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A problemática do Supply Chain Management frente aos impactos da Covid-19 e a retomada do crescimento

RC: 125786
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/administracao/impactos-da-covid-19

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

RIBEIRO, Jessiel de Moura [1]

RIBEIRO, Jessiel de Moura. A problemática do Supply Chain Management frente aos impactos da Covid-19 e a retomada do crescimento. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 07, Ed. 08, Vol. 07, pp. 28-47. Agosto de 2022. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/administracao/impactos-da-covid-19, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/administracao/impactos-da-covid-19

RESUMO

Discorrer sobre Supply Chain implica em considerar todo o planejamento e estruturação necessários ao pleno atendimento do cliente final, demandando a tomada de decisões que envolvem os aspectos estratégico, tático e operacional de uma organização. Com o surgimento da pandemia da Covid-19 a cadeia de suprimentos das diferentes empresas ao redor do mundo desorganizou-se, ocasionando um desabastecimento alarmante, além da escassez de mão de obra para o trabalho em todos os segmentos. Nesta perspectiva, a pergunta que surge é: como promover a nível global a retomada da indústria, comércio e serviços no pós-pandemia? Como objetivo, pretende-se investigar as soluções possíveis para reorganizar o fluxo de planejamento do abastecimento das empresas e retomada do pleno funcionamento da cadeia produtiva perante as demandas de sua clientela no pós-pandemia Covid-19. O presente artigo original foi desenvolvido tendo como metodologia a pesquisa bibliográfica, discorrendo sobre a paralisação dos processos de Supply Chain, originados pela pandemia do Covid-19 e consequente queda no abastecimento. Verificou-se a necessidade da criação e implementação de cadeias de suprimentos resilientes, frente às eventuais ocorrências drásticas; desenvolvimento/implantação de colaboração tecnológica por meio de ferramentas/plataformas de alta performance para melhor administração dos processos de Supply Chain, utilizando-se do sistema blockchain; promoção da capacitação de indivíduos e equipes.

Palavras-chave: Pandemia Covid-19, Supply Chain, Retomada do abastecimento pós-pandemia. 

INTRODUÇÃO 

As práticas do Supply Chain Management (SCM) compreendem o conjunto de processos interligados em uma cadeia que se inicia na compra da matéria-prima, produção, armazenamento, movimentação interna, transporte e distribuição até o consumidor final (NEOWAY, 2021).

Com o advento da pandemia da Covid 19 que promoveu, em curto espaço de tempo, uma crise global sem precedentes ao longo deste século, deu-se uma grave interrupção no fluxo de mercadorias necessárias ao cotidiano dos indivíduos no formato até então conhecido, impactando toda a cadeia produtiva e distributiva, e com isso, ocasionando a desaceleração da economia mundial. Os diferentes setores da sociedade passaram, então, a experimentar problemas de ordem sanitária, social e econômica (GERDEMAN, 2022).

O comércio entre os Estados Unidos e a China foi bastante afetado, na medida em que os trabalhadores ficavam doentes e as fábricas foram obrigadas a interromper suas atividades (HEISE, 2020).

No presente, desponta a redução das formas graves da doença e do contágio, apesar dos elevados números de óbitos registrados pelo mundo. Tal fato se deve aos resultados satisfatórios obtidos pela adoção das medidas necessárias ao enfrentamento da doença, como o isolamento social e demais medidas sanitárias adotadas, aliadas à vacinação em massa que abrangeu grande parte das nações.

O impacto da escassez de insumos e mercadorias em todos os segmentos ocasionou uma redução de 2% no crescimento anual da economia norte-americana entre julho e setembro de 2021, contrariando previsões anteriores de especialistas que apontavam para a casa de 7% ao ano. Concorre ainda para essa queda do crescimento econômico a majoração dos preços de combustíveis, de alimentos, de aluguéis e itens básicos para a sobrevivência dos norte-americanos (CBS NEWS, 2021).

Contudo, persistem dificuldades em diferentes organizações e seu esforço concentrado em sua busca por mão de obra necessária ao preenchimento das oportunidades profissionais ainda em aberto, já que o mercado de trabalho ficou fortemente desestruturado pela doença (CBS NEWS, 2021). Some-se a isso o fato de a recente retomada nos negócios ter pegado de surpresa inúmeras empresas, que, diante da pandemia, reduziram suas compras e produtividade, mas que, face à disparada na demanda dos consumidores, verificaram seu desabastecimento para atender prontamente ao ressurgimento da demanda (GERDEMAN, 2022).

Nessa perspectiva, o presente artigo científico original, cuja metodologia adotada foi a pesquisa bibliográfica, pretende responder à seguinte indagação: como promover a nível global a retomada da indústria, comércio e serviços no pós-pandemia?

Em resposta ao problema proposto, o objetivo deste estudo consiste em identificar as soluções possíveis para reorganizar o fluxo de planejamento do abastecimento das empresas e retomada do pleno funcionamento da cadeia produtiva perante as demandas de sua clientela no pós-pandemia Covid-19.

SURGIMENTO DA COVID-19

À humanidade não cabe relativizar os milhões de vidas perdidas por doenças contagiosas que, rapidamente, espalharam-se pelos muitos continentes, entre elas a Varíola, durante o século III (entre janeiro de 201 d.C. a dezembro de 300 d.C.); a Peste Negra em 1347, o Cólera em 1817, a Peste Bubônica em 1855, a Pandemia de Sarampo em 1875, a Gripe Espanhola em 1918, a Gripe Asiática em 1957, e a Gripe Suína (H1N1) em 2009, como indica o portal da Universidade de Medicina de Lisboa (UL, 2020).

Ainda assim, a pandemia da Covid-19 é considerada “a maior ameaça à saúde pública global do século”, evento que promoveu desequilíbrio e deficiências no avanço econômico, político e social em todos os países (SILVA, 2020, p. 448).

Tragédia de proporções inéditas, a Covid 19 ocasionou o desencadeamento de uma crise de ordem mundial afetando todos os setores da vida humana, exercendo forte pressão, também, sobre a capacidade produtiva dos diferentes setores industriais ao redor do mundo, já que ao mesmo tempo em que o contágio crescia, a oferta de produtos e serviços ia sendo lentamente paralisada (SILVA, 2020).

Antes do anúncio oficial emitido pelo governo chinês para informar à Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre o surgimento do novo coronavírus, os países importadores de mercadorias produzidas na China já começavam a sofrer com a queda sensível no fornecimento da cadeia de suprimentos oriunda daquele país (YOSHIDA, 2020, p. 12).

As interrupções no fluxo de produtos e de estoques, classificadas por especialistas como graves interrupções – quando fabricantes fecharam/paralisaram parcial ou totalmente as suas atividades, aeroportos adotaram restrições severas, houve a escassez de equipamentos e de suprimentos – em si, foram eventos que impactaram as redes globais de abastecimento, originados também pelo isolamento social tão necessário para conter a propagação do novo coronavírus (YOSHIDA, 2020, p. 12).

A China, que ao longo do tempo se transformou no maior centro local e global na produção de matérias-primas e peças de reposição para diferentes segmentos da indústria, tornou-se o principal fornecedor crítico para os setores de máquinas, telecomunicações, instrumentos de precisão, etc. (CAI e LUO, 2020).

Wuhan foi a cidade chinesa mais afetada pelo novo coronavírus, epicentro inicial da epidemia, cuja produção provém das grandes empresas do setor automobilístico e semicondutores, tão necessários aos gigantes do setor, entre eles Foxconn, Dongfeng, Motor Group, Honda e General Motors, que enfrentaram forte queda em seus negócios (CAI e LUO, 2020).

Rapidamente a disseminação da Covid-19 atingiu as províncias de Guangdong, Zhejiang e Jiangsu, região onde se concentram muitas empresas manufatureiras, levando a produção de carros, celulares e outros produtos a diminuir gradativamente, diante da falta de matérias-primas, de peças de reposição, e ainda a falta de mão de obra (CAI e LUO, 2020).

O sequente contágio pelo novo coronavírus ocasionou o fechamento de inúmeras fábricas nos diferentes países, face às ações de bloqueio na circulação de pessoas e meios de transporte, incluídos setores da indústria automobilística, eletrônica e até farmacêutica. Por consequência, o risco de falência de inúmeras empresas de médio e pequeno porte veio a tornar-se realidade no médio prazo (CAI e LUO, 2020).

Os impactos da Covid-19 no processo de abastecimento mundial ocorreram em duas fases, descritas por Cai e Luo (2020): na fase 1, entre fevereiro e março de 2020, mudanças graduais começaram a ocorrer em todos os processos produtivos na China, relativos ao fornecimento de matérias-primas e peças de reposição, ocasionando, de início, o atraso na entrega de pedidos de importação. Diante do crescimento contínuo da contaminação das pessoas, na fase 2, os processos produtivos foram interrompidos.

Cabe registrar que a China é considerada “um grande consumidor de commodities globais e produtos agrícolas, sendo que as interrupções na fabricação na China se espalharam pelas cadeias de suprimentos globais” (TWINN et al., 2020, apud SILVA, 2020, p. 450).

A redução no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) impactou a cadeia mundial de suprimentos de forma abrangente, quanto à produção e fornecimento de insumos, assim como à oferta de produtos industriais e serviços de uma forma geral, devido à crise global instalada, conforme explicou Steve Rick, economista chefe da seguradora Cuna Mutual Group (CBS NEWS, 2021).

CADEIA DE SUPRIMENTOS: ETAPAS, TIPOS E ABRANGÊNCIA

Segundo Pessoa et al. (2017, p. 176), a nova realidade mundial, representada pela “globalização, comércio eletrônico e automações” permite aos consumidores de todos os padrões e poder aquisitivo inúmeras experiências antes não imaginadas, ao mesmo tempo em que as organizações de diferentes portes buscam expandir seus negócios, seja em pontos de venda físicos ou eletrônicos. O fato é que todos esses aspectos implicam na gestão da cadeia de suprimentos, assim como no cuidado com os riscos inerentes a tal gerenciamento.

O conceito sobre Logística surgiu na França por volta de 1917, descrito no livro “Logística Pura: a ciência da preparação para a guerra”, escrito pelo então Tenente-Coronel Thorpe, fuzileiro naval dos Estados Unidos. Nesse livro foram descritas as “estratégias de guerra, cujo objetivo era cuidar do estoque, manutenção e distribuição de diferentes materiais, como alimentos, remédios, armas, roupas e meios de transportá-los”, passando então a Logística ser considerada a ciência que planeja e realiza diversos projetos (FUNDACE, 2019).

Mas houve um hiato entre o lançamento do referido livro em 1917 e o fortalecimento da área de Logística perante o contexto empresarial, ocorrido somente a partir de 1970, quando passou a englobar aspectos como planejamento eficiente, estoque e transporte de produtos (FUNDACE, 2019).

Segundo definição de Yoshida (2020, p. 17-8), a logística é a área que consiste no gerenciamento estratégico das atividades de aquisição, movimentação e armazenamento de materiais, “visando maximizar ganhos – presentes e futuros – por meio da inflexão dos custos no atendimento dos pedidos”. Compreende ainda:

o serviço ao cliente, relacionado ao tráfego e meios de transporte, armazenagem, localização da planta fabril e seus depósitos, o controle de inventário, o processamento de pedidos, a aquisição de materiais e sua movimentação e distribuição, suprimento, entrada e saída de materiais, devolução de mercadorias e previsão de volume de pedidos, atendendo o cliente de forma eficiente (…) (YOSHIDA, 2020, p.17-8).

A Logística tem a finalidade de permitir maior rentabilidade dos serviços perante clientes e consumidores, viabilizando o melhor fluxo e maior valor agregado de seus produtos perante sua clientela (YOSHIDA, 2020).

A evolução deste conceito levou ao surgimento do Supply Chain Management (SCM), integrando todos os processos envolvidos em Logística a outros necessários ao pleno gerenciamento desse setor (NEOWAY, 2021).

O SCM tornou-se estratégia fundamental para melhorias nos sistemas operacionais das organizações, permitindo a geração de vantagem competitiva por meio da redução de custos nas fases de produção, de inovações nos processos e da entrega ao consumidor final com maior qualidade (NEOWAY, 2021).

Contudo, existem riscos relativos a esse Gerenciamento, que se subdividem em: riscos operacionais, ameaças aos investimentos em inventário e custos da cadeia de suprimentos (YOSHIDA, 2020).

Segundo a empresa Neoway (2021), entre os tipos de cadeias de suprimentos, estão:

  1. Totalmente flexível: tem o foco na entrega rápida, como é o caso de clientes do e-commerce. É usado por áreas de mercado de alta demanda, diante de consumidores de maior poder aquisitivo;
  2. Ágil: com foco em respostas rápidas a demandas pouco previsíveis, tem como exemplo os insumos industriais. É usado em mercados de consumidores não fiéis, que requerem entregas rápidas, mas que oferecem alta rejeição a preços elevados;
  3. Enxuta: seu foco está na eficiência, na economia de escala e baixo custo de produção e entrega, representados por exemplo, por fornecedores de suprimentos de escritório. Usado em negócios do tipo B2B, costuma ter clientes que buscam por bons preços, com atendimento rápido e de qualidade;
  4. Reabastecimento contínuo: com o foco no desenvolvimento da fidelidade dos consumidores de produtos e serviços confiáveis, pode-se mencionar como exemplo os fornecedores de bebidas para bares. Usado para mercados cujas demandas são previsíveis, e clientes fiéis a seus fornecedores.

As diferenças entre um conceito e outro consistem no fato de a Logística tratar-se de uma abordagem específica que envolve as etapas entre o armazenamento e o transporte, enquanto o Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos envolve toda a gestão entre as empresas, a destacar: fornecedores, distribuidores, armazéns, consumidores, etc. (FUNDACE, 2019).

Por sua vez, está o Risk Management Supply Chain (SCRM). Segundo Lima Jr. et al. (2021, p.279), consiste na “intersecção de conhecimento entre os temas Gestão de Riscos e Gestão da Cadeia de Suprimentos”. São riscos inerentes às questões geográficas, que impactam as cadeias de suprimentos, as quais estão vinculadas aos contextos sociais e demandas dos diferentes países em suas relações fornecedor/comprador.

Lima Jr. et al. (2021) ensinam que tais riscos referem-se à natureza do risco ou à eficácia das estratégias das diferentes empresas, de países, etc., na medida em que podem ou não comprometer negócios e viabilidade de projetos comerciais. Estes autores descrevem cinco fatores de riscos, a destacar:

  1. Riscos de transporte: eventuais problemas durante o transporte de mercadorias, relativos a atrasos ou danos aos produtos;
  2. Risco de informação e previsão: possíveis erros nas informações e previsão da demanda, como por exemplo os erros relacionados à documentação de pedidos; entrada de pedidos e erros do sistema de informações; às solicitações urgentes de pedidos e alterações por clientes e manutenção adequada de estoque;
  3. Risco do fornecedor: eventual falência súbita de um fornecedor; escassez e defeitos ocasionados na produção inadequada do fornecedor; deficiências na resposta a pedidos urgentes;
  4. Risco ambiental: consistem em eventuais alterações operacionais do SCM; flutuações de preços relativas ao aumento dos preços das matérias-primas e inflação; oferta e demanda não atendidas devido à insuficiência de matérias-primas; mudanças nos regulamentos, leis e políticas relacionadas; mudanças tecnológicas;
  5. Risco destrutivo: relativos a desastres e acidentes naturais repentinos e inesperados, como epidemias, incêndios, acidentes de trânsito, greves e fechamentos de portos e aeroportos.

Aos cinco riscos descritos, Gerdeman (2022) acrescenta um sexto risco, relativos aos inúmeros pedidos demissionais de trabalhadores norte-americanos, ocorridos por diferentes motivações no pós-pandemia. 

O MULTILATERALISMO E A CADEIA GLOBAL DE SUPRIMENTOS

O multilateralismo é o termo que significa a concepção de estruturas que tendem a funcionar de forma universal entre as partes que a integram. Assemelha-se à finalidade de órgãos como o Fundo Monetário Internacional (FMI), a Organização das Nações Unidas (ONU), a Organização Internacional do Trabalho (OIT), entre outros, cada um deles submetidos “a determinado sistema de coordenação de relações entre diferentes estados, para atendimento de objetivos determinados” (FONSECA JR, 2019).

Fernandes e Simão (2020 p. 18-19) explicam que o multilateralismo como “princípio estruturante nas relações internacionais”, nasceu no século XX e pode ser definido como “a prática de coordenação de políticas nacionais entre três ou mais Estados, através de arranjos ad hoc ou de instituições”.

Por sua vez, o regionalismo e suas múltiplas formas fundamentam-se em bases de processos de coordenação entre Estados variados, com exceção da União Europeia (UE). Assemelha-se, também, a instituições diversas, entre elas a Organização dos Estados Americanos (OEA), Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), ou Aliança Atlântica, etc. (FONSECA JR, 2019).

Cabe mencionar também o conceito sobre multipolaridade, definido por Fernandes e Simão (2020) como a distribuição dos fatores de poder nos diferentes polos, poder esse que costuma ficar concentrado em países considerados pelo sistema internacional como potências mundiais. A multipolaridade distingue-se do multilateralismo, que é o arranjo entre os países interessados em acordos entre si, por estar relacionada às questões vinculadas à distribuição de poder.

O multilateralismo surge da necessidade das diferentes nações e suas demandas por acordos de fornecimento de insumos, produtos, commodities, etc. São acordos que podem ser realizados conforme as preferências regionais, bilaterais e até plurilaterais, sendo que seus signatários devem manter-se fiéis aos princípios do livre comércio (TIRONI, 1990).

As regras relativas ao multilateralismo e sua fiscalização estão a cargo da Organização Mundial do Comércio (OMC), com base em regulamentação técnica desenvolvida a partir de outros acordos já existentes. Entre os maiores polos mundiais de poder estão Estados Unidos, China e União Europeia (UE). Assim, em conformidade com a regulamentação técnica, os outros países podem escolher ou combinar suas escolhas pela cadeia produtiva de um ou outro grupo, conforme suas necessidades e interesses regionais (TIRONI, 1990).

Dessa forma, China, EUA e Alemanha vincularam-se comercialmente, passando a produzir/exportar para o norte da Ásia, América do Norte e Europa ocidental, respectivamente, enquanto Coreia do Sul, Japão e Cingapura ascenderam à condição de elevada importância na produção/fornecimento de produtos destinados à cadeia global, até em função de sua localização geográfica, já que suas exportações representam 40% dos produtos intermediários, conforme dados tabulados pela consultoria KPMG, conceituada empresa independente especializada em auditoria, consultoria de serviços e análise de impostos (TIRONI, 1990).

No que se refere especificamente aos Estados Unidos e China, Heise (2020) defende que se trata de uma relação comercial cujas características principais são protecionismo e incerteza.

IMPACTOS DO DESABASTECIMENTO NOS ESTADOS UNIDOS 

Com a pandemia da Covid 19 registrou-se forte queda no fornecimento de diferentes tipos de produtos destinados aos vários países. Foi um momento em que os Estados Unidos reduziram pela metade suas importações vindas da China, no intervalo entre janeiro e março de 2020, direcionando parte do volume de suas compras para fornecedores não chineses (HEISE, 2020).

No presente, superados dois anos da pandemia da Covid 19, os norte-americanos ainda se deparam com as prateleiras desabastecidas nos diferentes tipos de comércios, sejam alimentos e itens de supermercados, eletrodomésticos e até brinquedos, entre tantos outros (KAVILANZ, 2022).

É uma escassez que atinge até mesmo as lojas de conveniências, que costumam funcionar como pontos comerciais alternativos e ofertam até os itens alimentares, entre outros comuns aos supermercados. Registram-se casos de lojas situadas em cidades maiores ou de mercados secundários em áreas rurais, todos ainda relativamente desabastecidos em decorrência da pandemia da Covid 19 (KAVILANZ, 2022).

Mesmo assim, é um momento em que o Federal Reserve Board se prepara para reduzir o subsídio concedido à economia norte-americana durante a recessão, que está sendo retirado gradativamente, ao mesmo tempo em que o referido banco demonstra sua enorme preocupação quanto às possibilidades de crescimento da inflação, entre outras circunstâncias que podem comprometer a recuperação financeira do país (CBS NEWS, 2021).

Rocha (2021) refere que em grande medida, tais dificuldades foram potencializadas nos Estados Unidos pelo negacionismo do então presidente Donald Trump relativamente à periculosidade da doença, além da difusão de fake news a respeito dos assuntos relacionados à Covid 19, entre eles, as orientações quanto ao uso da hidroxicloroquina, a falta de incentivo pelas medidas preventivas de higiene e uso de máscaras de proteção facial, assim como a falta de incentivo maciço ao isolamento social e à vacinação.

Essa forma de lidar com a situação levou os Estados Unidos ao topo da lista de países com os mais altos índices de pessoas infectadas e consequentes óbitos. Rocha (2021) reporta que a visão do ex-presidente Trump sobre a doença levou-o a retirar o país da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e do conselho de Direitos Humanos da ONU, e consequente supressão da colaboração nos investimentos fornecidos para pesquisas científicas até então.

Sob o pretexto de questionar a autoridade da Organização Mundial de Saúde (OMS), e acusar a China de fabricar e exportar o novo coronavírus, além de apontar a demora chinesa em alertar àquele órgão sobre a realidade relativa à crise sanitária que despontava, o ex-presidente Trump rebaixou os investimentos costumeiros naquela OMS para 6,91%, entre outras medidas que prejudicaram as relações multilaterais (ROCHA, 2021).

Com relação ao comprometimento da cadeia de suprimentos, Attinasi et al. (2022) defendem que “os gargalos da cadeia de suprimentos decorrem da interação de vários fatores”, e os enumeram: 1. Forte recuperação da demanda global por bens manufaturados, que não foi acompanhada pelo aumento da oferta de bens; 2. Setores amplamente atingidos pela falta de oferta englobando semicondutores em face do crescimento da demanda por produtos e equipamentos eletrônicos, parcialmente ocasionado pelo isolamento social e necessidades do trabalho em home office de grande fatia da população; 3. As interrupções relativas à Logística, como resultado do congestionamento portuário e das atividades de navios porta-contêineres; das medidas restritivas de bloqueio em alguns países asiáticos, que são importantes fornecedores de diferentes insumos intermediários.

Diante dessa realidade, ao assumir a presidência norte-americana, o atual presidente Joe Biden reformulou o engajamento do país nos temas multilaterais; promoveu a imunização de 50% da população local, isto é, das pessoas que aceitaram a vacinação; anunciou o retorno daquele país à OMS, além da elaboração/adoção de um plano para distribuir 55 milhões de vacinas pelo mundo, destinando 75% dessas aos países mais necessitados (ROCHA, 2021).

Sobre o atendimento de fornecedores nacionais, verifica-se que entre os setores que mais sofreram com o atraso na produção estão 36% das empresas de pequeno porte de manufatura, construção civil e diferentes comércios, conforme dados tabulados entre 31 de maio a 6 de junho de 2021, pela empresa norte-americana Census Small Business Pulse (ROCHA, 2021).

Por sua vez, Helper e Soltas (2021) referem que o impacto ocasionado pela interrupção na cadeia de suprimentos ocasionou problemas que persistem em outros segmentos, entre eles os setores de construção civil, automotivo, vestuário e itens de primeira necessidade.

No que se refere ao setor da construção civil, a escassez de madeira de estrutura, painéis de parede e telhados ainda persistem, dificultando o andamento das construções. O preço da madeira sofreu um aumento da ordem de 19% entre maio de 2020 e maio de 2021, apesar de ter caído posteriormente, segundo pesquisa realizada pela National Association of Home builders. Face à volatilidade do setor, as alternativas encontradas pelos construtores foi retardar o início de novas obras (HELPER e SOLTAS, 2021).

Já o setor automotivo enfrenta forte elevação de preços para automóveis novos, usados e alugados, impactando grandemente o reaquecimento deste segmento. Face à pandemia da Covid 19, as montadoras cancelaram seus pedidos usuais para aquisição de semicondutores por terem acreditado na queda da demanda (HELPER e SOLTAS, 2021).

Contudo, suas dificuldades aumentaram muito, por ser um componente cujo fornecimento normal já é muito demorado, aspecto que foi muito piorado no momento em que se deu o fatiamento de sua produção, quando cada parte de suas fases de produção passou a cargo de várias empresas ao redor do mundo (HELPER e SOLTAS, 2021).

Gerdeman (2022) explica que, além da falta de insumos relativa às restrições à fabricação e envio de fornecedores, os setores automotivos e o de eletrônicos foram especialmente atingidos, já que os prazos de entrega subiram para 21 semanas por parte dos fornecedores da Malásia, por exemplo.

Entre os outros itens necessários à produção de veículos automotores, estão o aço, plástico e borracha, os quais estão entre as 30.000 peças necessárias à produção de cada unidade veicular, cabendo considerar ainda a logística necessária ao transporte de todas as peças necessárias advindas de diferentes partes do país (HELPER e SOLTAS, 2021).

Por sua vez, o setor de vestuário foi afetado em face da produção chinesa de manufaturados têxteis, calçados e máquinas ter caído fortemente em março de 2020, comparativamente a março de 2019. Diante desse cenário, os Estados Unidos identificaram oportunidades de importar produtos têxteis fornecidos pela Índia e Bangladesh, assim como calçados e máquinas fornecidas pelo Vietnã (HEISE, 2020).

Com relação aos artigos de primeira necessidade, tem-se que diante do isolamento social, já no início da pandemia da Covid 19 o consumo de papel higiênico de boa qualidade aumentou 40% por parte da população civil, diante do isolamento social e sua permanência em casa. Receosos pela falta do artigo, os norte-americanos “limparam as prateleiras das lojas” (HELPER e SOLTAS, 2021).

Uma vez que se trata de um item cuja demanda costuma ser estável, a armazenagem de grandes quantidades deste produto fica prejudicada, por se tratar de um artigo muito volumoso. Some-se a este fato a questão relativa ao tamanho dos maquinários, do volume de pessoal e dimensão de imóveis adequados para novas instalações fabris e volume de capital pecuniário em tempo recorde, inviáveis em curto espaço de tempo que permitisse driblar os impactos da pandemia. (HELPER e SOLTAS, 2021).

Entre as soluções encontradas pelos fabricantes, estão: produzir rolos maiores do que o tamanho habitual; operar seus maquinários na capacidade máxima possível (92%); manter estoques para duas a três semanas; reativar eventuais maquinários ociosos; reduzir o intervalo de descanso de seus equipamentos; investir em seus processos de distribuição, antecipando eventuais carências regionais (HELPER e SOLTAS, 2021). 

ESCASSEZ DE MÃO DE OBRA 

Segundo o relatório da consultoria Everstream, especializada em Inteligência Artificial, a demanda por trabalhadores deverá crescer significativamente em 2022, face às dificuldades das organizações dos diferentes setores em preencher seus postos de trabalho, em especial para as atividades relacionadas à Logística, que sofre com falta de motoristas para caminhões e vans, entre outras oportunidades (GERDEMAN, 2022).

Mais um, entre os fenômenos ocasionados pela pandemia da Covid 19, cujos resultados impactaram a economia de uma forma abrangente, devido às perdas de pessoal, às interrupções na cadeia de suprimentos, ao aumento do custo de vida e às urgências da retomada dos processos industriais, comerciais e de serviços, a falta de pessoal para preencher os postos em aberto vem permitindo a pressão dos trabalhadores pelo aumento nos salários ofertados (GERDEMAN, 2022).

Mesmo diante da atual queda nos pedidos de seguro-desemprego nos Estados Unidos, que registrou níveis abaixo de 250.000 solicitações em março de 2020, os especialistas avaliam que as empresas se empenham na manutenção de seus quadros de trabalhadores, face às dificuldades atuais por mão de obra (CBS NEWS, 2021).

Pode-se mencionar, por exemplo, a Malásia, que é um dos principais fornecedores de semicondutores do mundo, que reduziu em 60% a produção desses componentes, face à sua necessidade de adotar um terceiro bloqueio nacional, diante dos surtos recorrentes da doença que atingiram os trabalhadores locais, ocasionando a suspensão de suas atividades industriais (GERDEMAN, 2022).

Cabe mencionar ainda a contaminação de caminhoneiros pela variante ômicron, assim como o trabalho de inúmeras pessoas alocadas nas diferentes áreas produtivas, entre eles a embalagem e transporte de carne; o contágio dos trabalhadores de armazéns, portos, varejistas e lojas, todos tiveram seu trabalho e desempenho impactados, fatos relatados por Jon Samson, diretor executivo da American Trucking Associations (McCAUSLAND, 2020).

Em seu depoimento perante o Congresso norte-americano, Samson informou que antes da pandemia a indústria, de uma forma geral, já contava com menos 80.000 motoristas, mas que tal problema foi muito potencializado com a advento da Covid-19, já que, a falta de profissionais para carga e descarga de mercadorias impactou o cumprimento dos prazos de entrega.

Apesar da evolução da situação, os empresários responsáveis por negócios nos portos, armazéns, restaurantes, supermercados e fast food ainda enfrentam instabilidade em seu abastecimento, já que muitos trabalhadores foram acometidos pela nova variante da ômicron, ficando incapacitados provisoriamente para o trabalho normal (McCAUSLAND, 2020).

Por sua vez, empresários da indústria de embalagem de carne preocupam-se com aquele que foi apelidado de “mandato de vacinas” surgido com o Governo Biden, que estimula de todas as formas a adesão à vacinação, ao que muitos trabalhadores são refratários. Caso tal projeto seja aprovado, os empresários temem uma debandada massiva de mão de obra neste setor. Além disso, surgiriam os problemas com a legislação trabalhista, porque este segmento industrial ficaria impedido de contratar novos trabalhadores não vacinados, impactando sua produtividade (McCAUSLAND, 2020). 

O MULTILATERALISMO E A RETOMADA DA ECONOMIA MUNDIAL 

Segundo análise do FMI, a crise sanitária originada pela Covid 19 provocou um recuo de 5,3% no comércio de bens de consumo em outubro de 2020, índice que ficou abaixo do estimado pela OMS, cuja projeção estimava 9,2%. Registra-se que os diferentes países promoveram ações de proteção fiscal e monetária às organizações internas, adotando 133 medidas protecionistas por países componentes do G20, das quais 63% foram para facilitar o comércio, e apenas 37% restritivas (ROCHA, 2021).

Vários são os fatores a serem considerados para uma retomada mais robusta da economia mundial, a despeito dos sinais claros dessa evolução. McCausland (2022) aponta os riscos de novas variantes da ômicron e possíveis picos de casos como fatores impeditivos de uma retomada mais efetiva. Além disso, reporta a ocorrência de padrões climáticos anormais, diante das chuvas e tornados em plena primavera.

No que se refere à variante ômicron da COVID-19, Attinasi et al. (2022) compartilham da visão de McCausland (2022), quanto a um eventual “fechamento de fábricas e portos e como resultado disso lançam mais incertezas, especialmente no curto prazo. Em particular, pode haver contratempos nas cadeias de suprimentos se a China continuar a aderir a uma estratégia estrita de COVID-zero”. Os autores reportam ainda que a guerra na Ucrânia se constitui em mais uma preocupação global para a retomada ideal do abastecimento de suprimentos.

Diante da necessidade das empresas na criação de oportunidades de trabalho mais atraentes para a conquista de novos trabalhadores, avalia-se que a partir do segundo semestre de 2022 a normalização da cadeia de suprimentos ocorra de uma forma mais natural. McCausland (2022) destaca que 4,5 milhões de norte-americanos deixaram seus empregos espontaneamente em novembro de 2021, certos da existência de melhores ofertas e oportunidades.

Já Attinasi et al. (2022) contrariam as previsões de McCausland (2022), sugerindo que os problemas de fornecimento global não serão normalizados antes do final de 2022, em especial na região do euro, que compreende os seguintes países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Chipre, Eslováquia, Eslovênia, Estônia, Finlândia, França, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Malta, Holanda, Portugal, Grécia e Espanha.

Na visão de Gerdeman (2022) e Helper e Soltas (2021) a pandemia já acabou, diante dos sinais de queda dos reflexos na interrupção da cadeia de suprimentos, que se devem, em parte, ao fato de a variante ômicron ser bem menos grave do que as demais.

A lenta retomada dos negócios apresenta registros da elevação nas vendas de imóveis novos a níveis que superam as vendas globais deste segmento nos últimos 14 anos, enquanto as vendas de automóveis superaram o total global de vendas dos últimos 15 anos. Quanto aos itens fabris, os níveis de estoques acumulados chegaram a 45 dias, contra 33 dias no presente momento, resultado do impacto das interrupções na cadeia produtiva (HELPER e SOLTAS, 2021).

Além das dificuldades em manter estoques que atendam à retomada da demanda por bens de consumo, as organizações enfrentam a questão relativa à necessidade na identificação e contratação de mão de obra, cuja oferta de vagas de emprego chegou à marca de 8,3 milhões em abril de 2021 (HELPER e SOLTAS, 2021). 

MEDIDAS PREVENTIVAS SOBRE DESABASTECIMENTO EVENTUAL NOS ESTADOS UNIDOS 

Entre as lições absorvidas com o evento da pandemia da Covid 19, cogita-se a retomada de algumas atividades críticas na cadeia produtiva interna dos Estados Unidos, além da busca e definição por fornecedores alternativos, para evitar eventuais dependências de um único fornecedor para os diferentes produtos (HEISE, 2020).

Gerdeman (2002) reporta que, segundo a consultoria Everstream Analytics, especializada em Inteligência Artificial, aponta em seu Relatório Anual da Cadeia de Suprimentos, há cinco áreas com as quais os diferentes países devem se preocupar, algumas das quais estão relacionadas à pandemia da Covid 19, aqui relatadas.

No que se refere à carga marítima, que é um meio confiável, de baixo custo e de extrema utilidade para trajetos de longa distância, o transporte marítimo é considerado a espinha dorsal do comércio global, e representa preocupação, como demonstrou o evento da pandemia da Covid 19. Pode-se mencionar, por exemplo, que no final de 2021, alguns navios ficaram parados por 30 dias, aguardando para atracar nos portos de Long Beach e Los Angeles (GERDEMAN, 2022).

Sobre aumento nos estoques, surge o dilema nas decisões sobre acumular estoques preventivos, ação que compreende a compra, armazenamento e manuseio dos itens de interesse, sendo uma opção que pode ocasionar altos custos para sua manutenção, ou ainda que os itens guardados venham a estragar ou ficar obsoletos (GERDEMAN, 2022).

Quanto ao fator sustentabilidade, no relatório da Consultoria Everstream, existem preocupações de alguns países como Noruega e Alemanha, por exemplo, relativas às questões ambientais, sociais e de governança, que implicam em riscos legais e reputacionais (GERDEMAN, 2022).

São aspectos que consistem em violações aos direitos humanos relacionadas à cadeia de suprimentos, e às proibições quanto à venda de materiais extraídos, fabricados ou produzidos em determinadas províncias chinesas, como por exemplo a província de Xinjiang, cuja produção, aparentemente, ocorre a partir de trabalho forçado. Ressalta-se que as empresas que operam contrariamente a tais proibições estão impedidas de comercializar seus produtos em solo norte-americano (GERDEMAN, 2022).

Já no que se refere ao aquecimento global, as empresas fornecedoras internacionais, que são produtoras fabris, deverão atentar para as questões relativas às suas emissões locais de carbono tanto de suas empresas, como a fonte original das matérias-primas utilizadas por seus fornecedores.

Deve-se considerar ainda o consumo mundial de água, já que, segundo projeções elaboradas pelas Nações Unidas tem-se que 2/3 da população global sofrerá com a escassez de água até 2025.  Os descuidos gerais quanto à água e sua utilização deverão afetar residências, indústrias e até mesmo as redes logísticas (GERDEMAN, 2022).

Como exemplo, Gerdeman (2022) esclarece que em 2019 os navios maiores, utilizados como porta-contêineres viajaram totalmente carregados pelo Canal do Panamá. Outro aspecto reside nas necessidades de água para a agricultura, sendo que, diante do risco iminente de escassez de água, a produção de alimentos ficará comprometida. 

MEDIDAS PREVENTIVAS CONTRA O DESABASTECIMENTO 

Gerdeman (2022) refere que existem melhorias a serem feitas quanto à elaboração de previsões protetivas da cadeia de suprimentos dos diferentes setores industriais e comerciais. Esclarece que a própria consultoria Everstream Analytics desenvolveu ferramentas de inteligência artificial para detecções precoces que venham a permitir que problemas semelhantes aos ocorridos durante a pandemia da Covid 19 venham a ocorrer em eventuais oportunidades futuras. Esta autora reporta que quaisquer ações preventivas do Gerenciamento da Cadeia Produtiva não fiquem limitados a eventos específicos.

Entre as possíveis ferramentas, está a adoção do sistema blockchain, que permite entre suas várias funcionalidades, a capacidade de monitorar as cadeias de fornecimento, registros e certificações. Rodrigues e Yoshino (2021, p. 167) relatam tratar-se de tecnologia para elaboração de contratos entre as partes interessadas sem o envolvimento de terceiros e sem custos adicionais, cujos dados são rastreáveis e irreversíveis, permitindo “otimização nos fluxos nas cadeias de suprimentos”. O blockchain é considerado por especialistas como uma “tecnologia que resolve problemas como segurança, supervisão, transparência, privacidade e confiança de todos os envolvidos”.

Por sua vez, decisões recentes do Governo Biden-Harris, como por exemplo a criação de uma Força-Tarefa de Interrupções da Cadeia de Suprimentos (HELPER e SOLTAS, 2021).

No que se refere às questões de curto prazo, a função da força-tarefa será acompanhar e resolver os aspectos relacionados aos suprimentos de uma forma geral, mas com especial atenção para os segmentos da construção civil e componentes eletrônicos, como os semicondutores, por exemplo. Já no longo prazo, foram propostas ações de fortalecimento da base industrial, ensejando reduzir soluções e respostas a eventuais crises no abastecimento local (HELPER e SOLTAS, 2021).

Com relação às despesas relativas aos riscos inerentes às cadeias de suprimentos, a proposta consiste na realização de investimentos em pesquisas, em produção, em reciclagem para trabalhadores, assim como nas comunidades locais, promovendo a reconstrução da capacidade fabril sustentável no país. Os investimentos sugeridos foram de, no mínimo, US $50 bilhões, a serem apreciados e aprovados pelo congresso norte-americano (HELPER e SOLTAS, 2021).

Na perspectiva internacional, a proposta da Força-Tarefa instituída sugere o fortalecimento de parcerias voltadas aos cuidados inerentes à cadeia de suprimentos, conforme as estratégias geopolíticas mais convenientes (HELPER e SOLTAS, 2021). 

CONCLUSÃO

A literatura científica selecionada para o desenvolvimento do presente estudo, aliada às recentes publicações relativas à pandemia da Covid 19, às situações sequenciais e medidas governamentais existentes nos diferentes recursos midiáticos demonstram a gravidade das situações que afetaram toda a sociedade nos últimos dois anos.

As mudanças que atingiram a cadeia de suprimentos local e mundial comprometeram a forma como as pessoas viviam até então, compreendendo desde a falta de componentes diversos para a indústria, chegando até as prateleiras de supermercados e demais tipos de comércios, onde ainda faltam até mesmo produtos alimentares para os consumidores finais.

Tais deficiências vão sendo superadas lenta e gradativamente depois das medidas sanitárias implementadas pelos órgãos de saúde mundiais, em especial a vacinação maciça, permitindo a volta de certa normalidade social.

Contudo, o retorno aos patamares ideais ainda requer esforços compensados de governantes e empresariado em todos os aspectos mencionados, assim como no que se refere à identificação e captação de mão de obra em quantidade e qualidade que atenda aos diferentes setores da cadeia de suprimentos.

Em resposta à questão proposta para investigação deste estudo, que foi: “como promover a nível global a retomada da indústria, comércio e serviços no pós-pandemia?”, são sugeridas três ações consideradas fundamentais para o retorno à normalidade, que seguem descritas.

Uma primeira solução reside na criação de uma cadeia de suprimentos resiliente, isto é, que confira boas estratégias de Supply Chain, visando atender à demanda nacional/global de modo a permitir uma efetiva reestruturação do setor, e evitar eventuais novos desabastecimentos em crises futuras.

Como segunda solução acredita-se que será de grande valia a colaboração tecnológica, com o objetivo da criação de ferramentas/plataformas de alta performance, capazes de administrar os processos de Supply Chain, como por exemplo a utilização do sistema blockchain.

Por fim, e não menos relevante, sugere-se a promoção da capacitação de indivíduos e equipes, que sejam estimulados à conquista dos objetivos definidos pelas organizações.

REFERÊNCIAS

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[1] Graduado em Administração de Empresas e Pós Graduado em Controladoria.

Enviado: Agosto, 2022.

Aprovado: Agosto, 2022.

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Jessiel de Moura Ribeiro

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