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As possibilidades de intervenção de profissionais de psicologia na prevenção e posvenção do suicídio

RC: 101185
554
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/psicologia/possibilidades-de-intervencao

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

ANDRADE, Letícia Ésther de [1], FERREIRA, Eduardo Priamo [2]

ANDRADE, Letícia Ésther de. FERREIRA, Eduardo Priamo. As possibilidades de intervenção de profissionais de psicologia na prevenção e posvenção do suicídio. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 06, Ed. 11, Vol. 06, pp. 166-181. Novembro de 2021. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/psicologia/possibilidades-de-intervencao, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/psicologia/possibilidades-de-intervencao

RESUMO

O presente trabalho trata-se de uma revisão bibliográfica da temática suicídio. Apesar dos últimos anos ter surgido um número maior de campanhas de prevenção, o suicídio ainda é visto como um tema a ser evitado. Tendo em vista este cenário, o presente artigo tem como questão norteadora: Quais as possíveis intervenções psicológicas para evitar a tentativa de suicídio? O objetivo deste estudo é proporcionar uma revisão bibliográfica da temática, realizando uma exposição das possibilidades de intervenções que podem ser realizadas por profissionais de Psicologia, utilizando a teoria cognitiva comportamental na prevenção do ato suicida até a posvenção do suicídio. Para tal, serão expostos o conceito de suicídio, os fatores de risco e de proteção para os indivíduos, a prevenção universal, a prevenção seletiva e a prevenção indicada. Além destas, as possibilidades de posvenção estarão presentes nesse estudo, visto que estas também podem ser consideradas um tipo de prevenção indicada. O suicídio é um ato que pode provocar emoções intensas nas pessoas envolvidas, entretanto, ele é evitável, desde que seja haja conscientização e que a saúde mental das pessoas seja cuidada de forma acolhedora.

Palavras-chave: Intervenção, Posvenção, Prevenção, Suicídio.

1. INTRODUÇÃO

Suicídio, segundo a definição da Sociedade Brasileira de Psiquiatria (2014), é um ato consciente, escolhido por alguém, tendo como objetivo a morte, porém é um ato ambivalente. Cometer suicídio não é algo recente, está presente na humanidade desde tempos remotos, tendo como causas fatores psicológicos, biológicos, culturais e ambientais. Essa mistura de fatores torna esse tema complexo e da ordem da saúde pública. (SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSIQUIATRIA, 2014).

Para Tavares (2019, p. 18), “o suicídio é um ato singular, individual, o mais pessoal dos atos e ao mesmo tempo, é um novelo de relações. O suicídio é um problema de saúde coletiva. É um problema nosso.”

O Brasil ocupa o 8° lugar na lista mundial de países que mais cometem suicídio por dia. Cerca de 30 pessoas por dia cometem suicídio (aproximadamente, pois pode ocorrer não notificação de casos), sendo os homens mais da metade das vítimas (9,198 homens e 2.623 mulheres no ano de 2012). A taxa entre jovens subiu 30% em 2012. (SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSIQUIATRIA, 2014).

Apesar da coleta de dados referentes ao suicídio, pode haver uma subnotificação dos casos, fazendo com que o número seja ainda maior, visto que em um acidente de trânsito, por exemplo, não é possível saber se a pessoa que estava dirigindo o veículo provocou um acidente de forma não intencional ou intencional – exatamente para conseguir se matar -, caso ela venha a óbito (ROCHA; LIMA, 2019)

Diante deste cenário, o presente estudo tem como questão norteadora: Quais as possíveis intervenções psicológicas para evitar a tentativa de suicídio? Para isto, foi realizada uma revisão bibliográfica da temática, tendo como objetivo realizar uma exposição das possibilidades de intervenções que podem ser realizadas por profissionais de Psicologia na prevenção do ato suicida até a posvenção do suicídio, que também pode ser consideradas um tipo de prevenção indicada.

Em relação às intervenções psicológicas no âmbito da prevenção, vários fatores precisam existir para que esta se torne eficaz.

O suicídio é sensível a estratégias de prevenção, especialmente quando se encontram ouvidos atentos, corações generosos, profissionais capacitados e qualificados em serviços de saúde, vínculos afetivos, decisão política e políticas públicas acolhedoras e inclusivas, dentre outras medidas. (TAVARES, 2019, p. 16)

Os elementos que envolvem o suicídio são classificados em dois tipos: os fatores de risco e os fatores de proteção. Os fatores de risco são os elementos que propiciariam um risco maior à possibilidade de um indivíduo cometer suicídio.

Os fatores de proteção, em contrapartida, são os fatores que visam diminuir as possibilidades de um indivíduo cometer suicídio. Esses fatores são os que focamos nesse artigo como as possibilidades de intervenção psicológica, visto que este é um tema vasto e complexo.

Para a Sociedade Brasileira de Psiquiatria (2014), reconhecer todos os fatores – de proteção e de risco – é de suma importância para que o profissional de saúde possa saber se um paciente apresenta riscos clínicos de desejar o suicídio, mas também para elaborar as estratégias de intervenção psicológica ou psiquiátrica.

Segundo Turecki (1999), é bastante conhecida e estudada a relação entre o transtorno mental e o suicídio, deixando claro que o transtorno psiquiátrico tem grande relevância no risco de se cometer o ato. Também existem fortes evidências de que existe um fator comum entre a maioria dos sujeitos que cometem suicídio, que “é a presença de comportamentos impulsivos e impulsivos-agressivos” (TURECKI, 1999, p. 2)

Diante disso, torna-se necessário o estudo e intervenções psicológicas da / para a prevenção do suicídio e da/para a posvenção utilizando-se a abordagem teórica cognitiva comportamental.

2. PREVENÇÃO

A temática suicídio traz consigo várias ideias equivocadas que acabam por prejudicar as possibilidades de intervenções de prevenção.

No mundo todo, por bases religiosas e morais, o suicídio foi considerado por vários séculos uma atitude extremamente errada, criando vergonha nas pessoas. Essa vergonha gerou um tabu na nossa cultura, dificultando as estratégias de intervenção que preveniriam o ato. Como profissionais da saúde também estão inseridos na mesma cultura, acabam por também ter tabu em relação ao suicídio, que por muitas vezes acham que são casos isolados na sociedade, não dando atenção ao fenômeno.  (SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSIQUIATRIA, 2014)

Como o suicídio envolve questões individuais, sociais e culturais, torna-se necessário criar estratégias de prevenção que englobem do nível mais amplo ao nível mais específico. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (2012, p. 16), “O objetivo (…) é eventualmente promover, coordenar e apoiar planos e programas de ação intersetoriais apropriados para a prevenção de comportamentos suicidas em níveis nacional, regional e local.”

As vulnerabilidades podem aparecer em níveis diferentes e serem fatores a trabalhar nas prevenções universal, seletiva e indicada, pois que interagem entre si. (ORGANIZAÇAO MUNDIAL DE SAÚDE, 2012).

2.1 TIPOS DE PREVENÇÃO

Segundo Tavares (2019, p. 20), “todas as formas de prevenir os impulsos suicidas são bem-vindas, por propiciarem uma nova chance de reflexão, uma nova possibilidade de elaboração para aquele sujeito.”

No que tange à nível nacional, os programas de ação promoveriam conscientização sobre o suicídio, reduziria o preconceito, melhoraria a coleta de dados – e consequentemente – a pesquisa acerca das intervenções que surtiram efeito positivo na população. Outros três fatores também são importantes, como políticas que reduzam os meios de se cometer suicídio, o uso abusivo de álcool e auxiliar práticas midiáticas a serem responsáveis com a forma de apresentar notícias com essa temática. (ORGANIZAÇAO MUNDIAL DE SAÚDE, 2012).

No Brasil, o meio mais usado pelos homens para cometer suicídio é o enforcamento, seguido pelo uso das armas de fogo. O estatuto do desarmamento dificulta a morte por essa via. Entretanto, a estimativa era de que até 80% da população teria autorização para ter uma arma de fogo em sua residência. Essa proposta foi o oposto do que é “(…) preconizado mundialmente como estratégias de redução de violência, entre elas a auto infligida”. (TAVARES, 2019, p. 20).

Em relação à mídia, é importante orientar quanto á linguagem utilizada, devendo preconizar uma forma não sensacionalista do fenômeno, fornecendo informações como onde buscar ajuda e não mostrando imagens e o método utilizado para tal ato. (ORGANIZAÇAO MUNDIAL DE SAÚDE, 2012).

A prevenção nas comunidades é um tipo de prevenção relativamente específica, é chamada de prevenção seletiva. Nesse tipo de prevenção, o foco é prevenir o suicídio em populações que apresentem certo grau de vulnerabilidade, sendo esse um campo de atuação dos profissionais de Psicologia. Vulnerabilidades são características ou situações que poderiam aumentar as chances de um indivíduo ou grupo cometer suicídio, baseando-se em “(…) características sociodemográficas, distribuição geográfica, ou prevalência de distúrbios mentais e devidos a uso de substâncias, dependendo da contribuição destes diversos fatores para a carga geral de suicídio.” (ORGANIZAÇAO MUNDIAL DE SAÚDE, 2012, p.17-18).

A prevenção indicada é um tipo de prevenção ainda mais específica: é realizada com indivíduos que apresentam algum tipo de comportamento ou pensamento suicida. Alguns exemplos são: Tentativa anterior de suicídio, transtornos psicológicos, vícios, dores crônicas, crenças religiosas em que suicídio é um ato nobre, histórico de violência sofrida anteriormente, dificuldade de acessos à tratamentos de saúde em geral, facilidade de acesso às formas de se cometer suicídio, dificuldades financeiras e desesperança. (ORGANIZAÇAO MUNDIAL DE SAÚDE, 2012). Nestes casos, é imprescindível o acompanhamento psiquiátrico e psicológico da pessoa, porque ela se encontra como um potencial suicida. Além do acompanhamento profissional, é necessário que a família, os amigos e demais pessoas de seu círculo mais pessoal possam se unir para que o tratamento seja mais eficaz.

Segundo a OMS (2000), a atenção primária à saúde é fundamental na prevenção dos suicídios, por se tratar de um problema de saúde pública, em que a capacitação e a abordagem para identificação e atenção de um possível indivíduo que passe por determinado problema. A atenção primária possui um contato bem próximo com a comunidade, com familiares e amigos, sendo um elo fundamental entre a comunidade e a prevenção do suicídio e na identificação de transtornos mentais.

O suicídio é um fenômeno que envolve várias causas, tornando-o complexo. Um exemplo da complexidade é a dificuldade dos profissionais de saúde em entender a diferença entre transtornos psicológicos e transtornos psiquiátricos. O sofrimento psicológico é uma dor de viver, uma dor em resposta às violências sofridas, às questões individuais e sociais. Os transtornos psiquiátricos podem estar ou não envolvidos. Somente quando estão envolvidos é que deve se fazer uso de medicações, não prescrevendo-as sem analisar antes a presença dos fatores sociais. Os tratamentos preventivos do suicídio devem ser baseados na complexidade de fatores envolvidos. (TAVARES, 2019).

Segundo Kingdom et al. (2010) o vínculo que existe entre desesperança e suicídio é forte, visto que, se um indivíduo, que perde toda a esperança e só consegue enxergar dor, sofrimento e desespero em seu futuro, o suicídio passa a ser uma opção de evitar essa angústia que lhe consome. O tratamento com a TCC busca utilizar-se da boa relação paciente-terapeuta para que se consiga trazer de volta esta esperança e educar o paciente a enxergar com mais otimismo sua realidade ou a tentativa de sair desta. O tratamento é estruturado e com metas realistas, abordando diretamente o pensamento suicida, utilizando-se da identificação de pontos fortes e crenças nucleares positivas para que os pacientes recuperem sua esperança e enxerguem novamente possibilidades de mudança. Os métodos da Terapia Cognitiva Comportamental (TCC) se mostraram bastantes eficazes na redução da desesperança e dos riscos de suicídio, através de um plano antissuicídio específico, assim, aumentando a eficácia para a redução do ato. As principais características dos planos antissuissídicos são citados abaixo:

Identificar motivos específicos para viver.

Concordar colaborativamente com precauções de segurança.

Comprometer‑se a entrar em contato/telefonar para uma pessoa específica (fazer uma lista de contatos).

Comprometer‑se a entrar em contato com o terapeuta ou obter outro auxílio (fazer uma lista de contatos).

Bloquear ou reduzir o acesso a armas ou outros perigos (p. ex., pedir a um membro da família para guardar todas as medicações e fornecer a dose para apenas um dia de cada vez).

Identificar cognições e comportamentos adaptativos que auxiliem o paciente a combater o desespero, a ansiedade ou outros sintomas.

Desenvolver estratégias de enfrentamento para possíveis desencadeadores de pensamento suicida aumentado.

Anotar o plano e revisa‑lo com frequência. (KINGDON et al., 2010, p. 128)

A devida aplicação das técnicas de TCC para regular o ciclo do sono e vigília resultam em efeitos positivos na energia, interesse e outros sintomas da depressão. A TCC também trabalha a autoestima, inclusive de pacientes com esquizofrenia. (KINGDON et al., 2010)

2.2 FATORES DE RISCO ESPECÍFICOS EM JOVENS E IDOSOS

A atual organização social em que vivemos organiza o modo de viver das pessoas em dois tipos: as pessoas de sucesso e de fracasso. Esse sucesso e esse fracasso são vistos como responsabilidade dos próprios sujeitos, desresponsabilizando o Estado dos direitos e proteção de cada indivíduo, registrando nas subjetividades uma ideia de que as pessoas estão sozinhas e só depende delas tanto o sucesso quanto o fracasso. (TAVARES, 2019, p. 19).

Seguindo essa linha de raciocínio, Tavares (2019) defende que em nossa sociedade tecnológica, forma-se subjetividades competitivas e isoladas, onde aceita-se tanto discursos de ódio quanto de intolerâncias, sendo a morte vista como um fracasso, logo, morrer é o oposto de ser ter sucesso.

Os adolescentes são indivíduos que estão no tempo fazer escolhas para a vida presente e futura, afirmar suas vontades. Não sabem se cedem ao padrão vigente ou se buscam afirmar suas características individuais. Se não houver possibilidades de diálogo nessa etapa da vida, tendo apenas como companhia o mundo virtual, alguns podem encontrar no suicídio a forma de se livrar das dúvidas e angústias que os cercam (TAVARES, 2019)

De acordo com Friedberg e McClure (2004), casos em que crianças e adolescente deprimidos que cogitam e/ou tentam se ferir exigem que esta questão seja tratada ativamente. O entendimento da “ideação suicida como uma estratégia de resolução de problema mal adaptativa” (FRIEDBERG; MCCLURE, 2004, p. 153) foi fundamental para que a terapia tivesse bons resultados. O terapeuta precisa se sentir à vontade e seguro para questionar as crianças sobre pensamentos e comportamentos suicidas e elas sintam-se seguras para responder.

O tratamento utilizando a terapia cognitiva para jovens com ideações suicidas resulta de avaliação cuidadosa. O trabalho com os pais responsáveis é fundamental, com a orientação da retirada do alcance de qualquer coisa que possa ser usada pela criança para se ferir (facas, armas de fogo, remédios), seguindo com a terapia e suas estratégias para que a criança possa seguir um desenvolvimento saudável.

Hoje uma das angústias que mais afligem os adolescentes é o Bullying.

A Constituição, na forma da Lei 13.185/2015, define a prática de bullying como qualquer ato de violência, com intenção e repetição sistemática, seja contra um único indivíduo ou até mesmo contra um grupo. Essa lei engloba as definições – e exemplos de ocorrências – dos ataques às vítimas nos âmbitos “verbal (…), “moral”, “sexual”, “social”, psicológica (sic), “físico”, “material” e “virtual”. Prevê também sobre punição e conscientização, sendo esse segundo aspecto o priorizado.

Segundo Albino; Terêncio (2012), existem muitas correntes sobre como o “bullying” incide sobre crianças e adolescentes, especificamente no ambiente escolar. Podendo ocorrer inclusive na relação professor/aluno.

O bullying pode ocorrer com comportamentos passíveis de observação direta na forma de agressão física, roubo, obrigações sexuais ou servis ou a ameaça de algum desses. Pode ocorrer através de insultos, apelidos, comentários e expressões racistas, ataques homofóbicos ou qualquer expressão ou comentário que desqualifique outra pessoa. Há também uma forma sutil, que acontece sem ataques diretos ao indivíduo, mas através de boatos, exclusão sistemática ou prejudicando-a socialmente. (MARTINS, 2005)

O uso da internet e das redes sociais para a prática do denominado “cyberbullying” ou “bullying virtual” como previsto na Lei 13.185/2015, citada anteriormente, se trata do bullying praticado utilizando a tecnologia. Este tipo tem prejudicado muitas pessoas. Com o agravante de se disseminar mais facilmente um boato, uma foto ou um vídeo, muitas vezes chegando ao conhecimento de um número incalculável de acessos. (ALBINO; TERÊNCIO, 2012).

Nos dias de hoje vemos uma desvalorização das experiências de vida e uma perda de importância na sociedade nos indivíduos que não geram mais renda. Os idosos de hoje tiveram em sua vida jovem e adulta uma visão de vida em que sua vida pessoal era muito atrelada ao trabalho, gerando identificação e sentido de vida. A aposentadoria faz com que esses indivíduos percam parte do sentido de viver, que, quando atrelada ao abandono familiar, medo de dores, dificuldade de aceitar o próprio envelhecimento e de familiares, pode gerar o pensamento de ter se tornado um peso para a família. Esse pensamento/sentimento é o principal fator atrelado ao suicídio dos idosos. (TAVARES, 2019). A psicoterapia com idosos pode ser feita buscando técnicas e estratégias de prevenção que visem trabalhar essas questões que os angustiam, ressignificando essa etapa natural da vida.

Outra face desse problema é a subnotificação. Essa lacuna existente nos dados estatísticos vai além dos problemas com base administrativa. O suicídio, para ser declarado tem que transpor vários estigmas e preconceitos, como o social e o familiar, além dos aspectos religiosos. (RIBEIRO; MOREIRA, 2018)

2.3 FATORES GERAIS DE PROTEÇÃO

Em relação aos fatores de proteção que auxiliariam a / na prevenção de suicídio, é importante citar:

Fortes conexões com a família e apoio da comunidade; aptidões na solução de problemas, solução de conflitos e tratamento não violento de disputas; crenças pessoais, sociais, culturais e religiosas que desincentivam o suicídio e apoiam a autopreservação; buscar ajuda e acesso fácil a assistência de qualidade para doenças mentais e físicas. (ORGANIZAÇAO MUNDIAL DE SAÚDE, 2012, p. 17).

O meio mais utilizado pelas mulheres para cometer suicídio é a ingestão de medicamentos – “(…) barbitúricos, antidepressivos, tranquilizantes entre outros” (TAVARES, 2019, p.20) que podem ser prescritos por qualquer médico (a) especializado (a).

Caso esses (as) profissionais só decidam prescrever tais medicações após o acompanhamento regular de pacientes, poderá evitar o estoque de medicações em suas residências.

Especificando o papel da Psicologia na prevenção universal/geral do suicídio,

À Psicologia comprometida socialmente cabe ações em todos os níveis de prevenção ao suicídio, que incluem o cuidado e atenção aos sujeitos em profunda dor, sobreviventes, pessoas que já tentaram, vítimas de abuso, de preconceito, às mais diversas formas de vulnerabilidade e às diversas formas de violência, às intervenções psicossociais e de gestão. Interessa a construção de saídas coletivas, multiprofissionais, com o envolvimento do máximo possível de autores, num processo de construção de espaços de fala e de construção e reconstrução de narrativas. A Psicologia colabora na desconstrução de mitos, de superação de tabus, no enfrentamento às várias violências. (TAVARES, 2019, p. 22)

3. POSVENÇÃO

Posvenção é o nome dado à(s) intervenção(ões) realizada(s) após um suicídio consumado.

O luto é uma experiência natural como reação à uma perda simbólica como um projeto não realizado ou concreta como no caso do falecimento de um ente querido, perpassando aspectos diferentes na subjetividade. (ROCHA; LIMA, 2019)

Segundo a Organização Mundial de Saúde (2012), sobrevivente é qualquer pessoa de convívio da pessoa suicida, como familiares próximos, colegas de trabalho e amigos. Os sobreviventes são considerados um grupo de vulnerabilidade e, intervir com estes, permite conscientização sobre a depressão e os comportamentos suicidas. Para Basso; Wainer (2011), a vulnerabilidade está envolvida com sentimento de incapacidade, de perdas anteriores e de crenças sobre a morte em si, gerando uma desorganização e uma grande dificuldade de readaptação perante uma perda repentina.

Em se tratando da morte, as pessoas mais próximas da pessoa falecida, normalmente não irão passar por essa fase indiferentes, ao contrário, irão passar por sentimentos variados. Quando a morte é inesperada, além da tristeza natural ocorrem sentimentos como culpa, raiva, depressão e ansiedade de forma mais intensa do que quando a morte vem como consequência de uma doença (BASSO; WAINER, 2011).

O trabalho com grupos de sobreviventes acaba por ser também um trabalho de prevenção de suicídio, visto que uma pessoa vivendo um luto mais intenso pode desenvolver depressão, sendo essa uma das – senão a principal – causa do suicídio.

Basso; Wainer (2011) ao falarem sobre o processo de luto, alegam que mesmo quando a perda de um ente querido pode ser preparada previamente ela envolve uma variedade de sentimentos e mudanças na vida dos mais próximos, alterando as emoções e a própria vida. Ressaltam que a perda abrupta trará uma alteração ainda maior nas pessoas, dificultando a capacidade de resposta emocional frente a essa situação.

Segundo os autores, para trabalhar frente ao sofrimento da morte inesperada, o psicólogo irá priorizar o acolhimento e a escuta da pessoa enlutada. A Terapia Cognitiva Comportamental, por ter um enquadre breve, estruturado e mais focal pode contribuir na elaboração do luto e seus sintomas. Durante a psicoterapia os pensamentos desadaptativos e/ou disfuncionais independente da intensidade e da ordem que aparecerem podem ser trabalhados com estratégias de enfrentamento empáticas. (BASSO; WAINER, 2011).

Como exemplo de estratégias no tratamento do luto, podem ser citadas a resolução de problemas, o automonitoramento, o treino de habilidades sociais, estratégias de coping, reestruturação cognitiva e a prevenção à recaída. Entretanto, técnicas e outros instrumentos terapêuticos podem e devem ser utilizados de acordo com cada caso. (BASSO; WAINER, 2011).

O suicídio é uma morte violenta, não esperada, repercutindo em pessoas que conviviam com o (a) falecido (a), tanto no âmbito familiar, quanto no âmbito social.

Os enlutados por suicídio sentem não só tristeza e saudade, como no luto por outros tipos de morte, mas também vergonha e culpa. Esses sentimentos juntos podem fazer com que os sobreviventes sofram muito – talvez até mais do que se a pessoa falecida tivesse morrido por outra causa. (BASSO; WAINER, 2011; ROCHA; LIMA, 2019)

As intervenções que podem ser realizadas por profissionais da Saúde de um modo geral e por profissionais da Psicologia com os sobreviventes envolvem acolhimento, auxílio na elaboração do luto, prevenção de suicídio dos enlutados. Além disso, é de suma importância que realizem “(…) estudos e investimentos em posvenção para capacitação dos profissionais” (ROCHA; LIMA, 2019, p. 323)

De acordo com Rocha; Lima (2019), outros profissionais de saúde trabalham em parceria com a Psicologia nas atuações junto aos sobreviventes, principalmente psiquiatras. Estes profissionais em alguns momentos podem intervir inclusive da mesma forma que psicólogas (os), frisando que “(…) é importante que os sobreviventes recebam suporte especializado” (p. 336).

De acordo com Rocha; Lima (2019), é necessário não só acolher os enlutados por suicídio, mas também compreender cada sujeito em sua individualidade, respeitando as necessidades que cada um pode ter de acordo com suas experiências de vida. Os objetivos das intervenções com esse grupo são: permitir um espaço de ressignificação dos sentimentos e uma busca de uma nova forma de viver, apesar do que ocorreu.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nos últimos anos, houve um aumento nas taxas de suicídio, mas também uma tentativa maior de o prevenir. As estratégias atuais de prevenção universal podem contribuir para a queda progressiva desse fenômeno, porém é necessário que se amplie as estratégias de prevenção seletiva e indicada, bem como as estratégias de posvenção. Esta última é pouco vista no cotidiano e menos praticada. Como a cada suicídio várias pessoas são afetadas, torna-se necessário que estas pessoas também devam ser acolhidas por profissionais da saúde, sejam da Medicina, Enfermagem ou Psicologia (grupos estes de profissionais que normalmente tem mais acesso aos enlutados) para encaminhamento e/ou acompanhamento, tanto para evitar que cometam suicídio quanto para evitar psicopatologias.

Os profissionais de saúde (física e mental) necessitam de formação complementar específica para prevenção e posvenção do suicídio devido a multifatorialidade da temática. O Estado pode fornecer e incentivar programas de formação continuada de forma periódica, voltada para cada região, analisando as características da população a ser atendida.

É necessário que seja pensado e posto em prática algum programa de capacitação de profissionais da mídia. Esse programa deveria englobar orientações para que ao noticiarem alguma notícia de suicídio, que não incentivassem e não fornecessem informações para o grande público que facilitasse o ato, e principalmente, informando que é possível evitá-lo. Mídias televisivas e virtuais, por exemplo, poderiam informar os locais públicos que fornecem suporte psicológico para quem sofre de vícios, dependências químicas, vítimas de violências e depressão. Sendo está uma possibilidade de prevenção em uma localidade específica, mas não menos importante.

Os adolescentes vivem uma fase da vida em que buscam, ao mesmo tempo, ser diferentes, mas ser iguais aos outros adolescentes da mesma idade; essa fase conflituosa acaba por levar a um sofrimento que sem apoio pode levar uma parcela ao suicídio. Apoio este que precisa ser buscado na família, nos círculos de amizade e em profissionais devidamente capacitados, posto que o mundo virtual não é capaz oferecer o suporte necessário.

Os idosos passam por uma nova época social, em que muitas relações familiares não se baseiam em busca de orientações e ajuda nos mais velhos da família, e sim no mundo virtual; ficando isolados. Outro ponto importante, é que esses sujeitos não foram preparados para enfrentar o envelhecimento natural – nem as gerações anteriores.  Esses fatores, atrelados às vulnerabilidades que podem estar vivendo, tornam os idosos um grupo de risco para o suicídio.

Para se expor essa temática, é necessário que haja cada vez mais estudo teórico para profissionais e divulgação do conhecimento para a população. Somente com o envolvimento de todos os grupos sociais será possível vislumbrar uma diminuição das taxas de suicídio na população. Profissionais da Psicologia podem realizar essa “ponte” entre ciência e comunidades, facilitando o acesso à informações sobre fatores de risco e sinais de pensamentos suicidas, promovendo uma desmistificação dessa temática. Pessoas bem-informadas se tornam multiplicadoras de conhecimento e promovem proteção à indivíduos que cogitam a hipótese de suicídio. Dessa forma, gradativamente, será possível uma mudança na história brasileira no que tange a essa complexa temática.

A maior permanência no mundo virtual, que se tornou uma realidade, aumentou as chances de se praticar ou ser vítima de bullying virtual.  Para evitar que isso aconteça é necessário que e supervisionar o acesso, principalmente dos usuários mais novos. O cyberbullying é um fator de risco para o suicídio, que apesar dos estudos já realizados, necessita de mais espaço na própria literatura e na divulgação da sua gravidade, para que uma maior parcela da população possa compreender e agir sobre essas ações.

Aos indivíduos que têm acesso à psicoterapia, a abordagem Cognitiva-Comportamental se mostra um caminho com grandes possibilidades de intervenção, tanto às pessoas com tendência suicida quanto às pessoas que perderam um ente querido para o suicídio. Nessa corrente teórica, os atendimentos são estruturados de acordo com cada caso, existindo técnicas e estratégias de acordo com as idades e as fases em que o sujeito se encontra. O suicídio pode ser evitado, desde que a saúde mental ganhe mais visibilidade e seja mais acessível.

REFERÊNCIAS

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BASSO, Lissia Ana; WAINER, Ricardo Wainer. Luto e perdas repentinas: Contribuições da Terapia Cognitivo-Comportamental. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas. Porto Alegre – RS. Vol. 7 nº 1 – jan. / jun.  de 2011. Disponível em: https://www.rbtc.org.br/detalhe_artigo.asp?id=138 Acesso em 10 de ago. de 2021.

BRASIL, Lei nº 13.185, de 6 de Novembro de 2015. Institui o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (Bullying). Diário Oficial da União. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13185.htm Acesso em: 05/08/2021.

FRIEDBERG, Robert D; MCCLURE, Jessica M. A prática clínica de terapia cognitiva com crianças e adolescentes. Porto Alegre: Artmed, 2004.

KINGDON, David G; TURKINGTON, Douglas; WRIGHT, Jesse H. Terapia cognitivo-comportamental para doenças mentais graves. Porto Alegre: Artmed, 2010.

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[1] Graduação em Psicologia.

[2] Graduação em Psicologia.

Enviado: Abril, 2021.

Aprovado: Novembro, 2021.

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