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Cimentos biocerâmicos: uma nova perspectiva em endodontia

RC: 108405
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CONTEÚDO

ARTIGO DE REVISÃO

PINTO, Lara Garrido [1], VIDAL, André Luis Araújo [2]

PINTO, Lara Garrido. VIDAL, André Luis Araújo. Cimentos biocerâmicos: uma nova perspectiva em endodontia. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 07, Ed. 03, Vol. 02, pp. 142-153. Março de 2022. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/odontologia/cimentos-bioceramicos

RESUMO

Os biocerâmicos são materiais inorgânicos com características de bioatividade, ou seja, capacidade de integrar com os tecidos e estruturas do organismo ao qual está em contato. Especialmente na Endodontia, os biocerâmicos são empregados na indução e formação de tecido mineralizado, em casos de pulpotomias, rizogêneses incompletas e reabsorções radiculares. Recentemente, surgiram os cimentos endodônticos com propriedades biocerâmicas.  Neste contexto, o presente artigo, tem como questão norteadora: O uso dos biocerâmicos realmente apresenta propriedades no vedamento radicular quando comparado a outros materiais? O objetivo é realizar uma revisão bibliográfica sobre as características específicas desses cimentos. Os estudos mostram resultados promissores com cimentos endodônticos, principalmente quanto à biocompatibilidade e efeito de biomineralização. Concluiu-se que a melhor propriedade dos cimentos biocerâmicos, comparado a outros materiais obturadores, é representada pela sua bioatividade e por serem materiais considerados hidrofílicos, ou seja, podem agir mesmo em meios úmidos, sendo esta uma característica que se espera de um material que seja considerado ideal para a utilização em sistemas de canais radiculares.

Palavras-chave: Cimento endodôntico; barreira mineralizada; obturação radicular.

1. INTRODUÇÃO

Durante o tratamento endodôntico, diversos fatores podem influenciar no sucesso ou insucesso do mesmo. Cada fase que antecede à outra pode comprometer um bom prognóstico, fazendo-se necessário o máximo de atenção em cada etapa do tratamento, desde a exploração inicial até o material utilizado para o selamento do canal radicular (OLIVEIRA, 2014). Um bom prognóstico requer, além da eliminação de micro-organismos e da infecção bacteriana local, a seleção de um material obturador que cumpra alguns requisitos importantes. A falha no selamento apical e lateral pode permitir o acesso de micro-organismos, ocasionando deficiências no resultado do tratamento endodôntico e no reparo das alterações periapicais (ANACLETO, 2012; LOPES e SIQUEIRA, 2015).

Segundo Candeiro et al. (2012), o que vai determinar o sucesso de uma obturação é, além da técnica, o material obturador, uma vez que características como propriedades físicas, químicas e biológicas devem ser consideradas. O material ideal para o selamento dos canais radiculares é aquele que apresenta biocompatibilidade com os tecidos perirradiculares, boa capacidade de escoamento para atingir áreas de difícil acesso, propriedades antimicrobianas, adesão e tempo de trabalho adequado (HADDAD; AZIZ, 2016).

Neste sentido, situações que interferem na qualidade do selamento final do canal têm sido um desafio para os profissionais que miram na qualidade do tratamento. Dentes que apresentam formação incompleta da raiz possuem a anatomia apical aberta, o que dificulta a ancoragem do cone de obturação, podendo ocasionar um selamento insuficiente ou extravasamentos excessivos de material para o periodonto apical durante a sua compactação. Da mesma forma, comunicações com o periodonto causadas por reabsorções radiculares ou perfurações iatrogenias necessitam de vedação para que não comprometam a qualidade da obturação radicular por meio da infiltração de fluidos contaminados (LOPES E SIQUEIRA, 2015).

Ao longo dos anos, a endodontia vem evoluindo e se aprimorando não só nas técnicas de limpeza e modelagem dos canais, como também nos materiais utilizados para a vedação e obturação radicular nas mais diversas situações clínicas. Materiais como amálgama, cimento de ionômero de vidro, cimentos à base de resina e óxido de zinco-eugenol estão sendo substituídos por apresentar desvantagens como toxicidade, sensibilidade à presença de umidade e infiltração bacteriana (OLIVEIRA, 2014).

Os materiais biocerâmicos têm sido alvo de pesquisas na odontologia. É um material à base de silicato, com presença de alumina, zircônia, hidroxiapatita, fosfato de cálcio, silicato de cálcio e cerâmicas de vidro, elementos que se tornam bioagregados quando em contato com os tecidos. No uso endodôntico, os cimentos biocerâmicos são de fácil manipulação e possuem características e propriedades importantes como biocompatibilidade, estabilidade dimensional, alto pH, ao mesmo tempo que são antimicrobianos e bioativos (KOCH et al., 2010). Inicialmente, esses cimentos eram utilizados na indução da formação de tecido mineralizado em casos de pulpotomias, rizogêneses incompletas e reabsorções radiculares, assim como em perfurações iatrogênicas. Mais recentemente, tem sido empregado também como cimento obturador dos canais radiculares, apresentando características que evidenciam suas vantagens quando comparado a outros materiais para uma mesma finalidade. Sua característica hidrofílica permite que sejam utilizados na presença de umidade, sem que suas propriedades físicas e químicas sejam afetadas. Esta característica associada à leve expansão no momento de presa torna os cimentos biocerâmicos mais eficazes contra a percolação da obturação radicular, proporcionando previsibilidade ao tratamento (DEBELIAN e TROPE, 2016).

Neste contexto, o presente artigo tem como questão norteadora: O uso dos biocerâmicos realmente apresenta propriedades no vedamento radicular quando comparado a outros materiais? O objetivo deste artigo é realizar uma revisão bibliográfica sobre as características específicas desses cimentos.

2. REVISÃO DE LITERATURA

2.1 HIDRÓXIDO DE CÁLCIO – PASTA LC

Quando falamos de cimentos biocerâmicos, iniciamos o assunto com o hidróxido de cálcio, o material que pode ser considerado o precursor dos materiais com bioatividade na odontologia. Suas propriedades derivam da dissociação iônica dos íons cálcio e hidroxila, apresentam ação antimicrobiana (pH alcalino – 12,8), ação anti-inflamatória (ação higroscópica), poder de dissolução de matéria orgânica, poder de indução do reparo por tecido mineralizado e inibição da atividade osteoclástica (LOPES E SIQUEIRA, 2015).

Os mecanismos de ação da pasta LC são diversos. A separação iônica promove a ativação de enzimas como a fosfatase alcalina, de modo a estimular a formação de dentina secundária. A liberação de íons hidroxila promove elevação do pH do meio, alterando as propriedades da membrana citoplasmática bacteriana, o que prejudica as funções fundamentais como o metabolismo, o crescimento e a divisão celular (MARÃO, 2010). O pH básico também favorece a hemostasia e causa necrose superficial das células pulpares, estimulando as indiferenciadas células mesenquimais a diferenciar-se em odontoblastos que, consequentemente, irão produzir dentina reparadora e formação de ponte dentinária (PEREIRA et al., 2014; ANDRADE MASSARA, 2012). Nesse contexto, de acordo com Pereira et al., (2014), uma necrose superficial por coagulação é causada na polpa exposta devido ao seu efeito cauterizante, minimizando os mediadores químicos da inflamação, promovendo a recuperação rápida e completa do tecido pulpar e ocasionando a formação de uma barreira mineralizada.

O hidróxido de cálcio é utilizado na endodontia na forma de uma pasta intracanal temporária. Para isso, deve-se adicionar o pó de hidróxido de cálcio a um veículo adequado à indicação clínica do caso. Os principais veículos para o hidróxido de cálcio, do ponto de vista da atividade antimicrobiana, podem ser inertes ou biologicamente ativos. Do ponto de vista físico-químico, podem ser hidrossolúveis (aquoso ou viscosos) ou oleosos (LOPES E SIQUEIRA, 2015). Os veículos têm a função de possibilitar a dissociação iônica do hidróxido de cálcio em íons cálcio e hidroxila. Tal dissociação poderá ocorrer de diferentes maneiras, grau e intensidade, dependendo das substâncias a serem associadas à composição da pasta de hidróxido de cálcio. Para compreender a função do veículo a ser acrescido ao hidróxido de cálcio pró-análise para formar a pasta que será utilizada como medicação intracanal, primeiro deve-se lembrar que o hidróxido de cálcio possui baixa solubilidade e que o seu poder antimicrobiano depende da velocidade de liberação de íons hidroxila e do tempo de contato direto e indireto depois da sua difusão no interior do sistema de túbulos dentinários. O tipo de veículo influenciará diretamente nessa velocidade de dissociação iônica, favorecendo, assim, a penetração dos íons hidroxila e potencializando o poder antimicrobiano da medicação. Os veículos são adicionados ao hidróxido de cálcio a fim de melhorar a efetividade dessa medicação.

Como desvantagem, apresenta baixa resistência mecânica, o que dificulta a sua aplicação direta sob materiais restauradores condensáveis, ocasionando uma condição crítica em capeamentos pulpares (CHAIN, 2013; HILTON et al., 2013). Acrescenta-se ainda, que o material é solúvel em meio bucal e não apresenta adesividade às paredes dentinárias (HILTON et al., 2013; PEREIRA et al., 2014).

2.2 AGREGADO DE TRIÓXIDO MINERAL – MTA

O agregado de trióxido mineral (MTA) é um cimento biocerâmico reparador, indicado para casos de capeamento pulpar direto, reparo de lesões de furca (lesão em função de cárie ou traumatismo durante preparo ou abertura coronária), reparo de perfurações radiculares, reabsorções radiculares, retro obturações da raiz e apicificações (tratamento de polpa necrótica em dentes com rizogênese incompleta) (ANUSAVICE et al., 2013; COSTA et al., 2014).

O MTA foi desenvolvido pela Universidade de Loma Linda (USA) para selar a comunicação entre o sistema de canais radiculares e a superfície externa em todos os níveis do dente, sendo principalmente utilizado como material para capeamento pulpar direto, pulpotomia e tratamento da perfuração acidental da dentina. Apresenta, além da biocompatibilidade, o poder de regeneração tecidual com baixo índice de estímulo inflamatório. Entretanto, sua maior limitação é o alto custo.

O MTA consiste em um pó formado por partículas hidrofílicas que toma presa com água, tornando-se primeiramente um gel coloidal que em seguida torna-se rígido (ALMEIDA e CAVALCANTI, 2011; CHAIN, 2013). É um material biocompatível com capacidade de criar um ambiente favorável ao reparo tecidual e estimular a proliferação celular. Após manipulação, seu pH é de 10,2 e se eleva para 12,5 em 3 horas, tornando-se altamente alcalino, liberando hidróxido de cálcio e favorecendo a atividade antimicrobiana (CHAIN, 2013; ANUSAVICE et al., 2013). A presença do óxido de bismuto no material confere uma maior radiopacidade quando comparado à dentina. Isto é importante para que o material possa ser diferenciado das estruturas anatômicas adjacentes em exames radiográficos (CHAIN, 2013; ANUSAVICE et al., 2013; COSTA et al., 2012). O seu tempo de presa é em torno de 2 horas e 45 minutos até 4 horas, entretanto, esse tempo é alterado de acordo com o tamanho das partículas do pó, relação água/pó, temperatura e umidade. A sua capacidade de selamento é elevada devido à pequena expansão pós-presa do material, gerando baixos índices de infiltração por corantes, bactérias e toxinas. Sua contaminação com sangue durante a inserção não altera essa propriedade.

O MTA estimula a produção de tecido mineralizado na superfície da polpa exposta por meio da formação de uma camada de estrutura cristalina na superfície pulpar quando em contato com o cimento, assim como em contato com o tecido perirradicular na região apical da raiz (CHAIN, 2013). O pó apresenta silicato e tricálcio, óxido tetracálcico, óxido de silicato, óxido de bismuto (agente radiopacificador), aluminato tri e tetracálcio, sulfato de cálcio di-hidratado e tetra cálcio alumino férrico. Sua reação de presa ocorre por hidratação dos silicatos quando em contato com o líquido (água) (CHAIN, 2013; ANUSAVICE et al., 2013; JITARU et al., 2016).

Segundo Chain (2013) a reação química ocorre com o contato entre o pó de MTA e a água, formando o óxido de cálcio e o fosfato de cálcio. A reação entre os fluidos teciduais e o óxido de cálcio forma o hidróxido de cálcio, que entrará em contato com o dióxido de carbono presente na corrente sanguínea, formando, assim, o carbonato de cálcio. Após a reação de hidratação dos silicatos e consequente formação de Ca(OH)2, haverá a dissociação iônica e a liberação de íons cálcio e hidroxila. Esta liberação colabora na adesão e proliferação celular, modula a produção de citocinas, promove diferenciação e migração de células produtoras de tecido duro, promove reparo biológico a partir da formação de apatia carbonatada quando exposto em soluções fisiológicas, além de criar um meio alcalino antibacteriano e antifúngico (CHAIN, 2013).

O pó deve ser dosado conforme as instruções do fabricante, e dispensado próximo a uma gota de água ionizada ou soro fisiológico. Dessa forma, para a incorporação de ambos é necessário a utilização de uma placa de vidro ou de um bloco de espatulação como suporte para a mistura com o auxílio de uma espátula plástica ou de metal. Esses ingredientes devem ser misturados até que o produto obtenha uma consistência de pasta amolecida. E, após a sua homogeneização, com a espátula, porta-amálgama ou condensador, o MTA pode ser transportado para o local de aplicação desejado, considerando o tempo de presa inicial (aprox. 2 horas) e o tempo final (aprox. 6 horas) (CHAIN, 2013; ANUSAVICE et al., 2013).

Apesar de apresentar qualidades importantes, Parirokh e Torabinejad (2010), Hilton et al. (2013) e Costa et al. (2012), destacaram a dificuldade de manuseio, alto custo, escurecimento da dentina e elevado tempo de presa como pontos negativos. Essas desvantagens determinaram o lançamento no mercado de um novo material a base de MTA denominado MTA REPAIR HP — “High Plasticity” (Angelus ®, Londrina, PR, Brazil), visando contornar esses inconvenientes clínicos. A nova fórmula alterou as propriedades físicas resultando em um material mais plástico para facilitar a manipulação e inserção, porém, manteve as características químicas e biológicas do MTA original. Além disso, a nova fórmula utiliza o tungstato de cálcio como opacificador ao invés do óxido de bismuto, no intuito de evitar a descoloração do dente (ZUOLO, 2018).

2.3 PASTA LC X MTA

Estudos comparativos entre a pasta LC e o MTA têm sido realizados por diversos autores e indicam que o MTA possui propriedades físicas benéficas sobre o hidróxido de cálcio, incluindo uma boa capacidade de vedação, menor grau de dissolução e maior estabilidade estrutural. O MTA também tem capacidade de interagir com fluidos que contenham fosfatos para formar espontaneamente precipitados de apatita, o que não só explica sua biocompatibilidade e bioatividade, como também pode contribuir para a sua capacidade de selagem (OKIJI e YOSHIBA, 2009). Por meio de uma meta-análise, Li et al. (2015) fizeram, em seres humanos, uma comparação entre a eficácia do agregado de trióxido mineral (MTA) e a eficácia do hidróxido de cálcio (HC) no tratamento de capeamento pulpar direto.

Foi avaliada a resposta inflamatória, a formação de ponte de dentina e a taxa de sucesso. Observou-se que o grupo do MTA, apresentou significativamente maior taxa de sucesso e foi superior em termos de ausência de resposta inflamatória e formação de ponte de dentina, em relação ao grupo do HC. Os autores concluíram que o MTA pode ser um substituto adequado do HC utilizado para procedimentos de capeamento pulpar direto e questionam a recomendação de continuar utilizando hidróxido de cálcio como padrão-ouro para tais procedimentos. Hilton et al. (2013) realizou um ensaio clínico randomizado para avaliar e comparar o sucesso do capeamento pulpar direto em dentes permanentes, com MTA e com Hidróxido de Cálcio. Os testes foram realizados em 376 pacientes com 7 anos de idade ou mais, que apresentaram exposição pulpar e que o tratamento clínico adequado seria o capeamento pulpar.

Após confirmada a exposição pulpar, o autor seguiu o protocolo para controle de hemorragia e desinfecção, e utilizou em 181 pacientes pasta LC e em 195 o MTA e realizou a restauração. Foram realizadas radiografias imediatamente após o capeamento, após o primeiro mês e a cada 6 meses durante 2 anos para avaliar a vitalidade da polpa. Os resultados indicaram uma taxa maior de insucesso no grupo com hidróxido de cálcio (31,5%) comparado com o grupo com MTA (19,7%), evidenciando o desempenho superior do MTA comparado ao hidróxido de cálcio.

2.4 CIMENTOS BIOCERÂMICOS OBTURADORES

A partir de 2007, vários cimentos biocerâmicos pré-mistura dose prontos para uso têm sido desenvolvidos no intuito de facilitar sua aplicação nas diversas situações clínicas. O primeiro deles foi desenvolvido por uma empresa canadense de pesquisa e desenvolvimento de produtos (Innovative BioCeramix Inc.), denominado iRoot. Na sequência, outros cimentos pré-misturados foram desenvolvidos pela empresa norte-americana Brasseler Inc., como o EndoSequence e o BC Sealer. Todas eles são  similares em composição (silicatos de cálcio, óxido de zircônio, tântalo, óxido de cálcio, fosfato monobásico e cargas), e a característica comum desses cimentos encontra-se na sua consistência “putty” pronta para uso, apresentando excelentes propriedades mecânicas e biológicas e boas propriedades de manuseio (TROPE et al., 2015).

A utilização deste tipo de material pronto para uso também para a obturação dos canais radiculares passou a ser inevitável. Desenvolveu-se, então, os cimentos biocerâmicos obturadores de canais radiculares Endosequence e BC Sealer (Brasseler Inc, USA), com a mesma composição química básica dos outros produtos biocerâmicos pré-misturados, porém, menos viscosos, o que tornou a sua consistência ideal para vedar canais radiculares.

A técnica de obturação consiste em preencher o conduto com o cimento pronto para uso e utilizar um cone de guta-percha pré-selecionado no comprimento de trabalho como dispositivo para levar o cimento até a região apical e permitir o movimento hidráulico do selante nas irregularidades do canal principal e canais acessórios. Uma imagem radiográfica semelhante à condensação vertical clássica é, então, frequentemente vista (DEBELIAN e TROPE, 2016).

Devido às características deste cimento, a presença de umidade no interior das cavidades pulpares é um fator benéfico e aumenta a estabilidade dimensional da obturação. Al-Haddad et al. (2017) avaliaram a influência de diversos graus de umidade no desempenho de seladores biocerâmicos e concluíram que o grau de umidade não afeta os componentes químicos desses cimentos.

Propriedades dos cimentos com base biocerâmica têm sido avaliadas como propriedades físicas, biocompatibilidade, capacidade de selagem, adesão, solubilidade e eficácia antibacteriana. Os estudos mostram resultados promissores com cimentos endodônticos, principalmente quanto à biocompatibilidade e efeito de biomineralização. (AL-HADDAD e AZIZ, 2016).

3. DISCUSSÃO

Quando se idealiza um material para ser utilizado no reparo endodôntico, logo se pensa que este material deverá ser biocompatível, radiopaco, antibacteriano, dimensionalmente estável, fácil de manipular, podendo ser utilizado na presença de sangue. Os cimentos obturadores biocerâmicos são ideais para o uso em endodontia, pois reúnem essas características ideais para um cimento obturador, mostrando-se superiores aos cimentos existentes até então, uma vez que a umidade ou contaminação por sangue não diminui o seu desempenho.

Por serem hidrofílicos, a umidade residual do canal e túbulos dentinários é bioquimicamente um fator positivo. São também dimensionalmente estáveis e expandem ligeiramente na presa, garantindo um selamento a longo prazo. Além disso, ao final da presa possui pH acima de 12, conferindo efeito antimicrobiano semelhante ao hidróxido de cálcio (DEBELIAN e TROPE, 2016; SEROTA et al., 2017; LIMA et al., 2017).

Um dos grandes diferenciais dos cimentos biocerâmicos é o fato de que ele é um material considerado bioativo, ou seja, é um material capaz de interagir com tecidos vivos. Que é fruto da construção de uma camada de apatita, biomineralização, na interface material-tecido. Deste modo a análise da formação de apatita na exterioridade de um material, quando exposta a um fluido corporal simulado é uma forma aprovada para examinar a bioatividade in vivo dos tecidos duros.

O material considerado precursor dos cimentos biocerâmicos é o hidróxido de cálcio, e estes são bastante utilizados e disseminados devido aos seus comprovados efeitos como a manutenção da integridade pulpar. Em contato direto com a polpa, este material promove uma cauterização do tecido pulpar, isso se deve ao seu pH alcalino, causando a desnaturação das proteínas superficiais e necrose por coagulação tecidual superficial. Com isso é reduzida a liberação de mediadores químicos da inflamação, propiciando uma recuperação eficaz.

De um modo geral, a forma de ação do hidróxido de cálcio é muito semelhante ao do MTA, o óxido de cálcio e fosfato de cálcio (partículas hidrofílicas) reage com fluidos teciduais que dão origem ao hidróxido de cálcio, que futuramente vai reagir com o dióxido de cálcio, para dessa forma dar origem aos cristais de calcita. Também foi constatado que o MTA pode estimular uma maior secreção de interleucinas produzidas pelos neutrófilos, facilitando uma ação reparadora mais rápida.

Com relação à adaptação marginal, essa propriedade foi considerada adequada para materiais biocerâmicos, com elevada resistência adesiva nas paredes do canal radicular. Ainda assim, a descoloração dentária regida por cimentos endodônticos é um achado comum que prejudica o resultado estético do tratamento endodôntico.

Segundo Ahmed et al. (2012), todos os cimentos endodônticos demonstraram descoloração do dente quando depositados na câmara pulpar, essa descoloração se deve de compostos dos cimentos que se espalham em túbulos dentinários durante ou após a sua adaptação.

Sendo assim, algumas pesquisas apontam que os cimentos biocerâmicos seriam capazes de promover menor escurecimento da estrutura dentária. (LIMA et al., 2017)

4. CONCLUSÃO

Retomando a questão norteadora: O uso dos biocerâmicos realmente apresenta propriedades no vedamento radicular quando comparado a outros materiais? Por meio do estudo realizado, concluiu-se que a resposta é positiva, pois a melhor propriedade dos cimentos biocerâmicos, quando comparado a outros materiais obturadores, é representada pela sua bioatividade e por serem materiais considerados hidrofílicos, ou seja, que podem agir mesmo em meios úmidos, sendo esta uma característica que se espera de um material que seja considerado ideal para a utilização nos sistemas de canais radiculares. Portanto, considera-se um grande avanço na endodôntica as pesquisas acerca dos cimentos biocerâmicos, pois mudou-se a perspectiva tanto de qualidade do material que é utilizado, quanto na alteração das técnicas de obturação tradicionais.

REFERÊNCIAS

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[1] Pós-graduada em Endodontia e Graduada em Odontologia. ORCID: 0000-0003-2916-2209.

[2] Orientador.

Enviado: Fevereiro, 2022.

Aprovado: Março, 2022.

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Lara Garrido Pinto

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