desse modo criar uma consciência de valorização do passado”.

Das falas expostas, percebe-se que é atribuição do docente ampliar a aprendizagem e o conhecimento histórico dos estudantes a partir de diversas fontes e materiais. Os PCNs (BRASIL, 1998, p. 37) destacam que:

[…] os alunos têm acesso a inúmeras informações, imagens e explicações no convívio social e familiar, nos festejos de caráter local, regional, nacional e mundial. Nas convivências entre as gerações, nas fotos e lembranças dos antepassados e de outros tempos, crianças e jovens socializam-se, aprendem regras sociais e costumes, agregam valores, projetam o futuro e questionam o tempo. Rádio, livros, enciclopédias, jornais, revistas, televisão, cinema, vídeo e computadores também difundem personagens, fatos, datas, cenários e costumes que instigam meninos e meninas a pensarem sobre diferentes contextos e vivências humanas).

Sendo assim, levando em conta que o estímulo à aprendizagem da História é mediada por fatores diversos, entende-se que a ação pedagógica para além do aprendizado teórico, deve possibilitar aos alunos o contato com a realidade de forma prática, pois, acredita-se que esta também é uma forma de otimizar a construção do conhecimento histórico. Desenvolver projetos, trabalhos, visitar lugares, conhecer monumentos, entrevistar pessoas, enfim, são condições elementares e indispensáveis para o aluno progredir na construção do seu conhecimento histórico. Para tanto é preciso identificar o enfoque e a “[…] abordagem de uma História local que crie vínculos com a memória familiar, do trabalho, da migração, das festas, uma vez que, pressupõe a base da identidade, e é pela memória que se chega a História Local” (BITTENCOURT, 2011, p. 169).

Nota-se no Gráfico 5 que 71% dos docentes entrevistados concordaram que o Programa de Ensino da rede municipal contribui para a construção do conhecimento da História Local para os discentes do Ensino Fundamental II e 29% acreditaram que não contribui para tal fato pode estar associado a ideia de que somente o município é responsável em disponibilizar materiais para o processo ensino aprendizagem em relação a História Local.

Gráfico 5 – Programa de Ensino da rede municipal contribui para a construção do conhecimento da História Local para os discentes do Ensino Fundamental II

Fonte: Autoria própria

Diante da afirmativa da maioria dos entrevistados, relevante destacar algumas falas que justificaram a percepção dos docentes:

“- O Programa de Ensino tem como função orientar os docentes no que se refere aos conteúdos que deve trabalhar em sala de aula durante o ano letivo. O programa de Ensino do Município de São Mateus foi atualizado recentemente e segue os moldes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e insere também os conteúdos relacionados à História do Município de São Mateus. Portanto, cumpre sua função. Basta os professores adaptarem o Programa de Ensino a sua realidade de sala de aula”.

“- Sim, pois dá um norte ao professor na execução de seu trabalho, não o eximindo da tarefa do ensino e valorização de sua história regional e local”.

“- O programa indica em séries devidas o ensino da História Local respeitando a temporalidade dos fatos”.

Por outro lado, apesar de minoria, alguns discentes não concordaram que o que o Programa de Ensino da rede municipal contribui para a construção do conhecimento da História Local para os discentes do Ensino Fundamental II, segundo justificaram:

“-Não, pois não fornece nenhum material didático/visual”.

“-Acredito que haja um esforço no sentido de se tentar fomentar o aprendizado de História Local, porém, tais iniciativas não se mostram efetivas. O Programa de ensino desconsidera fatores como a falta de preparo dos profissionais, por exemplo”.

Diante dessas percepções, reconhece-se que ainda é necessário investir em ações, projetos, materiais didáticos, dentre outras ferramentas que ofereçam suporte pedagógico à prática dos docentes quanto a inserção da História Local nas aulas de História do Ensino Fundamental II, condição essa confirmada no Gráfico 6, quando 88% responderam que na prática de ensino enfrenta desafios pedagógicos para trabalhar os conteúdos relacionados a História Local no EF ll Rede Municipal de São Mateus-ES.

Gráfico 6 – Em sua prática de ensino, você enfrenta desafios pedagógicos para trabalhar os conteúdos relacionados a História Local no EF ll Rede Municipal de São Mateus-ES

Fonte: Autoria própria

Dentre os principais desafios destacados pela maioria dos docentes, cita-se a carência de material didático, verificado na transcrição de algumas falas?

“- A maior dificuldade para se trabalhar a História do Município de São Mateus é a falta de material didático ou de pesquisa. O professor deve se tornar um pesquisador e produzir o seu próprio material para trabalhar os conteúdos de História Local, o que não é uma tarefa fácil, já que possui poucos planejamentos e muitas tarefas para cumprir (preenchimento de pautas, correção de atividades e testes, entre outras)”.

“- Nem sempre encontramos materiais ricos e que realmente são verdadeiros”.

“- Falta de materiais, falta de incentivo por parte da Secretaria Municipal de Educação, como, por exemplo, a inexistência de cursos de formação continuada que abordem a História Local”.

Ainda assim, mesmo sabendo que essa é uma realidade que precisa ser transformada para melhorar a ação pedagógica em relação ao ensino da História Local, alguns docentes pontuaram que:

“- Depende da equipe pedagógica e do professor…Eu sou nascida e criada neste município e exploro a História na melhora maneira possível”.

“- Os desafios são a meu ver, mais de cunho pessoal, pois, nesse caso o professor muitas vezes deve sair da sua zona de conforto e procurar pesquisar sobre a História Local que pretende ensinar’.

A partir dessas opiniões, identifica-se que a carência de materiais didáticos não pode ser colocada como a única causa referente aos desafios pedagógicos quanto ao ensino da História local. É preciso reforçar que a busca por recursos e fontes históricas é também responsabilidade do professor. Nesse sentido, transpondo as reflexões e os desafios sobre o ensino da História Local, Simões et al. (2006) ressaltam que é notório o caráter insipiente da produção histórica local, e ainda muito mais, do seu ensino.

Entretanto, não se deve subestimar nem eximir a responsabilidade do professor nesse contexto, pois conforme ressalta Tardiff (2002), o docente é responsável em desenvolver contextos de aprendizagem enriquecedores, estimulantes e criativos, transformando a sala de aula em um espaço de compartilhamento de experiências, aprendizagens, opiniões, interesses individuais e coletivos e, sobretudo, da relação dos alunos com os diversos conhecimentos envolvidos na produção do saber histórico.

De acordo com as necessidades apontadas, elaboramos a Proposta para Formação Pedagógica “História Local”: formação para professores sobre a inserção da História Local na Educação Básica Séries Finais do Fundamental da Rede de Ensino de São Mateus/ES (Anexo).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Reconhecer a importância da História Local, sem dúvida, é um ponto de partida para a construção da identidade dos alunos, enquanto população mateense. É contribuir para a formação de sujeitos conhecedores de sua própria história que se tornem capazes de reconhecer e valorizar as suas origens, sua história passada, destacando também os efeitos da globalização para a sobrevivência de costumes considerados relevantes para a permanência e preservação por parte dos indivíduos a essa cultura.

Dessa forma, o Ensino da História Local carrega consigo significados relevantes no Ensino Fundamental II e, por isso, depende de uma proposta pedagógica voltada para um maior entendimento na construção do conhecimento e da consciência histórica dos discentes em relação aos assuntos relacionados ao seu dia a dia.

Considerando que o foco dessa pesquisa foi apontar a contribuição da História Local no processo de ensino/aprendizagem na disciplina História para a formação dos discentes do Ensino Fundamental da rede municipal de São Mateus/ES, ficou evidente que apesar da disponibilidade do Programa de Ensino que orienta os docentes sobre os conteúdos que devem ser trabalhados durante o percurso anual letivo, em sua maioria eles afirmaram que enfrentam desafios pedagógicos para trabalhar os conteúdos relacionados à História Local, de forma específica em relação à escassez de material didático.

Assim sendo, entrelaçando o contexto teórico à prática escolar na percepção dos docentes de História do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental frente à temática, percebe-se a necessidade do investimento em estratégias educativas que orientem melhor os docentes e os ofereçam apoio pedagógico em relação aos conteúdos ao serem trabalhados.

Para tanto, torna-se fundamental maior participação e incentivo da Secretaria Municipal de Educação e demais órgãos competentes quanto à disponibilização de cursos, palestras, seminários, dentre outras estratégias que auxiliem e norteiem melhor os docentes quanto à prática pedagógica.

Acrescenta-se também a necessidade de maior investimento em relação às estratégias formativas do docente de História em relação à ampliação do conhecimento e, consequentemente, do ensino de História Local. Esse apoio é fundamental para que o docente possa aprimorar a sua atribuição enquanto pesquisador e, por conseguinte, imprimir maior significado a sua prática pedagógica, contribuindo também para a formação dos discentes do Ensino Fundamental da rede municipal de São Mateus/ES.

A luz dessas reflexões, a presente pesquisa no campo teórico revelou que no processo ensino aprendizagem as concepções da história global e local coexistem e se entrelaçam na construção da consciência histórica dos alunos, bem como, evidenciou a necessidade da Formação Pedagógica “História Local” sobre a inserção da História Local na Educação Básica Séries Finais do Fundamental da Rede de Ensino de São Mateus/ES.

Portanto, mesmo diante dos desafios pedagógicos que norteiam o cotidiano escolar dos docentes, é preciso considerar que ainda assim é possível construir uma proposta pedagógica que contribua para uma aprendizagem significativa levando em conta e valorizando os conhecimentos dos quais os alunos são portadores, buscando ampliar o diálogo entre esses e os novos conhecimentos, as novas habilidades e as novas atitudes.

No entanto, reforça-se que aperfeiçoar a ação pedagógica e o processo ensino aprendizagem, requer o compartilhamento de responsabilidades entre todos os agentes envolvidos nesse processo, tanto de forma direta como indireta. É preciso que todos esses agentes possam reconhecer e valorizar a abordagem da História Local por meio do ensino da História nos anos finais do Ensino Fundamental, tendo em vista que por meio da consciência histórica, um indivíduo pode contar a sua experiência pessoal e ao mesmo tempo, entender que ele pertence a uma estrutura temporal maior.

Desse modo, o ensino aprendizagem da história global e/ou de uma comunidade local, não é apenas um mero ato de relatar eventos passados, mas é resgatar valores morais e culturais que trazem informações significativas tanto para a comunidade quanto para a própria formação da identidade do sujeito.

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APÊNDICE – REFERÊNCIA DE NOTA DE RODAPÉ

3. Escola primária ou ensino primário era aquele direcionado para a primeira fase escolar e/ou estágio da educação escolar. Enquanto o ensino secundário caracterizava-se como a transição da etapa anterior, constituindo-se a fase final e obrigatória da educação básica.

[1] Mestrado Profissional em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Regional Faculdade Vale do Cricaré- FVC; pós- graduada em História e Cultura Afro- Brasileira Faculdade Vale do Cricaré-FVC; pós- graduada em História do Brasil Faculdade de Educação do Espírito Santo- UNIVES; Curso de graduação em História Universidade Norte do Paraná- UNOPAR.

[2] Orientadora. Mestrado em Tecnologia Ambiental. Especialização em Psicopedagogia. Especialização em Pedagogia Empresarial. Especialização em Gestão De Recursos Humanos. Graduação em Licenciatura Plena em Pedagogia.

Enviado: Março, 2020.

Aprovado: Outubro, 2020.

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Maria Aparecida Teixeira Santana

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