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Leis econômicas: normativas ou enunciativas?[1]

RC: 131162
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/leis-economicas

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

ALFREDO, Benjamim [2]

 ALFREDO, Benjamim. Leis econômicas: normativas ou enunciativas? Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 07, Ed. 11, Vol. 01, pp. 134-152. Novembro de 2022. ISSN: 2448-0959, Link de acesso:  https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/leis-economicas, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/leis-economicas

RESUMO 

No estudo da economia política, quando se fala de leis econômicas, surgem algumas dúvidas, mais concretamente, saber se elas são ou não verdadeiras normas jurídicas, dado o seu caráter objetivo.  No uso da expressão “leis econômicas”, a sua aplicação na regulação da atividade econômica, bem como nas relações que o Estado estabelece com os demais agentes econômicos, são matérias que preocupam os estudiosos das ciências sociais. As leis econômicas caracterizam-se pelas teorias e doutrinas econômicas que, segundo os economistas, contribuem na realização da atividade econômica. E, porque o conceito de lei, como comando e fonte imediata de formação e revelação do direito, difere do conceito de lei em economia política, por se tratar de uma enunciação de teorias e doutrinas econômicas, que, embora útil, do ponto de vista científico, não é fonte de direito e nem sequer de cumprimento obrigatório.  Por isso, o questionamento do verdadeiro sentido e validade jurídica da lei em economia política é razão fundamental do presente estudo, que visa contribuir para a reflexão e clarificação da referida designação no estudo da disciplina de economia política, bem como na da ciência jurídica e na sua aplicação geral. O método usado para a realização do presente estudo consistiu na recolha de informação bibliográfica, fundamentos legais e nos conhecimentos técnicos e acadêmicos que o autor possui sobre a matéria.

Palavras-chave: Leis econômicas, Leis enunciativas, Leis normativas, Economia política, Norma jurídica.

1. INTRODUÇÃO

No estudo do objeto da economia política, as relações sociais de produção, distribuição e consumo, bem como as conexões e interdependências causais mais importantes que se suscitam, revelam o carácter do desenvolvimento das várias teorias, opiniões e doutrinas que têm sido aplicadas e designadas pelos economistas por leis econômicas. Aliás, a economia política, como ciência social, estuda as relações econômicas objetivas e subjetivas, ou seja, a atividade econômica em si e as relações que os agentes econômicos estabelecem entre si nas suas diversas relações. Tais relações são reguladas por diversas leis, que alguns tratadistas designam por leis econômicas, sem, no entanto, justificar a sua clarificação. No entanto, há um largo espectro de ligações no sentido da dialéctica e interdependência, tanto da economia como do direito, quando se fala das leis econômicas.  Entretanto, não se mostra pacífico discutir a    expressão leis econômicas. A mesma pode pretender significar normas reguladoras do comportamento, da atuação e das relações entre os agentes econômicos no âmbito da  realização   da atividade econômica como pode pretender significar a enunciação de teorias, doutrinas ou regras resultantes de estudos relacionados com matérias econômicas e que têm como objetivo contribuir para que a atividade econômica se realize, com base no conhecimento científico, num dado período histórico da vida social. Importa, no entanto, referir que, etimologicamente, a palavra economia deriva de duas palavras gregas, OIKO = casa  e NOMOS = norma ou lei,  que,  juntas, pretendem significar a administração ou comando da casa, tendo em conta a gestão dos recursos escassos na sociedade cidade, Estado da Grécia antiga. No entanto, o conceito de lei somente se torna verdadeiramente compreensível se tomarmos em conta a distinção entre lei em sentido formal e lei em sentido material. Enquanto o primeiro se refere ao ato normativo emanado de um órgão com competência legislativa, quer contenha ou não uma verdadeira regra geral, exige-se que tal deve revestir as formalidades relativas a essa competência. Enquanto o segundo diz respeito ao ato normativo emanado de um órgão do Estado, mesmo que não incumbido da função legislativa, desde que tal contenha uma verdadeira regra geral. O que se pode depreender desta distinção é, essencialmente, a matéria de natureza política, e que está intimamente interligada com a função legislativa. Ora, tanto num como noutro sentido, estamos em presença de um ato legislativo, e não de uma teoria ou doutrina que possa consubstanciar a validade do ato normativo por excelência, como se pretende dar a entender em relação às leis econômicas. Ressalva-se, contudo, que nem todas as regras ou normas são jurídicas. Fato curioso é que o direito não vive apenas da regulamentação, ele vive, também, das decisões, atos e teorias. Somente para exemplificar, os atos administrativos são direito, contudo, não são normas, tal como as sentenças judiciais e a doutrina dos jurisconsultos. Entretanto, a lei, no sentido jurídico, é matéria específica da ciência jurídica. Porém, podem existir normas técnicas que visam regular aspectos de não imediata relevância jurídica, matérias respeitantes a uma dada área específica.  É o caso das leis em economia política. Sem prejuízo de um debate mais profundo, entendemos que se deve entender por lei, no sentido formal, material e orgânico, a disposição genérica, abstrata, imperativa e coerciva provinda de um órgão com poder legislativo, contrariamente às leis econômicas que resultam de uma enunciação de um ente desprovido de poder legislativo. Com respeito a outras opiniões cientificamente conceituadas, o conceito de leis econômicas há de ter vingado devido às crenças produzidas e desenvolvidas por filósofos e pensadores medievais, e que aliaram tais leis às leis naturais e materiais. Embora a economia política não seja uma ciência normativa por excelência, ela baseia-se em conceitos, teorias e doutrinas que, por sua vez, despoletam regras e teoremas, que os economistas denominam de leis econômicas. No entanto, tais leis não se equiparam às leis no sentido jurídico, conforme já nos referimos. Segundo os pensadores econômicos, as leis econômicas são apriorísticas, ou seja, não têm de ser previamente verificadas, ou mesmo falsificadas, por serem verdadeiras em si mesmas. Elas são expressas matematicamente e podem ser verificadas empiricamente, mas não falsificadas.  Ora, defendemos que há uma distinção sobre as leis produzidas na base da ciência econômica e as leis no verdadeiro sentido jurídico, sendo estas caracterizadas pela generalidade, obrigatoriedade e coatividade, exigindo, por isso, cuidado na sua definição e aplicação. Aliás, as leis são feitas pelo Homem e para o Homem, e não o Homem para as leis. Este argumento não esgota, conforme se verá adiante, a reflexão sobre a necessidade de se falar das leis econômicas, abrindo, assim, campo para reflexão e debate crítico sobre a matéria em estudo: o saber se as leis econômicas são ou não verdadeiras leis, ou podem ser apelidadas de quase-leis ou leis facultativas, ou mesmo leis da economia, constitui matéria de grande interesse para os estudiosos das ciências sociais, principalmente para os economistas e juristas.

2. VISÃO GENERALISTA DE LEIS ECONÔMICAS 

A noção de lei econômica surgiu com o filósofo grego Aristóteles, que viveu no século IV a.c. Ele apresenta, no seu livro, denominado Retórica, a ideia de que a atividade econômica é desenvolvida na base das leis divinas ou naturais, e tais leis são econômicas, e, por isso, não podem ser questionadas pelo Homem. Para Aristóteles, a lei natural é tão perfeita e eterna   porque traduz uma vontade divina, razão pela qual ela não pode ser questionada ou alterada pelo Homem. Essa lei é válida para todos, no tempo e no espaço. Ora, esta visão de Aristóteles vingou na sua época, traduzindo a crença de que todos deviam se submeter à vontade divina.  Mesmo com o pensamento científico de muitos filósofos da época para reverter a posição de Aristóteles, tal não foi possível, pois a ideia prevalecente é de que os fenômenos da natureza    resultam da vontade divina. Por isso, somente as leis que provinham da vontade divina é que deveriam ser aceitas, com referência especial para as leis que se referiam à vida econômica. Tal posição, embora contrastasse com a de que tais leis resultam de uma observação de vários fenômenos estudados e que permitiam produzir hipóteses, proposições e modelos no âmbito da produção, troca e consumo de bens, não conseguiu reverter a posição prevalecente, sendo, hoje, comum falar-se de leis econômicas resultantes de um processo natural e divino de desenvolvimento humano.  Por isso, são leis que enunciam o pensamento econômico e têm como fim vincular toda a sociedade no âmbito da atividade econômica. Entretanto, a evolução da vida econômica e social demonstrou que tais leis, afinal, poderiam ser modificadas pelo ser humano em face de alterações das condições de produção e de consumo. Aliás, existe uma interdependência casual, entre as relações de produção e o nível de desenvolvimento das forças de produção e das necessidades sociais num dado momento, que determina a formação de um novo pensamento econômico, que tem em vista contribuir para a melhoria da atividade econômica em prol das necessidades econômicas e sociais. Da mesma forma que, com o desenvolvimento das relações sociais, também foram surgindo leis criadas pelo Homem e que visavam regular a sua vida social. Estas ideias podem servir para compreender as concepções idealistas subjetivas que apontam a vontade do Homem com que estando no desenvolvimento das leis que regem a sua vida social. Sabido que o Homem, ao longo do tempo, vive acompanhado de outros seres de sua espécie, com quem vem estabelecendo relações de várias ordens, nem sempre tais relações foram pacíficas. Vários conflitos são gerados e implicam a criação de normas para disciplinar e regular a vida social. Para regular a sua vida em sociedade, o Homem tem criado normas de conduta social. Inicialmente, antes da descoberta da escrita, tais normas eram formuladas oralmente e transmitidas pelos ascendentes aos seus descendentes, de geração para geração, através dos séculos. Mais tarde, com o surgimento da escrita, as normas passaram a ser escritas, para que pudessem ser conhecidas por todos. Dentre as normas de conduta social, o Homem criou, por exemplo, as normas morais, de ética e de cortesia, de cumprimento facultativo, por isso, o seu não cumprimento não implica a punição. No entanto, as leis naturais, referidas anteriormente, baseavam-se na razão e na lógica, passíveis de medição.  A sua avaliação poderia ser feita em termos do que de fato aconteceu, como aconteceu e porque aconteceu, permitindo, assim, a enunciação de teoremas e doutrinas pelos pensadores e filósofos da época medieval. E porque tais leis se baseavam em valores da natureza racional humana, aplicavam-se independentemente da vontade humana. Ora, estas posições podem ser questionáveis, porquanto a criação de tais leis não pode estar alheia à vontade humana, se tomarmos em linha de conta de que é o próprio Homem que observa os fenômenos, estuda-os e produz as teorias que vão reger a atividade econômica. Aliás, a questão de caráter objetivo das leis econômicas, defendida por vários autores, não coloca de lado a vontade humana, sendo, hoje, cada vez mais claro que é ela que desenvolve a maior parte das ditas leis que se modificam no tempo, sempre que ocorre uma certa situação adversa ou favorável para a realização da atividade econômica. O Homem é o cerne das ditas leis econômicas, embora não possa impor a sua vontade no que concerne ao cumprimento de tais leis. Aliás, como já nos referimos, as leis econômicas enunciam teorias e doutrinas, e não obrigam ao seu cumprimento, diferentemente das leis no sentido jurídico, ou seja, as normas jurídicas. As normas jurídicas emanam de um órgão competente e com autoridade, exigindo o seu cumprimento obrigatório por todos. Em caso de incumprimento, prevê-se uma sanção. Conforme dissemos, a economia política usa as leis econômicas no tratamento dos fenômenos econômicos, razão por que também se define como   ciência que estuda os fenômenos econômicos no âmbito da produção, da troca e consumo dos bens materiais escassos e serviços vitais na sociedade humana e das leis que regulam as relações que se estabelecem entre os diversos agentes econômicos em todo o todo o processo econômico.  Assim, podemos concluir que as leis econômicas enunciam as teorias, doutrinas econômicas  no verdadeiro sentido e caráter objetivo da economia política. No entanto, uma questão se coloca: afinal, que leis são estas? Partindo do princípio de que o desenvolvimento econômico e social é um processo histórico natural, através do qual o Homem luta para atingir a plena produção e produtividade, com a finalidade de atender às suas necessidades, cada vez mais prementes, de forma harmoniosa, tendo em conta a escassez dos recursos disponíveis, ele produz, para o efeito, leis. Tais leis, devidamente formuladas, formam um ordenamento jurídico econômico coerente, visando a ordem social, que vai permitir que a sociedade realize, de forma harmoniosa, a sua atividade econômica. De forma generalizada, fala-se de leis econômicas em referência às leis que se aplicam no âmbito da realização da atividade econômica, sem se esclarecer que tipo de leis são e como é que as mesmas se caracterizam. A expressão “leis econômicas” enquadra-se no objeto da economia política. Os manuais de economia e de economia política limitam-se a falar do caráter objetivo das leis econômicas e, de forma sumária, apresentam a sua tipologia, mas não desenvolvem a problemática que tal expressão suscita do ponto de vista didático. Entendemos que o assunto não parece interessar o seu desenvolvimento, tratando-se de uma matéria que parece ser pacífica, quando, de fato, levanta questões que podem interessar ao critério da verdade e da prática social. Entendemos que a expressão “leis econômicas” é histórica, mas carece do desenvolvimento do seu real sentido, tendo em conta a atualidade, quanto ao verdadeiro sentido de leis econômicas, pois entendemos que a expressão “lei” se enquadra no estudo da ciência jurídica e não pode, por isso, ser usada na ciência econômica de forma ímpar. Acreditamos que o seu uso, reiterado ao longo do tempo, e a sua aceitação por parte dos cultores das ciências econômica e jurídica, revela uma forte convicção de tratar-se da mesma designação de lei, por isso, não se tem questionado o seu verdadeiro significado e utilização em economia. Por exemplo, as leis de mercado, formuladas no princípio do século XIX, por um economista francês, Jean Baptiste Say, e a lei dos rendimentos decrescentes, referenciada por Samuelson e Nordhaus (1988), somente para citar estes, são princípios teóricos de economia que enunciam regras orientadoras da atividade econômica. São verdadeiros teoremas que os economistas deitam mão para formular e fundamentar os seus estudos e pareceres técnicos econômicos. Tais leis são referenciadas em diversos estudos que visam, também, a formulação de diversos planos econômicos estaduais. As teorias de Adam Smith, por exemplo, assentam no pressuposto de uma ordem natural, pressupondo a existência de leis econômicas que são impostas pela natureza, que cabe aos economistas a sua descoberta, formulação e divulgação. Certamente que Adam Smith não pretendeu promulgar um pensamento particular sobre a validade de tais leis, mas sim alertar da necessidade de se saber da sua existência no âmbito do tratamento das matérias econômicas. Neste caso, considera fundamental o papel do Homem em relação à formulação ou modificação de tais leis. Aliás, Quesnay, conforme referenciado por Valier (2016), desenvolveu a teoria da economia política na base das ciências da natureza. Ele defendeu que as leis econômicas são leis naturais e universais, por isso, deviam ser respeitadas e acatadas.  Entretanto, Valier (2016) criticou a posição de Quesnay, por este não ter percebido que as ditas leis econômicas são históricas, específicas de um sistema econômico e social historicamente determinado. Aliás, Valier (2016) remata dizendo que os sucessores imediatos de Quesnay, ou seja, os pensadores clássicos, também não perceberam isso, tendo continuado a defender a existência de leis econômicas que, por serem divinas, deveriam ser escrupulosamente respeitadas. É precisamente está a posição de Valier que ajuda a suportar a posição de que as ditas leis econômicas são enunciativas e não normativas no sentido jurídico, porque sofrem mutações a todo o tempo, e que tais leis não dependem do poder legislativo estadual. Aliás, Charles Fourier, defensor do socialismo utópico, referenciado por Valier (2016), trouxe uma outra visão e uma nova ideia em relação à crença dos economistas clássicos sobre as leis naturais, de que estas são consideradas válidas em qualquer tempo e lugar, e de que a história da humanidade é a história de uma sucessão de fases distintas. Sendo interessante a posição de Fourier, não podemos deixar de dizer que nela está implicitamente presente a ideia de que os sistemas econômicos e sociais podem ser muito diferentes e que as leis econômicas são leis historicamente determinadas. Aliás, a posição de Fourier é alicerçada nas mutações das formas de produção que conheceram evolução ao longo do tempo e que permitem que fases distintas ocorram, por exemplo, teorias cosmogônicas, considerando, por exemplo o que aconteceu com as formas da moeda, no final do século XVIII, na Europa. As várias mutações sobre a vida do Homem na terra e a evolução quanto às formas de produção e apropriação de recursos escassos concorrem para novas realidades teóricas, bem como a mudança do comportamento do ser humano e o meio em que o mesmo estiver a viver constituem factores que concorrem para as mutações no que concerne às teorias e doutrinas econômicas. É neste contexto que, segundo Fourier, referido por Valier (2016), surge, em determinado momento, uma lei essencial que rege as relações entre os homens, e, por sua vez, tal lei despoleta uma lei da atração, que segundo Fourier, rege o universo. Ora, este pensamento de Fourier, embora pouco desenvolvido, pretende tão somente corroborar com a posição de que as ditas leis econômicas somente têm validade num determinado momento e que elas se sujeitam às mutações que ocorrem na vida humana, no espaço e no tempo. Não pretendemos, com isso, discordar sobre a existência de tais leis naturais e universais, que não dependem do homem. Concordamos que a vida do ser humano despoleta mudanças no âmbito da geração e apropriação de recursos, cada vez mais escassos no universo, contudo, as ditas leis naturais sofrem, também, mutações, tendo em atenção o comportamento do homem em face da atividade econômica, mas não resolvem as preocupações que o ser Homem enfrenta na sua vida quotidiana.  Aliás, mesmo as leis econômicas cujas teorias e doutrinas   regem o valor, a distribuição dos rendimentos, o crescimento econômico, aliadas várias crises ambientais e mudanças climáticas, que o mundo enfrenta no tempo e no espaço, embora tenham   caráter histórico, não resolvem todos os problemas que o ser humano enfrenta.  Por isso, as leis naturais e as ditas leis econômicas imutáveis, porque específicas e mutáveis, tendo, também, em conta a forma particular como se organiza a sociedade e o comportamento das pessoas em sociedade. Por isso, a existência de leis econômicas, que provém dos pensadores econômicos e que devem ser entendidas como enunciativas, e as leis normativas, que provêm dos órgãos legislativos e que regulam as pessoas em sociedade. A escassez de debate sobre as leis econômicas, se são normativas ou   não, não pode significar aceitação e reconhecimento de que tais leis sejam verdadeiras normas jurídicas. Entendemos que se deve discutir a questão sobre se as teorias e doutrinas econômicas, porque se reportam ao ser e o dever ser, podem ou não suscitar   questões polêmicas que podem levar a duvidar do sentido que estas emprestam às ditas leis econômicas, já que aquelas formulam princípios que não coincidem com os princípios do direito, mormente quanto à sua validade como verdadeiras normas jurídicas. Os princípios, teorias ou doutrinas econômicas não são normas jurídicas, logo, não podem ser leis. Não tem um comando jurídico que lhes confira a validade como norma jurídica. Aliás, é preciso ter em conta que, em direito, as palavras têm sentido próprio e a ciência jurídica tem princípios que dão forma ao seu objeto e método. Além disso, em direito, as definições são perigosas quando não são devidamente formuladas, e podem atentar contra o fenômeno científico da disciplina que assenta numa base perene de fatos, atos, formalismos próprios e fundamentos que são seus suportes. A sistematização, as regras e as normas resultantes de uma previsão e estatuição, em face de um facto concreto da vida real, constitui a base fundamental da criação de uma lei, e, por sua vez, a sua fonte por excelência.  O direito não regula qualquer ou todas as situações da vida real, ele deixa, para outras áreas do saber científico, tal tarefa, considerando os moldes de vida social.  Aliás, o direito está para a sociedade, e esta, sem o direito, não consegue viver em harmonia.  A criação de leis constitui matéria do ser humano. O direito vive das suas fontes, e a lei é a sua fonte primária por excelência. Cada direito é um sistema de normas que exprime a vontade da sociedade. O conteúdo dessa vontade é determinado por vários fatores sociais. Entre eles, os mais importantes são as condições materiais da vida social, o modo como são gerados e apropriados os recursos escassos. Assim sendo, o desenvolvimento da atividade econômica despoleta normas jurídicas econômicas reguladoras da produção, troca e consumo de bens e serviços. A formação das normas jurídicas econômicas têm consequências. Os fatores econômicos, para serem regulados por lei, devem tomar a forma do motivo jurídico, e passam pela consciência social. As leis nascem dos atos do Estado e de órgãos competentes para o efeito. Contudo, esses atos são sempre condicionados pelas relações econômicas subjacentes, pela consciência jurídica da sociedade e pela correlação de forças entre os vários agentes econômicos. A força social que despoleta a criação das leis que vão reger a atividade econômica não é só um dos elos da cadeia dos fatores que determinam o conteúdo e a forma de criação de normas jurídico-econômicas. São todos os fatores sociais (econômicos, políticos, ideológicos) que determinam a essência e o conteúdo das normas jurídicas econômicas criadas diretamente pelos atos do poder estadual. Entretanto, quando se recorre ao conceito de tais leis, surgem vários aspectos que colocam em dúvida o saber se, de fato, tais leis econômicas são as produzidas pelos pensadores econômicos ou pelos poderes estaduais. Esta questão surge pelo fato de o sentido de lei consubstanciar comando geral e abstrato de cumprimento obrigatório, que resulta de uma relação entre um fato e a necessidade de sua regulação no âmbito da vida social.  Somente o órgão legislativo tem competência para criar a lei econômica no sentido de regular o ato econômico e os sujeitos que praticam a atividade econômica. Entretanto, o legislador não produz, e muito menos enuncia, teorias, opiniões ou doutrina econômica. Ele produz lei econômica entendida no sentido normativo.  O termo lei, contém vários sentidos e metamorfoses de outros termos no vocabulário jurídico. Partamos de alguns fatos exemplificativos para mostrar alguns aspectos subjacentes em relação ao nosso tema. Uma situação econômica, fato ou fenômeno econômico pode suscitar uma certa regulação. Para o efeito, caberá a referida tarefa a um órgão com competência legislativa. Pode, em face disso, criar-se uma lei que se designa de lei econômica?  Será que a referida lei também se compõe de uma previsão integrada pela caracterização abstrata da situação, de fato a que se reporta e a sua estatuição, pelo enunciado dos efeitos jurídicos que a verificação concreta de tal situação prevista desencadeia? Entendemos que sim, pois os factos, ou fenômenos econômicos, embora sociais, visam uma atividade econômica que, por sua vez, tem como elementos a produção, distribuição e consumo e as relações que se estabelecem entre os vários agentes econômicos visando o bem-estar.  Contrariamente, não concordamos que uma lei, referindo os princípios, as teorias e as doutrinas econômicas sejam consideradas lei econômica no sentido normativo, mas sim no sentido enunciativo. Sustenta, a nossa posição, o fato de tal lei pretender significar a aplicação de um método científico à prática, ou seja, o processo de observação, o estabelecimento de hipóteses, a realização de testes e a interpretação e síntese, através de processos lógicos que, embora mutáveis, contribuem para a evolução da ciência econômica e ajudam os agentes econômicos na realização da sua actividade.  Trata-se de elementos apenas prováveis e não exactos. Uma lei normativa não funciona com variáveis, mas sim na base da certeza em relação ao fato concreto que pretende regular. Podia-se falar de teoremas tão somente para comparar com as teorias ou princípios econômicos, os quais permitem a aplicação de variáveis na análise de uma determinada situação econômica. Martínez (1990) defende que o termo lei se emprega com dois significados diversos, embora seja admissível, em relação a eles, uma unidade de origem, uma razão comum. Acrescenta que, por lei, entende-se uma relação necessária, ou ao menos provável, entre um antecedente e um consequente, relação que corresponderá a uma ordenação natural da vida. Ainda segundo Martínez, também pode se entender a lei como comando que uma sociedade impõe aos seus membros. A lei reduz os antagonismos sociais e permite uma vida pacífica e harmoniosa. Esta realidade oculta constitui uma realidade bastante importante: a relação entre a ciência jurídica e a ciência econômica, ou seja, uma relação de dependência da segunda à primeira. Embora concordemos com a posição de Martínez, a produção de regras legislativas está necessariamente ligada a todas as outras produções de normas que a sociedade faz surgir, como é o caso da lei de produção de bens econômicos, por exemplo. Contudo, no sentido jurídico a lei comporta vários sentidos. Pode ser sinônimo de direito, neste caso, em sentido normativo, identificando-se com a autoridade do Estado ou mesmo com o ordenamento jurídico. Também se pode considerar a lei como fonte de direito, a forma de criação e revelação do direito. Entretanto, o sentido legal de lei é o que consta no artigo 1º, n.º 2, do Código Civil Moçambicano (PORTUGAL, 1966), que abarca apenas as disposições genéricas provindas dos órgãos estaduais competentes, deixando de lado, por isso, todos os atos normativos gerais, abrangentes, de cariz privatístico. Inclinamo-nos nesta acepção legal por ser a que provoca menor confusão ou dificuldade de compreensão conceitual. Então, onde se enquadraria a lei econômica nos sentidos atrás referenciados? Não é tarefa fácil enquadrar o conceito que mais se pode adaptar. Aliás, saber se a lei econômica é ou não uma verdadeira lei, do ponto de vista jurídico, nunca foi objeto de uma abordagem científica crítica, sendo-o agora por pertinência e razão de sua clarificação. É certo que os manuais de economia política apresentam, quando muito, a caracterização das ditas leis econômicas, contudo, não chegam a apresentar o seu conceito e noção exata do que seja a lei econômica na sua essência. No entanto, um pensamento crítico sobre a matéria não pode contentar-se em descrever somente o fato, mas sim uma teoria que pode contribuir para uma reflexão técnica científica sobre a validade jurídica das ditas leis econômicas. A teoria crítica permite não só descobrir os diferentes aspectos escondidos de uma realidade que é suscitada, mas sobretudo, abre as portas de uma nova dimensão, a de se saber se as leis econômicas são verdadeiras leis ou não. Por isso, a razão de se questionar a designação de leis econômicas, se são verdadeiras leis no sentido jurídico, matéria que pela sua pertinência, visa promover um debate e nova visão científica para uma reflexão e com vista à clarificação do verdadeiro sentido de tais leis.

3. AS LEIS ECONÔMICAS NA VISÃO DA ECONOMIA POLÍTICA

Desde sempre os juristas se interessaram por economia política, contudo, nunca se atreveram a apresentar definições sobre as matérias que interferem com a ciência do direito. As leis econômicas nunca constituíram matéria de discórdia na sua definição.  Os juristas defendem que as normas jurídico-econômicas visam regular aspectos do processo de produção e apropriação dos recursos escassos, os conflitos emergentes e a forma de planificação da atividade econômica e as relações que se estabelecem entre os agentes econômicos visando o bem estar social. Designar de leis econômicas ou de leis da economia nunca constituiu matéria de discórdia ou que servisse para fundamentar a retirada da sua validade como normas de  regulação de aspectos relacionados com  a  produção, troca e consumo de bens e serviços. Aliás, são várias as leis econômicas referenciadas em diversos manuais de economia e de economia política.   Segundo Martínez (1990), das várias leis econômicas, salientam-se:  a lei da concorrência; a lei do menor esforço ou do princípio hedonístico; a lei da população; a lei da oferta e da procura; a lei do custo de produção e a lei da utilidade decrescente.  São estes exemplos de leis econômicas que despoletam dúvidas e curiosidade em relação a sua validade como leis no sentido jurídico. Ora, uma leitura cuidada pode nos conduzir a designar tais leis como que resultantes dos princípios, das teorias e doutrinas econômicas, contudo, nelas, não se vislumbra qualquer comando jurídico. A designação de leis econômicas que se relacionam, por exemplo, com a regulação de matérias relativas à realização da atividade econômica, pode levar à conclusão de tratar-se de leis no sentido jurídico, pois estão imbuídas de um comando jurídico.  Entretanto, não fica clara a posição em relação a certas leis que, pela sua formulação, se confundem àquelas, por exemplo, a lei do custo de produção, segundo a qual os preços dos bens tendem a coincidir com os custos destes (MARTÍNEZ, 1990). Onde reside o comando nessa lei?  Embora a referida lei pretenda se referir à teoria segundo a qual o preço dos bens tende a coincidir com o seu custo, isto, no sentido de que o agente econômico deve ter em conta que, ao produzir um determinado bem, tem de levar em conta o custo no respectivo preço, não obriga o agente econômico ao seu rigoroso cumprimento, mas sim enuncia uma teoria que o pode ajudar em caso de pretender levar a cabo uma determinada atividade produtiva. Esta teoria pode ser útil para o agente econômico, porquanto ninguém estaria interessado em produzir algum bem a um determinado custo e vendê-lo abaixo desse mesmo custo. Certamente que perderia dinheiro. Entretanto, não se vislumbra aqui um comando, mas sim uma teoria, que recomenda o que o agente econômico poderá, querendo, fazer, e não seria sancionado se não o fizer. Outro exemplo é o da lei da utilidade decrescente, segundo a qual, quanto mais consumo de um bem ocorrer, há uma tendência de se atribuir, a esse mesmo bem menor, utilidade. Não há, nessa lei, um comando jurídico, mas sim uma teoria que pode ajudar tanto na produção como na escolha de um determinado bem, e na forma do seu consumo. Diferentemente, é o que se pode entender em relação à lei da concorrência e à lei monetária, dadas as suas características objetivas. A primeira, porque visa regular as regras do mercado no que concerne ao seu funcionamento, harmonia e salvaguardar outros aspectos afins próprios da oferta e da procura. Lei da concorrência. Esta lei pode ser entendida como comando e como lei normativa quando o Estado decide impor um regime de concorrência econômica. De fato, os agentes econômicos procuram, no mercado, as formas de realizar as suas aspirações. Uns vendem (oferta de bens e serviços) e outros compram (procura de bens e serviços). Naturalmente que, nesse processo, ambos discutem o melhor preço quanto ao melhor bem ou serviço. É compreensível que esta seja a forma de atuação dos agentes econômicos numa economia livre, onde as leis de mercado definem as regras porque os mesmos devem pautar. No entanto, a concorrência deve ser regulada, como forma de se salvaguardar e harmonizar os interesses do mercado (DURAND, 1961; FONTAINE, 1967). Discute-se, hoje, o direito da concorrência, sendo de destacar que o direito clássico da concorrência desleal que fez doutrina prende-se com elementos subjetivos, ligados ao comportamento dos participantes, no mercado e às suas relações mútuas; só proíbe as práticas contrárias aos usos honestos do comércio. O direito moderno da concorrência, pelo contrário, interessa-se muito mais pela instauração e salvaguarda de certas condições objetivas do mercado. Considera-se, por isso, a concorrência como um objeto de direito, que merece a proteção porque permite atingir certos fins, quer se trate de estabilidade de preços, do plano emprego, quer de um crescimento acelerado. Assim, numa concepção subjetiva de concorrência, considera-se a importação paralela, uma zona concedida a um distribuidor exclusivo, um ato de concorrência desleal. Contrariamente, o direito atual da concorrência julga que a possibilidade das importações paralelas deve ser preservada, tendo em vista salvaguardar a ordem concorrencial que pretende instaurar. Deste modo, a perspectiva atual do direito de concorrência tende, portanto, a modificar-se, indo das relações subjetivas entre agentes econômicos a uma ordem objetiva regulada da atividade econômica. A segunda, porque pretende regular matérias relativas à moeda, quanto à sua criação, circulação e uso. Ora, estas duas leis podem, sim, constituir leis no sentido normativo, em face do comando, nelas, subjacente.

4. LEIS ECONÔMICAS OU LEIS DA ECONOMIA? 

As asserções e argumentos em volta da expressão leis econômicas no âmbito da economia política sugerem questionamentos que, certamente, poderão despoletar diversas reflexões em volta do tema. E porque se trata de um tema polêmico, alguns estudiosos poderão assegurar que não existe qualquer dúvida ou querela em relação à expressão em causa por não haver qualquer confronto etimológico, e pelo facto de a expressão lei econômica se referir às leis que materializam as teorias e doutrinas científicas sobre a atividade econômica. Contrariamente, por exemplo, das leis de física e de química, que, por serem consideradas divinas e universais, a sua observância por todos se impõe, mas que as mesmas não são alteradas sem a observância de ensaios e experiências. Segundo Marshall (1990), pai da escola neoclássica, “a economia política raramente responde qualquer questão social, assim como qualquer questão social raramente pode receber respostas independentemente da economia política”. Contudo, a economia não recorre, para a verificação das hipóteses, ensaios e experiências realizadas em condições artificiais, em laboratórios, em que o investigador prescinde dos fenômenos que dificultam a análise do processo sob a sua forma mais pura. Falta à economia a possibilidade de realizar a experiência rigorosa das hipóteses formuladas, contudo, pode confrontá-las com os fatos, utilizando os conhecimentos históricos ou determinadas informações estatísticas. Sabido que a economia, bem como outras ciências sociais, enfrenta dificuldades de propor soluções exatas em face das mudanças constantes que ocorrem na sociedade, tendo em conta os problemas práticos que nela surgem. A ciência econômica procura formular leis, ou seja, providenciar explicações teóricas e doutrinárias, visando apoiar a produção e reprodução dos fenômenos   que tenha analisado em certas condições.  Não se trata, contudo, de formular verdadeiras leis que vão regular a vida social, mas sim a vida econômica. Por isso, é descabido o uso indiscriminado da expressão leis econômicas que pode confundir com as teorias e doutrinas econômicas e a expressão lei como comando jurídico econômico que visa a regulação das relações entre o Estado e os agentes econômicos e os instrumentos relacionados com o Plano e programas econômicos. Arguo que as leis econômicas, devem refletir o seu verdadeiro significado e discordo em relação à posição de que elas abrangem e vinculam toda a realidade econômica. Defendemos a existência de leis econômicas que representam as teorias e doutrinas econômicas realizadas pelos estudiosos no âmbito do processo investigativo e que traduzem um resultado que pode ser adotado ou não pela sociedade. São leis enunciativas e não normativas. Entretanto, existem, também, leis econômicas que advém da vontade humana e que emanam de órgãos competentes para a sua produção e aplicação, e tais leis destinam-se a regular a atividade econômica e as relações que se estabelecem entre os agentes econômicos. Dadas as suas características, vinculam os seus destinatários quanto ao seu cumprimento. Importa, porém, referir que esta posição não colhe consenso, conforme se pode ver adiante.

As leis econômicas, segundo os defensores das teses neutralistas ou mecanicistas, têm importância, pois a sociedade não pode desenvolver-se sem elas (MARTÍNEZ, 1990). Contudo, há um reconhecimento de que as leis econômicas não são muito rigorosas, e tal deve-se à própria natureza do objeto da economia política, diferentemente das ciências exatas (matemática, física, química e outras), cujas leis produzem melhor resultado em face da sua forma rigorosa e pela forma como são interpretadas e aplicadas. Ora, esta posição conceitual pode, no entanto, ser rebatida se recorrermos a Heisenberg (1981), quando defende que “os conceitos científicos existentes sempre se espraiam somente por uma parte limitada da realidade, enquanto a outra parte que não foi entendida é, por assim dizer, infinita.”, considerando esta infinidade bem superior na economia.  Ora, não basta defender a existência de leis econômicas cientificamente bem formuladas, elas devem significar uma certa verdade factual no tempo.  Entretanto, as leis econômicas, ou “quase leis”, como são, também, designadas, por serem menos rigorosas, nem sempre são acatadas, contudo, permitem a realização da atividade econômica. Contudo, como temos vindo a defender, elas são enunciativas e não normativas. Esta formulação pretende dar a entender que as leis econômicas, pela sua formulação, não permitem o seu cumprimento rigoroso e, por maioria da razão, não são vinculativas, deixando, por isso, ao critério de cada um o seu cumprimento. Ora, uma lei, é uma norma de caráter geral, definida por mandato do Poder competente e constituído para a impor. Ela deve ser acatada por todos. Trata-se de uma disposição imperativa e geral de atuação estadual, por isso, de cumprimento obrigatório. Aliás, Ascensão (1987) defende que a lei é o texto ou fórmula, imposto através do ato normativo, que contém regras jurídicas. Acrescenta, ainda, que “a Lei em si não é primacialmente uma atividade, nem uma regra, mas um texto ou fórmula, de certa maneira qualificados”.  A evolução das ciências exatas pode constituir uma das razões que levou os estudiosos a defenderem a    existência das leis econômicas, embora estas resultem de teorias e doutrinas, mas que algumas das suas formulações possuem comandos jurídicos quando se trata, por exemplo, de exigir aos agentes econômicos os cumprimentos de uma obrigação no âmbito da atividade econômica. Ora, se a lei regula uma relação entre o poder constituído e os particulares e serve de comando na regulação das pessoas em sociedade, é nesta base que a ciência econômica pretende, a nosso ver, aproveitar-se para fazer valer a sua existência, também, na atividade econômica, através das designadas leis econômicas. Contudo, o problema reside na observância dos preceitos normativos pelos destinatários de tais leis. Embora a lei, através dos seus comandos normativos, obrigue os destinatários ao seu cumprimento rigoroso, o mesmo não se pode dizer em relação ao grau de aceitabilidade no cumprimento das ditas leis econômicas provenientes dos pensadores econômicos. Entretanto, em economia política, existem aspectos de índole moral, como seja a forma como a sociedade encara a vida em sociedade, a questão do respeito mútuo e a conduta social em todos os seus aspectos, onde subjaz a ideia de uma lei moral, em que os particulares a ela se acham adstritos. Pelo seu comportamento, a pessoa humana sabe que uma determinada conduta pode ser lesiva ou pode criar um desfasamento ou perturbação na economia. Veja-se, por exemplo, alguém que coloca, no mercado, uma determinada mercadoria e especula o seu preço, não permitindo a sua procura ou compra pelos clientes. Tratando-se de um bem de necessidade primária, o Estado, pode criar uma lei para regular a oferta e a procura desse bem. Neste caso, será exigido, ao agente econômico que coloca o bem no mercado, o cumprimento das regras estabelecidas na referida lei. Caso não cumpra com a determinação legal, sujeita-se à penalização. Suponhamos, também, que alguém, sem prévia autorização do Banco de Moçambique (Banco Central), decide levar dinheiro para o estrangeiro e é detectado na fronteira.  Neste caso, trata-se de uma infração que deverá ser analisada em dois aspectos: a infração legal, em sentido jurídico, e a infração da ordem ética econômica e social, preenchendo, esta, a infração moral. O sujeito infrator sujeita-se à punição. Esta é a força que a lei monetária possui, enquanto comando normativo de cumprimento obrigatório, o que não acontece, por exemplo, quando o infrator é criticado pela população pelo ato praticado. A lei que consagra a observância de    poupança ou a reserva financeira para efeito de investimento numa atividade empresarial, por exemplo, o empresário poupará se tiver dinheiro para tal e criará uma reserva financeira, caso   obtiver um determinado ganho, dependendo da sua capacidade de obtenção do rendimento para o efeito. Diferentemente, por exemplo, da situação em que o empresário é obrigado a consignar um determinado valor monetário em jeito de poupança, e, não o fazendo, pode incorrer numa infração legal. Ora, caso o agente infrator pratique ato lesivo sem o conhecimento das autoridades competentes, poderá, a sociedade, repreendê-lo veementemente. Como se pode observar, todos os exemplos arrolados se misturam em volta de vários conceitos jurídicos e econômicos, realçando-se o fato de que a norma jurídica e o direito, em geral, distinguem-se da norma de ética e da moral.  O direito, como é sabido, não se identifica com a moral, sendo, contudo, defensável que, porque a sociedade tem valores a defender, a moral surge como elemento fundamental no âmbito da justiça. O direito é motivado pela justiça. É fato assente que a vida econômica e social se desenvolve na base de certas regras, cabendo à economia política revelar o efeito de tais regras e sua aplicação de forma eficiente. Aliás, as regras econômicas traduzem uma relação intrínseca, essencial e permanente entre os fenômenos econômicos e sociais, ou seja, na vida econômica e social. Não duvidamos de que as regras econômicas visam atingir um certo objetivo e dependem da vontade ou consciência dos homens, no entanto, elas diferem das leis da natureza, porque surgem apenas no processo da atividade econômica levada a cabo pelo Homem e traduzem a essência das relações de produção e consumo.  As leis da natureza obedecem a princípios fora do controle do ser humano.  As regras econômicas variam de acordo com os modos de produção e de sociedade para sociedade, e tendem a vigorar durante um certo período e num determinado espaço. As leis econômicas designadas para traduzirem a essência das relações econômicas entre o Estado e os agentes econômicos no âmbito dos planos econômicos, que variam no âmbito do processo ou circuito econômico, possuem, também, comandos jurídicos, e não podem ser enquadradas no âmbito das leis enunciativas das teorias e doutrinas econômicas.  Elas visam especificar a forma como a atividade econômica se deve desenvolver e se podem encaixar numa lei do plano econômico, instrumento jurídico essencial que vincula as pessoas jurídicas por ela abrangidas. Desta lei, podem surgir leis gerais que visam a materialização de cada situação econômica específica, ou seja, o que deve ser feito com vista a atingir-se os objetivos consagrados na lei do plano econômico. O mais certo seria apelidá-las de leis de economia ao invés de leis econômicas.

5. LEIS ECONÔMICAS: NORMATIVAS OU ENUNCIATIVAS?

Conforme vimos, as leis econômicas não criam normas jurídicas no verdadeiro sentido de direito, mas, sim, enunciam regras de conduta especializada aos agentes econômicos no âmbito da sua atividade econômica. Elas não podem, por isso, ser designadas de leis no verdadeiro sentido jurídico, porque não vinculam e não sancionam os agentes econômicos no âmbito da sua aplicação. As ditas leis, porque enunciativas, expõem e propõem um pensamento doutrinário sobre os diversos fenômenos econômicos. São leis que, pela sua natureza e relação lógica, formam um sistema coerente de pensamento econômico, usado pela sociedade na atividade econômica, enquanto as leis normativas, geralmente conhecidas como criadoras de normas jurídicas, caracterizam-se pela generalidade, abstração e sansão. São vinculativas e de cumprimento obrigatório. Aliás, há, uma clara identificação da lei com o direito, devido a expansão do seu império, sobretudo, se tivermos em conta, a partir do iluminismo e do positivismo, em que se acreditava na reorganização social pela via normativa, a decisão razoável que tomada por homens razoáveis, ou seja, os parlamentares burgueses dessa época.  O Estado nunca abdicou de usar a lei como seu instrumento de monopólio no âmbito da normatividade, em defesa da segurança e certezas jurídicas, entre outros fatores que podem assegurar a existência e manutenção do poder político. Em suma, podemos dizer que as leis econômicas são enunciativas e não vinculativas, resultam de proposições, exposições e declarações doutrinárias, resultantes de pensadores econômicos de determinadas épocas, e o seu cumprimento é facultativo, enquanto as leis normativas emanam de órgãos de soberania, e o seu cumprimento é vinculativo e obrigatório. Assim entendido, não se pode falar de um conflito terminológico, porquanto as leis econômicas, conforme vimos, são consideradas regras enunciativas, enquanto, na gíria jurídica, as leis são sempre leis no verdadeiro sentido, não deixando qualquer dúvida quanto às suas características e o seu verdadeiro sentido objetivo.

6. CONCLUSÃO

A polêmica que se levanta em relação à expressão “leis econômicas”, quanto ao seu verdadeiro significado, preocupa os estudiosos das ciências sociais devido ao fato de haver confusão em relação à sua designação em sentido jurídico. Os economistas falam de leis econômicas quando se referem   aos princípios, proposições, teorias e doutrinas econômicas no âmbito da produção, das trocas e do consumo. E porque tais matérias se enquadram no âmbito das probabilidades e opções e de como se pode utilizar os recursos produtivos escassos numa sociedade organizada, quanto a sua geração e apropriação, tal baseia-se em algumas leis que são estabelecidas e implementadas. Aliás, o desenvolvimento da economia tem como consequência a criação de suas próprias leis, na descrição, explicação e previsão, podendo, contudo, haver incertezas e variáveis que podem alterar as previsões e os objetivos esperados. No entanto, o Estado, através dos seus órgãos, cria leis que visam a regulação e harmonização da atividade econômica. Tais leis econômicas são as que regulam aspectos econômicos e as relações entre os diversos agentes econômicos, diferentemente das leis que enunciam proposições, declarações ou posições doutrinárias sobre determinada matéria econômica. A economia política, porque ciência histórica, estuda as leis específicas de um sistema econômico e social, historicamente, num determinado tempo, e as suas modificações não obedecem ao tradicional processo legislativo levado a cabo pelos órgãos legislativos, mas, sim, em face dos fenômenos econômicos que se desenvolvem num determinado tempo da vida social. Por isso, as leis econômicas não são, de fato, verdadeiras leis, mas sim regras enunciativas sobre a realização e o desenvolvimento do processo econômico num determinado espaço e tempo, e emanam de pensamento econômico, diferentemente das leis normativas, que emanam de órgãos de soberania e têm carácter vinculativo e de cumprimento obrigatório.

REFERÊNCIAS

ASCENSÃO, J. de O. O direito: introdução e teoria geral: uma perspectiva luso-brasileira. 4ª ed. Lisboa: Editorial Verbo, 1987. 

DURAND, P.  L’ évolution Contemporaine du droit de la concurrence.  In: ROUBIER, P. Mélanges en l’honneur de Paul Roubier: Droit privé, propriété industrielle, littéraire et artistique. França: Librairies Dalloz & Sirey, 1961.

FONTAINE, M. L’evolution du droit de la concurrence. Annales de La Faculte de Droit de Liège, v. 12, n. 1/2, p. 135–154, 1967.

HEISENBERG, W. Physics and Philosophy. Londres: George Allen & Unwin, 1981.

MARSHALL, A. On the method and history of economics C. 1870. 5ª ed. reimp. Sydney: University of Sydney, 1990.

MARTÍNEZ, P. S. Economia Política. Coimbra: Almedina, 1990. 

PORTUGAL. Decreto-Lei n.º 47344, de 25 de novembro de 1966. Aprova o Código Civil e regula a sua aplicação – Revoga, a partir da data da entrada em vigor do novo Código Civil, toda a legislação civil relativa às matérias que o mesmo abrange. Disponível em: https://dre.pt/dre/detalhe/decreto-lei/47344-1966-477358. Acesso em: 1 nov. 2022.

SAMUELSON, P. A; NORDHAUS, W. D.  Economia. 12ª ed. São Paulo: McGraw-Hill, 1988.

VALIER, J.   Breve história do pensamento económico de Aristóteles aos nossos dias. Lisboa: Texto & Grafia, 2016.

[1] O presente material tem como escrita o Português de Moçambique, podendo conter divergência linguística com o Português do Brasil.

[2] Doutor em Direito.

Enviado: Outubro, 2022.

Aprovado: Novembro, 2022.

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