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Atuação da enfermagem na emergência psiquiátrica

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CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

MONTELO, Letícia Divina dos Santos [1], MELO, Gleyson [2]

MONTELO, Letícia Divina dos Santos. MELO, Gleyson. Atuação da enfermagem na emergência psiquiátrica. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 08, Vol. 04, pp. 66-81. Agosto de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/emergencia-psiquiatrica

RESUMO

Entende-se por emergência psiquiátrica qualquer situação de natureza psiquiátrica em que existe um risco significativo de morte para o paciente ou para outros, necessitando da atuação efetiva do profissional de enfermagem. Um atendimento caracterizado como emergência psiquiátrica exige a tomada de medidas imediatas para controlar a situação, o que pode limitar a possibilidade do diagnóstico psiquiátrico quando não há preparação adequada dos profissionais de enfermagem que farão a abordagem inicial do paciente. O objetivo deste artigo é identificar as características exigidas do enfermeiro para atuação nas emergências psiquiátricas. Trata-se de uma pesquisa descritiva, do tipo qualitativa, com coleta de dados em livros, revistas especializadas,  banco de dados eletrônico como o Scielo (Scientific Electronic Library Online) e a Biblioteca Virtual em Saúde (BVS). Os resultados da pesquisa mostraram que a participação efetiva dos enfermeiros se tornou elemento fundamental para o diagnóstico, tratamento e cura dos pacientes psiquiátricos.

Palavras-chave: Reforma psiquiátrica, emergência psiquiátrica, atuação da enfermagem.

1. INTRODUÇÃO

A emergência psiquiátrica se caracteriza por uma situação de crise, desestabilização emocional, perturbação, conflitos, desordem mental e angústia tanto para o paciente quanto para seus familiares (LIMA; GUIMARÃES, 2015).

Diante da perspectiva de morte, o atendimento ao paciente com transtornos psiquiátricos exige a intervenção imediata não somente de um enfermeiro, mas também de outros profissionais visando o diagnóstico, tratamento e possível cura do paciente (OLIVEIRA; SILVA, 2017).

A partir desta percepção é que foi desenvolvido o objetivo geral deste artigo: Identificar as características exigidas do enfermeiro para atuação nas emergências psiquiátricas. Os objetivos específicos foram: Conhecer o contexto em que ocorreu a reforma psiquiátrica no Brasil; descrever as dificuldades existentes no atendimento do paciente com transtorno mental; caracterizar a atuação do enfermeiro psiquiátrica.

Elegeu-se como problemática a seguinte questão: A atuação nas emergências psiquiátricas exige conhecimentos diferenciados da equipe multiprofissional, em especial, do enfermeiro. Diante desta constatação, quais são esses conhecimentos, e sobretudo, qual a importância da atuação da enfermagem no atendimento ao paciente psiquiátrico?

Para responder a problemática, desenvolveu-se a pesquisa descritiva, do tipo qualitativa, com coleta de dados em livros, revistas especializadas, banco de dados eletrônico como o Scielo (Scientific Electronic Library Online) e a Biblioteca Virtual em Saúde (BVS). Para a pesquisa bibliográfica, utilizou-se como descritores: Reforma psiquiátrica, emergência psiquiátrica e atuação da enfermagem. Para a coleta de dados fez-se um recorte temporal, ou seja, os dados se referem às publicações dos últimos 5 anos, publicados em português. Naturalmente foram excluídas as obras com mais de 10 anos de publicação e aquelas em língua estrangeira.

O estudo do tema em questão se justifica pelo fato de que os serviços de emergência psiquiátrica ocupam um lugar de estratégia como porta de entrada do paciente com transtornos mentais, em situação de crise e que a falta de atendimento e atendimento adequados pode levá-lo a óbito.

Espera-se com a pesquisa incentivar outros estudos e a reflexão sobre a importância da atuação do enfermeiro nas emergências psiquiátricas, uma vez que a efetiva integração de um serviço de emergência psiquiátrica é um fator decisivo para o tratamento do paciente e consequentemente sua cura (VEDANA, 2016).

2. METODOLOGIA

Alguns pressupostos, segundo Gil (2014) são imprescindíveis na escolha dos procedimentos metodológicos. Em primeiro lugar, essa escolha deve permitir uma descrição da realidade investigada de forma clara, objetiva e precisa. Em segundo lugar, as ações devem ser desenvolvidas de forma racional, pautando-se na organização e na criticidade.

Propôs-se neste artigo um estudo qualitativo, do tipo descritivo, a partir da revisão da literatura disponível sobre o tema, ou seja, análise de livros, artigos publicados em revistas especializadas e banco de dados da Internet, como o Scielo (Scientific Electronic Library Online) e Biblioteca Virtual em Saúde (BVS),  utilizando-se os seguintes descritores: Reforma psiquiátrica,  emergência psiquiátrica e atuação da enfermagem.

Gil (2014) ressaltou que por meio do levantamento bibliográfico, o mais importante não é a quantidade de fontes encontradas abordando o assunto pesquisado, mas o levantamento de informações precisas e relevantes relacionadas ao tema da pesquisa, em quantidade razoável afim de que possa ser lida, interpretada e analisada pelo pesquisador, resultando na construção de um referencial teórico que responda a questão norteadora.

Optou-se por um recorte temporal, ou seja, os dados foram pesquisados em obras publicadas nos últimos 5 anos e que estivessem disponíveis para leitura na íntegra, além de terem sido publicados em português, excluindo-se, portanto, as obras em língua estrangeira e publicações superiores a 5 anos.

A interpretação e análise destas obras resultaram em discussões em que a atuação da enfermagem na emergência psiquiátrica se configurou como principal objeto de pesquisa.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

3.1 REFORMA PSIQUIÁTRICA NO BRASIL

A desinstitucionalização iniciada na Itália no final da década de 70 serviu como parâmetro para a reforma psiquiátrica brasileira. Depois de analisar experiências bem-sucedidas nos Estados Unidos, o médico Franco Basaglia passou a desenvolver as políticas públicas de saúde mental italiana denunciando a situação dos manicômios e sua falência enquanto espaço terapêutico. Esse desmonte dos manicômios deu lugar a construção de um complexo de assistência mental comunitário e que ficou conhecido como desinstitucionalização (SILVA et al., 2017).

Os gestores públicos de saúde desse país argumentavam que não bastava apenas trocar o local de atendimento do paciente mental, mas também, conhecer suas necessidades, contexto de vida e promover um atendimento mais humanizado do paciente. O que se entendeu chamar de atendimento mais humanizado do paciente foi a transferência do campo de atuação da psiquiatria da doença mental para a saúde mental, partindo se do pressuposto de que nem o hospital tampouco o manicômio não consegue recuperar os pacientes (HEIDRICH, 2017).

O trabalho desenvolvido pelos gestores italianos levou à aprovação da lei n. 180, conhecida como Lei Basaglia, em 1978, prevendo a extinção de todos os manicômios italianos (HEIDRICH, 2017).

A desinstitucionalização faz parte de um processo complexo que envolve não apenas a retirada dos usuários dos hospitais, mas fundamentalmente, a construção de condições efetivas para um cuidado comunitário contínuo e qualificado para todos que necessitem de atenção e tratamento (FIOCRUZ, 2015, p.7).

A reforma psiquiátrica no Brasil iniciou-se em meados dos anos 70, no auge da crise do modelo de assistência centrado nos hospitais psiquiátricos e a partir das reivindicações da sociedade civil organizada a favor dos direitos dos pacientes psiquiátricos (PESSOA JÚNIOR et al., 2016).

Por se tratar de mudanças não apenas estruturais, mas também éticas, de comportamento, de atitudes, de políticas públicas e de atuação das equipes multiprofissionais responsáveis pelos pacientes diagnosticados com distúrbios mentais, a reforma psiquiátrica foi considerada como um “conjunto de transformações de práticas, saberes, valores culturais e sociais no cotidiano da instituições, dos serviços e das relações interpessoais e marcada por impasses, tensões, conflitos e desafios” (KINKER, 2017).

A reforma psiquiátrica proposta teve como protagonista o movimento dos trabalhadores em saúde mental (MTSM), formado por trabalhadores da área sanitária, associações de familiares, sindicalistas, membros de associações de profissionais e paciente com histórico de internações e que ousaram denunciar a violência nos manicômios, mercantilização de vagas em hospitais e hegemonia de uma rede privada de assistência que se caracterizava pelo modelo hospitalocêntrico na assistência às pessoas com transtornos mentais (PIAI, 2017).

Na década de 80, diversos fatores contribuíram para que a efetivação da reforma psiquiátrica estivesse na pauta das discussões, tanto na área política, quanto econômica e social. Na área política, a redemocratização instigou a sociedade para a reivindicação dos direitos humanos; na área econômica, o Brasil entrava num período de recessão obrigando os gestores públicos de saúde a repensarem os altos custos dos manicômios; na área social, os movimentos sanitário e direitos humanos se destacaram pela luta a favor da desinstitucionalização psiquiátrica (EMERICH, 2017).

No entanto, a reforma psiquiátrica no Brasil só se efetivou a partir de 2001 quando foi sancionada a lei n. 10.216  que redirecionou a assistência em saúde mental no país, privilegiando o oferecimento de tratamento em serviços de base comunitária e dispôs sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais (BRAGA; FARINHA, 2018).

Essa legislação representou o marco legal na luta pela reforma psiquiátrica no Brasil, estabelecendo as bases para a construção de uma rede substitutiva de cuidados aos pacientes mentais. A partir de então, os antigos manicômios e hospitais psiquiátricos, paulatinamente estão sendo substituídos pelos serviços extra-hospitalares  de cuidados em saúde mental, a exemplo do modelo italiano (HEIDRICH, 2017).

Ainda assim, o processo de desinstitucionalização de pacientes com longo histórico de internação só se iniciou no Brasil em 2002, a partir das normatizações do Ministério da Saúde e que determinou regras claras para a redução de leitos psiquiátricos nos hospitais brasileiros (BRAGA; FARINHA, 2018).

Para que de fato a redução de leitos psiquiátricos se efetivasse, o governo federal criou uma série programas dedicados a esta questão, como o Programa Nacional de Avaliação do Sistema Hospitalar/Psiquiatria; Programa Anual de Reestruturação da Assistência Hospitalar Psiquiátrica no SUS, assim como a instituição do Programa de Volta para Casa e a expansão dos Centros de Atenção Psicossocial e Residências Terapêuticas, todos estes Programas estão permitindo gradativamente a redução dos leitos psiquiátricos no Brasil e o fechamento de vários hospitais psiquiátricos (ANTUNES, 2014).

Assim, avanços têm ocorrido, como a criação do CAPS (Centros de Atenção Psicossocial). Estes Centros levam em conta no tratamento do paciente psiquiátrico, os aspectos sociais implicados no adoecimento psíquico, como os laços sociais e familiares, a relação com a vizinhança, os vínculos de trabalho, lazer e cooperação e troca de experiências.

Carvalho et al. (2014) ainda salienta que o CAPS deve ser considerado uma

das iniciativas mais relevantes na saúde mental uma vez que lida não apenas com o doente mental, mas também com a participação e a colaboração de seus familiares, amigos e cuidadores. Os CAPS incluem ainda ferramentas de construção e participação coletivas voltadas para reinserção do usuário na sociedade. Para tanto, é de suma importância que suas ações demonstrem interfaces que alcancem os aspectos subjetivos e particulares da pessoa doente para que possa assim, compreendê-lo no contexto geral que ele está inserido.

Por outro lado, há críticas ao modelo implementado através do CAPS, como a falta de estratégias de cuidado, leitos de retaguarda e investimento e treinamento de pessoal, para uma atuação mais efetiva do enfermeiro. Mas todas essas críticas são consideradas infundadas, diante dos benefícios que o tipo de assistência promovido pelo CAPS propicia ao paciente mental.

Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), dentre todos os dispositivos de atenção à saúde mental, têm valor estratégico para a Reforma Psiquiátrica brasileira. É o surgimento destes serviços que passa a demonstrar as possibilidades de organização de uma rede substitutiva ao Hospital Psiquiátrico no país (CARVALHO et al., 2014, p.39).

Sobretudo, a reforma psiquiátrica no Brasil está percorrendo um caminho importante com a desinstitucionalização e ao adotar uma organização de rede de serviços de atendimento considerado humanizado como o CAPS, que reconhece o direito ao tratamento e inserção social dos pacientes com transtornos mentais.

3.2 EMERGÊNCIA PSIQUIÁTRICA

Com a desinstitucionalização promovida pela reforma psiquiátrica, surgiu o questionamento sobre como seria realizado o tratamento dispensado aos pacientes em emergência psiquiátrica. Para esse tratamento é sugerido os serviços oferecidos pelos hospitais gerais. Estes hospitais, conforme a Portaria 3.088/2011 são considerados pontos de atenção para atendimento dos pacientes mentais e compõe a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) em substituição aos hospitais psiquiátricos.

Dados fornecidos pela Fiocruz (2015) esclareceram que há no Brasil 888 leitos de saúde mental habilitados em 187 hospitais gerais, mas nem todos eles estão aptos para atender a emergência psiquiátrica, seja por falta de equipamentos adequados, seja por falta de recursos humanos.

A utilização dos serviços de emergência dos hospitais gerais e acolhimento em leitos do CAPS  estão amparados na Política Nacional de Saúde Mental, preconizada na lei n. 10.2016/2001. Nesse sentido, é preciso esclarecer também que as emergências psiquiátricas seguem as diretrizes da portaria ministerial n. 224/1992 que estabelece, entre outras coisas, que as organizações de serviços baseados nos princípios da universalidade; hierarquização; regionalização e integralidade das ações; diversidade e métodos de técnicas terapêuticas nos vários níveis de complexidade assistencial; ênfase na participação social; controle e avaliação dos serviços prestados (SOUZA; SILVA; OLIVEIRA, 2016).

Os serviços de emergência psiquiátrica constituem unidade central para o funcionamento adequado de redes de saúde mental, tanto pelo manejo de situações de emergência, como pela regulação da rede em que se inserem, e enfatizam a necessidade de priorização desses serviços nas políticas de saúde pública brasileiras, para seu aprimoramento e efetividade (OLIVEIRA; SILVA, 2017, p.12).

Oliveira e Silva (2017) também esclareceram que a efetiva integração de um serviço de emergência psiquiátrica e os demais serviços de saúde mental é um fator decisivo para o correto diagnóstico do paciente e consequentemente, o tratamento mais adequado e eficiente.

Além disso, as emergências psiquiátricas em hospitais gerais oferecem um novo modelo assistencial, que possui como prioridades a manutenção e a integração do paciente na comunidade. Diante disso, esses serviços de emergências psiquiátricas no hospital geral surgiram como um importante auxiliador neste processo de atenção ao doente mental diante da reforma psiquiátrica. Estes possuem uma rede de atenção diversificada, descentralizada e integrada à rede de serviços de saúde (PRADO; CASTILHO; MIRANDA, 2015).

Essa reflexão exige ainda o entendimento do conceito de emergência psiquiátrica. Para Prado, Castilho e Miranda (2015), trata-se de alterações agudas no pensamento, do humor, do comportamento ou das relações sociais, portanto, requerem intervenção médica imediata, pois existe a possibilidade de evolução para o óbito do paciente. Outras características do paciente mental que necessita da emergência psiquiátrica são a fragilidade psíquica, perda de sua autonomia, dificuldades de sociabilidade, comprometimento psíquico e físico.

Menegon et al., (2018) conceituou emergência psiquiátrica como qualquer situação de natureza psiquiátrica em que o paciente mental desenvolva um risco significativo de morte ou dano grave, para o próprio paciente ou outras pessoas de sua proximidade, exigindo uma intervenção terapêutica.

Outra definição foi dada por Dias et al., (2014) esclarecendo que se trata de uma manifestação psíquica ou de comportamento que se caracteriza por risco iminente à integridade física do indivíduo ou outras pessoas próximas ou que entre em contato com este paciente. Mais ainda, a emergência psiquiátrica atende dois grupos: o primeiro grupo se refere às emergências cérebro-orgânicas, ou seja, aquelas que provocam rebaixamento da consciência. O segundo grupo se refere às emergências comportamentais, ou seja, aquelas que abrangem os comportamentos de diversas patologias psiquiátricas e de personalidade.

Diante de diversas mudanças no contexto psiquiátrico houve, portanto, um aumento no número de casos de pacientes sujeitos a crises descompensadas na comunidade. Para resolução de tal problemática é que foram criados os serviços de emergências psiquiátricas, que oferecem um atendimento rápido e ágil, com a proposta de caracterizar diagnósticos clínicos e psicossociais do quadro apresentado pelo paciente. Sendo assim, uma medida de intervenção imediata, que inclui também a orientação do tipo de tratamento com maior indicação para o caso em médio e longo prazo (PAIANO, 2016).

A emergência psiquiátrica é considerada uma situação de crise, de desestabilização, de perturbação, seja em aspecto individual ou coletivo. Diante desse quadro, é indispensável que haja uma intervenção imediata de uma equipe qualificada e multiprofissional, afim de evitar danos à saúde do paciente e a de terceiros (PAIANO, 2016).

É preciso um entendimento ainda sobre o termo crise psiquiátrica, motivos que levam ao paciente mental à emergência psiquiátrica. Esta crise se caracteriza por diversas situações que envolvem psicoses, idealizações, tentativas de suicídio, depressão e síndromes cerebrais orgânicas, podendo provocar desestruturação da vida social, familiar e psíquica do paciente (DEL-BEN et al., 2017).

A relação existente entre crise psiquiátrica e emergência psiquiátrica faz-se a partir do reconhecimento de que o paciente mental sofre de alterações psíquicas graves, acompanhadas ou não de comorbidades clínicas (DEL-BEN et al., 2017).

Estes autores defendem que as situações de crise se caracterizam pela grave sintomatologia aguda; grave ruptura de relações familiares ou sociais; recusa das intervenções, mas aceitação do contato com a equipe; recusa de qualquer forma de contato e situações emergenciais no contexto familiar ou social, ou ainda, impossibilidades pessoais de seu enfrentamento efetivo.

Outros autores como Brasil (2015) e  Ferigato (2018) explicaram que a crise psiquiátrica se torna de emergência quando a avaliação dos responsáveis pelo paciente aponta para situações de sofrimento emocional e psíquico e de comportamento, transtorno de afeto. Dessa forma, é importante e necessária a articulação entre os diferentes aspectos envolvidos numa situação de crise psiquiátrica, buscando sempre, a identificação e estadiamento de sua gravidade.

O atendimento às emergências psiquiátricas deve atender aos objetivos que são prioritários, como estabilização do quadro clínico, reconhecimento de patologias e alterações orgânicas que podem ter ocasionado as alterações mentais, estabelecimento de hipóteses diagnósticas e encaminhamento para continuidade do cuidado. Por se tratar de um momento crítico caracterizado pela fragilidade, principalmente quando o paciente passa por uma crise psiquiátrica, é relevante que o este e seus familiares recebam todas as informações necessárias para o atendimento efetivo (VEDANA, 2016).

3.3 ATUAÇÃO DO ENFERMEIRO NA EMERGÊNCIA PSIQUIÁTRICA

Constitui-se de um grande desafio para o profissional de enfermagem manter-se atualizado. O mercado de trabalho está cada dia mais competitivo e os pacientes, sejam eles os que necessitam dos serviços de emergência ou não, exigem informações e um tratamento mais efetivo para a doença, em especial, no que se refere à doença mental (AGUIAR, 2017).

Até antes da década de 80 não havia no Brasil a exigência para que o enfermeiro atendente nos serviços de emergência tivesse qualquer tipo de formação específica na área. No Brasil, os serviços emergência são caracterizados pelo número excessivo de pacientes, essa situação se torna pior ainda, pela falta de um espaço adequado para triagem, escassez de recursos financeiros, número insuficiente de profissionais com preparação para atuar na área específica de emergências psiquiátricas e falta de um protocolo de acolhimento que atenda em todas os hospitais gerais. Em alguns destes hospitais o protocolo está implantado, mas há uma resistência do enfermeiro por utilizá-lo de forma efetiva (AGUIAR, 2017).

Os enfermeiros que atuam especificamente nas emergências psiquiátricas devem ter sua atuar em consonância com as diretrizes da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Essas diretrizes consolidam um modelo de atenção aberto e de base comunitária, cuja proposta e a garantia de livre circulação dos pacientes mentais pelos serviços e comunidade das quais estes pacientes fazem parte (RIBEIRO et al., 2018).

Uma das dificuldades no atendimento psíquico de emergência pelos enfermeiros se refere à falta de treinamento e conhecimento dos profissionais para atuação na área de saúde mental. Ribeiro et al., (2018) esclareceu que após a formação inicial dos enfermeiros não há uma frequência na capacitação ou aperfeiçoamento nesta área, dificultando a prestação de serviços e cuidados à pessoa que demanda atenção em saúde mental.

Um fator importante nas emergências psiquiátricas é que é necessário o estabelecimento de uma relação da equipe profissional o mais próximo possível do paciente mental e de seus familiares, desenvolvendo um vínculo de confiança e respeito no qual o paciente se sinta acolhido e receba todas as informações necessárias para a efetivação do tratamento. Quando se trata de uma crise psiquiátrica, explicar os motivos e objetivos das medidas tomadas diminui a ansiedade destes pacientes, tranquilizando-os (CÉZAR; COELHO, 2017).

A atuação do enfermeiro se caracteriza inicialmente pela observação do comportamento do paciente em crise psiquiátrica, pois geralmente estes pacientes são agressivos e apresentam até mesmo dificuldades motoras. Essa observação inclui se há possibilidade de riscos para os indivíduos próximos. Nesse sentido, os familiares também podem contribuir com o enfermeiro, relatando o histórico de doença do paciente, uma vez que este não se encontra em condições de relatar qualquer tipo de informação sobre a doença ou tratamento realizado (DEL-BEN et al., 2017).

A abordagem à pessoa com transtorno mental em situação de emergência nos hospitais gerais é de tal importância que, se realizada com segurança, prontidão e qualidade é capaz de determinar a aceitação e a adesão dessa pessoa ao tratamento (KONDO et al., 2017).

A avaliação inicial do paciente psiquiátrico de emergência caracteriza-se por algumas particularidades, como tempo limitado para atendimento, tomada de decisão imediata e intervenções urgentes. No entanto, segundo Bel-Ben (2017), uma única avaliação não permite o diagnóstico definitivo dos motivos que levaram o paciente mental ao serviço de emergência. Recomenda-se que o paciente fique em observação por algumas horas para que se verifique a evolução dos sintomas e iniciada a terapêutica, é importante também a observação de possíveis efeitos colaterais.

O enfermeiro deve estar preparado também para realizar a contenção física, mas a recomendação de Kondo et al., (2017) é que esta seja feita em situações extremas em que há risco tanto para o paciente quanto para os profissionais. Geralmente, a contensão física é necessária para imobilizar os pacientes agressivos, agitados e que não conseguem acalmar-se facilmente.

Outro cuidado do enfermeiro se refere à verificação dos dados vitais do paciente. A importância dessa análise em conjunta com o exame físico e laboratorial do paciente com transtornos mentais se deve aos riscos de depressão respiratória, hipotensão e outros problemas causados pelo uso de medicações depressoras do sistema nervoso central e que são prescritas para paciente com comportamento agressivo (ELIAS, 2015).

Os cuidados aos pacientes atendidos em um serviço de emergência psiquiátrica estendem-se mesmo após o atendimento inicial. Por todo tempo o paciente deve permanecer em observação nas enfermarias. O enfermeiro deve desenvolver ainda a observação e descrição do comportamento do paciente, intervenção clínica, uso de medidas terapêuticas em enfermagem, atendimento de suas necessidades básicas, orientação ao paciente e seus familiares (PAES; MAFTUM, 2017).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ficou evidenciado na pesquisa que a reforma psiquiátrica brasileira iniciada em meados da década de 70 deu um novo impulso para os serviços de emergência mental. A criação da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) contribuiu para que houvesse uma maior preocupação com o atendimento ao paciente mental e seus familiares (ESTELMHSTS et al., 2018).

Não restam dúvidas de que o desinstitucionalização dos manicômios fez com que aumentasse a demanda de pacientes nos hospitais gerais, evidenciando também a necessidade de preparação, atualização e qualificação dos enfermeiros para atuação nestas instituições que atendem as emergências psiquiátricas (VELOSO, 2018).

Especificamente sobre a atuação do enfermeiro na emergência psiquiátrica, constatou-se que há um número grande de profissionais que não estão preparados para atuar nesta área, mas que essa realidade tem se modificado conforme os próprios enfermeiros se conscientizam de que o paciente com transtorno mental também necessita de um atendimento humanizado (BELLINI et al., 2019).

O resultado da pesquisa mostrou que além dos conhecimentos técnicos e científicos, os enfermeiros também precisam adquirir conhecimentos humanísticos, uma vez que sua atuação envolve pacientes com risco de vida, agressivos, dependentes e que muitas vezes não conseguem entender seu estado de saúde mental (COSTA; SILVA; CUNHA, 2018).

O mesmo ocorre com seus familiares. Neste momento de apreensão e dúvidas é natural que os familiares busquem informações sobre o estado de saúde dos pacientes. Nesse sentido, todas as informações necessárias devem ser dadas, esclarecendo sobre as condições reais de saúde do paciente, o tipo de tratamento realizado e perspectivas quanto à cura ou não (VARGAS, 2017).

Diante do exposto, espera-se que a pesquisa tenha contribuído para conscientizar os enfermeiros e demais interessados sobre o assunto, quanto a importância deste profissional no atendimento ao paciente mental, pois este profissional é considerado referência nas emergências psiquiátricas (VARGAS, 2017).

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[1] Graduação em Enfermagem, supervisora em hotelaria hospitalar na área administrativa no Anima Centro Hospitalar.

[2] Orientador. Professor do Curso de pós-graduação em Emergência e Urgência do CEEN,  26ª turma.

Enviado: Agosto, 2019.

Aprovado: Agosto, 2020.

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Leticia Divina Dos Santos Montelo

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