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A Importância do Enfermeiro para Pacientes Mentais no Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS)

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CONTEÚDO

CORRÊA, Samite Araújo de Souza [1]

CORRÊA, Samite Araújo de Souza. A Importância do Enfermeiro para Pacientes Mentais no Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS). Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 2, Vol. 13. pp 395-416 janeiro de 2017. ISSN: 2448-0959

RESUMO

Este artigo focaliza a importância do enfermeiro que atua com pacientes psiquiátricos. Por ser um assunto que requer mais discussões, em razão dos números alarmantes em todo o mundo, a relevância desta pesquisa se dá pelo fato de reforçar a ideia da necessidade da busca de novas configurações de profissionais para desenvolver suas atividades com eficiência e ao mesmo tempo com valorização nos centros psicossociais – Caps, no Brasil. Os objetivos da pesquisa são identificar a importância do enfermeiro no cuidado com o paciente mental, elencar funções específicas do Caps a fim de que o enfermeiro desenvolva um trabalho digno com pacientes mentais e identificar terapias e tratamentos por meio de programas de atendimento com base em políticas públicas de saúde aos pacientes psiquiátricos nos hospitais e fora deles.  A metodologia utilizada foi a partir de uma revisão bibliográfica, cuja proposta viabiliza a análise de natureza básica, tendo como suporte uma abordagem qualitativa do problema, tais como: Brasil (1997; 2010; 2011); Figueiredo (2011); Amarante (1982) Hirdes (2009) Mesquita et al (2010); Resende, (1987); Rotelli (1982); Stuart (2001; 2002); Taylor (1992). Após uma leitura seletiva a fim de verificar, mais atentamente, as obras que contêm informações úteis e uma interpretação crítica/analítica para a intelecção sobre a importância do enfermeiro nos cuidados com pacientes mentais no CAPS.

Palavras-chave: Enfermeiro, Saúde, CAPS, Pacientes Mentais.

INTRODUÇÃO

Em nossos dias, a discussão em torno das questões de pacientes mentais é latente, compreendendo desde as áreas de conhecimento até a sociedade de maneira ampla. Não obstante, a situação daqueles que necessitam de tratamento torna-se complexa, pois o número tende a aumentar e muitas vezes há poucos profissionais para atender. Dentre estes, vamos destacar o enfermeiro do Centro de Atendimento Psicossocial (CAPS), doravante, CAPS, que por ser um profissional importante, deve ser considerado peça fundamental no processo.

Segundo a definição do Ministério da Saúde, os CAPS constituem em “instituições acolhedoras de pacientes transtornados mentalmente, estimulam a integração social e familiar, apoiam iniciativas de autonomia, com atendimento médico e psicológico”.

Evidentemente, a enfermagem psiquiátrica consiste em uma área que se diferencia dos outros da profissão por ter em seu rol pacientes “especiais”, configurando um fator que exige do enfermeiro um desenvolvimento amplo, com uma compreensão expressiva e uma preocupação que se adeque ao relacionamento enfermeiro/cliente.

Este estudo desenvolveu-se com o objetivo de identificar a relação entre o enfermeiro e o paciente psiquiátrico e suas possibilidades de dimensionar os desafios encontrados nesse relacionamento. Trata-se de um estudo de relevância, pautado em referências bibliográficas que discutem abordagens acerca de cuidados com pacientes mentais, programas coordenados pelo Ministério da Saúde por meio do CAPS no Brasil.

São diagnosticados vários casos de pessoas com situações de doenças mentais, é tanto que o Ministério da Saúde (2010) destaca que

O acesso à atenção em saúde mental aumentou, chegando a 63% de cobertura, com forte participação da atenção básica e de ações intersetoriais como inclusão social pelo trabalho, assistência social e promoção de direitos. Cerca de 16.000 leitos com baixa qualidade assistencial foram fechados de forma pactuada e programada. Os hospitais psiquiátricos ficaram menores, e 44% dos leitos de psiquiatria estão situados em hospitais de pequeno porte. Pessoas com longo histórico de internação foram desinstitucionalizadas. Desde 2006, os gastos federais com ações extra-hospitalares nessa área aumentaram em relação aos gastos hospitalares. No ano de 2009, por exemplo, 67,7% dos recursos federais para a saúde mental foram gastos com ações comunitárias.

Assim, compreende-se que os percentuais indicam uma necessidade de ampliar cuidados com as doenças mentais, principalmente dos serviços de enfermagem, com profissionais capazes de desenvolver trabalhos com o paciente, auxiliando em sua melhoria de vida, a partir da decisão advinda da família ou do próprio paciente.

O enfermeiro que atua nesse processo por tempo prolongado desenvolve um conhecimento de si mesmo e muitas experiências de cunho particular que facilitam a relação terapêutica. Essas relações são fundamentais para que haja superação de seus desafios cotidianos do enfermeiro e conduz a uma forma de assistência cada vez mais qualificada ao paciente psiquiátrico.

O processo terapêutico se inicia quando o paciente compartilha conhecimentos de si mesmo com o profissional da área de saúde, os quais façam sentido em suas atividades da vida diária, permitindo ao profissional conhecer aquilo que pensa, sente e como age, e, assim, poder ouvir, falar e perceber os pormenores mais sutis que ainda não foram ditos.

Nesse sentido, Taylor (1992) salienta:

Atualmente, reconhece-se que o uso que o enfermeiro faz de sua própria personalidade pode ter uma influência terapêutica na experiência do cliente, se ele usar de compreensão e habilidade. Essa é a única ferramenta exclusiva sua e que apenas depende dele seu manejo. É importante que o profissional faça o melhor uso possível de seu tempo, sua energia e suas habilidades, dedicando-se àqueles clientes cujo diagnóstico de enfermagem indica um potencial em beneficiar-se com esse tipo de investigação feita pelo enfermeiro (TAYLOR, 1992).

Além disso, é preciso considerar que a realidade está intimamente relacionada com o serviço de saúde e, sobretudo com a Atenção Básica e a Estratégia de Saúde da Família (ESF). Ressaltamos que esta é a porta de entrada das pessoas à procura de atendimento cuidados com a saúde. Nesta modalidade de assistência, a atenção no âmbito da saúde mental, inclui a assistência a indivíduos em sofrimento psíquico ou com transtornos mentais já instalados e o desenvolvimento de ações preventivas e de detecção precoce, que envolvem o paciente e a família dele.

Dessa maneira, esta pesquisa procura discutir ideias que possam contribuir para outros desdobramentos de estudos alusivos à questão psiquiátrica e a importância do enfermeiro para pacientes cadastrados em uma unidade dos CAPS.

1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A Constituição Federal (1988) assegura que todos os cidadãos têm direito à vida e à saúde. Dessa forma, recorremos à Carta Magna para fundamentar esta pesquisa, em razão da discussão sobre políticas públicas em todos os sentidos e nela consta a fundamentação de toda a legislação brasileira. Serão consultados documentos em publicações nacionais do Ministério da Saúde e autores que versam sobre a função importante do enfermeiro que assiste pacientes mentais, além de publicações de Amarante (2009), Alves et al (2009), Resende (1987), Rotelli (2009), Mesquita (2010) e Brasil (1997; 2010).

Na Constituição Federal de 1988 foram anunciadas garantias de sistematização das ações e dos serviços destinados à promoção, preservação e recuperação da saúde individual e coletiva, onde esta passa a ser instituída como um direito de todos e dever do Estado, regida através do Sistema Único de Saúde (SUS) como assistência aos princípios básicos de universalidade, integralidade e equidade à população.

Estudos advindos do Ministério da Saúde apontam que nos anos 80 a atenção aos casos de saúde mental se intensificou especialmente após a vigência da Lei nº 10.216/01, que tem por objetivos “a redução do número de pacientes internados e do tempo de internação, além de propor a participação das famílias e da comunidade na assistência em saúde mental”.

Amarante (2009) assinala que “aquele em cuja razão existisse tal contradição seria um alienado, o que tornaria incapaz de julgar, de escolher; incapaz mesmo de ser livre e cidadão, pois a liberdade e a cidadania implicavam no direito de possibilidade a escolha”. No passado, a luta pela desconstrução do processo manicomial abarcou problemas a serem questionados em busca de resoluções, e, a partir daí, houve a necessidade da reconstrução da subjetividade do paciente em suas atividades da vida diária, pois este necessitava de casa, trabalho e espaço social.

Os primeiros Centros de Saúde Mental de base territorial começaram a funcionar, assumindo a responsabilidade de prevenção, tratamento e reinserção do paciente mental na sociedade, com um caráter assistencial, social e terapêutico. Segundo Alves (2009), “outras experiências como Psicoterapia Institucional e a Psiquiatria de Setor, almejavam restaurar o aspecto terapêutico do hospital psiquiátrico e a recuperação da função terapêutica da Psiquiatria”, com vistas a promover as ações comunitárias, tendo na internação apenas uma das etapas do tratamento.

Resende (1987) descreve que a década de 70 caracterizou-se por denúncias de grupos de profissionais contra a “indústria da loucura”, condenada como dispendiosa e com caráter crônico. Dessa forma, as denúncias foram aceitas e foram elaboradas uma nova proposta, normas e ordens de serviço emanadas do Ministério de Saúde, das Secretarias Estaduais de Saúde e do Instituto Nacional de Previdência Social, e com isso, era possível coibir parte dos excessos praticados contra paciente psiquiátricos.

Segundo Rotelli et al (2009), a base dos projetos “de desinstitucionalização encontra-se na ruptura da causalidade linear da doença-cura, problema-solução e na reconstrução do objeto enquanto sujeito histórico”. Ainda ressalta que as “novas instituições deverão estar à altura da complexidade da tarefa de intervir na sua existência-sofrimento”.

Para Hirdes (2009), a partir dos marcos da reforma psiquiátrica, foram criados serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico, quais sejam: redes de atenção à saúde mental, Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), leitos psiquiátricos em hospitais gerais, oficinas terapêuticas, residências terapêuticas, respeitando-se as particularidades e necessidades de cada local.

Os municípios passaram a ser ressarcidos através das portarias ministeriais, com a finalidade do deslocamento dos recursos para modalidades alternativas à internação psiquiátrica e compatibilizando os procedimentos das ações de saúde mental com o modelo assistencial.

O prisma obscuro da psiquiatria está sob uma cortina de informações não publicadas, a “doença”, da “existência global complexa e concreta” dos pacientes e do corpo social. E é nesta “separação artificial se constrói um conjunto de aparatos científicos, legisladores, administrativos (precisamente a “instituição”), todos referidos a “doença”” (ROTELLI, apud HIRDES, 2009).

Muitos avanços ocorreram com as experiências de desinstitucionalização. Entretanto, pensamos que, a despeito de muitos serviços que trabalham sob a égide da reforma psiquiátrica em nosso país, há a necessidade de constantemente redimensionarmos o olhar para as práticas em curso, para que aos novos serviços correspondam às balizas propostas, no nosso caso, o referencial da reforma psiquiátrica italiana. Há que lembrar, também, que os dispositivos como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) deverão se constituir como lugares de passagem; do contrário, sem esta revisão e crítica, a tendência dos novos serviços que trabalham no contexto da reforma psiquiátrica poderá encaminhar-se para a institucionalização. Para que isto não ocorra, torna-se crucial a instrumentalização dos trabalhadores de saúde e de saúde mental, a sensibilização dos gestores de saúde e a permanente preocupação com a qualidade dos serviços oferecidos (HIRDES, 2009).

Hirdes (2009) analisa que a Conferência Regional para a Reestruturação da Assistência Psiquiátrica foi um marco histórico para o setor de saúde mental a qual possibilitou mudanças ao nível do Ministério da Saúde. Depois das decisões em Caracas, em 1990, os países da América do Sul, inclusive o Brasil seu comprometeu a promover a reestruturação da assistência psiquiátrica, rever criticamente o papel hegemônico e centralizador do hospital psiquiátrico, salvaguardar os direitos civis, a dignidade pessoal, os direitos humanos dos usuários e propiciar a sua permanência no âmbito comunitário.

Na Declaração de Caracas os organizadores reconheceram e reafirmaram a validade dos princípios de cidadania dos portadores de transtornos mentais e a necessidade da construção de redes de serviços alternativos para os hospitais psiquiátricos, assim como advertem para o aumento da vulnerabilidade psicossocial e das diferentes modalidades de violência.

A VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986 foi sem dúvida, o grande marco histórico na Reforma Sanitária Brasileira, onde contou com participação de vários setores organizados da sociedade e na qual houve um consenso de que para o setor de saúde no Brasil não era suficiente uma mera reforma administrativa e financeira, mas sim uma mudança em todo o arcabouço jurídico-institucional vigente, que contemplasse a ampliação do conceito de saúde de acordo os preceitos da reforma sanitária.

Desta forma, passou-se a privilegiar a criação de serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico como as redes de atenção à saúde mental, aos CAPS, leitos psiquiátricos em hospitais gerais, oficinas e residências terapêuticas, buscando respeitar as particularidades e necessidades de cada local.

Mesquita et al (2010), sobre a questão da reforma psiquiátrica no Brasil, relatam:

O movimento pela Reforma Psiquiátrica tem início no Brasil no final dos anos setenta. Este movimento tinha como bandeira a luta pelos direitos dos pacientes psiquiátricos em nosso país. O que implicava na superação do modelo anterior, o qual não mais satisfazia a sociedade. O processo da Reforma Psiquiátrica divide-se em duas fases: a primeira de 1978 a 1991 compreende uma crítica ao modelo hospitalocêntrico, enquanto a segunda, de 1992 aos dias atuais destaca-se pela implantação de uma rede de serviços extra hospitalares.

O Relatório de Gestão 2007­2010 Brasil (2011) expressa que

As necessidades em saúde mental cresceram e se complexificaram, exigindo uma permanente atualização e diversificação das formas de mobilização e articulação política, de gestão, e de construção de estratégias inovadoras de cuidado. Os avanços no campo da saúde mental dependem hoje fundamentalmente da capacidade de os gestores se articularem intersetorialmente, assegurando apoio político e trabalho integrado entre todas as linhas e níveis de atuação governamental no campo da saúde mental. A instalação do Colegiado Nacional de Saúde Mental, com composição intersetorial, no SUS, passa a ser assim instância de pactuação fundamental para a gestão pública das Políticas de Saúde Mental. Usuários e familiares começam a se organizar e reivindicam sua participação formal no Colegiado Nacional. Esta inclusão representará um avanço ainda maior para a consolidação de uma direção coletiva e democrática da Política de Saúde Mental no Brasil (BRASIL, 2011, p. 9).

Assim, é preciso que haja gestores capazes de garantir o funcionamento pleno do CAPS em cada município e o atendimento a pacientes psiquiátricos seja garantido.

Quanto à atuação do enfermeiro essencial ao paciente psiquiátrico, vê-se que

O relacionamento enfermeiro-paciente já foi chamado de uma variedade de termos que inclui “relacionamento terapêutico enfermeiro-paciente”, “terapia de enfermagem psiquiátrica”, “psicoterapia de apoio”, “terapias de reabilitação” e “aconselhamento não diretivo”. A relação enfermeiro-cliente evolui para uma relação de parceria entre ambos, que expande as dimensões do papel de enfermagem psiquiátrica, que incluem competência clínica, defesa do paciente-família, responsabilidade fiscal, colaboração interdisciplinar, responsabilidade social e parâmetros ético-legais. Todos fazendo parte desta parceria (TAYLOR, 1992).

A Estratégia Saúde da Família (ESF) imprime a obrigatoriedade da responsabilidade da família é um fator que influencia na garantia da assistência ao indivíduo e traz a ele a segurança de que será tratado e com isso, poderá retornar às atividades em seu lar, para que outro paciente que necessitar dos serviços públicos de saúde mental seja atendido. Isso é um tipo de mudança importante no sistema.

Essa transformação do Sistema de Saúde caracteriza um cenário privilegiado para implementação de transformações marcantes das práticas e saberes na área de saúde mental, para que a família intermedie o tratamento de seus entes.

Sobre essa questão, Stuart e Laraia (2001) analisam:

Apenas no final dos anos 30, a formação em enfermagem passou a reconhecer a importância do conhecimento psiquiátrico nos cuidados gerais da enfermagem para todas as doenças. Um importante fator no desenvolvimento da enfermagem psiquiátrica foi o surgimento de terapias somáticas, como psicocirurgias, terapia de choque insulínico e terapia eletroconvulsiva, tornando os pacientes mais susceptíveis ao tratamento (STUART; LARAIA, 2001).

A enfermagem psiquiátrica passa então a ser um fator de garantias ao tratamento de pessoas. As terapias representavam um alívio ao sofrimento daqueles que necessitavam de atenção básica na área da psiquiatria.

Os autores asseveram, ainda, que

À medida que se evoluíam as terapias somáticas, as enfermeiras iniciavam seus esforços para a definição do seu papel como enfermeiras psiquiátricas. A prática contemporânea da enfermagem psiquiátrica ocorre em um contexto social e ambiental. A função desta cresceu em complexidade desde seus elementos históricos originais. Hoje ela engloba as dimensões da competência clínica, defesa do paciente, da família, responsabilidade fiscal, elaboração interdisciplinar, responsabilidade social e parâmetros éticos e legais (STUART; LARAIA, 2001).

Nota-se que a responsabilidade social e a legalidade se tornam pontos de referência para que o enfermeiro assista o paciente com dignidade. Esses fatores podem interferir nas relações de confiança entre a família e o profissional, uma vez que o cuidado requer envolvimento com o outro, conecta-se à ideia de corresponsabilizar-se pelo outro, de envolver-se com o sofrimento do outro, de solidarizar-se com o outro. Pressupõe-se, portanto, que vincular-se a alguém seja um ato que requer disponibilidade para o outro, nos vários tipos de relação intrapessoais e interpessoais.

A respeito de profissionais disponíveis no sistema para atender a saúde mental na atenção básica, vimos que

Em 2008, a Portaria GM 154/08 recomendou a inclusão de profissionais de saúde mental nas equipes dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF). Este foi um dos principais avanços do período 20072010 para a inclusão das ações de saúde mental na Atenção Básica. Os NASF são dispositivos com alta potencialidade para garantir a articulação entre as equipes de Saúde da Família e as equipes de saúde mental dos municípios, melhorando o acesso e o cuidado das pessoas com transtornos mentais e com problemas relacionados ao uso de álcool e outras drogas. Esta estratégia, em processo de implantação, ainda precisa ser melhor monitorada. Dados de dezembro de 2010 informam que 1.288 NASF estão em funcionamento no país. Dos 7634 trabalhadores destes Núcleos, 2349 são trabalhadores do campo da saúde mental, cerca de 31%. Para potencializar esta estratégia, foi publicado em dezembro de 2009 o Caderno do NASF, que conta com um capítulo específico sobre Saúde Mental, Álcool e outras Drogas. No capítulo introdutório do Caderno, o Apoio Matricial é enfatizado como estratégia fundamental para a garantia do cuidado (BRASIL, 2011, p. 26).

É relevante lembrar que a Lei 180 abriu precedentes quando garantiu condições de possibilidades para a extinção do modelo manicomial, corroborando para as ideias até então tidas como absurdas e impossíveis de serem operacionalizadas socialmente.

Quando houver possiblidade de tratar o transtorno mental de uma forma inovadora, com responsabilidade, dignidade e cidadania ao paciente, contribuindo para a transformação dos demais modelos de assistência psiquiátrica e ressignificação do conceito e da prática da reforma psiquiátrica em todo o mundo, inclusive o Brasil, todos terão acesso ao tratamento, à informação e à prevenção de doenças psiquiátricas.

De 2003 a 2010, esta reestruturação da assistência hospitalar psiquiátrica aconteceu num  processo coordenado e pactuado, que permitiu que a redução do número de leitos e de hospitais  psiquiátricos fosse concatenada com a construção e expansão progressiva de uma rede de atenção  aberta,   diversificada   e   inserida   na   comunidade,   com  base   estratégica   nos   Centros   de   Atenção  Psicossocial (CAPS), ações de saúde mental na atenção básica,   Programa De Volta para Casa e   programas de inclusão social pelo trabalho. Nesse sentido, ao mesmo tempo em que leitos de baixa qualidade foram gradualmente fechados, um processo responsável de desinstitucionalização de pacientes há longo tempo internados se iniciou, com a implantação de Residências Terapêuticas e a inclusão de beneficiários no Programa de Volta para Casa, programa criado em 2003 (BRASIL, 2011, p. 26).

Um exemplo apresentado pelo Ministério da Saúde foi o censo psiquiátrico paulista entre 2007 e 2010, que contabilizou leitos e moradores. Acompanhar esses números pode ajudar a organizar outros hospitais pelo Brasil afora.

O “Censo Psicossocial dos Moradores em Hospitais Psiquiátricos do Estado de São Paulo”, realizado em   2008, foi   um   fato   importante   do   período   2007­2010, para   o   projeto   de desinstitucionalização da Reforma Psiquiátrica. O maior número de leitos psiquiátricos do país ainda está em São Paulo, estado que detém a maior proporção de moradores para o total de leitos (6.400 moradores, cerca de 60 % do total de leitos do estado). Assim, a iniciativa da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo foi um fato relevante, por apontar onde se concentram os moradores e permitir pactuações locais para a desinstitucionalização destes pacientes, com a implantação de residências terapêuticas e inclusão de beneficiários no De Volta para Casa. Isto poderá significar avanços em alguns municípios do estado, com potencial de ampliação da rede substitutiva e de reestruturação da assistência hospitalar. Entretanto, até o momento, dois anos após o lançamento dos resultados do Censo, menos de 300 moradores foram de fato desinstitucionalizados, apontando para os obstáculos políticos e técnicos que o processo de reintegração social de moradores ainda apresenta para a Reforma (BRASIL, 2011, p. 26).

O estado de São Paulo conta com um número considerável de leitos, além do programa “De Volta pra casa” – uma iniciativa que permite desinstitucionalizar uns moradores já tratados e garantir espaço para outros que têm necessidade de tratamento.

2. HISTÓRIA DA REFORMA PSIQUIÁTRICA

 Segundo as pesquisas, a loucura sempre existiu e há muitos anos, configura em um desafio para as sociedades primitivas e modernas. Para estudiosos, na Grécia Antiga, o “louco” era considerado como uma pessoa com poderes diversos, como se tivesse uma manifestação dos deuses, sendo, portanto, reconhecida e valorizada socialmente, então não havia necessidade de controle, nem exclusão.

Já na Idade Média, a loucura era vista como expressão das forças da natureza, sendo algo não humano, caracterizada pelo terror e pela atração, algum tempo depois, era considerada possessão por espíritos maus. Esse controle era vinculado à religião, que a igreja controlava.

Com o Racionalismo, a loucura passou do cunho das forças da natureza, assumindo o status para uma situação desvinculada da razão. Assim, o “louco” era aquele que transgredia ou ignorava a moral racional. Com um caráter moral, a loucura passa a ser algo desqualificante com irresponsabilidade (ALVES et al, 2009).

Resende (1987, p.20) assinala que durante todo o período da Antiguidade e da Idade Média o louco gozou de certo grau de “extraterritorialidade” e a loucura era no essencial “experimentada em estado livre…, circulava… fazia parte do cenário e linguagem comuns […].

Com o surgimento do Mercantilismo, a população em relação tem um novo olhar em relação ao “louco”, isto é, todos que não contribuíam para o movimento da produção, comércio e consumo, era encarcerado, sob a prerrogativa do controle social. A Revolução Francesa contribuiu para que os excluídos retornassem à sociedade, mas isolados em setores próprios dos hospitais gerais, que se organizavam em um espaço de assistência pública acolhimento, reclusão e correção. Depois de um tempo, as pessoas consideradas loucas foram levadas para as instituições beneficentes e conduzidas ao mundo do trabalho, e quem tinhas condições de exercê-lo, era aproveitado como fator humano de mão de obra barata.

A psiquiatria pareceu no século XIX e as instituições sociais deveriam ser radicalmente transformadas, assim, Philippe Pinel se responsabilizou pela reforma de um hospital em Paris. Esse médico procurou agrupar as doenças e assim observá-las, produzindo conhecimentos que até então não havia sido possível. Pinel autorizou que tirassem os alienados e inscreve suas alienações das correntes e ainda ensinou que a loucura, enquanto doença deveria ser tratada clinicamente. As ideias de Pinel reforçaram a separação dos loucos dos demais excluídos, a fim de estudá-los e buscar a cura. Com o tempo, a população de doentes mentais só aumentava e houve agrupamentos de muitas pessoas em espaços de tratamentos.

No início do século XIX, houve predominância do pensamento doutrinário organicista e os tratamentos físicos resultaram das dificuldades práticas do tratamento moral e a urgências determinadas pela superpopulação nos manicômios. O desenvolvimento da anatomia patológica influenciou o pensamento da psiquiatria da época de forma contundente, fazendo com que os alienistas buscassem causas orgânicas da loucura e desenvolvessem procedimentos terapêuticos físicos e medicamentosos.

A forma de se pensar acerca das causas da loucura foi se transformando e as críticas ao modelo fechado e autoritário, que continuava presente nos hospícios da época, forjaram o surgimento à proposta de criação de colônias de alienados. Essas colônias neutralizavam as denúncias de superlotação, aprisionavam e violentavam os internados nos hospícios a fim de transformar o modelo assistencial.

No século XX, depois da 2ª Guerra Mundial, a Europa e os Estados Unidos tiveram os primeiros movimentos transformacionais de hospícios do modelo vigente. Com a reconstrução dos países da Europa, após a vitória dos aliados, os hospícios passaram a sofrer críticas a seus atos violentos e excludentes no tratamento da loucura, e em alguns locais buscaram-se formas de transformação que pudessem se adequar à nova ordem, onde o pensamento de participação democrática e do bem-estar social se tornaram presentes.

Surgiram algumas iniciativas de modificação das práticas institucionais que passaram a ser denominadas Reforma psiquiátrica. Essas se diferenciam em seus conceitos, suas práticas e abordagens, porém com alguns pontos em comum. Em 1961, na Itália, Franco Basaglia assumiu a direção do Hospital de Gorizia e adotou medidas que visavam a promover a humanidade do paciente, com o objetivo de resgatar a dignidade e direitos como cidadãos.

A proposta era transformar o manicômio em local de cura com mudanças para a humanização dos pacientes com espaços coletivos para a participação de profissionais e pacientes. Basaglia (1999) defendia que o ato terapêutico fundamental era descobrir a pessoa, o sujeito que sofria encoberto por rótulos e conceitos produzidos socialmente, como por exemplo, de que loucos são ameaças à sociedade.

A partir daí surge uma trajetória de lutas em busca da desconstrução do hospital psiquiátrico e de toda a cultura manicomial e a situação se expandiu para a questão política, enfrentando limites e contradições. As propostas foram divulgadas na Itália no final dos anos 60, em lutas estudantis em 1968 e na luta operária de 1969, possibilitando intensa repercussão mundial na época. Em 1971, Basaglia iniciou o trabalho de transformação do hospital psiquiátrico de San Giovanni em Trieste e posteriormente este processo passou a ser chamado de desinstitucionalização, que levou ao fechamento completo do manicômio e a construção de uma rede de atenção territorial.

Neste processo, o programa vigente possibilitou outra estrutura da assistência psiquiátrica, englobando e redimensionando a prevenção e a inserção social. Ainda neste trabalho, iniciou a desconstrução da prática institucionalizada e seu respectivo processo de socialização, onde começa a ser produzido os “territórios”, em que os pacientes se formalizavam na condição de hóspedes.

Houve processos significativos para os operadores de Trieste e para técnicos, estudantes, voluntários, italianos e de várias partes do mundo, incluindo o Brasil, com estudantes brasileiros participando, os quais foram de relevante importância para as ideias que colaboraram na Reforma Psiquiátrica Brasileira.

A Reforma Psiquiátrica Brasileira vem acompanhando os princípios e a evolução junto à Reforma Sanitária, de acordo com o marco inicial de todo o processo de desinstitucionalização fundado e instituído na Reforma Italiana. Na desinstitucionalização busca-se deslocar o centro da atenção da instituição para a comunidade, o distrito ou território.

Segundo Amarante (2009), o Movimento da Reforma Psiquiátrica Brasileira se inspira na tendência caracterizada pela crítica epistemológica ao saber médico, e este movimento por sua vez, identifica-se com a trajetória de desinstitucionalização prático-teórica desenvolvida por Basaglia, na Itália. No final da década de 70 as ideias de Basaglia chegam ao Brasil, em virtude da repercussão internacional da luta Antimanicomial do processo psiquiátrico italiano.

Segundo Amarante (2009), pode-se dizer que há uma forte relação da reforma sanitária por uma perspectiva inicial de crítica quanto a natureza do saber médico, torna-se um conjunto de medidas de cunho administrativo, sem o questionamento das abordagens técnicas centradas quase que exclusivamente em sintomas, no especialismo, na cultura medicalizante e no intervencionismo diagnóstico e terapêutico.

Após muitos anos de lutas antimanicomiais, em 1978, o Parlamento Italiano aprovou a Lei da Reforma Psiquiátrica, conhecida como Lei 180 ou Lei Basaglia.  Esta foi posteriormente englobada na Lei da Reforma Sanitária. O grande desafio do Movimento da Reforma Sanitária passa a ser a promoção do sistema desintegrado, no que diz respeito à articulação dos campos de governo, e centralizado, ora em serviços médicos hospitalares privados, ora em programas verticalizados, para outro sistema com comando único em cada esfera governo.

Desta forma, em um processo construtivo, se evolui para a instalação de instâncias de participação social como os Conselhos Municipais, Estaduais e Nacional de Saúde, podendo-se admitir grandes evoluções nos processos de descentralização e municipalização do setor da saúde, com uma estrutura de um sistema de saúde pública fundamentado nos princípios solidários e da justiça social.

Pode-se considerar que o movimento pela reforma psiquiátrica foi mais além, pois foi em busca de transformações qualitativas no modelo de saúde e não somente de reorganização administrativa.

2.1 OBJETIVO DO CAPS

Nos compêndios que envolvem a área das ciências clínicas, o Ministério da Saúde (2010) estabelece que o principal papel do CAPS é promover a integração dos pacientes a um ambiente social e cultural concreto, designado como seu “território”, o espaço da cidade onde se desenvolve a vida quotidiana de usuários e familiares e possuem a principal estratégia do processo de reforma psiquiátrica.

Além disso, o Ministério da Saúde destaca outras funções do CAPS, tais como:

  • prestar atendimento em regime de atenção diária;
  • gerenciar os projetos terapêuticos, oferecendo cuidado clínico eficiente e personalizado;
  • promover a inserção social dos usuários através de ações intersetoriais que envolvam educação, trabalho, esporte, cultura e lazer, montando estratégias conjuntas de enfrentamento dos problemas. Os CAPS também têm a responsabilidade de organizar a rede de serviços de saúde mental de seu território;
  • dar suporte e supervisionar a atenção à saúde mental na rede básica, PSF (Programa de Saúde da Família), PACS (Programa de Agentes Comunitários de Saúde);
  • regular a porta de entrada da rede de assistência em saúde mental de sua área;
  • coordenar junto com o gestor local as atividades de supervisão de unidades hospitalares psiquiátricas que atuem no seu território;
  • manter atualizada a listagem dos pacientes de sua região que utilizam medicamentos para a saúde mental.

Nesse sentido, infere-se que apesar de os hospitais psiquiátricos consumirem 88% dos recursos orçamentários do SUS destinados à saúde mental há um atendimento mínimo. Os dados são do relatório da III Conferência Nacional de Saúde Mental prever que até o ano 2004 e esses inúmeros desafios para que o atendimento seja digno, realizado por profissionais valorizados.

Importa salientar que os investimentos nos serviços substitutivos vêm aumentando desde 2004 e a reorientação do modelo assistencial em saúde mental demanda investimentos políticos, técnicos, financeiros e éticos, entre outros, além da articulação com outras instâncias educação, trabalho, cultura, habitação e habilitação profissional, com vistas a consolidar a cidadania. Esses fatores representam a autonomia dos Caps e a garantia de sua eficiência.

3. O PAPEL DO ENFERMEIRO

O papel do enfermeiro representa uma das partes integrantes do processo de tratamento, pois tende a criar novas perspectivas para o seu trabalho no campo da saúde mental, cujas características consistem na transição de uma prática de caráter hospitalar para tratamento dos “doentes mentais” para outra que envolve novos princípios e conhecimentos, na interdisciplinaridade e do reconhecimento do outro como ser humano, que interage no contexto familiar e comunitário, configurando um avanço na área da saúde mental.

Ao analisar o papel do enfermeiro, sua importância e necessidade para o paciente mental, convém ancorarmos em ideias que tratam da alienação e contradição na razão, pois é aí, muitas vezes, que o indivíduo depende de cuidados, de alguém que esteja consciente para oferecer ajuda ao tratamento. O enfermeiro psiquiátrico desempenha um papel importantíssimo e para obter êxito, necessita de uma preparação e de uma qualificação que o torne capaz de cuidar, entender e ajudar seus pacientes “especiais”.

A enfermagem psiquiátrica diferencia-se dos outros ramos da profissão no que se refere ao principal objeto, no caso, o esforço visando à resistência ao usuário, que requer do enfermeiro um desenvolvimento mais completo, uma compreensão especial e um maior interesse no relacionamento enfermeiro-cliente.

O cuidado de enfermagem depende do entendimento do comportamento do paciente e o seu modo de reagir. É preciso aprender a encarar o paciente como seu semelhante, sendo para ele tanto um enfermeiro como uma pessoa comum. Quanto mais preparado o enfermeiro estiver para compreender o comportamento humano e lidar com isso, mais confiança ele terá em sua capacidade de responder ao “desafio” das necessidades emocionais do seu cliente.

Por isso a nossa preocupação como futuros participantes de uma equipe interdisciplinar, está voltada para pesquisas que devem avançar em relação à atuação na rede de saúde mental voltando-se para o desempenho dos profissionais de enfermagem com suas dificuldades, expectativas, suas satisfações para com pacientes e terapias específicas vivenciadas nesta rede.

Mesmo que pesquisas apontem que os enfermeiros enfrentam dificuldades nas tarefas com indivíduos com queixas inerentes à saúde mental na atenção básica, a necessidade de atendimento do indivíduo com transtorno mental e sua família representa uma conduta que faz parte da nossa realidade. Esse profissional possui grande importância no tratamento, pois atua, na maioria das vezes, como coordenador da equipe da ESF, que exige equilíbrio e profissionalismo, com muitos desafios para atender à saúde mental.

Segundo o Ministério da Saúde (1997, p. 16;17), dentre tantas atribuições básicas do enfermeiro, destacam-se:

– Executar, no nível de suas competências, ações de assistência básica de vigilância epidemiológica e sanitária nas áreas de atenção à criança, ao adolescente, à mulher, ao trabalhador e ao idoso;

– Oportunizar os contatos com indivíduos sadios ou doentes, visando promover a saúde e abordar os aspectos de educação sanitária;

– Promover a qualidade de vida e contribuir para que o meio ambiente torne-se mais saudável;

– Discutir de forma permanente, junto a equipe de trabalho e comunidade, o conceito de cidadania, enfatizando os direitos de saúde e as bases legais que os legitimam;

– Participar do processo de programação e planejamento das ações e da organização do processo de trabalho das unidades de Saúde da Família.

No Caps, essas atribuições se ampliam, por isso é que o enfermeiro exerce um papel imprescindível na assistência às pessoas com transtorno mental, pois promovem a sensibilização do paciente, da família e da comunidade, se for o caso, responsabilizando-se pela construção de novos espaços de reabilitação psicossocial, que farão com que os indivíduos se sintam valorizados, afinal, a cidadania dessas pessoas e de sua família está assegurada na política de desinstitucionalização.

4. DISCUSSÃO DOS ACHADOS

As pessoas atendidas nos CAPS apresentam um intenso sofrimento psíquico, que lhes impossibilita de viver e realizar seus projetos de vida, com suas famílias e amigos. São, preferencialmente, pessoas com transtornos mentais severos e/ou persistentes, com transtornos relacionados às substâncias psicoativas (álcool e outras drogas) e também crianças e adolescentes com transtornos mentais.

Os usuários dos CAPS apresentam, muitas vezes, um histórico de internações psiquiátricas, podem nunca ter sido internados ou podem já ter sido atendidos em outros serviços de saúde como consultórios, postos de saúde, upas, etc. O importante é que essas pessoas sejam atendidas nos CAPS, pois é lá descobrirão o que são e o que fazem.

Considerando que a ESF funciona, com a UBS, como porta de entrada no sistema público de saúde, é importante destacar a função do enfermeiro no atendimento às pessoas com transtornos mentais e sua família. Neste sentido, seu papel merece destaque, uma vez que ele é o profissional que deve oferecer à família e ao doente meios de tratamento.

Outro ponto a ser frisado é que a saúde pública iniciou-se no Brasil entre os séculos XIX e XX, onde a partir daí manteve-se em extensão num processo de elaboração de normas e organizações sanitárias e de mudanças de práticas dominantes até então. Hoje em dia, há muitos caminhos para o tratamento de paciente psiquiátricos.

Vários períodos foram compostos por marcos administrativos e políticos na saúde pública brasileira, em que foi possível evidenciar a duplicidade entre a assistência e a previdência, onde era caracterizado o privilégio exercido pela prática médica curativa, individual, assistencialista e especializada, em detrimento da saúde pública, assim como o desenvolvimento de um sistema que dava prioridade a capitalização e a sua produção privada.

A partir daí irá se construindo estratégias ou projetos terapêuticos para cada usuário.  Os usuários do CAPS possuem um projeto terapêutico individual e um conjunto de atendimentos concernente a sua particularidade, que personalize o atendimento de cada pessoa na unidade e fora dela e proponha atividades durante a permanência diária no serviço, segundo suas necessidades, segundo consta do projeto terapêutico do usuário do serviço, o CAPS poderá oferecer, conforme as determinações da Portaria GM 336/02.

Além disso, é preciso observar as três modalidades de atendimento:

1 – Atendimento Intensivo, que é diário, oferecido quando a pessoa se encontra com grave sofrimento psíquico, em situação de crise ou dificuldades intensas   no convívio social e familiar, precisando de atenção contínua, podendo ser domiciliar, se houver necessidade.

2- Atendimento Semi-Intensivo, em que o usuário pode ser atendido até 12 dias no mês. Essa modalidade é oferecida quando o sofrimento e a desestruturação psíquica da pessoa diminuíram, melhorando as possibilidades de relacionamento, mas a pessoa ainda necessita de atenção direta da equipe para se estruturar e recuperar sua autonomia. Esse atendimento pode ser domiciliar, se necessário;

3- Atendimento Não-Intensivo: oferecido quando a pessoa não precisa de suporte contínuo da equipe para viver em seu território e realizar suas atividades na família e/ou no trabalho, podendo ser atendido até três dias no mês, podendo ser também domiciliar.

Eis a importância do enfermeiro nos três tipos de atendimento citados anteriormente. Assim, cada CAPS deve ter um projeto terapêutico do serviço, que leve em consideração as diferentes contribuições técnicas dos profissionais dos CAPS, as iniciativas de familiares e usuários e o território onde se situa, com sua identidade, sua cultura local e regional.

5. DISCUSSÃO

De acordo com a pesquisa sobre este assunto, foi possível verificar que o enfermeiro representa um profissional necessário para desenvolver trabalhos no campo da saúde mental nos CAPS, uma vez que o paciente e sua família dependem de alguém que conheça as patologias e se dedique a quem precisa de tratamento.

As informações e o suporte necessários, contribuindo para sua reinserção social. A falta de capacitação desse profissional prejudica a assistência a estas pessoas, as quais devem ser atendidas em conformidade com as políticas de saúde, ou seja, de forma digna, humanizada e respeitoso.

Sabendo-se que a ESF é um modelo de assistência que propicia a ação de promoção da saúde e prevenção de doenças, destacando-se aqui as doenças mentais, o enfermeiro tem neste contexto um papel fundamental, uma vez que favorece o atendimento preventivo e acolhedor afim de proporcionar uma assistência humanizada e holística e, assim, contribuir para a melhor qualidade do cuidado prestado.

Para melhorar a qualidade da assistência prestada pela ESF na atenção básica, ao paciente psiquiátrico, é preciso qualificar os profissionais e conhecer suas limitações, pontos importantes que devem ser levados em consideração, para a educação permanente em saúde, assim prestar um cuidado que satisfaça às necessidades do cliente e sua família e busque a resolutividade de seus problemas.

Neste estudo foi evidenciado que a os enfermeiros, muitas vezes, podem se dedicar às atividades rotineiras, não tendo condições de desenvolver atividades específicas, que visem à promoção e prevenção em saúde mental. Estes profissionais mantêm práticas tradicionais, com fulcro no cuidado rotineiro, com atividades como triagem e controle de medicamentos sobrepondo-se às demais.

Esta situação não condiz com as diretrizes estabelecidas pela Política de Atenção Integral à Saúde Mental, que propõe a transformação da assistência psiquiátrica em um modo de atenção que privilegie as atividades que favoreçam o processo de inserção social do portador de transtorno psíquico.  Os profissionais podem atualizar-se e treinar para que tenha condições boas de trabalho, diferente de jornadas de trabalho exaustivas, remuneração insuficiente e excesso de responsabilidades. Nessa mesma lógica, as equipes de saúde da família também começaram a realizar atividades de grupo como artesanato, sendo uma forma de envolver a comunidade, porém nem sempre há um aproveitamento desse momento para promover e recuperar a saúde mental.

Conforme as novas diretrizes preconizadas pela Reforma Psiquiátrica, a ESF deve ter a família como aliada no tratamento paciente mental. Para sua integração, é necessário que o serviço apoie o serviço técnico e humanizado. Os trabalhadores do serviço de saúde, sobretudo os enfermeiros, precisam ter consciência da importância do envolvimento da família das pessoas com transtornos mentais nos projetos de reinserção desses na comunidade.

É preciso que haja compromisso do enfermeiro, da família, do paciente e seu familiar, com vistas a romper com os saberes e práticas tradicionais da psiquiatria para uma atuação mais abrangente, de modo que o cuidado seja compreendido em um modelo de assistência integral, que considere também os aspectos psicossociais e espirituais do indivíduo, família e comunidade.

Em suma, é necessário que o enfermeiro conheça a política da reforma psiquiátrica e esteja habilitado para trabalhar com pacientes psiquiátricos com preparação para acolher e apoiar as famílias em suas necessidades.

5.1 NOSSAS PALAVRAS

O enfermeiro possui uma responsabilidade imensa; uma tarefa importante, pois este representa o lado seguro de quem precisa de apoio no tempo de tratamento. Aquele que incentiva, que mostra caminhos certos, que tem conhecimento de técnicas e de tecnologias capazes de ajudar o paciente e a se sentir melhor.

Na década de 70 registraram-se várias denúncias quanto à política brasileira de saúde mental em relação à política de privatização da assistência psiquiátrica por parte da previdência social, quanto às condições (públicas e privadas) de atendimento psiquiátrico à população.  Formaram-se núcleos estaduais, principalmente nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais constituem o Movimento de Trabalhadores em Saúde Mental.

A I Conferência Nacional de Saúde Mental (I CNSM), de 1987 recomenda a priorização de investimentos nos serviços extra-hospitalares e multiprofissionais como oposição à tendência hospitalocêntrica.  No final de 1987 aconteceu o II Congresso Nacional do MTSM em Bauru, no qual se concretizou o Movimento de Luta Antimanicomial, cujo lema era “por uma sociedade sem manicômios”.

Para Saraceno (1999),

A história natural das doenças encontra a história natural dos serviços. Assinala a importância da revisão e crítica dos serviços para as transformações efetivas na vida dos pacientes, uma vez que estas variáveis – os serviços – têm um peso significativamente mais importante do que as variáveis clínicas. O autor ressalta que um serviço de alta qualidade deverá ser permeável e dinâmico, com uma alta integração interna e externa.

Saraceno (1999) sublinha que “a organização (seja em termos de acesso da demanda, seja em termos da não estereotipia da resposta) orientada às necessidades do paciente e não às do serviço”. A integração interna dos serviços destinarem-se à burocratização estandardizada dos procedimentos. Entretanto, estaria centrada nas especificidades de cada pessoa.

A integração externa traduz-se como a permeabilidade do serviço aos saberes e aos recursos que circundam estes saberes e recursos e tal permeabilidade amplia-se também à ativação dos recursos. O autor entende que os empecilhos a serem demolidos são aqueles que não permitem a utilização de outros saberes e recursos.

Entre os princípios para a organização dos serviços de saúde mental, houve a necessidade do deslocamento essencial da perspectiva da intervenção dos hospitais psiquiátricos para a comunidade, o deslocamento do centro do interesse somente da doença para a pessoa e para a sua desabilidade social, além do deslocamento de uma ação individual para coletiva nos confrontos dos pacientes psiquiátricos.

Tanaka Ou (2006) analisa que

O objetivo de avaliar a atenção em saúde mental na atenção básica de saúde, foram realizados um estudo comparativo entre os diagnósticos de problemas de saúde mental feitos pelos pediatras e os prováveis problemas de saúde mental identificados por meio da aplicação de um questionário padronizado aos pais.

Assim, a reforma destaca-se por um movimento com a finalidade de intervir no então modelo vigente, buscando o fim da mercantilização da loucura para assim poder construir coletivamente uma crítica ao chamado saber psiquiátrico e ao modelo hospitalocêntrico na assistência aos pacientes psiquiátricos. O projeto de desinstitucionalização visou a reconstrução do objeto (enquanto sujeito histórico) que o modelo tradicional reduziu e simplificou (causalidade linear doença/cura-problema/solução).

Para o êxito desse projeto é necessário que as novas instituições estejam à altura do objeto que está em constante reconstrução na sua existência-sofrimento: esta é a base da instituição inventada e principalmente buscar a organização do quadro de recursos humanos com profissionais que atendam os pacientes com atenção e conhecimento.

CONCLUSÃO

Esta pesquisa teve como objetivo analisar a importância do profissional enfermeiro, a organização do CAPS, suas finalidades, a questão do paciente psiquiátrico e a legislação vigente. Concomitantemente, examinamos o histórico dos congressos e conferências sobre pacientes mentais.

A análise desenvolveu-se a partir de pressupostos teóricos concernentes à psiquiatria, considerando os aspectos estruturais e organizacionais dos CAPS, por meio dos textos disponibilizados pelo Ministério da Saúde.

Ficou evidenciado que a formação do profissional enfermeiro exige uma prática constante para o mundo multirreferencial e das perspectivas do desenvolvimento humano como forma de promover mudanças qualitativas nos segmentos sociais. Com a otimização dos serviços, os pacientes e suas famílias poderão obter resultado satisfatórios após o tratamento, que pode durar anos ou pode ser breve.

Vimos que o Ministério da Saúde brasileiro tem buscado organizar os CAPS com equipamentos, medicamentos e recursos humanos a fim de promover a dignidade da pessoa com necessidades psiquiátricas. Como o Brasil é signatário de programas internacionais, é possível renovar cada vez mais em prol do profissional que atua, do paciente que precisa de tratamento e de sua família que precisa de apoio.

Os resultados encontrados apontam para a necessidade de mudanças na formação profissional do médico, otimizando sua capacidade de diagnósticos precoces e encaminhamentos adequados, assim como a necessidade do aperfeiçoamento do processo de trabalho, no que tange ao atendimento em si, como na articulação entre as diferentes instâncias da rede.

No âmbito hospitalar, ambulatorial e da unidade básica de saúde, a concepção de saúde-doença é multifatorial e centrada no indivíduo, enquanto no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS).

Os autores que fundamentaram esta pesquisa concluem que o desafio é avançar no entendimento da concepção do processo saúde-doença e na formulação de processos de trabalho pautados no âmbito dos determinantes, por meio da compreensão de que a saúde mental também tem sua origem no âmbito da reprodução social e não somente nos resultados do processo saúde-doença.

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[1] Discente do curso de enfermagem da Faculdade São Lucas.

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Samite Araujo de Souza Corrêa

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