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Principais indicadores socioeconômicos do arranjo produtivo de calçados de Campina Grande, PB

RC: 71093
201
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/geografia/arranjo-produtivo

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

ALMEIDA, Hermes Alves de [1], SOUSA, Getulio Pamplona de [2]

ALMEIDA, Hermes Alves de. SOUSA, Getulio Pamplona de. Principais indicadores socioeconômicos do arranjo produtivo de calçados de Campina Grande, PB. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 12, Vol. 16, pp. 85-102. Dezembro de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/geografia/arranjo-produtivo, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/geografia/arranjo-produtivo

RESUMO

Os arranjos produtivos locais são aglomerações de empresas, instaladas num mesmo recorte geográfico, com especializações produtivas, que resultam na geração de emprego e renda. O objetivo principal deste trabalho foi o de estabelecer os principais indicadores socioeconômicos do arranjo produtivo de couro e calçado de Campina Grande (APCC), PB. Utilizaram-se dados sociais e econômicos publicados relacionados ao seguimento de calçados e um estudo de caso, com vinte empresas locais. Foram aplicados questionários semiestruturados, com perguntas aos atores sociais diretamente relacionados às empresas. As análises foram feitas com base na estatística descritiva, utilizando-se a planilha Excel. O APCC de Campina Grande tem grande importância histórica, econômica e social e é o responsável por mais de 90% de todos os calçados produzidos no Estado da Paraíba. Há necessidade de mais apoio técnico, cooperação e inovação, visando aprimorar novas técnicas de produção e alcançar novos nichos de mercados consumidores. Urge a necessidade de se estabelecer estratégias futuras, no curto ou médio prazo, sobre a opção do material predominante do setor de calçados; o couro ou o plástico/borracha.

Palavras-chave: arranjos produtivos, desenvolvimento, inovação tecnológica.

1. INTRODUÇÃO

As transformações socioeconômicas, políticas, ambientais e culturais ocorridas no cenário mundial e, por conseguinte, no contexto empresarial, impulsionaram não somente a discussão, mas também, a procura por alternativas promissoras que possibilitassem alcançar a competitividade de mercados. Nesse contexto, a inovação e a tecnologia vieram através do arranjo produtivo local (APL).

As atividades do seguimento industrial de Campina Grande, Paraíba, a partir dos meados das décadas do século passado, a priori, eram constituídas por empresas “tradicionais”, não somente pela opção, mas por concentrar nos ramos de alimentos, têxtil, extração de produtos vegetais e de couros, especialmente, o curtimento de peles.

Os incentivos fiscais oriundos da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), a partir da década de 1960, proporcionaram o soerguimento e inclusão de empresas produtoras de bens e serviços, agrupando-as no mesmo recorte geográfico e formando-se, o que se denomina, atualmente, de arranjo produtivo local.

As atividades de couro e calçados no Nordeste brasileiro e, especificamente, no Estado da Paraíba têm “enraizamento” histórico em Campina Grande. Esse pioneirismo se deve, em grande parte, a tradição na comercialização de couros e artefatos, existente desde o início do século XX, que influenciou no surgimento da pequena indústria de calçados, de empresário local (ROCHA; VIANA, 2006).

As políticas públicas promovidas pela SUDENE, por meio do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste, possibilitaram novos investimentos no aglomerado de empresas de calçado em Campina Grande, com destaque para a maior empresa, a São Paulo Alpargatas, fabricante das sandálias havaianas, por gerar milhares de emprego e renda.

A forma de organização, cooperação e aproveitamento coletivo, como preceitua um APL, fortalece a sobrevivência e o crescimento das pequenas e médias empresas, além da oportunidade na geração de emprego e renda e, consequentemente, o desenvolvimento local e/ou regional (CASSIOLATO e LASTRES, 2000)

A indústria de calçados em países em desenvolvimento sempre teve relevância para a economia local e/ou regional, por ser uma atividade geradora de emprego e renda. Com o declínio ou extinção da produção de algodão e da indústria têxtil, em Campina Grande, o seguimento de couro e calçado passou a integrar o desenvolvimento local, como a atividade promissora, formando aglomerados de pequenas e micros empresas, ou seja, Arranjo Produtivo de Couro e Calçado (APCC) de Campina Grande.

O sucesso deste APCC credita-se as parcerias e aos apoios de instituições locais, especialmente, a Federação das Indústrias do Estado da Paraíba (FIEP) e o Centro de Tecnologia do Couro e Calçado Albano Franco (CTCC), que contribuíram na inovação tecnológica, no design e no parque produtivo (SINDICALÇADOS/PB, 2018).

Os clusters são outras denominações para os tipos de aglomeração de empresas, termo esse citado pela primeira vez por Porter (1990). Embora exista alguma semelhança entre APL e cluster, no Brasil esse tipo de aglomerado de empresa foi popularizado por arranjo produtivo local.

Com a evolução do conceito de desenvolvimento, para fortalecer o paradigma da sustentabilidade, incorporaram-se nas discussões de arranjo produtivo local ponderações sobre as dimensões (ALVARENGA et al., 2013).

Neste contexto, o desenvolvimento local, inicia-se a partir do aproveitamento de potencialidades locais e desencadeia numa cadeia produtiva, com geração de emprego e renda, nas escalas locais e regionais. Os novos formatos organizacionais induzem as empresas o trabalho conjunto em busca de benefícios, mesmo existindo dicotomias existentes entre si.

No cenário atual da globalização e modernização da economia, a competitividade das empresas precisa, a cada dia, não somente oferecer bons preços e qualidade dos seus produtos e serviços, mas procurar sempre a inovação (CASSIOLATO e LASTRES, 2000).

Somente entre a década de 1980 e 1990 esses aglomerados passaram a ser denominados de Arranjos Produtivos Locais, ancorado no enorme sucesso comercial das empresas instaladas nos distritos industriais italianos e no Vale do Silício na Califórnia (BNDES, 2020?). A ação de políticas tanto públicas quanto privadas pode contribuir para fomentar e estimular em longo prazo (SOUZA, 2003).

A partir do final dos anos 1990 e com a contribuição da Rede de Pesquisa em Sistemas e Arranjos Produtivos Locais (Redesist), essas aglomerações fizeram partes nos debates acadêmicos, na busca do apoio para o desenvolvimento de sistemas e arranjos produtivos e inovativos no Brasil (LASTRES et al., 2014).

Marshall (1890) foi um dos pioneiros nos estudos sobre a existência de aglomerações industriais produtivas, nas quais a localização era vista como um ambiente gerador de vantagens competitivas. Ele presumia a formação de uma rede de empresas de pequeno e médio porte, como condição para privilegiar a iniciativa local e a interação entre empresas e instituições, semelhantes aos distritos industriais italianos.

Na visão de Santolin e Caten (2015), os distritos industriais seriam aglomerações de empresas de um determinado setor de atividade e companhia correlatas, com características a proximidade geográfica, a especialização setorial, a predominância de pequenas e médias empresas, a presença de colaboração e competição entre firmas.

Emergem, a partir daí conceitos amplamente utilizados na literatura como os clusters, utilizado pela primeira vez por Porter (1990), como sendo uma aglomeração de empresas. Os clusters são concentrações geográficas de empresas de um setor específico que englobam arranjos de empresas que fornecem matérias primas, serviços e infraestrutura especializadas (PORTER, 1998; SCHMITZ, 1999).

A capacidade competitiva de clusters advém da proximidade geográfica, que possibilita acessos a empregados, fornecedores e instituições de apoio, relacionamentos, incentivos, produtividade e inovação (PERRY, 2005).

Diante disso, houve a necessidade de se estabelecer as principais características de inovação e cooperação dos arranjos produtivos de couro e calçados de Campina Grande (APCC) e suas relações com o desenvolvimento, sendo essas determinações os objetivos principais.

2. MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho teve como base o arranjo produtivo de couro e calçado (APCC), localizado na cidade de Campina Grande, PB, latitude 07º13’51”S, longitude 35º52’54”W e altitude 512 m, região geográfica intermediária de Campina Grande, PB.

O município de Campina Grande possui uma extensão territorial de 595,5 km2 e com uma população estimada, em 2018, de cerca de 410 mil habitantes. Exerce grande influência política e econômica sobre o “Compartimento da Borborema”, composto por mais de 60 municípios e uma população de quase 1 milhão de habitantes.

A gênese da indústria de couro, de curtimento de peles e derivados de calçados, historicamente, surgiu, na Paraíba e, em especial, em Campina Grande. Essa atividade decorreu da comercialização de couros no interior do Estado e, especial, no município de Campina Grande, quando começou a surgir, no início do século passado, as primeiras indústrias de processamento de couros, bem como a de calçados, com predominância de pequena empresa.

Os procedimentos metodológicos constituíram em duas formas principais de coleta de dados. Uma documental e a outra de coleta de dados, in loco, das empresas e dos atores socais envolvidos no arranjo produtivo de couro e calçados de Campina Grande.

Os dados oriundos de documentos oficiais, relacionados aos indicativos sociais e econômicos do seguimento de couros e calçados, publicados em revistas, relatórios e/ou disponibilizados nos sites das seguintes instituições: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (ABICALÇADOS), da Rede de Pesquisa interdisciplinar em Arranjos e Sistemas Produtivos e Inovativos Locais (RedeSist), Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial e a Federação das Indústrias da Paraíba (FIEP). Além do Banco do Nordeste, Sindicatos dos calçados da Paraíba (Sindicalçados/PB).

Os procedimentos metodológicos seguiram os critérios propostos por Gil (2002), aplicando-se questionários semiestruturados, com cerca de 100 perguntas, aos gestores e/ou responsáveis de vinte empresas, relacionadas: ao perfil geral das empresas, tipos de calçados, grau de importância da localização, cooperação formal e informal, empregos gerados, grau de cooperação entre as empresas, dentre outras.

De posse de todos os dados, foram estabelecidas as principais características dos aspectos sociais e econômicos do APCC de Campina Grande. Os critérios técnicos de análises foram feitos mediante o uso da estatística descritiva, utilizando-se a planilha eletrônica Excel, para execução dos cálculos e confecções dos gráficos.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

3.1 A EVOLUÇÃO DA CADEIA PRODUTIVA DE CALÇADOS: O CASO DE CAMPINA GRANDE

O parque industrial de Campina Grande se desenvolveu com o advento da rede ferroviária, impulsionado pelo comércio do algodão. As atividades do ramo algodoeiro foram fundamentais para as transformações do espaço urbano campinense que culminou com a instalação das primeiras indústrias na cidade.

Corrobora-se com os relatos de Oliveira (2007), que essa industrialização surgiu juntamente com a produção pecuária e o cultivo do algodoeiro, quando passou a exercer influência de âmbito regional a partir do século XIX. Logo no início do século XX, o transporte ferroviário transformou a relação do sistema produtivo da Paraíba e proporcionou à cidade de Campina Grande, um avanço econômico, principalmente, relacionado ao escoamento mais rápido da produção de algodão.

As indústrias calçadistas nem sempre são modernas em tecnologia e em organização e tem uma cadeia que passa pela industrialização do calçado (masculino, feminino, infantil e esportivo), importação de insumos, desenvolvimento e marketing até chegar as diferentes etapas da comercialização.

As indústrias de calçados são intensivas em todo o mundo e grande geradora de emprego e renda. No relatório da Abicalçados (2018) destacou o Brasil como sendo o terceiro maior produtor, oitavo maior exportador e quarto maior consumidor de calçados do mundo. Esses resultados convergem com os de Klein (2008), ao relatar as vantagens competitivas do Brasil na tradição com couro e manufaturas, tanto por possuir uma sociedade consumidora de moda quanto pela gama de produtos e preços.

A indústria calçadista brasileira se concentrava, principalmente, nos Estados do Rio Grande do Sul e São Paulo. Na Paraíba, ela teve início por volta da década de 1940, no município de Cajazeiras e, posteriormente, com os incentivos da SUDENE, nos anos 60, para Patos e Campina Grande.

Até o término da década de 1950, a indústria campinense tinha pouca ou nenhuma expressão, se concentrava na atividade de couro e pele e na produção têxtil, bebida, sabão, alimentos e beneficiamento do algodão.

O processo de industrialização de Campina Grande começou a se desenvolver a partir da década de 1960, com a instalação da Federação das Indústrias do Estado da Paraíba (FIEP), com sede em Campina Grande, que liderou o processo de desenvolvimento da estrutura produtiva campinense.

O perfil da indústria calçadista em Campina Grande se dá no modelo de aglomerados e é formado em três categorias: a) Microempreendedor Individual (MEI) e informal; b) Sociedade Empresária Limitada (LTDA), e c) Sociedade Anônima (SA).

A categoria MEI é predominantemente forte na informalidade e funciona na sua grande maioria nos fabricos de fundos de quintais e quase toda produção é vendida internamente e/ou para os estados circunvizinhos.

As unidades fabris, em geral, instalam-se em típicas casas de áreas suburbanas (fábricas de fundo de quintal), como mostra a Figura 1

Figura 1. Vistas das unidades de fabricação de calçados. Campina Grande, PB.

Fonte: os autores

Como forma de apoio para estes pequenos produtores a Prefeitura Municipal, através da administração da Agência Municipal de Desenvolvimento (AMDE), instalou uma unidade de produção coletiva onde congrega empresas formais e informais. O APC é predominantemente familiar e informal. Embora, as instituições de apoio estejam se mobilizando na tentativa de reorganizar esse espaço produtivo e dando suporte para que os atores locais formalizem suas situações e possam auferir dos direitos que o mercado oferece.

A maioria dos proprietários do setor informal tem baixo nível de escolaridade formal, porém, possuem larga experiência na confecção de calçados.

A Sociedade Empresária Limitada (LTDA) é constituída por empresas formais e com produção destinada para outros mercados fora da Paraíba. Atende quase todo o Brasil e algumas delas exportam parte da produção para outros países, principalmente, os latinos americanos.

A maior empresa local no seguimento de calçados enquadra-se na categoria Sociedade Anônima, como por exemplo, a São Paulo Alpargatas (sandálias havaianas) que sozinha produz mais de 70,0 % de calçados tanto em quantidade de pares quanto em valor monetário (exportação).

A comercialização de calçados de Campina Grande, nas três categorias de empresas do APCC e, em especial, as micros têm dificuldades de comercializar em virtude da carência de estrutura de escoamento. Condição essa, que nem sempre existe nas empresas formais, mais organizada e, portanto, com mais chances de mercados.

Os canais de comercialização são importantes ferramentas comerciais, que visam diminuir o impacto da competição acirrada e, por isso, as empresas precisam aprimorar as alternativas para levar os produtos e serviços aos clientes, o que concorda com as recomendações do Sebrae (2014).

Os micros empresários formais e informais configuram-se em vender, na sua maioria, direto ao comprador. A Figura 2 apresenta o perfil com as diferentes formas de comercialização.

Os grandes varejistas e atacadistas (Figura 2) participam no processo como intermediários, fazem vendas no atacado para os pequenos comerciantes, porém, essa modalidade exige à condição de preços mais acessíveis, quando muitos produtores não conseguem atender essa demanda.

Os quantitativos apresentados revelam que as principais formas de comercialização dos micros empresários (≈80,0 %) são para os comerciantes com vendas no atacado e para os pequenos varejistas. Conforme relatos de Kehrle e Moutinho (2005), as empresas sediadas em Campina Grande constituem a base de uma dotação de capital social tangível sem similar no interior no Nordeste, considerada como privilegiadas mesmo quando avaliadas no nível nacional.

Figura 2. Frequência relativa das principais formas de comercialização dos micros empresários do AP de couro e calçado de Campina Grande, PB.

Fonte: ABICALÇADOS (2018), adaptado pelo autor

A maioria das empresas deixa em segundo plano a questão da funcionalidade e qualidade. Evidencia-se que há pouca preocupação com o quesito qualidade, optando pelo uso do material sintético a fim de atingir os nichos de mercados com baixo poder aquisitivo. Talvez essa seja o fator que explica a Paraíba produzir mais que São Paulo, mas perde em faturamento no ranking nacional. Parece óbvio que São Paulo ao agregar na matéria prima o couro, por exemplo, o valor final do calçado será maior.

Os principais destinos de comercialização da produção do APCC de Campina Grande são os estados nordestinos, principalmente, Pernambuco. Muitos dos aglomerados das empresas trabalham sob encomendas e as demais, comercializam seus produtos nas feiras locais, exposições e por ambulantes.

As instituições financeiras responsáveis pelo suporte aos investimentos industriais no Nordeste brasileiro foram: o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), cujas políticas foram orientadas pelas diretrizes do Plano Brasil Maior (PBM), do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). O BNB dispõe de linhas de crédito para o setor industrial, como por exemplo, dos Programas de Financiamento à Inovação.

O Estado da Paraíba ainda contou com o apoio de dois fundos: o de Apoio ao Desenvolvimento Industrial da Paraíba (FAIN), administrado pela Companhia de Industrialização do Estado da Paraíba (CINEP), que objetiva a concessão de empréstimos subsidiados para financiar investimento fixo e fortalecer capital de giro, através do Imposto sobre Circulação de Mercadoria (ICMS); e o da Industrialização do Estado da Paraíba (FUNDESP), que tem por finalidade gerar financiamentos em caráter excepcional e complementar os financiamentos bancários, destinados à aquisição de máquinas e equipamentos.

A excelente localização geográfica de Campina Grande, associada ao potencial tecnológico trouxe vantagens competitivas para a indústria local, formando aglomerados de empresas de pequeno e médio, as quais se interligam entre si o que favorece a sinergia entre os agentes produtivos.

A evolução do Produto Interno Bruto (PIB) campinense, de 2010 a 2015, quase dobrou, saindo de 4,993 bilhões de reais, em 2010, para 7,978 bilhões de reais, 2015. Isso mostra, portanto, a pujança econômica da cidade, apesar da grave crise que assolou o Brasil nos últimos anos.

Outro aspecto importante para o desenvolvimento do município é a atividade educacional de nível superior, com universidades públicas e privadas. Além disso, a referida cidade tem dois importantes polos tecnológicos, sendo um na área de couro e calçados e outro, de tecnologia da informação.

Outro indicador importante é o índice de desenvolvimento humano municipal (IDH-M), tem por finalidade medir os parâmetros de saúde, educação e renda para a promoção do desenvolvimento do município, cujas frações de renda, longevidade e educação, mostraram ascensão temporal, no período de 1991 a 2010. Os itens renda e educação, por exemplo, saíram, respectivamente, de 0,584 (1991) para 0,702 (2010) e de 0,316 (1991) para 0,654 (2010).

3.2 O COMPLEXO CALÇADISTA E A COMERCIALIZAÇÃO NO BRASIL E NO MUNDO

O complexo de couro e calçados no Brasil, começou a se desenvolver em meado do século XIX ainda de forma artesanal. As maiores tradições pecuaristas foram, por exemplo, o Vale dos Sinos, no Rio Grande do Sul, com a imigração alemã, e Franca, em São Paulo, com os italianos, contribuíram positivamente para a consolidação da indústria de calçados, organizada por pequenas e médias empresas com gestão familiar.

Concorda-se com Noronha e Turchi (2002), que a origem teuto-brasileira na formatação desse conjunto de empresas no RS teve uma dinâmica diferenciada no seu desenvolvimento, gerando identidades e formas de cooperação entre os empresários do setor. Com tecnologia informatizada, a partir da década de 1970, surgiu uma nova dinâmica na produção, passando a contar com uma indústria sólida e integrada ao mercado internacional.

O domínio do mercado mundial de calçados, dos países em desenvolvimento, durante a década de 1980, coube a China e a Índia os principais protagonistas. Esse panorama resultou de estratégias adotadas pelos países desenvolvidos em concentrar segmentos industriais mais especializados e de alta tecnologia, enquanto as economias em desenvolvimento dedicam a segmentos que necessitam mais de mão de obra.

Condições essas que corroboram com as afirmações de Santana (2014), que o domínio compatível, para esse mesmo período, resultou no aumento da produção e do consumo de calçados, numa proporção superior ao crescimento da população mundial.

Conforme resultados do relatório da Abicalçados (2018), a ascensão do consumo interno e externo da cadeia produtiva de calçados, no biênio 2017 e 2018, fez com que as exportações atingissem 58% da produção mundial, além dos 54,0 % de consumo interno dos países que provém de calçados importados.

Dos dez maiores produtores mundiais de calçados, em 2016, seis são asiáticos, dos quais China, Índia e Vietnã produzem 72,28% da produção mundial.  A participação na produção de calçados, em pares, do principal produtor por estado é apresentada na Figura 3.

Figura 3. Participação percentual de pares de calçados dos principais polos calçadistas/estado.

Fonte: ABICALÇADOS (2018), adaptado pelo autor.

Comparando-se os percentuais do principal polo de produção de pares de calçados, de cada localidade/estado (Figura 3), verifica-se que, a participação dos indicadores, em %, de Campina Grande, PB, foi sempre superior, em cada um dos anos analisados, do que em qualquer outro local.

Analisando-se a participação dos dois polos do nordeste, nos anos de 2015 a 2017, verifica-se que a concentração do polo de calçados de Campina Grande, PB, foi, em média, 93,1 % contra 62,8 % do de Sobral, CE, ou seja, o polo campinense participou com 48,33% a mais do que o de Sobral.

Escolhendo-se o APCC de Campina Grande, como referência para o nordeste, contata-se uma participação 86,82% maior do que, a média, dos dois polos principais da região Sudeste e de 66,1% do da região Sul.

É importante destacar, também, a estimativa de calçados produzidos, no recorte geográfico estadual e não por polo. Escolheu-se para apresentar (Figura 4), a produção para os três maiores produtores estaduais, em milhões de pares de calçados.

Ao se confrontar, individualmente, os polos (Figura 3) com a participação na segmentação da produção de cada um dos três estados (Figura 4), verifica-se que existem diferenças na produção de pares de calçados.

Figura 4. Participação na segmentação da produção de calçados, em milhões de pares, dos três principais estados produtores.

Fonte: ABICALÇADOS (2018), adaptado pelo autor

O Estado do Ceará passa a ter a maior participação nacional, percentual e em número de pares, com produção superior a 255 milhões de pares, contra 161 e 186 milhões da Paraíba e Rio Grande do Sul, respectivamente, ou seja, produziu a mais, tanto ano a ano quanto no período estudado, 59,1 e 36,8 %, respectivamente.

Apesar dos avanços tecnológicos na indústria de calçados, a participação da mão de obra humana se faz necessário, incluindo-se a modelagem, o corte, a costura, embalagem e expedição. A subcontratação de trabalhadores para a confecção do calçado, especialmente, tende a gerar “gargalos” na produção. Essa é uma prática historicamente utilizada pelas indústrias. Concorda-se com a sugestão de Druck (2011), que a terceirização encontrou justificação para legitimar a sobrevivência empresarial numa conjuntura de crise e instabilidade econômica.

Dos diversos setores da economia, o da indústria calçadista é um dos mais favoráveis a geração de empregos e o aumento das divisas. A Figura 5 sumariza os quantitativos de postos de trabalhos na indústria de calçadista, nos três principais estados produtores de calçados.

Figura 5. Postos de trabalho na indústria calçadista, dos três principais estados produtores de calçados.

Fonte: ABICALÇADOS (2018), adaptado pelo autor

Mesmo com as crises econômicas local e internacional, observa-se (Figura 5) tendência de crescimento e/ou de manutenção dos postos de trabalhos ao longos desses três anos. Com boa parcela da capacidade instalada dos arranjos produtivos de couro e calçados ociosa, num cenário econômico mais favorável, poderia retomar as contratações, sem necessidade de grandes investimentos em estruturas e equipamentos, em virtude da qualidade do parque fabril instalado.

As turbulências políticas e econômicas internacionais, associadas às consequentes oscilações cambiais, além dos problemas estruturais do sistema produtivo brasileiro não foram suficientes para reduzir a venda de calçados ao mercado externo, em 2017, obtendo-se, assim, a maior receita nas exportações desse setor desde 2013.

As Figuras 6 e 7 mostram, respectiva, os resumos da venda de calçados no mercado interno (estado) e externo (países), em milhões de pares e de dólares.

O destino de venda para o estado do Rio Grande do Sul se mostra superior em receita (dólares) do que os demais, mas em termos de quantidades de pares de calçados é inferior ao Ceará (Figura 6). Na média, dos três anos analisados, a receita cambial do RS foi de 419 milhões de dólares contra 274 milhões de dólares do Ceará, ou seja, 53,0 % mais dólares, embora tenha produzido 52,0 % menos de pares de calçados.

O Estado da Paraíba ocupa o terceiro destino de venda de calçados tanto em quantidades de pares de calçados quanto em receitas cambiais (dólares). Do montante produzido, mais de 90% provém do APCC de Campina Grande.

Figura 6. Principais destinos de venda interna de calçados, em US$ e pares.

Fonte: ABICAÇALDOS (2018) adaptado pelo autor.

Figura 7. Principais destinos das exportações de calçados brasileiro

Fonte: ABICAÇALDOS (2018) adaptado pelo autor.

A balança comercial da produção e consumo mundial de calçados tem mostrado um saldo positivo, ou seja, exporta mais do que importa. Os quatros principais destinos das exportações de calçados brasileiros, em milhões de dólares e em número de pares, são mostrados na Figura 7

Observa-se (Figura 7) que os EUA e o país que gera as maiores receitas de exportação de calçados, seguido pelos países do MERCOSUL (Argentina e Paraguai) e o associado (Bolívia). No entanto, quando se compare as receitas com os números de pares de calçados importados, constata-se que os números de pares de calçados vendidos para Paraguai, nesse período, foi, em média, 16,0 % maior, o equivalente a mais de 2 milhões de pares.

Confrontando-se os dois histogramas (US$ e pares) ano a ano (Figura 7), para os dois países citados, observa-se que são duas relações inversas (EUA « Paraguai), ou seja, gerando maiores receitas para os EUA vendendo menos pares de calçados, com média de exportação, em milhões de dólares, quatro vezes maior.

Nota-se, também, que ao comparar a Argentina com o Paraguai (Figura 7), observa-se semelhança no perfil, cuja receita cambial é cerca de duas vezes maior e compra menos de cinco milhões de pares de calçados.

No ano de 2017, as exportações brasileiras de calçados atingiram o patamar superior a um bilhão de dólares, com taxas de crescimento para os cinco mercados sul-americanos: Paraguai (57,4%), Bolívia (41,5%), Argentina (31,7%), Peru (15,1%) e Equador (10,4%). Enquanto que no mesmo período ocorreu uma queda nas exportações para os Estados Unidos (-5,5 %).

As discussões, semântica e a formação dos arranjos produtivos locais, sequer perpassam por uma análise mais refinada do caráter inovador e de políticas públicas, principalmente, no intuito de geração de emprego e renda, difusão da tecnologia e desenvolvimento local.

Concorda-se com a velha teoria de Schumpeter (1984) que, a inovação é a “força motriz” do desenvolvimento econômico. Os APL que desprezem os processos de inovação tecnológica e cooperação, não passarão de uma mera aglomeração de empresas produtiva, mas sem a dinâmica necessária para alavancar o desenvolvimento.

Essa tese corrobora com as abordagens de Perroux (1975) da necessidade que terão as empresas para buscarem a inovação tecnológica, nos moldes schumpterianos, ou seja, o surgimento de novas indústrias e o desaparecimento das velhas, fatores essenciais para o crescimento de uma determinada região.

CONCLUSÕES

Os Arranjos produtivos locais (APLs) requerem apoio técnico, aprendizagem coletiva, cooperação e inovação, visando aprimorar novas técnicas de produção, de redução de custos e novos mercados consumidores.

O Arranjo produtivo de Couro e Calçado de Campina Grande tem grande importância histórica, econômica e social e o responsável por mais de 90% de todos os calçados produzidos no Estado da Paraíba.

Evidencia-se na categorização do APCC de Campina Grande, formado na modalidade de sociedade limitada, maior organização, interação e cooperação entre os atores sociais do segmento.

Os indicadores sociais e econômicos dos APLs mostram serem atividades com maiores chances à geração de empregos e renda.

Urge a necessidade de se estabelecer estratégias futuras, no curto e/ou médio prazo, qual a opção preferencial pela cadeia produtiva, o couro ou material sintético.

REFERÊNCIAS

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ALVARENGA; R. A. M; MATOS, F. R. N; MACHADO, D. Q.; SOBREIRA, M. C.; MATOS, L. B. S. Arranjo produtivo local e desenvolvimento sustentável: uma relação sinérgica no município de Marco (CE). RAM, Rev. Adm. Mackenzie, v. 14, n. 5, p. 15-43, 2013.

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[1] Doutor e mestre em Agronomia e graduado em Meteorologia.

[2] Mestre em Desenvolvimento Regional.

Enviado: Agosto, 2020.

Aprovado: Dezembro, 2020.

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Hermes Alves de Almeida

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