ARTIGO ORIGINAL
MARTINS, Andressa Moura de Oliveira [1], BATISTA, Jessica Cristina Paschoal [2], GONÇALVES, Catia Martins [3]
MARTINS, Andressa Moura de Oliveira. BATISTA, Jessica Cristina Paschoal. GONÇALVES, Catia Martins. Responsabilidade dos agentes públicos: Atos de improbidade administrativa em relação a gastos públicos na saúde. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 06, Ed. 03, Vol. 02, pp. 146-166. Março de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/administracao/agentes-publicos, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/administracao/agentes-publicos
RESUMO
A problemática dessa pesquisa envolve o conhecimento de atos de improbidade administrativa em relação a gastos públicos de saúde e o reconhecimento da responsabilização dos agentes públicos envolvidos. Esse artigo possui o objetivo de identificar as sanções de responsabilidade dos agentes públicos em casos de atos de improbidade administrativa quanto aos gastos públicos na área da saúde. A metodologia utilizada foi o método de pesquisa qualitativo, em virtude das variáveis de pesquisa não mensuráveis, com a coleta de dados realizada mediante a pesquisa bibliográfica em bases de dados científicas nacionais e com análise da revisão de literatura integrativa. Os resultados alcançados da pesquisa demonstram que, na área de saúde, não existem muitos estudos que abordem a responsabilização aos agentes públicos por atos de improbidade administrativa quanto a gastos públicos na saúde, sendo de extrema relevância assim, a demonstração, mediante a pesquisa bibliográfica quanto as sanções que podem ser aplicadas, bem como conceitos básicos como improbidade administrativa, quem são considerados agentes públicos e as sanções aplicadas em casos de improbidade.
Palavras-chave: Agentes públicos, gastos públicos, improbidade administrativa, saúde.
1. INTRODUÇÃO
A Administração Pública é o conjunto de órgãos, funções e agentes públicos que atuam para o funcionamento de todo o Estado, em termos federal, estadual e municipal. A estrutura da administração é formada pelos órgãos públicos, enquanto que, as funções são os deveres e responsabilidades que são atribuídos a pessoas físicas que prestam serviço para o Estado, sendo denominados como agentes públicos, que podem ser políticos, honoríficos, administrativos, credenciados e delegados.
O principal e primordial objetivo da Administração Pública é a satisfação do interesse público, em atendimento às necessidades da sociedade, em âmbito municipal, estadual ou federal. Essas necessidades abrangem diversas áreas, como segurança, saúde, cultura, assistência social, lazer, educação, entre outros.
A Administração Pública também é denominada como máquina pública, no encargo de entidades e gestores públicos, que possuem o dever de administrar negócios e atividades públicos de forma correta, consciente e responsável. Estabelece-se então, os deveres e obrigações dessas entidades e agentes.
Quando os gestores públicos assumem a responsabilidade da administração dos serviços públicos, a sua atuação deve ser responsável, honesta, digna, íntegra, honrada, entre diversos outros atributos que devem ser atrelados as ações dos agentes. Espera-se da administração atitudes probas, com prerrogativas eficazes para o desenvolvimento de uma atuação eficiente.
A literatura possui diversas contribuições de autores que abordem os atos dos agentes públicos e a necessidade de estarem de acordo com os princípios da Administração Pública, conforme o que dispõe a Constituição Federal de 1988. Contudo, notou-se em pesquisa da viabilidade do tema, a ausência de pesquisas que abordassem o aspecto teórico acerca da responsabilização dos agentes públicos em face de atos de improbidade administrativa quanto a gastos públicos na saúde.
Sendo assim, a problemática de pesquisa é: Qual é a responsabilidade dos agentes públicos sobre os casos de atos de improbidade administrativa na gestão de gastos na saúde? Com isso, o objetivo geral de pesquisa é apresentar a responsabilização aplicada aos agentes públicos em casos de ato de improbidade administrativa na área de recursos na saúde. Os objetivos específicos são: delinear o conceito de agentes públicos e Administração Pública; conhecer o que é improbidade administrativa e ressaltar a responsabilidade dos agentes públicos no que diz respeito aos casos de atos de improbidade administrativa quanto a gastos públicos na área da saúde.
Os procedimentos para a construção da pesquisa foram sob a égide do método de pesquisa qualitativa, pois, as variáveis de pesquisa que compõem esse estudo são de ordem não mensurável. Para a coleta de dados, foi realizada uma busca nas principais bases de dados científicas, com a triagem dos estudos conforme a leitura dos resumos e encaixe na temática deste estudo. A análise foi feita conforme revisão de literatura integrativa.
Este artigo está dividido em cinco seções. A primeira é a introdução, com um apanhado acerca de todo o trabalho. A segunda seção é o estado de arte, trazendo alguns conceitos relativos a temática. A terceira é a descrição dos métodos de pesquisa utilizados para a construção deste artigo. A quarta seção é a apresentação e discussão dos resultados obtidos mediante a pesquisa bibliográfica. Por fim, a quinta seção é relativa as considerações finais, com o fechamento da pesquisa.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
Essa seção possui o objetivo de trazer o entendimento doutrinário acerca do que são os agentes públicos, improbidade administrativa e a Administração Pública. Possui o objetivo de trazer esses conceitos para que seja possível entender como ocorre a responsabilização dos agentes públicos em casos de atos de improbidade administrativa relativa a gastos públicos na área da saúde.
2.1 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2017) traz que a definição primária do termo administração pode variar de acordo com o entendimento de muitos, para uns vem da preposição ad – significa mais, ou do verbo are – que significa servir, executar – e também traz que para muitos vem de ad manus trahere, que apresenta a ideia de direção ou gestão. É presente nas duas hipóteses de interpretação que existe o sentido de subordinação e hierarquia. A palavra administrar “significa não só prestar serviço, executá-lo, como, outrossim, dirigir, governar, exercer a vontade com o objetivo de obter um resultado útil; e que até, em sentido vulgar, administrar quer dizer traçar programa de ação e executá-lo” (DI PIETRO, 2017).
Por conseguinte e de forma sintetizada, o vocábulo abarca tanto o significado de atividade superior de planejamento, direção, comando, como também a atividade subordinada de executar. No âmbito do Direito, é visto que o vocábulo administração possui um sentido amplo para que seja abrangida a legislação e a execução das atividades estatais. Alguns autores apresentam a função administração, propriamente dita e, a função do governo para a definição e entendimento do que concerne à Administração Pública. Tanto no âmbito do direito privado quanto do direito público, os atos da administração possuem uma certa limitação quanto a guarda, conservação e percepção dos benefícios dos bens estatais administrados – não sendo incluso os bens alienados, em razão da vontade externa do administrador quanto a imposição de orientação a seguir quanto ao bem (DI PIETRO, 2017).
Caetano (2016), por sua vez, compreende a Administração Pública como um conjunto de decisões e operações, através dos quais o Estado e as outras entidades públicas buscam, sob as orientações gerais estabelecidas pela política e mediante ao estímulo, a coordenação e a orientação das atividades privadas, satisfazer as necessidades coletivas dos indivíduos regularmente, no que diz respeito a segurança e o bem-estar dos mesmos, de modo a empregar racionalmente os recursos adequados para se obter esse efeito.
O conceito de Administração Pública, segundo o entendimento de José Afonso da Silva é:
O conjunto de meios institucionais, financeiros e humanos preordenados à execução das decisões políticas. Essa é uma noção simples de Administração Pública que destaca, em primeiro lugar, que é subordinada ao Poder político; em segundo lugar, que é meio e, portanto, algo de que serve para atingir fins definidos e, em terceiro lugar, denota os seus dois aspectos: um conjunto de órgãos a serviço do Poder político e as operações, as atividades administrativas (SILVA, 2017, p. 655).
Sob uma perspectiva global, Hely Lopes Meirelles (2016) conceitua Administração como todo aparelhamento do Estado que preordena a realização de serviços, objetivando satisfazer as necessidades coletivas. Sua atuação não envolve a prática de atos governamentais, mas, tão somente, ela atua no campo de execução, tendo maior ou menor autonomia funcional, conforme a aptidão do órgão e seus agentes.
Meirelles (2016) define o ato de administrar, em sentido lato, como gerenciamento de interesses, junto a preservação moral e o respeito aos fins dos bens atribuídos à proteção e conservação aos agentes públicos, sendo oportuno destacar que se esses bens e interesses são individuais, efetiva-se, desta forma, a Administração Pública. Nesse contexto, a Administração Pública é compreendida pelo gerenciamento dos bens e dos interesses da sociedade no que diz respeito ao âmbito federal, estadual ou municipal, de acordo com os princípios do Direito e da moral, objetivando a manutenção do bem e interesse comum. No âmbito do Direito Administrativo, a Administração Pública tem como propósito abranger tanto as pessoas quanto os órgãos governamentais, assim também como a atividade administrativa em si mesma, conforme o sentido mais objetivo da Administração Pública (MEIRELLES, 2016).
Viegas complementa o pensamento de Hely Lopes de Meirelles com o preconizado:
Assim sendo, pode-se falar de administração pública aludindo-se aos instrumentos de governo como à gestão mesma dos interesses da coletividade. Ademais adverte o autor, em nota de rodapé, que sempre que a expressão Administração Pública for escrita com maiúsculas está se referindo a pessoas e órgãos administrativos, e a expressão com letras minúsculas – administração pública – esta se referindo à atividade administrativa em si mesma (VIEGAS, 2011).
Di Pietro apresenta que existem dois sentido para a expressão Administração Pública, sendo em sentido subjetivo, formal ou orgânico e objetivo, material ou funcional. A autora aduz que:
a) em sentido subjetivo, formal ou orgânico, ela designa os entes que exercem a atividade administrativa; compreende pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos incumbidos de exercer uma das funções em que se triparte a atividade estatal: a função administrativa; b) em sentido objetivo, material ou funcional, ela designa a natureza da atividade exercida pelos referidos entes; nesse sentido, a administração pública é a própria função administrativa que incumbe, predominantemente ao Poder Executivo (DI PIETRO, 2017, p. 54).
Conforme pode se depreender do pensamento supracitado, a autora apresenta que em sentido subjetivo, formal ou orgânico, o cerne da Administração Pública se concentra quanto aos entes que exercem a atividade administrativa estatal, como as pessoas jurídicas, os órgãos, os agentes públicos para que assim sejam exercidas as funções administrativas ao qual cabem como incumbência ao Estado. Por conseguinte, ainda existe o sentido objetivo, formal ou funcional, que exibe o escopo concernente a natureza da atividade a ser exercida pelos agentes públicos e quem estiver inserido na Administração Pública, tão logo trazendo o conceito a função administrativa sendo, de forma essencial, a Administração Pública em si.
Ainda em consonância com o entendimento de Di Pietro, com a premissa de que administrar compreende planejar e executar, tem-se os seguintes sentidos quanto a Administração Pública, sendo:
a) em sentido amplo, a Administração Pública, subjetivamente considerada, compreende tanto os órgãos governamentais, supremos, constitucionais (Governo), aos quais incumbe traçar os planos de ação, dirigir, comandar, como também os órgãos administrativos, subordinados, dependentes (Administração Pública, em sentido estrito), aos quais incumbe executar os planos governamentais; ainda em sentido amplo, porém objetivamente considerada, a administração pública compreende a função política, que traça as diretrizes governamentais e a função administrativa, que as executa; b) em sentido estrito, a Administração Pública compreende, sob o aspecto subjetivo, apenas os órgãos administrativos e, sob o aspecto objetivo, apenas a função administrativa, excluídos, no primeiro caso, os órgãos governamentais e, no segundo, a função política (DI PIETRO, 2017, p. 56).
Segundo Di Pietro (2017), a Administração Pública pode apresentar um sentido mais amplo, que compreende um sentido de cumprimento da função política em exercício dos atos administrativos executados pelos entes governamentais que fazem parte da estrutura da Administração Pública. A autora também traz à tona o sentido estrito que possui concernência a compreensão da Administração Pública somente quanto aos órgãos administrativos e, de forma mais objetiva, o aspecto da função administrativa. Tendo em vista todo o conhecimento quanto a definição da Administração Pública, é necessária a apresentação da estrutura da Administração Pública e suas particularidades sintetizadas.
A Administração Pública organiza-se de forma que a estrutura é concernente as pessoas, entidades e órgãos que irão desempenhar as funções administrativas, como também a definição da estrutura elementar administrativa do Estado. Essa organização é instituída por intermédio de Leis e, excepcionalmente, por decretos e outras normas (MARINELA, 2015).
A Administração Pública é composta pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Contudo, essa composição não apresenta a plenitude quanto a estrutura da Administração Pública, já que esses são os entes federativos da República Federativa do Brasil, sendo que para esses entes desempenharem suas funções, assim entendido como atribuições e serviços públicos que devem prestar, criam órgãos para satisfazer as necessidades da sociedade (HACK, 2018).
Por conseguinte, é possível constatar a descentralização das funções da Administração Pública. Essa divisão dá origem à Administração Pública Direta e Indireta, conforme disposto no artigo 4º, do Decreto-Lei nº 200/67, que diz:
Art. 4° A Administração Federal compreende:
I – A Administração Direta, que se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios.
II – A Administração Indireta, que compreende as seguintes categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria:
a) Autarquias;
b) Empresas Públicas;
c) Sociedades de Economia Mista.
d) Fundações públicas (BRASIL, 1967).
O referido Decreto é o responsável pela divisão da Administração Pública em Direta e Indireta, estabelecendo a estrutura da Administração Pública, conforme o artigo supracitado, que a Administração Direta compreende os serviços prestados pelos Ministérios e órgãos que fazem parte do que é denominado como ente político. Já ao que concerne à Administração Indireta, as entidades, denominadas como entes – ou entidades – administrativas são as autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas, entes que são dotados de personalidade jurídica própria, sendo esta uma diferença quanto aos entes políticos, que em sua estrutura possuem órgãos vinculados a pessoa jurídica dos entes federativos. Vale ressaltar que essa organização de estrutura é cabível para o âmbito federal, estadual, municipal e distrital conforme a organização do país.
A Lei Maior no artigo 37, caput, expressa os princípios constitucionais que direcionam a Administração Pública, compreendo que os princípios tidos como princípios constitucionais do Direito Administrativo, tem por serventia o direcionamento dos entes federativos, sendo o disposto no caput do artigo que “obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência” (BRASIL, 1988).
O princípio da legalidade, conforme dito por Celso de Mello, pode ser entendido como:
Assim, o princípio da legalidade é o da completa submissão da Administração às leis. Este deve tão-somente obedecê-las, cumpri-las, pô-las em prática. Daí que a atividade de todos os seus agentes, desde o que lhe ocupa a cúspide, isto é, o Presidente da República, até o mais modesto dos servidores, só pode ser a de dóceis, reverentes obsequiosos cumpridores das disposições gerais fixadas pelo Poder Legislativo, pois esta é a posição que lhes compete no direito Brasileiro (MELLO, 2016, p. 48).
A legalidade, conforme pode ser exibido no exame acima, é um dos requisitos necessário para o bom e correto funcionamento da Administração Público, representando um dos princípios que gera segurança para os cidadãos, limitando assim o impacto dos atos dos agentes da Administração Pública.
O princípio da moralidade pode possuir referência de pensamento a necessidade de uma boa administração quanto aos recursos e particularidades estatais, sendo possuidor de relação direta com as decisões a serem tomadas pelos agentes públicos. É possível entender que “É certo que a moralidade do ato administrativo juntamente a sua legalidade e finalidade, além de sua adequação aos demais princípios constituem pressupostos de validade sem os quais toda atividade pública será ilegítima” (MEIRELLES, 2016).
Quanto ao princípio da impessoalidade Garcia apresenta o entendimento:
Um princípio ainda um pouco conturbado na doutrina, mas, a maioria, dos doutrinadores, relaciona este princípio com a finalidade, ou seja, impõe ao administrador público que só pratique os atos em seu fim legal. Se traduz a ideia de que a Administração tem que tratar a todos os administrados sem discriminações, benéficas ou detrimentosas. Para a garantia deste princípio, o texto constitucional completa que para a entrada em cargo público é necessário a aprovação em concurso público (GARCIA, 2012).
Ao que concerne o princípio da publicidade, Di Pietro apresenta a concernência referente a:
O princípio da publicidade, que vem agora inserido no artigo 37 da Constituição, exige a ampla divulgação dos atos praticados pela Administração Pública, ressalvadas as hipóteses de sigilo previstas em lei. O inciso XIII estabelece que todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado (DI PIETRO, 2017, p. 68).
O referido princípio tem em seu escopo a necessidade de que os atos sejam devidamente publicados para o conhecimento a quem interessar, sendo o sigilo reservado a casos de extrema segurança nacional. Abrange a atuação estatal como um todo, como a divulgação oficial de seus atos, mas também quanto ao propicio do conhecimento da conduta interna dos agentes (MEIRELLES, 2016).
Este princípio versa sobre o atendimento aos anseios na sociedade, seja alcançado de modo legal atingir resultados positivos e satisfatórios, como o próprio nome já faz referência, ser eficiente. Meirelles complementa:
O Princípio da eficiência exige que a atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em se desempenhar apenas com uma legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento as necessidades da comunidade e de seus membros (MEIRELLES, 2016, p. 90).
Os cinco princípios supracitados são princípios expressos no escopo do artigo 37 da Constituição Federal de 1988, contudo ainda existem alguns princípios trazidos por normas infraconstitucionais que podem e são utilizados para norteio das ações dos agentes públicos, tais como o princípio da supremacia do interesse público, entre tantos outros.
2.2 AGENTES PÚBLICOS
Os órgãos de Administração Pública possuem três elementos importantes, a competência ou atribuição, que consiste na tarefa a ser cumprida; a repartição que representa o conjunto de meios, materiais voltados ao cumprimento da tarefa; e o agente, que consiste no indivíduo que atua no órgão, sendo este o objeto presente na elucidação do presente capítulo (MOTTA; DOUGLAS, 2012).
Como assevera Figueiredo (2011), o conceito de agente público é bem mais amplo que o de funcionário público, pois nele estão incluídos, além dos funcionários públicos, os agentes políticos e os particulares que atuam em colaboração com a Administração Pública, inclusive os contratados temporariamente.
A respeito do tema, salienta Garcia (2014), que o Estado desempenha inúmeras atividades com o objetivo de alcançar o seu fim, fazendo-o no exercício dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Essas atividades correspondem às funções estatais: a legislação, a administração e a jurisdição. Porém, essas funções são exercidas por órgãos e entidades que, por sua vez, são integradas por pessoas físicas, denominadas de agentes públicos.
Observa-se na doutrina que, agente público é um gênero que comporta várias espécies, dentre as espécies adotadas pela doutrina, como se percebe da lição de Di Pietro (2017), são espécies de agentes públicos: os agentes políticos, os servidores públicos, os militares e os particulares em colaboração com o poder público.
Meirelles (2016) afirma que os cargos “são apenas os lugares criados no órgão para serem providos por agentes que exercerão suas funções na forma legal”, e arremata com precisão ao afirmar que “órgão, função e cargo são criações abstratas da lei; agente é a pessoa humana, real, que infunde vida, vontade e ação a essas abstrações legais”.
A Lei de Improbidade Administrativa – Lei nº 8.429/02, tem um conceito abrangente de agente público e define como autores dos atos de improbidade o agente público e terceiros, a saber:
Art. 2º Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.
Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta (BRASIL, 2002).
Verifica-se que existem várias espécies que compõem o gênero dos agentes públicos: os agentes políticos, os agentes honoríficos, os agentes delegados e os agentes administrativos que se dividem em subespécies, no qual se enquadram os servidores públicos, os empregados públicos e os temporários.
Os agentes políticos ocupam cargos eletivos ou vitalícios, e integram os três poderes. Podem ser também considerados agentes políticos, os membros do do Tribunal de Contas, do Ministério Público e os Magistrados, estes ocupando cargos vitalícios. São agentes políticos porque têm a possibilidade jurídica de ingressar na esfera jurídica de outros entes, impondo-lhes deveres ou criando-lhes direitos (OLIVEIRA, 2018).
Agentes honoríficos são cidadãos convocados, designados ou nomeados para a prestação transitória e, normalmente, sem remuneração, de serviços públicos relevantes, sem qualquer vínculo empregatício ou estatutário e geralmente sem remuneração. Os agentes honoríficos não são servidores públicos, mas exercem momentaneamente uma função pública, sujeitando-se à hierarquia e à disciplina do órgão a que estão servindo (MEIRELLES, 2016).
Ainda afirma Meirelles, que:
Os agentes públicos não são servidores públicos, mas momentaneamente exercem um função pública e, enquanto a desempenham, sujeitam-se a hierarquia e disciplina do órgão a que estão servindo, podendo perceber um pro labore e contar o período de trabalho como de serviço público. […] Tal serviço não gera vínculo empregatício, nem obrigação de natureza trabalhista, previdênciária ou afim entre prestador e tomador. […] Somente para fins penais é que esses agentes são equiparados a funcionários públicos quanto aos crimes relacionados com o exercício da função, nos expressos termos do art. 327 do CP (MEIRELLES, 2016, p. 82).
Na lição de Meirelles (2016), agentes delegados são particulares, pessoas físicas ou jurídicas, e que recebem a incumbência da execução de determinadas atividades, “obras ou serviços públicos e o realizam em seu próprio nome, por sua conta e risco, mas segundo as normas do Estado e sob permanente fiscalização do delegante”. São exemplos de agentes delegados os concessionários e permissionários de obras e serviços públicos, os serventuários de ofícios ou cartórios não estatizados, os leiloeiros, os tradutores e intérpretes públicos, bem como as demais pessoas que recebem delegação para a prática de alguma atividade estatal ou serviço de interesse público.
Outra espécie que vale a menção consiste nos agentes administrativos. São todos aqueles que se vinculam ao Estado por relações profissionais, sujeitos a hierarquia funcional e ao regime jurídico determinado pela entidade estatal a que servem. Não possuem poder político, desempenhando suas funções no plano administrativo, com maior ou menor autonomia, mas sempre sujeitos ao controle hierárquico.
São modalidades de agentes administrativos admitidos no artigo 37 da CRFB/88: servidores públicos concursados (II); servidores públicos que exercem cargos ou empregos públicos em comissão (V); e servidores que foram contratados temporariamente para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, IX).
Di Pietro (2017) afirma que os servidores públicos que se submetem a regime estatutário, quando nomeados, ingressam numa situação jurídica que é estabelecida previamente, sobre a qual são submetidos através do ato da posse; não havendo, portanto, qualquer possibilidade de modificação dessas normas vigentes, ainda que a Administração concorde com tal ato, uma vez que essas normas são de ordem pública cogentes, não derrogáveis pelas partes.
Para Meirelles (2016) empregados públicos “são todos os titulares de emprego público (não de cargo público) da Administração Direta e Indireta, sujeitos ao regime jurídico da CLT, daí serem chamados também de celetistas”. Pelo fato de não ocuparem cargos públicos, não podem adquirir a estabilidade prevista na CRFB/88 e portanto são enquadrados no regime geral da previdência social.
Meirelles (2016) refere-se aos temporários como contratados por tempo determinado, e os define como ” servidores públicos que estão submetidos ao regime jurídico administrativo especial da lei prevista no art. 37, IX, da Carta Magna, bem como ao regime geral da previdência social”. Entende o STJ que as controvérsias relacionadas a contratação temporária é da competência da Justiça do Trabalho.
2.2.1 DEVERES DOS AGENTES PÚBLICOS
O agente público uma vez investido no cargo, emprego ou função pública, tem como obrigação prestar atendimento a uma demanda pública, obedecendo as normas constitucionais pertinentes à Administração Pública e também as leis infraconstitucionais e os estatutos. Para Meirelles (2016, p. 104) “Os poderes e deveres do administrador público são os expressos em lei, os impostos pela moral administrativa e os exigidos pelo interesse da coletividade”. São impostos também aos agentes públicos deveres funcionais, que tem como objetivo assegurar a conformidade das ações administrativas e o interesse público.
A Lei nº 8.112/1990, em seu artigo 116 traz os deveres dos servidores públicos federais, e que muitos estados e municípios já incluíram em seus estatutos:
Art. 116. São deveres do servidor:
I – exercer com zelo e dedicação as atribuições do cargo;
II – ser leal às instituições a que servir;
III – observar as normas legais e regulamentares;
IV – cumprir as ordens superiores, exceto quando manifestamente ilegais;
V – atender com presteza: a) ao público em geral, prestando as informações requeridas, ressalvadas as protegidas por sigilo; b) à expedição de certidões requeridas para defesa de direito ou esclarecimento de situações de interesse pessoal; c) às requisições para a defesa da Fazenda Pública.
VI – levar ao conhecimento da autoridade superior as irregularidades de que tiver ciência em razão do cargo;
VII – zelar pela economia do material e a conservação do patrimônio público;
VIII – guardar sigilo sobre assunto da repartição;
IX – manter conduta compatível com a moralidade administrativa;
X – ser assíduo e pontual ao serviço;
XI – tratar com urbanidade as pessoas;
XII – representar contra ilegalidade, omissão ou abuso de poder (BRASIL, 1990).
Segundo o art. 11, caput, da Lei Federal n. 8.429/92, constitui ato ímprobo aquele “que atenta contra os princípios da Administração Pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições” (BRASIL, 1992). Ao agente público cabe o dever de obediência que lhe impõe o acatamento das ordens legais de seus superiores e sua fiel execução. Dever este, que advém da hierarquia funcional e fundamenta-se no princípio disciplinar que informa a Administração Pública (MEIRELLES, 2016).
Araújo (1994) considera que o dever de obediência e o dever de cumprimento das ordens superiores encerram objetivos concretos, tais como o respeito à hierarquia e o resguardo da moralidade administrativa. O agente público tem o dever de obediência e está obrigado ao cumprimento das ordens emanadas de seus superiores hierárquicos, no entanto “não está o servidor obrigado a cumprir mecanicamente toda e qualquer ordem superior, mas, unicamente, as ordens legais” (MEIRELLES, 2016).
Já ao que concerne o dever de ética, este advém do princípio da moralidade administrativa e estabelece ao servidor público o dever de em nenhum momento desprezar o elemento ético de sua conduta. Segundo o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil Federal (Decreto 1.171/94), “a dignidade, o decoro, o zelo, a eficácia e a consciência dos princípios morais são primados maiores que devem nortear o servidor público” (MEIRELLES, 2016).
O dever de eficiência, Preceitua Meirelles (2016) é o que impõe ao agente público o dever de realizar suas funções com presteza, perfeição e rendimento funcional. É o mais moderno princípio da função administrativa, que além da legalidade, exige resultados positivos na execução do serviço público e um atendimento satisfatório das necessidades da comunidade e de seus membros.
Afirma Dallari (1994) que: “O Poder Público somente cuida daquilo que é essencial e fundamental para a coletividade, e que, portanto, deve ser bom, produtivo, eficaz, eficiente”, constituindo a reclamação pela eficiência da Administração Pública um direito subjetivo do administrado.
Para que a Administração Pública seja eficiente, deve aproveitar o máximo de tudo aquilo que a coletividade possui, em todos os níveis, e durante toda a realização de suas atividades. Somente será juridicamente eficiente a atuação estatal quando seu resultado quantitativo e qualitativo for satisfatório, levando-se em conta o universo possível de atendimento das necessidades existentes e os meios disponíveis (CARDOZO, 1999).
2.3 IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
A improbidade administrativa instituída no ordenamento jurídico por intermédio da Lei nº 8.429/92, conhecida como Lei da Improbidade Administrativa (ou pela denominação Lei do Colarinho Branco) traz um marco para a conduta do Estado, como figura democrática de Direito perante a sociedade no que diz respeito as suas atitudes para as prestações estatais. Função do Estado, mediante ações de seus agentes públicos, é velar pelo bom funcionamento da Administração Pública, seja na forma direta ou indireta, pois desconsiderando a personalidade física, o agente público estaria representando o Estado, no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
Segundo Bonavides (2014), no que diz respeito ao conceito positivado no ordenamento jurídico, um ato ímprobo, ou seja, a improbidade administrativa constitui todo e qualquer ato de agente público, sem distinção, sendo servidor público ou não, que atente contra a administração direta, pertencente aos poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, objetivando enriquecimento ilícito, dano aos bens públicos e/ou violação ao que prediz os princípios da Administração Pública.
Na Lei Maior, a improbidade administrativa aparece positivada no artigo 15, V e no artigo 37, §4º versam sobre o que, constitucionalmente falando, seria a expressão improbidade administrativa. Está disposto no artigo 37, §4º:
§ 4º – Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível (BRASIL, 1988).
Ao que se refere a presença da improbidade administrativa em âmbito infraconstitucional, tem o destaque da Lei nº 3.164 de 1957, conhecida como Lei Pitombo-Godói Ilha. Segundo Garcia e Alves (2013), a citada lei possuía, como ponto positivo, atribuição de legitimidade para ajuizamento de medidas judiciais cabíveis contra funcionário público dotado de enriquecimento ilícito, ao Ministério Público e ao povo. A Lei nº 3.502 de 1958, de acordo Garcia e Alves (2013), foi sancionada um ano após a publicação da Lei Pitombo-Godói Ilha. Conhecida como Lei Bilac Pinto, regulava a devolução e o perdimento de bens públicos em face de enriquecimento ilícito por parte de agentes públicos por abuso ou influência em razão de cargo ou função. Após inúmeras pautas parlamentares fora promulgada a Lei nº 8.429 de 1992, possuidora de real eficácia no combate à corrupção, tendo revogado as Leis anteriores de nºs 3.164/1957 e 3.502/1985.
3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A metodologia de pesquisa, conforme disposto por Reis (2010), consiste em um conjunto de etapas e processos a serem cumpridos, ordenadamente, na investigação, representa o passo a passo realizado da geração da pergunta a ser respondida até a obtenção da resposta e quais meios serão utilizados para tanto.
Para Lakatos e Marconi (2007), a indução representa um processo mental, por meio da partilha de dados particulares, com constatação devida, inferindo assim uma verdade geral ou universal, não contida nas partes examinadas. Com isso, o objetivo de argumentos do método indutivo é proceder a conclusões cujo conteúdo é muito mais amplo do que as premissas baseadas. Prodanov e Freitas (2013) aduzem que no raciocínio indutivo a generalização dos conceitos abordados deriva de observações de casos advindos da realidade concreta. As constatações particulares que resultam na elaboração das generalizações.
3.1 CLASSIFICAÇÃO DA PESQUISA
A classificação dessa pesquisa quanto a sua natureza é uma pesquisa básica. Isso porque, a pesquisa é de ordem qualitativa e não mensurável, sendo aplicada para a contribuição do conhecimento acadêmico-científico. Quanto ao objetivo, é exploratória, pois, conforme o entendimento de Gil (2010) a pesquisa exploratória tem o objetivo de proporcionar maior familiaridade com o problema da mesma, com objetivo de tornar mais explícito ou a construir hipóteses. A grande maioria dessas pesquisas envolve o levantamento bibliográfico, bem como análise de exemplos que estimulem a compreensão.
Em relação a abordagem do problema, a pesquisa é qualitativa. De acordo com Gerhardt e Silveira (2009, p. 33), a pesquisa qualitativa tem preocupação com aspectos da realidade que não podem ser quantificados, com foco na compreensão e explicação da dinâmica das relações sociais. Segundo os autores, essa modalidade tem como escopo o universo de significados, motivos, aspirações, valores, entre outros, o que compreende um aspecto não tangível da pesquisa. Essa modalidade de pesquisa se caracteriza pela objetivação, a descrição, a compreensão e a elucidação de um fenômeno. Ademais, ela objetiva identificar a precisão das relações entre o global e o local referente ao acontecimento do fenômeno e observar as diferenças do mundo social e o mundo natural, entre outros métodos.
3.2 PROCEDIMENTOS PARA COLETA DE DADOS
A estratégia adotada para no presente artigo consistiu pela utilização de pesquisa bibliográfica. Fonseca (2002) aduz que, a pesquisa bibliográfica é realizada por meio de levantamento de referências teóricas que foram publicadas em meios escritor e eletrônicos, tais como: livros, artigos científicos, entre outros. Todo trabalho científico é iniciado com a pesquisa bibliográfica, pois, busca-se o embasamento em teorias que abordem informações e conhecimentos prévios a respeito do problema estudado.
Sendo assim, a coleta de dados foi realizada nas principais bases de dados nacionais, com os seguintes descritores: improbidade administrativa; agentes públicos; saúde; gastos públicos. Os descritores resultaram em mais de 150 estudos, aos quais foram filtrados com base nas suas palavras-chave e resumos, para serem inclusos apenas os estudos e livros que fossem pertinentes ao objetivo aqui traçado.
4. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
A Lei nº 8429/92 foi sancionada em junho de 1992, com a finalidade de criação pela solicitação da sociedade contra atos gravosos que permeavam, e ainda permeiam, o serviço público, pois, somente o Decreto-Lei Federal nº 3240/41 era ineficaz contra as diversas irregularidades. Era preciso efetivar uma Lei que combatesse de forma eficaz os atos de atentado à moralidade administrativa e que causavam prejuízos para a população.
A improbidade administrativa está ligada ao desígnio de corrupção, malversação administrativa, desonestidade ou atos que a função pública seja exercida de modo imoral ou ilegal, seja por omissão indevida de atuação ou pela não observância culposa ou dolosa das normas legais (BARBOSA, 2010).
Consoante Figueiredo (2011) a Lei em comento dispõe de três categorias para os atos de improbidade administrativa: atos que resultem em enriquecimento ilícito; atos que causem prejuízo ao erário e atos que atentem contra os princípios da Administração Pública, conforme versam os artigos 9º, 10 e 11 da Lei apontada. Como consequência, a responsabilização do agente pode ser pela perda de bens e valores que foram adquiridos ilegalmente; ressarcimento do dano de modo integral; perda da função pública; multa civil; perda de direitos políticos; proibição de recebimento de benefícios ou incentivos, sendo tais medidas aplicadas conforme o dano e o proveito obtido pelo agente público.
Encontra-se no título XI, a contar do art. 312 do Código Penal brasileiro, os crimes que podem ser cometidos contra a Administração Pública, tais como: peculato, emprego irregular de verbas públicas, concussão, corrupção passiva, violação de sigilo funcional e de proposta de concorrência, contudo, a título de brevidade, busca-se a apresentação de alguns crimes que são decorrentes de atos de improbidade administrativa na gestão de recursos na saúde, sendo, in verbis:
Art. 312 – Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio;
Art. 315 – Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei;
Art. 316 – Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida;
Art. 317 – Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem;
Art. 325 – Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação;
Art. 326 – Devassar o sigilo de proposta de concorrência pública, ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo; (BRASIL, 1940).
Os crimes contra a Administração Pública ferem a normalidade funcional, a probidade, a moralidade, a eficácia e a incolumidade que devem ser sempre observados e respeitados em todos os atos administrativos, não sendo tal realidade diferente no momento da execução do processo licitatório (BITENCOURT, 2016). Vale ressaltar que:
Os crimes contra a Administração Pública propriamente foram divididos pelo Código Penal de 1940 em três capítulos: “crimes praticados pelos seus próprios integrantes” (funcionários), “crimes praticados por particular contra a Administração Pública” e “crimes contra a Administração da Justiça” (BITENCOURT, 2016, p. 37).
Por sua vez, Garcia (2013) admite que é necessário o entendimento quanto a tipologia dos crimes que são praticados pelos funcionários públicos, aos que não são. O entendimento doutrinário aduz que existem crimes considerados como funcionais próprios, este em função de quando não existe a qualificadora de funcionário público, sendo considerado o fator da atipicidade da conduta – como é considerado na corrupção passiva. Também existe a tipologia quanto aos crimes impróprios, quando também se tem o afastamento da qualidade de funcionário, sendo desclassificado o ato ou considerado como conduta atípica relativa, em função de crimes como o peculato.
Em concernência ao crime peculato, ainda em conformidade com o entendimento de Garcia, tem-se que:
O dispositivo em questão prevê quatro modalidades do delito de peculato, a saber: a) peculato-apropriação (primeira parte do caput do art. 312); b) peculato-desvio (segunda parte do caput do art. 312); c) peculato-furto (§ 1º); e d) peculato culposo (§ 2º). O caput descreve o chamado peculato-próprio, caracterizado pela anterior posse do dinheiro, valor ou qualquer bem móvel por parte do funcionário. Caso inverta o título da posse e se aproprie, se assenhore da coisa, cometerá o agente o peculato-apropriação. Caso desvie o bem, ou seja, o empregue em fim diverso daquele a que era destinado, em proveito próprio ou alheio, haverá peculato-desvio. Já o §1º prevê o chamado peculato-furto, no qual o funcionário subtrai o bem ou concorre para que seja subtraído, embora não esteja ele na sua posse, prevendo o § 2º a modalidade culposa do delito (GARCIA, 2013, p. 7).
Outro crime contra a Administração Pública e contra a sociedade no desvio de verbas destinadas a saúde, é o crime de corrupção. Consiste no delito da corrupção, ao qual se tem em casos de tipologia como a corrupção passiva e ativa. A corrupção passiva, presente no artigo 317, possui natureza funcional, ao qual são atos ilícitos praticados pelos agentes públicos contra o aspecto geral da Administração Pública. A corrupção ativa, encontrada no artigo 333 do Código Penal, são atos praticados por particulares contra a Administração Pública em geral (GARCIA, 2013).
Esse crime apresenta a vantagem indevida, ao qual o funcionário público se aproveita de sua função privilegiada e fere os preceitos da moralidade, legalidade e impessoalidade, ocorrendo assim no favorecimento de terceiro mediante ação ou até mesmo omissão. Pode ser apresentada em uma espécie de troca de favores, ao qual o funcionário apresenta uma ação para o terceiro e o mesmo fornece uma contraprestação indevida ou ainda a omissão funcional que ocasione em benefício para o terceiro interessado (MARTINS, 2013).
É dever da Administração Pública a garantia aos cidadãos do direito à saúde, pois, é um direito fundamental e coletivo. Nesse sentido, Silva (2017) aponta que o Sistema Único de Saúde (SUS), ao qual é integrado com uma rede hierarquizada e regionalizada de ações e serviços voltados para a área da saúde, é o meio que o Poder Público executa o seu dever em prover o acesso à saúde para a sociedade em geral. O SUS também denota ações e serviços na área federal, estadual, municipal e distrital, ao qual é regido pelos princípios de descentralização, com direção única por cada área governamental.
A Emenda Constitucional nº 29/2000, ressignificando o disposto no artigo 198, promove que as entidades apliquem em período anual ações estratégicas de saúde pública com recursos advindo de arrecadações tributárias e também pela transferência de percentuais e critérios estabelecidos em Lei Complementar. Contudo, o artigo 77 do ADCT, ao qual foi acrescido pela mesma EC, estabelece que, para a União, o percentual é de 5%; para os Estados é de 12% e para os Municípios e Distrito Federal é de 15% (SILVA, 2017).
A manifestação de recursos públicos, como consequência da improbidade administrativa é algo preocupante, pois, resulta em outros eventos, como o que se pode ver pela judicialização da saúde e o impacto que esses atos improbos causam em todo o SUS, impactando negativamente a vida de milhões de usuários em todo o território nacional. A crise vista na saúde pública resulta em diversos problemas sociais, contudo, a sua razão é, por muitas vezes, objeto de desvio de recursos por agentes públicos com má-fé.
Desse modo, apontam Leal e Ritt que:
São inúmeras as situações que estão presentes as denominadas “máfia da saúde” que superfaturam cirurgias, cobertas e garantidas pelo SUS. Situações de compra de remédios e medicação com valor superfaturado, medicação experimental e desnecessária até. Cita-se também a “máfia dos laboratórios” que, através da judicialização, colocam remédios experimentais no mercado. Sem esquecer-se de licitações de medicações realizadas de forma fraudulenta. A saúde é um direito fundamental, o Estado deve prestar com melhor organização e critérios mais objetivos para prestar a judicialização, com um controle mais rigoroso, evitando assim, brechas, gargalos que dão margem à prática da corrupção, que faz com que toda a sociedade fique prejudicada. Os atos de improbidade não se restringem a só uma esfera, atingindo a esfera executiva, judicial e legislativa (LEAL; RITT, 2015, p. 105).
Sendo assim, é preciso que sejam feitas investigações internas e externas, por meio de auditorias e fiscalizações constantes nos órgãos estatais da saúde, pertencentes ao SUS, pois, existem diversos casos judiciais, aos quais fora comprovado que, a responsabilização do agente público em caso de gastos públicos na saúde impactou de forma significativa na vida de toda a sociedade.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para que a sociedade possa usufruir da existência de seus direitos, é preciso que a Administração Pública possua recursos suficientes, bem como funções definidas e agentes públicos intencionados a realizarem a sua função em prol do interesse público. Contudo, nem sempre os agentes públicos executam atos públicos com base nos princípios constitucionais, o que resulta em atos de improbidade administrativa.
Conforme apresentado na pesquisa, os atos de improbidade administrativa, por vezes, os que buscam enriquecimento ilícito ou vantagem indevida, são de ordem financeira, com o desvio e alteração de registro dos gastos públicos. Na área da saúde, que possui um grande déficit de atuação estatal, não seria diferente.
Conclui-se essa pesquisa, ao apontar que, a perda de direitos políticos, devolução de valores que foram adquiridos de forma ilegal, perda de direitos políticos, entre outros, são meios de responsabilização dos agentes públicos que cometem atos de improbidade administrativa na gestão de recursos públicos na área da saúde.
REFERÊNCIAS
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[1] Graduanda em Administração Pública (UFF).
[2] Graduanda em Administração Pública (UFF).
[3] Graduanda em Administração Pública (UFF).
Enviado: Janeiro, 2021.
Aprovado: Março, 2021.