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O impacto da perícia judicial nos casos de manifestações patológicas em revestimentos cerâmicos

RC: 61505
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/engenharia-civil/revestimentos-ceramicos

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

MAIA, Daniel Araújo [1], SILVA FILHO, Antônio Freitas da [2]

MAIA, Daniel Araújo. SILVA FILHO, Antônio Freitas da. O impacto da perícia judicial nos casos de manifestações patológicas em revestimentos cerâmicos. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 10, Vol. 04, pp. 81-97. Outubro de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/engenharia-civil/revestimentos-ceramicos, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/engenharia-civil/revestimentos-ceramicos

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo apresentar aos profissionais que atuam na área da construção civil o impacto da perícia judicial na análise das causas das manifestações patológicas em revestimentos cerâmicos. Buscou-se responder se a perícia judicial tem a importância necessária para servir como elemento norteador investigativo das causas das manifestações patológicas no revestimento cerâmico. Realizou-se um estudo de caso em um edifício localizado no Bairro de Patamares, no Município de Salvador/BA. O referido estudo possibilitou a identificação de manifestações patológicas e suas prováveis causas, bem como destacou a importância da NBR 13755 (ABNT, 2017). O estudo de caso baseou-se na leitura sistematizada da revisão bibliográfica acerca do tema, de forma a discorrer sobre as causas possíveis das fissuras e dos destacamentos das pastilhas nas jardineiras e nos muros de playgrounds. Buscou-se também discorrer sobre a importância da perícia judicial para a análise dessas manifestações patológicas e como o laudo produzido auxilia os magistrados em suas decisões em processos judiciais. Foi possível comprovar que, em geral, não existe uma causa específica para as ocorrências patológicas, e sim um somatório de fatores. Ademais, a ausência do rejuntamento das placas cerâmicas em algumas muretas caracteriza o uso inadequado do produto, seja este por especificação não apropriada ao tipo de exposição, por defeito do material em si ou do procedimento do seu preparo ou da aplicação. Assim, espera-se que este trabalho sirva como exemplo para novos empreendimentos no ramo da engenharia civil, a fim de evitar problemas técnicos ocasionados por descumprimento das Normas Técnicas Brasileiras.

Palavras-chave: Laudo, edificações, danos estruturais e estéticos.

1. INTRODUÇÃO

A obra de construção civil desdobra-se em várias fases. Todas importantes para o sucesso do empreendimento construtivo, principalmente, a fase final. Exigem-se redobrados cuidados na etapa final, por se tratar da concretização do projeto idealizado, bem como do aspecto estético da obra.

Destaca-se, em especial, a qualidade do revestimento como fator essencial para a estética do edifício. São recorrentes no mercado construtivo demandas judiciais, nas quais são narrados insatisfações e pedidos de responsabilização das construtoras.

Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Cerâmica para Revestimentos, Louças Sanitárias e Congêneres – ANFACER (2007), o Brasil é o segundo maior consumidor de cerâmica do mundo, sendo superado apenas pela China. Seu uso intenso é devido ao material ser, dentre as suas vantagens, de baixo custo, de boa qualidade, bonito esteticamente, além de aumentar a valorização imobiliária do imóvel.

As edificações são construídas pelo homem para abrigar o desenvolvimento satisfatório de inúmeras atividades fundamentais para a prosperidade da sociedade, como moradia, trabalho, educação, saúde, entre outras (DUARTE, 2001). Um dos materiais mais utilizados nas construções é o revestimento cerâmico.

Entre as principais justificativas para o uso do revestimento cerâmico, destaca-se o fato de ser um material de fácil limpeza, durável, o que permite uma manutenção por espaços longos de tempo, podendo ser resistente a ambientes corrosivos. Contudo, apesar de tantas vantagens, o destacamento das cerâmicas é algo que tem se tornado recorrente nas construções residenciais, comerciais e/ou industriais.

Diante desse dado, pergunta-se: Qual o impacto da perícia judicial como elemento norteador para investigar as causas das manifestações patológicas no revestimento cerâmico, principalmente quando são levadas à justiça reclamações a respeito da qualidade das edificações?

Como hipótese, admite-se que a perícia é importante para auxiliar o juiz com informações técnicas e científicas para o esclarecimento dos motivos das manifestações patológicas apresentadas no revestimento de edifícios. Segundo o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia – CONFEA, por meio da Resolução n. 345, de 27 de julho de 1990, a perícia em engenharia é a atividade que envolve a apuração das causas que motivaram determinado evento, na qual se faz necessária a elaboração de um laudo, que é a peça técnica em que um perito ou profissional habilitado relata o que observou, apresentando suas conclusões.

O objetivo geral deste trabalho é apresentar aos profissionais que atuam na área da construção civil, o impacto da perícia judicial, tomando-se como referências as causas das manifestações patológicas no revestimento cerâmico de um edifício localizado no Bairro de Patamares, na Cidade de Salvador/BA.

A partir do detalhamento do objetivo geral, a pesquisa pauta-se ainda em objetivos específicos, quais sejam: (a) Identificar a ocorrência de manifestações patológicas, por meio do laudo técnico em perícia judicial, e suas prováveis causas; (b) Verificar os tipos de manifestações patológicas existentes e, por meio do laudo pericial, identificar a origem do problema; (c) Demonstrar a importância da qualidade e dos cuidados na etapa final do projeto de revestimento cerâmico nas edificações; (d) Enfatizar a importância da NBR 13755 (ABNT, 2017), considerando os seus aspectos técnicos e legais.

O estudo faz-se necessário, pois foram identificadas manifestações patológicas no revestimento, situação que motivou destacamento cerâmico, fissuras, trincas e manchas na edificação. A abordagem do tema contribuirá para evitar prejuízos no setor da construção civil, tanto para as construtoras como para os engenheiros, além de reflexos comerciais em novos empreendimentos, em especial, na fase final do projeto.

O artigo foi elaborado utilizando-se de livros, artigos, monografias, teses, por meio de leitura sistematizada acerca do tema em questão, de forma a discorrer sobre as causas possíveis das fissuras e dos destacamentos das pastilhas nas jardineiras e muretas do playground. Ademais, buscou-se também discorrer sobre qual a importância da perícia judicial para a análise dessas manifestações patológicas, fundamentando-se as observações com base nas recomendações previstas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas. Após a revisão bibliográfica, foi realizado um estudo de caso.

2. REVESTIMENTO CERÂMICO

O revestimento cerâmico vem sendo usado desde a antiguidade e tinha como finalidade revestir as paredes dos grandes palácios e de construções nobres. Seu uso se tornou notório no meio do século XX, quando sua fabricação em larga escala tornou o produto financeiramente mais acessível (SILVA et al, 2015).

Segundo Figueiredo (2008), existem várias vantagens no uso do revestimento cerâmico em fachadas de edifícios. Ele favorece a estética, assim como atua como uma barreira protetora da fachada, que sofre agressões físicas e está sujeita à deterioração por conta das intempéries.

Para Pacheco e Vieira (2017), o revestimento das fachadas tem como atribuição proteger contra a ação de agentes agressivos. Por isso, é um dos componentes mais deteriorados, que necessita de manutenção ao longo do tempo. Ele fica submetido a variações térmicas, chuva, incidência solar, umidade, vento, carregamentos estáticos e dinâmicos, peso próprio e impacto.

Conforme Silva et al. (2015), o grande diferencial do revestimento encontra-se nas seguintes características: higiene, fácil limpeza, isolamento térmico e acústico, estanqueidade à água e aos gases, proteção dos elementos de vedação, qualidade do acabamento, segurança contra o fogo, aparência estética e visual aprazível.

Portanto, o revestimento na fachada é um excelente aliado na valorização do imóvel, pois o primeiro aspecto que se observa em um edifício é a beleza do seu exterior (FIGUEIREDO, 2008).

De acordo com a NBR 13755 (ABNT, 2017), que estabelece procedimentos para a colocação de pastilhas e placas cerâmicas com argamassa colante em paredes externas e fachadas, a falta de cuidados nos procedimentos de aplicação está diretamente ligada aos destacamentos/desplacamentos do revestimento. A seguir, apresentam-se os procedimentos a serem seguidos e planejados para execução:

  • Profissionais preparados e com treinamento;
  • A argamassa colante deve ser adequada ao serviço e deve ser usada argamassa flexível, capaz de dissipar as deformações diferenciais que poderão ocorrer entre a camada de acabamento e a base;
  • A argamassa deve ser usada em, no máximo, 2h e 30min após a sua preparação, sendo proibida a adição de água ou outros produtos nesse período;
  • Deve-se molhar o reboco da área a ser aplicada a cerâmica, se a mesma estiver exposta ao sol;
  • A argamassa deve ser aplicada na espessura de 3 a 5 mm, sendo utilizada uma desempenadeira de aço dentada;
  • A argamassa deve ser aplicada em trechos limitados, para que as placas sejam aplicadas ainda com a argamassa fresca e úmida;
  • Sobre as juntas estruturais, o revestimento deve contemplar a execução de juntas de movimentação com seccionamento do substrato até a base;
  • Recomenda-se que a execução de juntas verticais de movimentação seja espaçada no máximo a cada 6 m e juntas horizontais a cada 3 m. (ABNT NBR 13755 (ABNT, 2007)

Como se vê, de acordo com as orientações técnicas estabelecidas na legislação para execução revestimento, métodos, materiais e ferramentas devem ser usados de forma adequada para que assim se tenha qualidade no assentamento de todo e qualquer revestimento.

O destacamento das placas cerâmicas é determinado pela ausência de aderência dessas placas ao substrato ou à argamassa colante. Um dos indícios é a ocorrência de um som cavo ou quando é observado um estufamento do acabamento. São inúmeras as causas desse problema, dentre elas podemos citar a deformação lenta da estrutura de concreto armado, variações hidrotérmicas, rejuntes pouco resilientes, assentamento sobre superfície contaminada ou execução de revestimento sobre base recém-executada (MILITO, 2009).

De acordo com Cascudo, Carasek e Freitas (2014), as fissuras demonstram diversos problemas que acontecem com as fachadas, antes de a estrutura entrar em colapso elas expressam um estado de fissuração.

Eflorescências são manchas esbranquiçadas que se destacam no revestimento e acabam sendo aderidas pelo mesmo. Acontece devido a um processo químico do cimento Portland, reagindo com água. Para dificultar o aparecimento dessas manchas, podemos garantir o tempo necessário para secagem de todas as camadas anteriores do revestimento cerâmico, bem como usar placas de boa qualidade e diminuir o consumo de cimento no emboço ou utilizar cimento com baixo teor de álcalis (NaO e KO). (MILITO, 2009)

As juntas sofrem deterioração devido a agentes agressivos, como a chuva ácida ou as fissuras. As juntas não podem ter grande quantidade de resinas, pois podem ficar velhas e perder sua cor, isso ocorre porque as resinas são de origem orgânica. As juntas são encarregadas pela estanqueidade do revestimento cerâmico e pela sua capacidade de incorporar as deformações. Logo, a degradação das juntas implica o mau desempenho dos revestimentos cerâmicos (MILITO, 2009).

Segundo Figueiredo (2008), uma manifestação patológica pode ser considerada com um caso em que a edificação, em um determinado instante da vida útil, não cumpre o desempenho esperado. O problema é apontado, geralmente, baseado nas manifestações patológicas que se entende por manifestações estruturais e/ou funcionais da parte afetada, demonstrando os vestígios de aviso dos defeitos vistos.

Por conta das grandes variações climáticas que ocorrem no Brasil, são registradas amplitudes térmicas significativas em quase todas as regiões do país. As amplitudes térmicas são um dos principais fatores a serem considerados na previsão da vida útil dos materiais. De acordo com as características de cada material, elevadas amplitudes térmicas poderão resultar em uma rápida perda de durabilidade e de resistência mecânica e, consequentemente, em envelhecimento precoce. (LENCIONI; LIMA; MORELLI, 2006).

Para Lima e Morelli (2003), as variações térmicas desempenham grande poder nos processos físicos e químicos de desgastes das estruturas de concreto, o que, consequentemente, tem influência nas fachadas.

De acordo com Colen (2009) e Silva (2014), para a análise da degradação é importante averiguar os valores máximo e mínimo de temperatura e a amplitude térmica, sendo que essas variações, aliadas a umidade, geram esforços hidrotérmicos sobre os acabamentos, propiciando uma dilatação das partes construtivas em função dos seus coeficientes de dilatação potencial e de seus métodos construtivos.

Por conta das variações de temperatura associada a umidade, surgem os esforços hidrotérmicos, que são agrupamentos de esforços que atuam de forma direta sobre os acabamentos. Esse tipo de variação ambiental acarreta uma dilatação das unidades construtivas por conta dos seus coeficientes de dilatação potencial e de suas metodologias construtivas, dilatações seguidas de contrações quando as variações são negativas. Devido a essas variações, surgem as gretas e as fissuras. Os acabamentos das fachadas sofrem essas mudanças de dimensão mais diretamente, por estarem eles mais expostos a mudanças de temperatura. (MATOS; LIMA, 2006)

Para Matos e Lima (2006), um dos motivos da degradação do revestimento cerâmico é a exposição à água da chuva, que tem em sua composição compostos de dióxido de enxofre, de dióxido de carbono e de óxidos de nitrogênio, que resultam em compostos com pesos específicos altos. A partir daí, há a formação de ácidos que reagem com materiais das fachadas.

Ainda para esses autores, a agressividade desse ar que é contaminado, muitas vezes por conta dos avanços tecnológicos e indústrias químicas, gera uma degradação nas fachadas dos edifícios, que acaba por exigir uma restauração e/ou uma prevenção mais imediata do que deveria.

Segundo Milito (2009), a infiltração frequente acarreta a desagregação do revestimento cerâmico, com formação de bolor onde não tem incidência de sol ou com pulverulência. Essas infiltrações de água acontecem através de lajes e de coberturas mal impermeabilizadas ou de argamassas de assentamento com baixo teor de cimento.

Um conceito do perito, extraído da NBR 13795 (ABNT, 1996), esclarece que o perito deverá atender aos requisitos que o habilite a realização da perícia, para tanto deve comprovar estar legalmente habilitado pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, com atribuições técnicas para proceder a perícia, ou seja, somente aquele que atender aos requisitos estabelecidos tem habilitação para realizar a perícia judicial.

Outro aspecto a ser esclarecido é a definição legal de perícia. A norma prevista na NBR 13795 (ABNT, 1996), esclarece que perícia é a atividade que envolve a apuração das causas que motivaram determinado evento.

Destaca-se ainda que a norma básica para perícias de engenharia, divulgada pela IBAPE-SP (2002), classificou as perícias em: a) arbitramento; b) avaliação c) exame d) vistoria. Não cabe, nesse artigo, o aprofundamento da classificação em destaque, em face do objetivo proposto.

Efetivamente, a perícia judicial se torna necessária quando, nas ações judiciais, o engenheiro habilitado é nomeado por um juiz para auxiliá-lo com informações técnicas, que contribuirão para o esclarecimento dos fatos sobre os quais a perícia se tornou necessária.

Para o Professor Sérgio Cruz Arenhart, a colaboração técnica desta prova pericial “advêm da necessidade de se demonstrar no processo fato que dependa de conhecimento especial que esteja além dos conhecimentos que podem ser exigidos do homem médio e do juiz de cultura média” (ARENHART, 2019, p.884).

Exige-se do perito, nesse caso, a imparcialidade, a perfeição técnica na elaboração do laudo, seguindo a ética profissional, bem como a ausência de interesses objetivos ou subjetivos, como por exemplo a amizade ou a inimizade com um dos envolvidos no processo, o grau de parentesco, os favorecimentos etc.

Em alguns processos judiciais, o juiz precisa analisar e emitir uma decisão sobre fatos complexos, muitas vezes essas questões envolvem conhecimentos técnicos especializados que extrapolam a sua formação.

Nesses casos, a assistência de profissionais qualificados e que estejam legalmente habilitados para lhe transmitir as informações necessárias é imprescindível.

Assim, tendo vista a complexidade de situações envolvendo obras construtivas, o perito se faz necessário, auxiliando a justiça quando a situação em pauta depende de conhecimento técnico ou científico.

3. ESTUDO DE CASO

A perícia envolveu uma ação judicial motivada pelo descolamento e desplacamento de placas da fachada de um prédio na área urbana do Município de Salvador/Ba.

Os moradores das unidades, ao perceberem os problemas decorrentes do descolamento e desplacamento das placas cerâmicas, buscaram o judiciário, relatando os fatos relativos ao problema de placas da fachada.

Por se tratar de discussão que exigia conhecimentos especializados, foi necessária a realização de perícia judicial de engenharia para averiguar as ocorrências das manifestações patológicas.

Diante da necessidade de se confirmar o motivo da existência das manifestações patológicas, a perícia fundamentará as conclusões do magistrado a respeito da qualidade da obra.

3.1 CARACTERIZAÇÃO DO EMPREENDIMENTO

O objeto periciado foi um edifício localizado em Patamares – Colina A, bairro da capital baiana, situado em uma região próxima ao mar.

Como já mencionado, o objetivo desse artigo foi identificar os fatores que levaram o destacamento das cerâmicas no edifício estudado e a importância da perícia judicial para comprovação do fato.

Para a exata compreensão da situação, faz-se necessário indicar a localização, conforme Figura 01, do empreendimento, ou seja, as coordenadas geográficas, assim definidas: latitude -12,9522 e longitude -38,402.

O Município de Salvador/Ba possui um clima tropical, com temperatura média anual em torno dos 25 °C e precipitações abundantes durante o ano todo, sem estação seca discernível. Os bairros litorâneos, fora da Baía de Todos os Santos, como Pituba, Patamares e Praia do Flamengo, recebem fortes ventos, vindos do mar, com aproximadamente 2.500 horas de sol por ano, a umidade do ar é relativamente elevada, com médias mensais entre 79% e 83%, sendo a média anual de 81%, conforme dados extraídos do site Wikipédia.

Figura 01 – Localização do Edifício.

Fonte: Google Earth, (2019).

3.2 METODOLOGIA APLICADA

O prédio em análise teve sua construção finalizada por volta do ano 2012, o qual teve toda a sua fachada, piscina e jardineiras do playground revestidas em cerâmica. Segundo o manual do síndico, empregou-se argamassa colante para o assentamento das placas cerâmicas, e para o rejuntamento utilizou-se um rejunte industrializado comercial, ambos materiais não estão especificados no documento analisado

As cerâmicas utilizadas foram pastilhas da marca NGK (5×5 cm), na cor branca, contudo, por volta de dois anos começaram a aparecer algumas fissuras e várias placas se descolaram e/ou desplacaram, mesmo com os seus moradores alegando que algumas manutenções tinham sido realizadas conforme orientado pela construtora no ato da entrega, tendo em vista que as manutenções são necessárias para garantir a durabilidade do produto.

Foram realizadas algumas visitas ao edifício em questão, com o intuito de verificar quais os tipos de manifestações patológicas existem no edifício, além de se observar quais as falhas de construção que causam desconforto à população, ou seja, erros que estejam prejudicando o desempenho das edificações, quanto à segurança, à estética e à habitabilidade.

3.3 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Foram observadas fissuras horizontais no pavimento do playground, ilustrada na Figura 02, que geralmente coincidem com a extremidade ou com a mudança de direção da manta asfáltica do sistema de impermeabilização.

Figura 02 – Patologias na Jardineira.

Fonte: Próprio autor.

Segundo o laudo técnico realizado pela perícia judicial, esta situação indica que a movimentação da manta asfáltica não tem a capacidade de absorver esforços da alvenaria; a tela plástica, colocada nestas situações, como elemento de transição de esforços provenientes dos diferentes materiais e de ligação entre os materiais, não funcionou corretamente nesse cenário.

Após realização de perícia judicial, outro problema encontrado neste edifício foi o descolamento das pastilhas, indicado na Figura 03, que tem diversas origens, sendo que as mais correntes se devem a: movimentação acentuada da parte estrutural da envoltória (conjunto estrutura de concreto e alvenaria); deficiência da argamassa colante, retração da argamassa do emboço, assentamento inadequado, etc. O comprometimento do desempenho da argamassa colante, por sua vez, tem variadas causas, tais como: uso do produto fora do prazo de validade; preparo inadequado – excesso de água na mistura; não atendimento ao tempo de repouso estabelecido pelo fabricante; não atendimento ao tempo em aberto para sua aplicação; uso após o tempo máximo de 2h e 30min permitido e distribuição descontínua da argamassa na superfície.

Figura 03 – Descolamento de pastilhas no muro.

Fonte: Próprio autor.

De acordo com a NBR 13755 (ABNT, 2007), durante o assentamento deve-se remover uma placa cerâmica a cada 5 m2, assentada no máximo há 30 minutos, a qual deve ter o tardoz inteiramente impregnado de argamassa colante, para fins de verificação do serviço. Além disso, recomenda-se a verificação da aderência, que, em oito determinações, após 28 dias de idade, pelo menos quatro valores devem ser iguais ou maiores a 0,3 MPa. Não se tem informação das inspeções de controle de qualidade efetuadas pela construtora durante o assentamento das pastilhas cerâmicas.

Por meio da perícia judicial, pode-se comprovar, a partir de laudo pericial apresentado ao magistrado no processo judicial em tramitação, que no edifício em questão, observa-se que os descolamentos das pastilhas cerâmicas ocorrem, na maioria das situações, por deficiência da argamassa colante, seja pelo desrespeito do “tempo em aberto”, de “maturação”, de “vida útil” ou argamassa inapropriada, podendo ser comprovado pelo aspecto “limpo” do tardoz das placas cerâmicas descoladas, conforme Figura 04.

Figura 04 – Tardoz das cerâmicas da mureta.

Fonte: Próprio autor.

No caso das jardineiras, constatou-se, por meio do laudo pericial, que o descolamento, além da movimentação diferenciada dos materiais, decorre também do esforço gerado pela camada de terra e do tipo de vegetação com raízes não apropriadas para esta situação.

Figura 05 – Mureta do Edifício.

Fonte: Próprio autor.

Ainda segundo o procedimento estabelecido na NBR 13755 (ABNT, 2017), pelo menos três dias após o assentamento, deve ser executado o rejuntamento das pastilhas cerâmicas com a argamassa apropriada para o tipo da exposição. A ausência do rejuntamento das placas cerâmicas na mureta, Figura 05, sugere que a argamassa de rejuntamento empregada não era apropriada para o uso, ou foi usada argamassa fora do prazo de validade, ou com preparo inadequado, ou ainda que, as manutenções não tenham ocorrido de forma adequada.

Os sistemas de estrutura, de alvenaria de vedação, de impermeabilização e de revestimento, que constituem a envoltória do edifício, devem possuir características compatíveis entre si, para que suas funções e requisitos de desempenho sejam cumpridos. O surgimento de fissuras nos edifícios ocorre com frequência e afetam, especialmente, a estanqueidade e a estética do imóvel, o que causa grande desconforto aos moradores.

As fissuras ocorrem de maneira aparentemente aleatória, mas, na maioria das vezes, sucedem de fenômenos químicos, mecânicos ou físicos. Elas podem surgir de forma congênita, por conta de deficiência de projetos ou de sua incompatibilização; durante a execução da edificação; pelo uso de materiais e traços inadequados; por ação de agentes degradantes; por condições de exposição e; até mesmo, por uso indevido da edificação. Além destes prováveis agentes, a ocorrência de fissuras é acentuada pelas movimentações térmicas e higroscópicas (capacidade de o material absorver água), normais nos acabamentos decorativos das edificações.

A forma, o grau de intensidade e as dimensões das fissuras geram indicações para as possíveis causas de sua ocorrência.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Mediante a investigação das causas das manifestações patológicas no revestimento cerâmico, por meio da perícia judicial, foi possível, após a emissão de laudo pericial de engenharia, comprovar que, em geral, não existe uma causa específica para as ocorrências patológicas, e sim um somatório de fatores, o que resulta no aparecimento de fissuras, no descolamento de pastilhas cerâmicas e em outras anomalias no sistema de revestimento, que podem ser detectadas visualmente e, se necessário, comprovadas por meio de testes expeditos ou ensaios de laboratórios.

As fissuras decorrem, provavelmente, da movimentação dos materiais e dos sistemas construtivos da edificação. Da mesma forma, a causa do descolamento das pastilhas cerâmicas é caraterizada pela deficiência da argamassa colante.

Até então, não se pode afirmar, em todas as situações, se a falha é do produto ou da execução, entretanto, nos casos onde temos a ausência de argamassa no tardoz da pastilha, pode-se afirmar que o destacamento foi causado pela má execução. A ausência do rejuntamento das placas cerâmicas caracteriza o uso inadequado do produto, seja este por especificação não apropriada ao tipo de exposição, por defeito do material em si ou do procedimento do seu preparo ou da aplicação ou, ainda, pela falta de manutenção adequada.

A realização deste trabalho foi importante pois mostrou que a prova pericial de engenharia é uma técnica colaborativa que serve não apenas para formação da convicção do juiz em processos, mas também, colabora para aferir a qualidade das obras de construção civil, em especial, dos revestimentos cerâmicos, imprescindível para evitar responsabilização por má qualidade do produto.

Assim, espera-se que este trabalho sirva como exemplo para novos empreendimentos no ramo da engenharia civil, a fim de evitar problemas técnicos ocasionados por descumprimento das Normas Técnicas Brasileiras, no caso em questão a NBR 13755 (ABNT, 2017); como consequência de possíveis descumprimentos, ressalta-se também a importância da perícia judicial como elemento norteador para a investigação das causas e para esclarecimentos técnicos de engenharia, para os quais se faz necessária a emissão do laudo pericial.

REFERÊNCIAS

ARENHART, Sérgio da Cruz. Prova e convicção. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2019.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 13755:2017: Revestimento de paredes externas e fachadas com placas cerâmicas e com utilização de argamassa colante: procedimentos. Disponível em: <https://ecivilufes.files.wordpress.com/2011/04/nbr-13755-revestimento-de-paredes externas-e-fachadas-com-placas-cerc3a2micas-e-com-utilizac3a7c3a3o-de argamassa-colante-procedimento.pdf>. Acesso em: 01 mar. 2019.

CARASEK, H; Freitas, J.G.; Cascudo, O. Utilização de termografia infravermelha para avaliação de fissuras em fachadas com revestimento de argamassa e pintura. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ac/v14n1/v14n1a06.pdf>. Acesso em: 12 abr. 2018.

DEUTSCH, S. F. Perícias de engenharia: a apuração dos fatos. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito (LEUD), 2011.

FIGUEIREDO, C.R. Uso do revestimento cerâmico em fachadas de edifícios. In: VII Encontro Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído. Fortaleza/CE, 2008.

GOMES, B.M.C. et al. Análise das principais causas de manifestações patológicas em edificações residenciais em João Pessoa-PB: classificação e prevenção. In: Conferência Nacional de Patologia e Recuperação de Estruturas. Recife/PE, 2017.

LENCIONI, J.W; Lima, M.G; Morelli, F. Uma discussão sobre o conhecimento dos fatores ambientais nos estudos sobre degradação do ambiente. In. Encontro Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído. Florianópolis/SC, 2006.

MAIA, Élcio A. Patologia das edificações. Noções fundamentais: fundamentos de avaliações patrimoniais e perícias de engenharia. São Paulo: Editora Pini Ltda., 1999.

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VIEIRA, G. L.; Pacheco, C.P. Análise quantitativa e qualitativa da degradação das fachadas com revestimento cerâmico. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S036669132017000400432&lng=pt&tlng=pt>. Acesso em: 09 abr. 2018.

[1] Especialista em engenharia elétrica e de sistemas de energia, Pós Graduação MBA em gestão de recursos humanos, Pós graduando em engenharia de avaliações e perícias, Graduação em engenharia civil, Graduação em administração de empresas.

[2] Mestrado em Engenharia. Graduação em Engenharia Civil.

Enviado: Abril, 2020.

Aprovado: Outubro, 2020.

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Daniel Araújo Maia

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