REVISTACIENTIFICAMULTIDISCIPLINARNUCLEODOCONHECIMENTO

Revista Científica Multidisciplinar

Pesquisar nos:
Filter by Categorias
Administração
Administração Naval
Agronomia
Arquitetura
Arte
Biologia
Ciência da Computação
Ciência da Religião
Ciências Aeronáuticas
Ciências Sociais
Comunicação
Contabilidade
Educação
Educação Física
Engenharia Agrícola
Engenharia Ambiental
Engenharia Civil
Engenharia da Computação
Engenharia de Produção
Engenharia Elétrica
Engenharia Mecânica
Engenharia Química
Ética
Filosofia
Física
Gastronomia
Geografia
História
Lei
Letras
Literatura
Marketing
Matemática
Meio Ambiente
Meteorologia
Nutrição
Odontologia
Pedagogia
Psicologia
Química
Saúde
Sem categoria
Sociologia
Tecnologia
Teologia
Turismo
Veterinária
Zootecnia
Pesquisar por:
Selecionar todos
Autores
Palavras-Chave
Comentários
Anexos / Arquivos

Economia solidária e gestão pública de resíduos sólidos na coleta seletiva em Belém: análise das experiências da CONCAVES e da COOTPA

RC: 15408
160
5/5 - (4 votes)
DOI: ESTE ARTIGO AINDA NÃO POSSUI DOI
SOLICITAR AGORA!

CONTEÚDO

DISSERTAÇÃO

BARROZO, David da Costa [1], MAGALHÃES, Diego Ventura [2], FERREIRA NETO, Luiz Reis [3], FERREIRA, Marilia Matos Gonçalves [4]

BARROZO, David da Costa. Et.al. Economia solidária e gestão pública de resíduos sólidos na coleta seletiva em Belém: análise das experiências da CONCAVES e da COOTPA. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 03, Ed. 05, Vol. 03, pp. 35-71, Maio de 2018. ISSN:2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/administracao/economia-solidaria

RESUMO

O contexto que a Economia Solidária (ES) vem se destacando nos últimos anos. Quanto à precariedade do trabalho, deve-se à própria implicação do trabalho assalariado nas condições do novo regime de acumulação flexível, podendo ser caracterizada pela  transformação do mundo do trabalho, a saber, pelo desenvolvimento sistêmico de um processo complexo de reestruturação produtiva e mudanças organizacionais, pela emergência de um novo e precário mundo do trabalho, e pela fragmentação da classe  trabalhadora. O artigo desenvolve uma análise teórico-conceitual sobre Economia Solidária e Políticas Públicas relacionadas com a coleta seletiva e, em seguida, realiza uma pesquisa empírica comparativa, com duas experiências concretas, em cooperativas de coleta seletiva de resíduos sólidos operando na cidade de Belém, estado do Pará: a Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis da Terra Firme (CONCAVES) e a Cooperativa dos Profissionais do Aurá (COOTPA). A dinâmica pretendeu identificar e analisar processos como a trajetória da qualidade de vida dos trabalhadores cooperados, levando em consideração os riscos de reprodução da precarização ou não do trabalho; e a conquista da autonomia administrativa e operacional das cooperativas em relação às políticas públicas em todos os níveis ou, ao contrário, a reprodução das relações de subordinação e assistencialismo.

Palavras-chave: Precarização do Trabalho, Trabalho  Associado, Coleta  Seletiva, Políticas Públicas.

INTRODUÇÃO

Este tema de estudo tem sua relevância no aprofundamento de pesquisas que realizam uma análise profunda sobre os empreendimentos solidários, que contemplam desde o momento de sua origem até os dias atuais, por meio da identificação dos fatores materiais, sociais e culturais que impulsionam os indivíduos a aderirem e, sobretudo, a permanecerem. Tem como objetivo complementar os estudos existentes que se limitam a averiguar circunstâncias que, à revelia e a contragosto desses trabalhadores, os forçaram a buscar alternativas de trabalho e renda, como se a existência dessas pressões fosse suficiente para conduzi-los, passivamente, numa determinada direção.

Atrelado a esta temática, este estudo trata das relações de trabalho associadas como mecanismo de combate à prática de precarização do trabalho e como alternativa na geração de trabalho, emprego e renda para redução de problemas socioeconômicos. Portanto, diz respeito à Economia Solidária, que juntamente com as políticas públicas, pode tornar-se mecanismo indutor e impulsionador do desenvolvimento social, econômico e ambiental.

O artigo tem ênfase na abordagem microeconômica, pois estuda a trajetória de duas cooperativas populares, ao mesmo tempo com uma abordagem macroeconômica, com ênfase na gestão pública na coleta seletiva. Trata-se de um processo dinâmico, na medida em que se estuda a dinâmica de gestão de duas cooperativas e a relação com a dinâmica de gestão pública na coleta seletiva.

É nesta perspectiva que esta nova economia pode vir a destacar-se na perspectiva da organização de cadeias produtivas solidárias, constituídas pela articulação de empreendimentos autogestionários, associações e cooperativas urbanas e rurais, que contribuem para inserção socioeconômica de sujeitos historicamente excluídos das políticas públicas de desenvolvimento tanto em âmbito regional como nacional (EID et al, 2010).

Como estudo prático e de importância para a bibliografia acadêmica, realizar-se-á uma investigação empírica comparativa em duas cooperativas de coleta seletiva de resíduos sólidos urbanos e domiciliares localizadas em Belém, no Estado do Pará, a Cooperativa dos Catadores de Materiais Recicláveis – CONCAVES e a Cooperativa de catadores intitulada de Cooperativa dos Profissionais do Aurá – COOTPA. Estes dois empreendimentos têm sua formalização como cooperativa, com a mesma base econômica e social, cabendo questionar em que circunstâncias a cooperação e a organização sócio-produtiva desenvolvem-se conjuntamente e fazem do trabalho um elemento não apenas central, mas diferencial e sua autonomia em relação à administração pública, em seus diferentes níveis.

Nesse momento, cabe ressaltar a importância no estudo comparativo entre as duas cooperativas selecionadas, considerando que a COOTPA teve sua fundação por meio de indução da Prefeitura Municipal de Belém, enquanto a CONCAVES surgiu pela iniciativa dos próprios cooperados. Esta diferença será relevante para o processo de investigação, considerando que o foco desta Dissertação trata de uma discussão entre a Economia Solidária e Gestão Pública, como foco na autonomia ou dependência das cooperativas dos incentivos e benefícios disponibilizados pelo poder público para desenvolvimento das atividades desses empreendimentos e de seus trabalhadores cooperados.

Como problematização da pesquisa, buscou-se responder: se cooperativas populares da coleta seletiva, criadas pelos próprios trabalhadores, sem participação, em processo indutor pela Administração Pública Municipal, durante sua formação inicial, garante autonomia administrativa e operacional, permanece e amplia esta autonomia, no decorrer dos anos, reafirmando os princípios da Economia Solidária, comparativamente às cooperativas induzidas?

O objetivo geral da pesquisa é analisar se as cooperativas populares são alternativa positiva para o problema da precarização do trabalho e se, no decorrer dos anos, ocorre a conquista da autonomia administrativa e operacional das cooperativas, em particular de catadores na coleta seletiva em relação à gestão pública. Para isto, pretende-se identificar e analisar, por meio do estudo de dois casos comparativos, considerando a análise da trajetória profissional e pessoal dos trabalhadores associados nos espaços do trabalho e da reprodução da família.

Como objetivos específicos visa realizar: a) revisão bibliográfica com autores contemporâneos que tratam da temática Economia Solidária e Economia do Trabalho relacionada com a Gestão Pública articulada com as atividades desenvolvidas por estas cooperativas, com ênfase na temática dos processos decisórios, das relações de trabalho e no trabalho, da construção da autonomia plena ou relativa, das práticas de assistencialismo, das políticas de qualificação; b) analisar a trajetória profissional e pessoal dos trabalhadores associados, nos espaços do trabalho e da reprodução da família, em duas cooperativas de catadores da coleta seletiva em Belém, CONCAVES e COOTPA, relacionado a mudanças na qualidade de vida e analisar a trajetória da orientação de gestão das cooperativas, em estudo, centrada na questão da autonomia administrativa e operacional focada na subordinação à gestão pública ou ao aprofundamento da autonomia e da autogestão destes trabalhadores.

Sua justificativa consiste na possibilidade de contribuir, para um maior entendimento, sobre a dinâmica da gestão coletiva de empreendimentos econômicos solidários, especificamente, no segmento da coleta seletiva de resíduos sólidos urbanos e domiciliares, quanto à organização, aos processos relacionados com a qualidade do trabalho, e o papel do poder público como apoiador dessas experiências.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 REESTRUTURAÇÃO CAPITALISTA, EMERGÊNCIA DO TRABALHO ASSOCIADO E ECONOMIA SOLIDÁRIA

Como reação às devastadoras consequências provocadas pelo capitalismo, no âmbito sócio-político-econômico, materializada na crescente taxa de desemprego e precarização do trabalho, observa-se o surgimento e maturação de movimentos sociais e organizações econômicas autogestionárias ao redor do mundo, como mecanismos, baseados na resistência e contraposição dos trabalhadores à dominação capitalista, apresentando-se como oposição aos seus valores e práticas.

Essa reação dos trabalhadores já ocorre historicamente desde meados do século XIX, na forma de cooperativas de autogestão, empresas falidas e recuperadas sob o controle dos trabalhadores, entre outras formas.

De modo geral, a estrutura socialmente excludente do capitalismo é tendencialmente impulsionadora das organizações do trabalho associado. Estruturalmente, essas organizações apresentam características e importância distintas, dependendo da época, da conjuntura social, econômica e política em que os trabalhadores vivem.

Nas últimas décadas, com o neoliberal, motivador da acumulação de capital desenfreada, altera-se a realidade social, com a modificação das estruturas regionais de vida e de trabalho; desocupação de instituições e movimentos populares de resistência ao capitalismo; incentivo à prática do racismo e de conflitos nacionais; divisão da classe operária, crescente precarização da força de trabalho e a contenção dos elementos democráticos presentes na vida política da sociedade, passando o Estado a ser uma figura gestora dos negócios privados, com caráter racional e eficiência econômica-administrativa (DAL RI, 2010, p. 7).

Ideologicamente, o capitalismo neoliberal é contrário à solidariedade entre a classe trabalhadora e as organizações com caráter autônomo e de classe, devido ao ideário de transformação social, e que devido à falta de força política encontrou resistência para sua efetiva operacionalização. Contudo, não impediu as ações de resistência, por parte dos trabalhadores, quanto à devastadora relação capitalista de produção, materializadas na criação de unidades de trabalho associado e no esforço de criação de postos de trabalhos não baseados nos critérios de apropriação capitalista.

A criação de cooperativas e empresas de autogestão, pelos trabalhadores, tem sua motivação principalmente no desemprego e na manutenção de postos de trabalho, e visam à produção de excedente econômico para a manutenção do empreendimento e dos seus membros.

Nesse sentido, as experiências procuram desenvolver a produção e a conservação da comunidade de trabalho a qual se fundamenta em quatro pilares: a) perspectiva de substituição do trabalho assalariado pelo trabalho associado; b) implantação de uma política igualitária de distribuição de rendimentos; c) organização diferenciada do processo de trabalho, com tendência à extinção de estrutura hierárquica e da burocracia; d) gestão autogestionária, por meio de assembleias e comissões de trabalho.

Nesta perspectiva, a relação existente entre o trabalho associado e a economia solidária remete à interação da massa trabalhadora associada a uma forma de produção estruturada em unidades de produção independente e de forma autônoma. E como mecanismo de combate à relação de exploração e subordinação do trabalho ao capital, essencial ao processo capitalista de trabalho, introduz profundas modificações na forma de organização e gestão dos empreendimentos solidários.

A economia solidária, conceitualmente, é considerada uma forma de organização para geração de trabalho e renda, como mecanismo de melhoria da condição de vida dos considerados trabalhadores pobres e miseráveis, por meio da mobilização, motivação e do envolvimento dessas pessoas. Estruturalmente, se manifesta em empreendimentos solidários coletivos: grupos informais, associações, cooperativas, empresas autogestionárias; que por meio de uma autogestão garantem a melhoria e manutenção do bem-estar aos excluídos do emprego formal pelo processo capitalista.

A economia solidária determina-se como um misto de conceitos e práticas que visa propor saídas para a crise do trabalho assalariado e para a reestruturação produtiva, partindo da reorganização do trabalho e dos modos de apropriação da riqueza, coexistindo com a economia do capital e se materializando economicamente por meio do progresso das políticas públicas de desenvolvimento.

Segundo Daniela (2011), na literatura, pode-se encontrar vários termos que se referem à economia solidária, tais como: economia social, economia popular, economia popular solidária, economia cidadã, economia humana, economia do trabalho, dentre outros. Ressalta que existem distintas experiências e formas de organização no campo da economia solidária, também são distintas as percepções dos autores.

Conforme França Filho (2002) a própria expressão “economia solidária” indica a junção de duas noções historicamente dissociadas- economia e solidariedade- sugerindo a inserção do elemento solidário no centro da elaboração de suas atividades e relações econômicas. Para Leite (2009) expõe que é no quadro atual de crise do trabalho assalariado que os estudiosos começaram a detectar, desde os anos de 1980, um conjunto de movimentos centrados na formação de cooperativas de produção e de associações de trabalhadores, nas quais se busca a autogestão e que vêm sendo reconhecidas pelo termo “economia solidária”.

Fundamentada na cooperação e no caráter humano, pressupõe que a racionalidade técnica esteja focada na racionalidade social, na qual a manutenção de postos de trabalho e o combate à precarização do trabalho são as causas fundamentais de sua existência, contudo é de fundamental importância o engajamento dos trabalhadores no processo de tomadas de decisões, atuando como atores principais desse processo.

Segundo Singer (2004, p. 12), por possuir como objetivo central o trabalho, poderá ser enquadrada como uma Economia do Trabalho, voltada para o atendimento das necessidades definidas pelo coletivo de trabalhadores, sustentada na formação dos trabalhadores associados e na metodologia de formação específica para cada empreendimento.

Historicamente, a economia solidária esteve presente na sociedade, por meio das experiências econômicas solidárias e autogestionárias, como alternativa para combater as mazelas do processo capitalista – concentração de terra, renda e poder -, manifesto através de movimentos sociais dos trabalhadores. Contudo, devido à imprecisão e descontinuidade desses movimentos, a economia solidária não chegou a apresentar expressividade para formulação de uma efetiva economia do trabalho e uma alternativa concreta ao modo de produção capitalista.

Desde os primeiros anos de atividade econômica pretende-se assegurar condições mínimas à (re) conquista da dignidade e da subsistência, supõe-se que no decorrer dos anos, com o processo de maturação dos investimentos e da coesão social, os impactos sejam maiores na qualidade de vida das famílias associadas, e em seu entorno econômico, contribuindo efetivamente para o desenvolvimento das localidades urbanas e rurais. (EID et al, 2010).

Nesta perspectiva, a economia solidária perpassa o ideário de uma iniciativa para a satisfação do consumo básico e da sobrevivência imediata das famílias associadas, devendo ir além, romper com o processo inicial de ser somente uma economia popular. Se reduzida a isto, encontra-se, amarrada a um círculo vicioso onde, pessoas pobres produzem e vendem ou prestam serviços somente a outros pobres, sem articulação externa, parcerias e apoio de instituições públicas, fechando-se a possibilidades de construção de pequenas cadeias produtivas autogestionárias constituídas por empreendimentos solidários e expansão das atividades, com qualificação continuada e adoção de tecnologia social, mas mantendo sua identidade de movimento social, ampliando sua capacidade de resistência, por dentro do modo de produção capitalista.

Mercadologicamente, pressupõe um processo de troca de produtos e serviços, baseados nas diferenças recíprocas, complementares e na utilidade, conforme o interesse das partes, estabelecendo um sistema de relações econômicas e sociais favoráveis a todos os indivíduos e empreendimentos envolvidos no processo.

No Brasil, a economia solidária, na forma de empresas de autogestão, ganhou destaque na década de 90, devido à abertura de mercado e a falência de empresas em face da concorrência do mercado mundializado, motivadas pelo processo de abertura de mercado nacional, a terceira revolução industrial, o avanço tecnológico e a substituição do trabalhador pela máquina.

Com a abertura para as empresas estrangeiras, muitas indústrias nacionais com baixa capacidade produtiva decretaram estado de falência, o que ocasionou o aumento do número de desempregados no país. Nesse cenário, de falta de postos de trabalho, surgiu à luta dos trabalhadores desempregados, a recuperação de empresas, em processo falimentar, sob o regime da autogestão.

Essa é mais uma alternativa à crescente precarização em que se encontra o mundo do trabalho, exigindo dos trabalhadores habilidades quanto aos conhecimentos técnicos demandados nos processos de trabalho e comportamentos quanto às formas de gestão coletiva da cooperativa. A economia solidária nacional é formada tanto por pequenas, médias e algumas grandes empresas, que vivenciaram processos falimentares e que na atualidade são cooperativas autogestionárias, quanto por pequenos grupos de produção ou serviços ainda formalizados ou informais que se estruturam e mantêm suas atividades com ou sem apoio de políticas públicas, incubadoras universitárias, organizações, dentre outras instituições, sendo de caráter público ou privado.

Segundo Adriano (2010, p. 119), o cooperativismo no Brasil ganhou outro significado, a partir do desenvolvimento da economia solidária e da consolidação das empresas como cooperativas de produção, e as empresas e empreendimentos de economia solidária ganharam uma conotação diferenciada das cooperativas tradicionais, devido ao caráter econômico e político e a nova cultura de valores e mecanismo de integração grupal.

O cooperativismo solidário centra-se no esforço para garantir o desenvolvimento e a sustentabilidade dos empreendimentos, com perspectiva de autonomia em relação aos governos, no que tange à sua forma de representação, articulação e atuação com os trabalhadores cooperados para a geração de trabalho e renda.

Diante da mudança no mundo do trabalho, em que pressões contínuas do empresariado por um novo perfil funcional, mais capacitado tecnologicamente e multifuncional, exige, no campo da economia solidária a sistematização e a qualificação dos cooperados, para garantir a eficácia dos empreendimentos solidários, baseados na instrução para a prática da autogestão, da democracia interna, entre outras. Outra característica, são as limitações e indefinições em que os empreendimentos solidários estão inseridos, quer no âmbito jurídico, quer no das políticas públicas. Além disso, tem concorrência mercadológica acirrada para inserção e manutenção no mercado.

A autogestão é um elemento fundamental para os empreendimentos solidários, e requer uma mudança cultural, pois esta nova economia gera uma postura diferenciada da comumente desenvolvida, quando na figura de empregado assalariado, passa a ser trabalhador associado em um empreendimento coletivo, sendo necessário o desenvolvimento da solidariedade; do trabalho coletivo; o gerenciamento do próprio negócio; a conquista da autonomia de gestão e não aceitação de intervenção dos órgãos governamentais, desenvolvendo a capacidade para a administração coletiva de um negócio.

O desenvolvimento da autogestão nos empreendimentos solidários é um longo processo sujeito às contradições, mas apresenta-se como uma alternativa para combater o modelo tradicional do mercado de trabalho – mera execução de tarefas, com a incorporação da vivência das pessoas/grupo, no que tange o conhecimento, valores, comportamentos, desejos e ideias; ao mesmo tempo em que envolve o processo de interação entre os indivíduos no grupo. Como todos os trabalhadores passam a ser responsáveis pelo empreendimento, é exigida uma visão organizacional estratégica do negócio e conhecimento necessário para a manutenção do empreendimento, advindo de suas experiências.

Para a economia solidária, o ser humano é o foco da organização da sociedade, pois são definidas as relações sociais, econômicas e produtivas. Logo, se fundamenta no diálogo com o trabalhador e na inserção de suas vivências e anseios, ou seja, da realidade, para sua construção.

Para Adriano (2010, p. 121), a economia solidária é um caminho pedagógico para a ação autônoma dos trabalhadores, sendo relevante o processo que leva ao produto final e não apenas o resultado. Seu desenvolvimento e seus princípios envolvem um processo lento de educação, de formação, qualificação e capacitação de forma permanente e integral.

2.1.1 TRABALHO ASSOCIADO, COOPERATIVISMO POPULAR E MUDANÇAS SOCIAIS

O trabalho associado pode ser identificado como uma parte do movimento da luta na busca por mudanças estruturais e sociais, utilizando-se da cooperação, para superação do modelo de exploração e atingir o processo de transformação social.

Esse processo de transformação pode ser interpretado, como o estágio contínuo de desenvolvimento da sociedade, assim como de suas forças produtivas e das suas relações sociais, para edificação de uma sociedade organizada, levando-se em consideração os preceitos humanistas, sociais e ambientais.

Neste contexto, tem-se o surgimento de empreendimentos sociais específicos – as cooperativas populares -, como elemento particular da resistência dos trabalhadores ao avanço do capital.

Estruturalmente, as cooperativas inicialmente apresentavam duas correntes políticas: as cooperativas de consumo, com a finalidade de aquisição conjunta, pelos trabalhadores, de produtos de consumo; e as cooperativas de produção – como tentativa – pelos trabalhadores – em assumir o controle do processo de trabalho e produção. Ambas buscavam a reorganização do processo produtivo, fora das práticas de exploração capitalista, com uma nova relação social baseada na cooperação mútua.

A organização cooperativa tende naturalmente a internacionalizar-se qualquer que seja o aspecto que possa tomar a orientação econômica e social, uma vez que o primeiro princípio da cooperação é a associação, isto é, a unidade. Sua essência consiste em buscar uma solução aos problemas coletivos graças a uma ação a partir da associação, a título individual, de homens e mulheres em sociedades cooperativas; e em seguida, mediante a conjunção dessas associações cooperativas em federação; finalmente o curso natural de sua evolução conduz a organização, por meio de federações de alcance nacional e o acordo para o processo dos interesses comuns. (WATKINS, 1973, p.15)

Segundo Christoffoli (2010, p. 23), as cooperativas tradicionais, de grande porte são constituídas, em sua maioria por capitalistas coletivos, devido à construção das cooperativas coletivas de produção, e que buscam eliminar apenas o capitalista individual e, em outros casos o trabalho assalariado, mas mantendo estruturalmente a propriedade privada, pertencente a um grupo específico de trabalhadores, não abrangendo a totalidade da classe.

Na medida em que a forma jurídica capitalista da propriedade subordina de modo determinante todas as formas divergentes dela, as formas coletivas só podem desenvolver as suas potencialidades depois que a forma privada individual tenha sido abolida, o que só pode ocorrer, no entanto, no contexto de uma mudança social global do modo de produção. O cerne do modo de produção reside no caráter de classe do poder de Estado, cujo componente essencial é a forma jurídica da propriedade. A defesa e garantia desta é a função central do Estado nas sociedades divididas em classes. (GERMER, 2006, p. 8)

Apesar do preceito capitalista da propriedade privada, nos empreendimentos de trabalho associado, sua essência está na valorização da vida, na proteção à saúde e ao meio ambiente, e mais intensamente, no combate ao capital monopolista e ao modelo econômico vigente.

Segundo Dal Ri e Vieitez (2010, p. 8), o trabalho associado, como movimento histórico de resistência ao capitalismo, baseou-se na criação, por meio da união dos trabalhadores, de uma tecnologia social, denominada de organização coletiva de massa – Organizações de Trabalho Associado (OTAs) -, como exemplo, os sindicatos, os comitês de fábricas, as cooperativas e associações; que tinham como transformar as relações de produção nas unidades de trabalho.

Esta forma associativa de trabalho está intimamente ligada à mudança social, no que diz respeito à criação e recuperação de unidades de trabalho pautadas em relações de produção relativamente democráticas, ou seja, os benefícios democráticos do associativismo sejam de fato historicamente relevantes, transcendendo, a situação social de subalternidade ou mera complementaridade da atividade capitalista.

Portanto, a mudança social encontra-se tanto nos atos concretos de estabelecimento de unidades de trabalho associado, quanto nas ilações teóricas ou ideológicas que buscam determinar o seu sentido e direção histórica. Porém, aqui terminam as confluências. As unidades de trabalho associado apresentam diversas variantes de organização, e as teorizações a seu respeito chegam ao ponto de se contradizerem em suas formulações. (DAL RI; VIEITEZ, 2010, p. 72).

A criação das OTAs está intimamente ligada a situações históricas de formações sociais capitalistas, como: hegemonia política, ideologia burguesa, situação revolucionária, dentre outras. Teve também como influência os movimentos e organizações mais amplas. Esses empreendimentos associativos estão presentes na sociedade desde meados do século XIX, contudo ganharam destaque apenas com a implantação do neoliberalismo, devido ao crescimento do cooperativismo, da economia solidária, dos empreendimentos de autogestão, dentre outros; que ideologicamente defendem a igualdade social, com valores de liberdade e igualdade.

Cinco são as características que norteiam o trabalho associativo: a) associação; b) propriedade; c) poder; d) distribuição; e) relações com os movimentos sociais. (DAL RI; VIEITEZ, 2010, p. 69).

A associação desenvolve-se pela organização coletiva dos trabalhadores em unidades de trabalho baseados em um sistema de cooperação coletiva autônomo, que se diferencia do modelo capitalista pela forma de apropriação do excedente econômico do empreendimento, ou seja, da forma de distribuição igualitária da riqueza e do poder gerado, na qual a tomada de decisão é de responsabilidade da assembleia geral dos trabalhadores. No contexto das OTAs define-se propriedade por propriedade associativa dos trabalhadores, ou seja, não permite a individualização do capital aplicado no empreendimento social; possui um mecanismo de socialização e democratização.

Quanto à relação de poder, no trabalho associado, centra-se na figura da assembleia geral dos trabalhadores, que decide e regulamenta as questões referentes ao empreendimento solidário, tratando questões desde a aprovação do estatuto e das normas.

No trabalho associado, têm-se duas práticas básicas de organização de poder, segundo Dal Ri; Vieitez (2010): “a representatividade e a horizontalizada”, no qual a primeira, apesar da assembleia ser o principal órgão de poder, as decisões são tomadas, na maior parte do tempo, pelo Conselho Administrativo ou Conselho Diretor eleito pelos associados. Já a segunda, a maior parte de decisão é tomada nas assembleias gerais e geralmente a OTA, possui órgãos intermediários para tomada de decisões setoriais.

No âmbito da distribuição, tem-se uma mudança significativa no modo em que se distribui a riqueza, em decorrência de alterações na unidade de produção e o modo igualitário ou equitativo de apropriação ação da riqueza e de distribuição do poder característicos das organizações de trabalho associado ou de autogestão.

O trabalho associado afirma-se pela inter-relação e interdependência de elementos relevantes da democracia e da socialização, contudo sua incorporação às lutas anti-sistêmica só é efetivada por meio de aliança com os movimentos sindicais e outras forças populares, que garantam a ultrapassagem das limitações econômico-corporativas. Essa aliança permitiu a elevação da categoria de força de nível hegemônico, ou seja, de força capaz de contribuir para engendrar uma outra concepção de mundo no plano reflexivo e prático (DAL RI; VIEITEZ, 2010, p. 93).

2.1.2 CONDIÇÕES DE TRABALHO E A ECONOMIA SOLIDÁRIA

Para melhor entender os aspectos de condição de trabalho e sua relação com Economia solidária é de crucial importância entender a concepção de trabalho, que segundo Marx (1983), consiste, antes de tudo, em um processo entre o homem e a Natureza, em que por meio de ações, medidas, regulação humana se controla a Natureza. Segundo Antunes (2000), a realização do ser social se efetiva pelo trabalho, que se desenvolve por meio dos laços de cooperação social existentes no processo de produção material, no qual o ato de produção e reprodução da vida humana se realiza pelo trabalho.

Com a Revolução Industrial, ocorreram mudanças profundas no mundo do trabalho, mudando a base de produção que era a sociedade rural, por meio da produção agrícola e a propriedade da terra, que perdurou até o século XIX, para a sociedade industrial pautada na produção de bens em larga escala e o poder passou para a propriedade das fábricas, denominado de modo de produção capitalista.

“A utilização em larga escala das máquinas, ademais, rompe a unidade técnica entre o trabalho e sua ferramenta, inaugurando processos de desqualificação do trabalho e de desvalorização do trabalho que passa a ser marca indelével dos nossos processos produtivos” (TEIXEIRA, 2002, p. 17).

Com o modo de produção capitalista, provocou intensas mudanças no processo de trabalho, no qual a produtividade passa a ser o centro desse processo, passando o trabalho, segundo Weber (2003), a ser a própria finalidade da vida, por meio da padronização e mecanização da produção que tendia a uma uniformidade da vida.

Nesse processo, o trabalho que passa a ser regido pelas condições do modo de produção capitalista passa a ser degradado, tornando o trabalho um meio de subsistência e a força de trabalho uma mercadoria. Segundo Marx (2002, p. 111), o trabalho torna-se tanto mais pobre quanto mais riqueza produz.

Nesse contexto, a produção de riqueza na sociedade capitalista, desprende-se paulatinamente da utilização da força de trabalho humana que vai sendo substituída por máquinas, consequentemente quem não consegue vender a sua força de trabalho é tido como excluído e marginalizado.

“A organização social está pouco aperfeiçoada; que os homens ainda se deixam explorar pela violência e pela fraude; e que a espécie humana, politicamente falando, ainda está mergulhada na imoralidade (…)” (SAINT-SIMON, 2002 b, p.60).

Na tentativa de combater os aspectos negativos produzidos pelo modo de produção capitalista, surgem formas alternativas a esse modo de organização de trabalho, destaca-se, a Economia Solidária. Fourier (2002) aborda sobre as vantagens do desenvolvimento do trabalho coletivo, baseado em um trabalho industrial baseado no princípio da atração passional, com trabalho desenvolvido com vontade e com liberdade pelos trabalhadores, pautado na participação e na repartição proporcional da riqueza com a classe trabalhadora, produzindo um associativismo que traria vantagens econômicas, sociais e ecológicas.

“Uma organização composta de diversas faculdades corporais e intelectuais, experimentando necessidades ou inclinações físicas e morais, sensações, sentimentos e convicção” (OWEN, 2002, p. 103).

Singer (2002) conceitua que a ES surge com os operários no início do capitalismo industrial em combate a pobreza e desemprego causado pela substituição da força de trabalho pelo maquinário industrial. Neste momento, os trabalhadores passaram a organizar-se por meio de cooperativas, na tentativa de recuperar o trabalho e a autonomia econômica, que são princípios básicos de igualdade e democracia. Esse tipo de associação, ou seja, a empresa solidária visa maximizar a quantidade e qualidade do trabalho.

De modo geral, a ES como alternativa para o modelo de exclusão e dominação do trabalho, na tentativa de resgate aos valores humanos e na formação societárias mais igualitária, baseado na retomada da autonomia e resgate do trabalho no seu pleno sentido: fonte digna de vida, em oposição à forma de trabalho capitalista que gera sofrimento, pobreza, operação e miséria humana.

A analisar experiências concretas em economia solidária requer ultrapassar a importância dos resultados econômicos obtidos, requer o reconhecimento das transformações introduzidas em outras dimensões, como a emancipação e interação dos agentes integrantes no estabelecimento solidário por meio da transformação econômica e dos processos culturais, sociais e políticos por eles trazidos.

Deve-se ter em mente que o conjunto de experiências é heterogêneo, ou seja, com variadas características, pretensões e ações. Historicamente, tem-se que as motivações preponderantes para a criação de um empreendimento econômico solidário são de ordem econômica e as questões relativas à qualidade de vida, ou seja, é justamente manter sua sustentabilidade concomitantemente aos ganhos de natureza extraeconômica, preservando os princípios da economia solidária.

Elementos essenciais para análise de experiências concretas vinculada a ES, relaciona-se a três dimensões relacionais com a qualidade de vida busca pelos agentes solidários, a saber, a) dimensão subjetiva e saúde; b) dimensão de crescimento pessoal e c) dimensão societal. (BRASIL, 2011, p. 198).

A primeira dimensão está vinculada à convivência e à oportunidade de trabalho, negado pela conjuntura do desemprego, responsável por um sentimento de bem-estar que conduz a benefícios extraeconômicos com rebatimentos para a melhoria na saúde.

A segunda retrata a valorização do ser humano, ao invés do capital, é um dos princípios da economia solidária, pois trata de um ganho substancial e que pode resultar em mudanças mais profundas, pois se centra no processo de crescimento pessoal e de aprendizagem é favorável a transformações que extrapolam as aspirações individuais e alcançam aspirações coletivas.

A terceira refere-se à definição de sentir-se parte de um processo de mudança transcendente ao nível pessoal e que diz respeito à participação na construção de um projeto de sociedade.

Rutkowski (2008) afirma que quando se observa cooperativas de trabalho, detecta-se que a renda gerada por esses empreendimentos é pequena, e que essa realidade impede investimentos necessários para melhorar a produção, ou mesmo dificuldades em cumprir com outras necessidades como: contribuição com a previdência social ou construir fundos de saúde e educação. Essa realidade impede a ampliação do número de associados, fomenta grande rotatividade entre os cooperados, mantém a dependência de apoio externo, o que acaba por abalar a crença de alcançar os objetivos propostos de geração de renda e de contribuição com as políticas públicas de limpeza urbana (EID, LAFORGA E LIMA, 2010).

Segundo Brasil (2001, p. 185), os principais motivos que ensejaram a criação dos empreendimentos são em primeiro lugar a economia solidária como alternativa ao desemprego, seguido pela complementação de renda e por último está o trabalho associado convertido em motivação para os empreendimentos. Cabe ressaltar que juntos, a necessidade de trabalho e renda responde pela maior parte das motivações.

Vendo-a seja como um campo de trabalho institucional, seja um alvo de políticas públicas de contenção da pobreza, seja ainda uma nova frente de lutas de caráter estratégico, visões, conceitos e práticas cruzam-se intensamente, interpelando-se e promovendo a economia solidária como uma alternativa para… os excluídos, os trabalhadores, um modelo de desenvolvimento comprometido com os interesses populares, etc.; uma alternativa, ao aprofundamento das iniquidades, às políticas de corte neoliberal, … ao próprio capitalismo. (GAIGER, p. 1-2).

Em 2000, 0 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE identificou que havia cerca de 24.500 catadores nos municípios brasileiros, 22% menores de 14 anos. Nos últimos anos o Ministério Público tem atuado com vigor junto às prefeituras, objetivando impedir o trabalho de crianças e jovens nos lixões.

Segundo Eid, Laforga e Lima (2010), a formação de cooperativas de trabalhadores que se encontram no setor de reciclagem de lixo, a estrutura e o funcionamento do mercado de reciclagem são baseados em três componentes: o catador autônomo, que realiza a primeira etapa do processo, recolhe e separa os resíduos em um cenário competitivo; os sucateiros, que informal ou formalmente, compram os produtos reciclados pelos catadores ou cooperativas e os vendem às indústrias, ou compradores internacionais; as indústrias e os compradores internacionais compõem o terceiro componente desta cadeia de reutilização de resíduos, sendo estes últimos os grandes beneficiados de todo o processo de reciclagem.

2.1.3 ECONOMIA SOLIDÁRIA NO ESTADO DO PARÁ: GÊNESE, DIFICULDADES, PERSPECTIVAS

A filosofia da economia solidária, conforme já discutido, surgiu como um questionamento sobre a forma institucional de produção e reprodução da sociedade e enquanto construção coletiva do desenvolvimento local/regional. Neste contexto vale ressaltar a importância na compreensão das especificidades locais/regionais; averiguação e sistematização das experiências a fim de unificar as lutas contra a globalização neoliberal.

Segundo Laville (2004) as raízes históricas da economia solidária se diferenciam de um lugar para outro, diferenciando-se, portanto, de um país para outro. Na América Latina, afirma que está marcada pela colonização e pelas formas de subordinação do trabalho e das “práticas assistencialistas” que dificultam a autogestão produtiva. Vale ressaltar que as práticas solidárias devem ser pautadas na especificidade de cada localidade, pois se pautada em formas estrangeiras traz uma assimetria que torna difícil a realização das novas demandas dos movimentos sociais engajados no processo.

No Brasil, a economia solidária destacou-se última década do século XX, com ênfase na organização dos empreendimentos solidários (cooperativas, associações e grupos de produção), logo se tem que a economia solidária surgiu da oposição dos trabalhadores ao modo de produção capitalista e busca uma nova concepção de sociedade, evidenciada a partir da década de 80, com a abertura democrática.

Se tratando de economia solidária no estado do Pará, historicamente existem três correntes que delimitam o marco inicial desse movimento no estado, a primeira aponta a política de microcrédito do Banco do Povo da Prefeitura Municipal de Belém no período de 1997/2000, como a grande alavanca para a origem da economia solidária no Pará; a segunda afirma que a economia solidária já era difundida pela Cáritas brasileira, mais especificamente  nas regiões nordeste e oeste do estado, denominada de “cooperativismo alternativo”. A terceira consiste que a economia solidária já existia empiricamente em muitos empreendimentos, contudo não explicitamente identificada.

Considera-se a primeiro ensaio de política de fomento à ES, o fomento, através de linhas de crédito e incentivo à criação de cooperativas associativas solidárias já em 1998 pelo Banco do Povo belenense, que possibilitou a geração de emprego e renda à população local e a formalização de impedimentos vinculados à economia popular.  Atrelado a essa política creditícia, o governo municipal ainda promoveu ações para a qualificação dos trabalhadores quanto a formação de cooperativas sobre os princípios da ES, contudo a qualificação fornecida foi insuficiente, gerando até no enfraquecimento de cooperativas induzidas pelo município, organizadas como mecanismo de promoção de inclusão socioprodutiva dos trabalhadores.

Segundo o FPEPS (2005), a economia solidária da região teve sua origem na economia popular, por meio do Fórum de Empreendedores Populares de Belém – iniciativa com objetivo principal de contribuir para a organização solidária dos diversos segmentos da economia popular -, ocorrido em 2000, visando oferecer apoio para a tentativa de organização da economia solidária.

Influenciados pelos debates vivenciados no Fórum Social Mundial, em 2000, na cidade de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, iniciava a constituição, por meio da economia popular, um movimento pelos vendedores ambulantes das principais avenidas de Belém, marco inicial da concretização da economia solidária no Pará, que fundamentou-se na necessidade de sobrevivência ao mercado de trabalho local.

Vale ressaltar, que as ações públicas efetivadas no ano 2000, tinham seu objetivo fixado apenas para geração de emprego e renda, na tentativa de mobilização de desempregados e da formalização da economia informal e da economia popular, por meio de programas e projetos vinculados ao fomento do empreendedorismo. Neste momento a ES se apresentava de forma indireta. Contudo, esse era o momento oportuno para a difusão da economia solidária no estado do Pará, considerando organização sucessiva de eventos envolvendo diversos trabalhadores, os quais tinham por finalidade não exclusivamente a geração de trabalho e renda, mas a busca por melhoria nas condições de vida, tomando como base os conceitos da coletividade e da solidariedade, por meio da interação do movimento de empreendedores populares.

Nesse contexto, a economia solidária foi tomando forma no estado do Pará, no qual os trabalhadores da economia popular passaram a constituir empreendimentos baseados nos princípios do cooperativismo, reciprocidade e democracia, no qual todos os integrantes do grupo são ativamente responsáveis pelo gerenciamento do negócio.

Um exemplo concreto da atuação da ES no Pará consiste na mobilização dos trabalhadores instalados na área comercial da Usina do Progresso – espaço localizado no bairro do Reduto em Belém – contra a Prefeitura Municipal de Belém na sua tentativa de retirada dos trabalhadores dessa área, prevalecendo assim a garantia ao trabalho.

Outro exemplo foiparticipação de 150 trabalhadores no I Encontro de Empreendedores de Belém, ocorrido em 2000, com apoio do Banco do Povo de Belém e da Agência de Desenvolvimento Solidário/ADS. O evento é considerado importante para motivação desses servidores públicos quanto à importância de discursos e mobilizações dessa categoria para resolução e melhor desempenho de suas atividades econômicas. A partir desse evento, surgiu o Fórum de Empreendedores Populares de Belém.

É nesse cenário que percebe-se uma evolução na economia solidário paraense, por meio de discussões desses empreendedores foram elaborados projetos visando o fortalecimento econômico e a organização desses empreendimentos, o que resultou, em 2001, no fornecimento pelo Banco do Povo de novas linhas de crédito mais adequadas e a disponibilização de planos de formação e de capacitação através do Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador/PLANFOR – plano que fazia parte da política nacional de qualificação profissional.

Outro fato marcante, nesse ano, foi a 1ª Avaliação Pública do Banco do Povo de Belém, no qual foi sugerida a criação de Fóruns de Desenvolvimento Local Solidário, por bairro ou conjuntos de bairros, inserindo nas discussões a temática, a fim de fortalecer a economia solidária.

No ano seguinte, segundo FPEPS (2005) foram organizados 13 fóruns locais, mobilizando cerca de dois mil empreendedores em encontros e assembleias, para a discussão com as instituições de fomento a realidade da economia local e a articulação dos próprios empreendedores. Neste mesmo ano, foi criado o Conselho Popular de Controle Social, com o objetivo de obtenção de parcerias para melhorar o acompanhamento aos empreendimentos e o amadurecimento da gestão compartilhada, em que os empreendedores deveriam cumprir com responsabilidade o papel de sujeito ativo da política de microcrédito popular.

Neste mesmo ano, vários foram os eventos promovidos pela PMB, dentre eles a Jornada de requalificação em gestão de empreendimentos populares, que objetivava o fortalecimento da economia popular e paulatinamente foi se inserindo discursos para a construção de empreendimentos solidários juntamente a efetivação da economia solidária. Nessa jornada foram discutidas e aprovadas propostas para o III Encontro Brasileiro de Economia Solidária.

Na III Plenária Nacional de Economia Solidária, o Pará foi referência nos debates e na apresentação de propostas para constituição da economia solidária no Brasil. Já a IV Plenária Estadual de Economia Solidária centrou-se nas discussões referentes a assuntos dentre os quais a relação entre economia e geração de trabalho e renda e a valorização do trabalhador. Outro evento importante na história da economia solidária paraense foi à instituição do Fórum de Empreendedores Populares do Estado do Pará, formado por gestores e empreendimentos solidários, para a discussão das suas demandas.

Quando a temática ES é discutida nos eventos, detecta-se a presença de cooperação, conflitos, negociações e tensões entre os agentes dos empreendimentos solidários, criando um aparente contexto paradoxal entre, por um lado a busca da defesa do coletivo e, por outro a manifestação espontânea das relações de poder em disputa por espaço. Contudo, apesar das diferenças na forma de pensar entre os empreendimentos solidários, prevalece sempre a vontade de cooperação.

Em 2007, como fruto da V Plenária Metropolitana de Economia Solidária, ocorrida em 2007106, constituiu-se a definição de economia solidária no Pará como um movimento que fortalece a luta, a união e a igualdade social, por meio de novas estratégias de desenvolvimento social, econômico e cultural, de geração de trabalho e renda, para um comércio justo e solidário, restabelecendo as relações de dignidade.

Vale ressaltar que as lutas do movimento de economia solidária do Pará, em certos momentos, aconteçam de maneira descontínua e pulverizada, às vezes até mesmo por questões pessoais e individualizadas, mas já concreta a importância dessa “nova” economia para o estado, o que se materializou, em 2007, da criação da Diretoria de Economia Solidária/DECOSOL, na Secretaria de Estado de Trabalho, Emprego e Renda/SETER, formada por fusão de diversos agentes solidários por meio de forças e lutas para a constituição da economia solidária, como parte da agenda de ações do governo.

Uma ação concreta do movimento solidário no estado foi o encaminhamento de proposta de lei estadual de economia solidária, que discutida e revisada em reunião por representantes de empreendimentos solidários, assim como de gestores e de assessorias, que compõem o movimento de economia solidária do Pará, como o PITCPES. Outra importante atuação do movimento solidário paraense se materializou no no Fórum Social Mundial/FSM, em 2009, em Belém, com a presença de estandes na  Feira Nacional de Economia Solidária, como ocorreram debates acerca das áreas de interesse da economia solidária e a criação de cartilhas sobre a moeda social – Amazônida, organizado pelo Grupo de Trabalho/GT de Economia Solidária, fundado em 2008 e composto por empreendimentos solidários, representantes do governo estadual e assessorias, particularmente o PITCPES.

Cabe ressaltar que apesar dos avanços vivenciados pelo movimento da Economia Solidária no estado, ainda se faz presente a falta de esclarecimento e conhecimento dos conceitos e seus princípios por muitos agentes engajados em empreendimentos solidários, que apesar de se identificarem com essa economia, têm dificuldades em definir a Economia Solidária.

Este fato se deve a duas constatações: a primeira consiste na não participação de todos os empreendimentos solidários em cursos, oficinas, seminários, encontros, plenárias. Os empreendimentos comparecem apenas quando adquirem apoio financeiro e logístico, por parte dos organizadores do evento e assessorias, ou mesmo por parte de políticas de fomento. A segunda é pela ausência ou pouca capacitação e qualificação sobre economia solidária.

Segundo o Atlas da Economia Solidária no Brasil (2005) aponta que dentre as principais formas, regularizadas, de empreendimentos de economia solidária as associações são as de maior representatividade com o percentual de 52% de todos os empreendimentos, seguido dos empreendimentos informais com 25%, as cooperativas com 13% e outras formas de experiências com 9%[5]. Segundo Miranda et al, (2008), mapeando esses empreendimentos, com base nos dados do mesmo órgão, 44% se localizam no meio rural, 37% na área urbana e ainda 19% com área de atuação mista.

No estado, existem alguns desafios que precisam ser ultrapassados para que se efetive economia solidária em todo o território paraense. A título de exemplo, tem-se a criação de estratégias efetivas de participação dos empreendimentos solidários situados no interior do estado, a partir de apoio financeiro e logístico para virem a eventos na capital, para a capacitação de seus agentes quanto à economia solidária. Essas estratégias podem ser materializadas por meio da implantação de fóruns regionais e locais.

Um fator importante seria a mudança na cultura em relação ao trabalho coletivo, a confiança mútua, assim como a formação de lideranças ativas nos empreendimentos e formação técnica e profissional, para os trabalhadores dos empreendimentos. Para tal, se faz necessário que a formação sobre economia solidária seja realizada por meio de parcerias com o movimento de economia solidária, no que tange ao fornecimento de assistência técnica e incentivo ao movimento, em conjunto com assessorias de fomento, para elaboração de projetos que auxiliem desde a organização dos empreendimentos até a sua infraestrutura para produção, beneficiamento e comercialização dos produtos, juntamente com políticas públicas de apoio ao transporte e escoamento da produção.

Paralelamente a isto, é necessária a inclusão, no mercado dos produtos provenientes dos empreendimentos solidários, a criação de políticas públicas e políticas de microcrédito apropriadas aos empreendimentos para melhorar a qualidade dos produtos da economia solidária.

Outro desafio centra-se na legalização da economia solidária no Pará, por meio da aprovação e execução da lei estadual de economia solidária e seu real cumprimento independente da gestão governamental, pois será o marco norteador para as ações da economia solidária, que vise à questão da sustentabilidade ambiental, educacional e de saúde nos empreendimentos solidários. Este desafio já foi transformado em conquista, com a elaboração e o debate da lei de fomento à economia popular e solidária no estado do Pará, sendo considerado um avanço no que diz respeito ao próprio marco jurídico da economia solidária no estado.

Apesar dos entraves ainda existentes no movimento da economia solidária no Pará, já se pode destacar algumas conquistas como o apoio para elaboração, aprovação e implementação de projetos direcionados a empreendimentos solidários em seus diversos segmentos produtivos. A título de exemplo tem-se o Projeto Centro de Formação em Economia Solidária/CFES/SENAES/MTE que visa à qualificação para o conjunto de trabalhadores, ou seja, para gestores, assessores e empreendedores solidários. Assim como, o curso de especialização em Economia Solidária da Amazônia direcionado para graduados, gestores públicos, representantes do movimento de economia solidária, ou seja, trabalhadores da economia solidária ou interessados que pretendiam se especializar na temática.

Outra conquista foi à criação da DECOSOL/SETER[6], ainda em estruturação, para o fomento da economia solidária no Pará direcionada a constituição de empreendimentos solidários com os jovens do Programa Bolsa Trabalho, por meio de formação/capacitação/qualificação profissional destinada a empreendimentos coletivos e familiares.

Destaca-se nesse cenário, a realização de Feiras estaduais de economia solidária, assim como, a participação de empreendimentos paraenses em feiras e eventos em nível estadual, nacional e internacional, como meio de criação de estratégias de fortalecimento da economia solidária no Estado, assim como o avanço do movimento por meio de debates e sugestão de ações para promover a economia solidária. Atrelado a esses eventos tem-se a realização de conferências e plenárias estaduais e a participação do estado do Pará no Conselho Nacional de Economia Solidária com assessoria e empreendimento.

Nesse contexto de desafios e conquistas, têm-se que o movimento de economia solidária ainda precisa conquistar novos espaços, fortalecer suas lutas e ações para uma real participação em âmbito social, político e cultural do estado do Pará, no qual sempre prevaleça a solidariedade e cooperação.

2.1.4 A ECONOMIA DO TRABALHO E A ECONOMIA SOLIDÁRIA

Conceitualmente Coraggio (2000), define a economia do trabalho como uma economia social que centra-se na criação do bem coletivo e não no interesse individual dos indivíduos, fator predominante na economia capitalista. Segundo Coraggio (2000), essa economia baseia-se em atividades domésticas, como o trabalho de limpeza, cozinha, confecção de roupas, atividades essas consumidas pelas unidades familiares sem passar pelo mercado, contemplando um conjunto de atividades entre as quais as cooperativas.

Esta economia possui sua interação a Economia Solidária, por se desenvolver devido à falta de capacidade da estrutura capitalista de inserir uma parcela dos trabalhadores no mercado de trabalho, assim como a limitação das políticas públicas compensatórias em relação ao desemprego e a das condições de precarização do trabalho, o que provoca uma reação na população excluída a procurar formas de subsistência na em empreendimentos domésticos para assegurar a reprodução da vida ampliada, que consiste na melhoria da qualidade de vida com base no desenvolvimento das capacidades e das oportunidades sociais das pessoas.

Outra interação entre essas Economias se materializa no conceito de empresa social que consiste em estabelecimentos que não produzem apenas mercadorias, mas que produzem o “social” e valoriza a “pessoa”, em contrapartida a desvalorização do modo de produção capitalista.

3. METODOLOGIA

Essa pesquisa foi realizada em dois momentos. Inicialmente e ao longo de todo o processo investigativo, se buscou materiais teóricos para fundamentar a temática dissertada, por meio de revisão bibliográfica. Posteriormente, com a realização da pesquisa participante e estudos de casos, como mecanismo de coleta e processamento das informações levantadas junto aos dirigentes e cooperados, sobre as cooperativas selecionadas: Cooperativa de Catadores de Materiais Recicláveis da Terra Firme (CONCAVES) e Cooperativa dos Profissionais do Aurá (COOTPA).

A pesquisa participante ocorre com participação dos pesquisadores nas relações de comunicação com as pessoas ou grupos da situação que se está investigando. Essa metodologia objetiva tornar os pesquisadores aceitos pelas pessoas ou grupos pesquisados. A participação dos pesquisadores consiste na busca de identificação do pesquisador com os valores e os comportamentos do grupo. Já o estudo de caso consiste no estudo profundo e exaustivo de um ou poucos objetos, permitindo seu amplo e detalhado conhecimento (GIL, 2007).

Em relação aos objetivos da pesquisa, os autores classificam como exploratória e descritiva, com abordagem qualitativa, pois na pesquisa qualitativa o pesquisador se interessa mais pelo processo do que pelos resultados, examina os dados de maneira intuitiva e privilegia o significado. Esses dados são complexos de tratamento estatístico e as questões a investigar não se estabelecem mediante a operacionalização de variáveis, sendo formuladas com o objetivo de investigar os fenômenos de toda a sua complexidade e em contexto natural (BODGAN; BIKLEN, 1994, p. 16 citado por BOAVENTURA, 2004, p. 56-57).

A pesquisa de campo junto às cooperativas ocorreu sob a forma de visitas técnicas às instalações das cooperativas, realização de entrevistas com os dirigentes para verificação do processo de gestão e relação com as políticas públicas, além disso, diálogos e aplicação de questionários com os cooperados para identificação da história profissional e pessoal, para avaliação da orientação de gestão, avaliação da relação com a administração pública municipal, averiguação das condições de trabalho, temas centrais desta dissertação.

Inicialmente, em maio de 2012, visou-se realizar uma pesquisa exploratória junto às cooperativas analisadas para a solicitação de permissão o desenvolvimento da pesquisa, a manutenção de um contato inicial e identificação de aspectos norteadores da pesquisa, como o histórico das cooperativas, o número de cooperados, a regularidade jurídica e a identificação dos dirigentes e dos cooperados.

As informações coletadas através das entrevistas, da observação direta a ser registrada em diário de campo e da documentação fornecida, bem como os dados secundários, foram transformadas em elementos essenciais para responder aos objetivos da pesquisa.

4. ANÁLISE DOS DADOS

4.1 ANÁLISE COMPARATIVA DAS EXPERIÊNCIAS DA CONCAVES E DA COOTPA: DEPARTAMENTO DE RESÍDUOS SÓLIDOS (DRS) E A GESTÃO PÚBLICA DOS RESÍDUOS SÓLIDOS DE BELÉM

Iniciando o processo de pesquisa de campo, a mesma foi realizada junto ao DRS e ocorreu em 28.02.2013, a entrevista com a Sra. Elvira Pinheiro de Oliveira, Coordenadora de Projetos Sociais e Educação Ambiental.

A Gestão de Resíduos Sólidos de Belém é desenvolvida pela Secretaria Municipal de Saneamento, ficando o DRS responsável por todas os planos e ações de limpeza urbana e gestão dos resíduos sólidos de Belém, dentre tais atribuições destaca-se a limpeza de vias públicas, a capinação, limpeza de canal, bueiro, educação ambiental e a coleta seletiva.

A Política de Resíduos Sólidos de Belém centra sua atuação vinculada a Rede Recicla Pará (RRP)[7] e Associação de Catadores da Coleta Seletiva de Belém (ACCSB)[8], que atualmente possui um galpão disponibilizado pela Prefeitura localizado no Canal São Joaquim, no bairro de Val de Cans. Todo material passível de reciclagem, tais como papel, plástico, alumínio, deve ser levado para o galpão. O referido material é recolhido nas ruas, e que, se não fosse a correta destinação, poderia virar lixo, gerando impactos ambientais. Mas, após análise e triagem, tudo deve ser reciclado.

Nesse cenário, a Prefeitura possui um plano de atuação específico: primeiramente, é a responsável pelo desenvolvimento de trabalho de educação ambiental nos bairros de Belém, para posteriormente seguir com a efetiva atividade de coleta seletiva. Somente após a aplicação destes procedimentos é que o catador entra no processo de coleta seletiva para coletar os resíduos sólidos. No primeiro momento, o DRS acompanha o catador na coleta domiciliar no sentido de orientar a coleta correta e eficiente, para que depois o mesmo possa prosseguir suas atividades de forma independente, visando a autogestão das cooperativas.

A primeira fase da política de Resíduos sólidos que está sendo realizada, qual seja a educação ambiental realizada porta a porta com os moradores de Belém, com vistas a destacar a importância da coleta seletiva e como deve ser realizada. tal fase foi realizada nos bairros de Umarizal, Nazaré, Marambaia, Pedreira e Souza. Atualmente, encontra-se em expansão para os conjuntos habitacionais da Providência, Promorar e Paraíso dos pássaros.

Em relação ao processo de fomento e incentivo a criação de Cooperativas responsáveis pela coleta seletiva, este é inexistente na atual política municipal, tendo em vista que o único suporte que é disponibilizado pela Prefeitura às cooperativas já existentes estão relacionadas a necessidade de apoio logístico O DRS possui 06 (seis) caminhões coletores que ficam a disposição para empréstimo as cooperativas devidamente cadastradas e regularizadas. Quando os veículos são cedidos, há necessidade de acompanhamento por um fiscal da Prefeitura para evitar que o caminhão seja desviado para outras atividades, que não seja a coleta seletiva.

Segundo a entrevistada, o primeiro Projeto efetivo desenvolvido pela Prefeitura para coleta seletiva em Belém ocorreu em 2004 com a figura do Posto de Entrega Voluntária, que não conseguiu lograr êxito por vários motivos, dentre eles a falta de comprometimento das empresas e moradores na realização da separação dos resíduos orgânicos e recicláveis e não recicláveis, o que dificultava a seletividade, além da atuação de vândalos que quebraram as lixeiras seletivas coletoras instaladas pela Prefeitura.

Diante dessa realidade, a política foi substituída pela atual proposta de educação ambiental e coleta porta a porta, com a distribuição, em 2007, de 60 carrinhos de metalon a catadores e cooperativas vinculadas à prefeitura pela Rede Recicla Pará e Associação de Catadores da Coleta Seletiva de Belém, no qual 50% já se encontram deteriorados.

Quando perguntado das dificuldades existente para efetiva aplicação de coleta seletiva em Belém, foi destacada a falta de comprometimento por parte da população que não se conscientiza da importância do tratamento e destinação dos resíduos sólidos, e não cooperação na realização da coleta seletiva domiciliar, o que acaba comprometendo o trabalho dos catadores, mesmo após a visita dos agentes de educação ambiental da prefeitura.

Outra dificuldade apontada está relacionada à infraestrutura logística do departamento que possui poucos caminhões para efetiva coleta seletiva – seis conforme já relatado – e quando há necessidade de manutenção em um deles por falhas mecânicas, acaba por interromper a coleta seletiva no trecho atendido pelo mesmo. Há, ainda, a necessidade de mais barracões para recebimento do material coletado, para efetivação da triagem e destinação dos resíduos recicláveis, sendo o ideal um em cada bairro e não apenas um para recebimento de todos os resíduos como ocorre atualmente.

Com a mudança de gestor público em 2013, o DRS espera que a nova administração venha agregar políticas e recursos para a atividade de coleta seletiva em Belém. Ressalta que já se iniciou as primeiras atividades ligadas a reestruturação das políticas ligadas ao tratamento dos resíduos, efetivada pelo projeto dos 100 dias, denominado “Cuida Belém, cuide também”, que visa limpar, primeiramente, os bairros de Belém e levar a efetiva educação ambiental aos moradores de Belém. Após, será necessário a implantação de uma política efetiva de resíduos sólidos em Belém, com a criação de um plano efetivo de gerenciamento de resíduos sólidos, com recursos próprios, de forma a possibilitar a integração com os demais Municípios do estado do Pará.

Por fim, Ressaltou que atualmente a Política de Resíduos Sólidos em Belém ainda encontra-se no estágio de planejamento, mas com a mudança da Administração pública municipal, visa-se a implantação de uma Política efetiva, com a realização da coleta seletiva em todos os bairros de Belém, com a alternância da coleta de resíduos seletivos dos resíduos não recicláveis, em dias distintos, cujo primeiros seriam destinados os centros de triagem de cada bairro, no qual seriam tratados e destinados por cooperativas e assim a aplicação efetiva das diretrizes e da legislação nacional destinadas aos resíduos sólidos.

4.2 CONCAVES: DA COLETA SELETIVA À CONSCIENTIZAÇÃO AMBIENTAL

Para análise da realidade da CONCAVES, inicialmente foi realizada a pesquisa junto ao atual presidente da Cooperativa. Sr. Jonas de Jesus Fernandez da Silva, que se encontra em seu segundo mandato, cada um com 4 anos, iniciado em 2006 e terminado em 2014.

A CONCAVES iniciou suas atividades em 2004, contudo sua efetiva regularização ocorreu em 2005, com a participação de 13 cooperados, e atualmente, já alcançou a quantidade de 31 cooperados, sendo 27 mulheres e 4 homens. Sua atividade centra-se na coleta seletiva porta a porta e comercialização de plástico, alumínio, papelão, garrafas pet e cobre. De caráter totalmente particular, a ideia de formação da cooperativa veio dos próprios cooperados, sem intervenção e incentivo do poder público.

Todos os catadores que trabalham na Cooperativa são considerados cooperados, e não possuem qualquer vínculo com catadores avulsos; contudo existe um projeto para ampliação da atuação da Cooperativa, a partir do momento em que o Poder Público efetivar a implantação da coleta seletiva no Pará, mas especificamente na região metropolitana de Belém, com a assinatura do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).

A rotina de comercialização e remuneração é baseada na produtividade semanal. No decorrer da semana, são realizadas vendas casadas e alternadas, ou seja, de forma que durante a semana vende-se papel/papelão, seguido da venda de plástico; após, cobre intercalado com garrafas pet.

A Concaves deve arcar, ainda, com suas despesas fixas, quais sejam, água, luz, combustível do caminhão, IPTU do imóvel da sede e do galpão que foram cedidos por um parente do atual presidente, além dos gastos com material de expediente.

A proposta de remuneração depende do desempenho e dedicação semanal de cada cooperado, gerando em média de R$ 70,00 a R$ 120,00 por semana, com o volume entre 08 e 10 toneladas, pagos após apuração da receita semanal e das despesas, contudo busca-se a meta de uma remuneração semanal de R$ 150,00. Para que isto ocorra, há a necessidade de melhoria da infraestrutura e aumento do volume de coleta seletiva para 15 toneladas.

Cada Cooperado recebe valores diferenciados, baseados na frequência e desempenho na execução das atividades, que deve ser avaliada durante a reunião em grupo que ocorre aos sábados.

Quando questionado se a cooperativa oferece outros benefícios fora à remuneração, ressaltou-se a disponibilização do computador da Cooperativa para navegação na internet e uma ajuda de custo para os cooperados que ficarem doentes e impossibilitados de trabalhar, por uma semana.

Quanto à realização de treinamentos, são realizados mediante convênio com Instituições, como por exemplo, o Projeto Cataforte[9]; OACB e Cempre (Compromisso empresarial da Reciclagem)[10].

Na realização das atividades de coleta seletiva, são utilizados equipamentos de proteção individual (EPI) que foram doados à Cooperativa por meio do Projeto Sócio-produtivo desenvolvido pela ONG da Coca-Cola, como: luvas, botas, máscaras, uniformes, óculos de proteção, chapéus e protetor solar.

A jornada de trabalho é de 08 horas semanais de segunda a sexta, com duração de 08:00 às 12:00 e das 14:00 as 18:00 horas, e aos sábados de 08:00 às 12:00 horas, no qual é realizada as reuniões para prestação de contas, pagamento semanal e planejamento das atividades da semana seguinte, além da divisão e distribuição de tarefas. Excepcionalmente, os cooperados se reúnem aos domingos, mas somente quando há necessidade de eventos e coleta de material extra.

Além das reuniões semanais que ocorrem aos sábados, acontecem assembleias, com reconhecimento de ATA a cada 02 anos, para discussão das expectativas e planos para o futuro da CONCAVES, assim como a deliberação para receber novos cooperados.

O material coletado é obtido principalmente por meio da coleta porta a porta, com apoio e colaboração dos moradores do bairro da Terma Firma, e por meio de convênios e contratos com Instituições públicas e privadas, a saber, UFPA, Banco da Amazônia, Instituto Evandro Chagas, Caixa Econômica Federal, Companhia das Docas do Pará, SEAD, Banpará e Iterpa.

A divisão do trabalho entre os cooperados ocorre de forma igualitária e por meio de rodízio de atividades, conforme estado físico do cooperado e volume de trabalho, sendo a distribuição da seguinte forma: 1) 02 cooperados ficam no escritório no setor administrativo, para atender ao telefone, receber pessoas e propostas de parcerias, além da atualização das informações no site e facebook da cooperativa; 2) 04 saem no caminhão para coleta nas Instituições conveniadas e parceiras; e, 3) os demais ficam no galpão para realização de tarefas de coleta, triagem e destinação do material.

A principal fonte de conflitos existentes está ligada à baixa remuneração obtida com o trabalho desenvolvido, além do descontentamento com alguns cooperados que não são tão comprometidos e ainda não compreendem o sentido do trabalho coletivo e que a cooperativa pertence a todos os cooperados.

A principal dificuldade enfrentada é a falta de reconhecimento da importância do trabalho desenvolvido pela cooperativa – coleta de resíduos sólidos -, como agente de proteção ambiental, bem como a falta de uma estrutura física e efetiva para implantação de políticas públicas voltadas ao trabalho do catador.

As perspectivas e desafios para o futuro estão ligados às novas investidas do novo Prefeito de Belém que realizou reunião com a CONCAVES e está priorizando a atividade de limpeza e destinação dos resíduos sólidos de Belém. Apesar de estarem todos legalizados e regulamentados, não existe, ainda, nenhuma linha de financiamento a disposição, contudo estão existe análise sobre a possibilidade de obtenção de empréstimo para melhoria da estrutura física e compra de equipamentos que maximizem as atividades desenvolvidas, pois atualmente só possuem uma balança e um caminhão que foram cedidos pela SEDES, fator este que limita a produtividade.

Outra perspectiva é a assinatura de um Projeto junto a Fundação do Banco do Brasil, no qual será doado a CONCAVES três contêineres e 01 veículo para o desenvolvimento de suas atividades.

Quanto ao histórico da cooperativa, os 13 cooperados que fundaram a CONCAVES eram catadores antes da formalização da cooperativa, que visando a melhoria das condições de trabalho e da qualidade de vida e acreditando na relevância social do trabalho desenvolvido, se uniram. Após com o sucesso coletivo e visibilidade da CONCAVES no bairro onde atuam, outros cooperados foram incorporando a cooperativa, mesmo sem nunca antes ter trabalho como catadores, seja por necessidade financeira, seja por falta de opção no mercado de trabalho.

Como principal dificuldade enfrentada pela cooperativa no processo de formação, foi destacado o alto custo para a regularização e burocracia, juntamente com a baixa compreensão da importância e reconhecimento do trabalho do catador.

Com o passar do tempo, ocorreram mudanças significativas no trabalho desenvolvido pela CONCAVES, a partir do apoio da população da Terra Firma que após diversos trabalhos de conscientização ambiental e da importância da coleta seletiva, realizados pela própria Cooperativa, passou a separar o lixo em casa, facilitando o trabalho dos catadores. Além destes fatores, foi possível verificar que a efetivação de convênio e contratos com órgãos e Instituições públicas e privadas para recolhimento de material reciclado ajudou no aumento da produtividade da cooperativa.

Dentro do processo produtivo existem dois gargalos; o primeiro ligado a não realização da coleta seletiva por parte da população em geral que mistura lixo orgânico, com materiais recicláveis e não recicláveis e; a falta de estrutura logística, representada pelo falta de mais caminhões e equipamentos para coleta de uma maior quantidade de resíduos sólidos e o baixo valor recebido pela venda do material reciclado que acaba por não remunerar adequadamente o catador pelo trabalho realizado.

Outra dificuldade encontrada é a falta de apoio por parte do poder público, em especial do DRS, que é o setor responsável pela gestão dos resíduos sólidos em Belém.

Analisando o primeiro aspecto da pesquisa, quanto à conquista da autonomia administrativa e operacional das cooperativas em relação à gestão pública, a CONCAVES teve o início de suas atividades por iniciativa dos próprios cooperados sem interferência do Poder Público e durante toda sua trajetória permaneceu independente das intervenções governamentais para manutenção de suas atividades.

Passando para análise da trajetória da qualidade de vida dos trabalhadores, e considerando que os cooperados durante toda a trajetória da cooperativa, observou-se uma melhoria da qualidade de vida quanto ao aspecto de reconhecimento dentro do ambiente de trabalho e alternativa para obtenção de renda, levando em conta a escassez de vaga no mercado de trabalho.

Com efeito, a maioria dos cooperados não possuía emprego de carteira assinada antes de ingressar na cooperativa, com exceção de uma cooperada.

Dentro da trajetória da CONCAVES, todos seus cooperados optaram por tornar parte da cooperativa, tanto por convite do atual presidente, Jonas, quanto por iniciativa própria; A grande maioria se sente motivado e satisfeito com o trabalho que desenvolvem, pois é repassado a todos a importância que o trabalho de coleta seletiva tem para o futuro e as mudanças econômicas e sistemáticas que vêm ocorrendo para essa atividade.

Um fato importante a destacar é que a maioria dos cooperados estudou até completar o ensino médio ou ainda estudam, de forma que visam cursar nível superior na área de meio ambiente para utilizar o conhecimento obtido no seu ambiente de trabalho.

Economicamente, a média da remuneração não chega a um salário mínimo para cada cooperado, fator que por vezes desmotiva alguns trabalhadores a procurarem ocupações intermediárias para complementar à renda principal tirada na cooperativa, como serviços de manicure, assistente de gráfica, vendas de catálogos, dentre outros.

Com a baixa renda obtida com o trabalho do cooperado, a remuneração só consegue suprir as despesas básicas: água, luz, transporte, em alguns casos permitiu a aquisição de eletrodomésticos, como liquidificador e televisão. Nenhum dos cooperados possui conta em banco ou crédito na cidade, em forma de cartão de crédito, salvo casos em que possuem cartão Yamada.

Considerando que os cooperados são moradores do bairro em que a CONCAVES está sediada, a maioria se dirige ao trabalho a pé ou de bicicleta. Quanto à moradia, há uma parte dos cooperados que possuem casa própria e outros que moram com parentes; entretanto, a maioria mora em casa alugada.

A participação em cursos, palestras e seminários foram realizadas por todos quando ingressaram na cooperativa e sempre que havia possibilidade de novos cursos. Todavia, poucos realizaram os cursos profissionalizantes.

Quanto à questão do processo decisório, as respostas foram unânimes, toda e qualquer decisão das atividades e decisões é tomada de forma coletiva. O presidente reúne as possibilidades e parcerias a serem firmadas, discute com os cooperados e divide as tarefas e ações a serem realizadas, com a anuência de todos, nas decisões semanais realizadas aos sábados.

Quando investigado as dificuldades enfrentadas para manter a cooperativa, foi destacada a falta de infraestrutura e equipamentos, seguida da baixa remuneração mensal retirada com o trabalho. Outro item destacado foi o baixo comprometimento da gestão pública com a atividade de coleta seletiva, que acaba por se tornar um entrave na realização dessa atividade ao invés de auxiliar e dar suporte às cooperativas de catadores de resíduos sólidos.

Quanto a avaliação da atual administração, é tida pelos cooperados como “clara, transparente, e faz com que todos façam parte da cooperativa” (sic). E o atual pretendente apresenta as características de um bom diretor, julgada pelos cooperados: “ter liderança, autoridade, clareza na distribuição das tarefas e da parte financeira da cooperativa e uma linha de comando” (sic). Quanto à avaliação do trabalho e aos cooperados, a avaliação geral é que “são bons cooperados e que a melhoria deve ser baseada em um maior comprometimento, com maior coletividade no desenvolvimento das atividades e gostar do que faz para valorizar a profissão de catador” (sic).

Como perspectiva para a cooperativa, visam: “uma melhor infraestrutura, o efetivo apoio por parte da gestão pública e aumento da remuneração obtida” (sic).

Diferentemente da CONCAVES, a COOTA em seu processo de constituição, em 2001, teve indução da gestão pública municipal, no governo de Edmilson Rodrigues. Formada inicialmente por 32 catadores avulsos que trabalhavam diretamente com coleta seletiva e venda de material reciclado coletados no lixão do Aurá, receberam a proposta para criação de uma Cooperativa de coleta seletiva que visava agregar melhoria no desenvolvimento das atividades dos catadores.

Inicialmente, por meio do acordo firmado entre a prefeitura e a Cooperativa, foi instalada dentro do Aurá uma balança, no qual 10% do valor de todo o material que saia do lixão era destinada a COOTPA. Juntamente foi disponibilizado um galpão, equipamentos – prensa e esteira – e veículos – guindaste e caminhão. Contudo com a mudança de Governo o acordo foi desfeito e a Cooperativa foi retirada do Aurá tendo que deixar todos os equipamentos, veículos. A partir daí a COOTPA perdeu o incentivo e vinculação com o poder público passando a sede para um terreno da antiga presidente, Mara.

A maior dificuldade apresentada pela Cooperativa foi à descontinuidade administrativa, as duas primeiras administrações, de 2001 a 2004 – Jairo Ramos e 2005 a 2012 – Mara Suely Martins, foram muito instáveis e marcadas por conflitos internos e prejudiciais a Cooperativa, que por pouco não findou suas atividades em 2012, quando por meio de Assembleia Geral, os 22 cooperados restantes e atualmente vinculados a cooperativa, se reuniram e decidiram retirar a administração da cooperativa da então presidente Mara e eleger um novo conselho administrativo, presidido até hoje pela Maria Fernanda Leal Ribeiro.

Após a retira da sede da COOTPA de dentro do Aurá, quatro foram às sedes: 1) galpão no nova vida, em 2008; 2) quintal da casa da ex-presidente, Mara, e 3) por último e atual o galpão alugada na comunidade Fazendinha, no bairro da Terra Firma, que devido o reajuste no aluguel que ocorrerá em 2013, está sendo cogitada a possibilidade de mudança de espaço físico.

Atuando na coleta, triagem e venda de produtos reciclados – plástico, alumínio, pet, papelão, ferro e cobre – que são triados e embalados para venda que ocorre semanalmente. Além dos 22 cooperados, sendo 13 mulheres e 9 homens, atualmente, a COOTPA também conta com apoio de catadores autônomos que trabalham vinculados à cooperativa e sua remuneração é equivalente aos dias trabalhados e ao volume de material coletado e disponível para venda.

A atual estrutura de produção é realizada, via coleta porta a porta no bairro das Águas Lindas e por meio de parceria mantida com Órgãos públicos, via contrato de duração de seis meses, a saber, UFPA, Ministério Público, banco do Brasil, Instituto Evandro Chagas, Banco da Amazônia e Caixa Econômica, com jornada de trabalho semanal, de segunda à sexta das 7:30 às 12:30, podendo ter expediente no período da tarde e aos sábados, quando agendado busca de material em algum parceiro. A maioria dos contratos com Órgãos públicos é compartilhada com a CONCAVES, no qual o recolhimento de material é dividido mês a mês entre as cooperativas.

O trabalho é realizado com a devida proteção por equipamentos de proteção individual, como: luvas, botas, máscaras, uniformes, óculos de proteção, chapéus e protetor solar, recebidos por meio de doação da ONG da Coca-cola. Contudo apesar de terem esses equipamentos em estoque, nem todos usam.

As decisões e prestações de contas são realizadas quinzenalmente, de forma clara e transparente, no qual são apresentadas todas as notas e anotações sobre as despesas e confortada com as receitas, gerando uma sobra que é dividida igualmente entre os cooperados. As vendas do volume coletado são realizadas quinzenalmente.

As tarefas são divididas igualitariamente, no qual são montadas equipes de três cooperados, 1) equipe formadas por três cooperados, responsável pela coleta porta a porta em carroças; 2) equipe de três cooperados que ficam no galpão realizando a triagem do material e 3) uma equipe administrativa que fica responsável por realizar as negociações para obtenção de parcerias e pela comercialização do material reciclado. Há rodízio entre as equipes para assegurar a equidade na realização das tarefas.

Uma grande dificuldade enfrentada é a total falta de equipamentos e estrutura logística, o que acarreta custos excessivos e que absorvem maior parte do rendimento da Cooperativa, sendo: aluguel do galpão (R$ 400,00); aluguel do caminhão para transporte do material reciclado (R$ 250,00/diária), ração dos cavalos.  As carroças utilizadas são emprestadas, ficando a cooperativa responsável pela manutenção e alimentação dos dois cavalos. Outra dificuldade é a falta de apoio e implantação de políticas públicas voltadas para coleta seletiva, o que potencializa a desvalorização do trabalho desenvolvido pelos catadores.

Assim como a CONCAVES, em 2010, a COOTPA recebeu como doação um caminhão e uma balança para o desenvolvimento de suas atividades, contudo devidos problemas administrativos e conflitos internos com a última presidente, Mara, que utilizava o caminhão para realização de atividades extra cooperada, quando foi destituída do cargo, ela devolveu o caminhão para a SEDES e ainda encontra-se em posse da balança, no qual a COOTPA ainda tenta recuperar tanto o caminhão quanto a balança.

Passando para análise dos aspectos relativos à qualidade e melhoria nas condições de trabalho, configura-se similarmente a realidade encontrada na CONCAVES, de mão de obra que pela escassez de vaga no mercado de trabalho buscou na atividade de coleta seletiva um meio de subsistência, contudo a maioria dos cooperados já trabalhava dentro do lixão do Aurá e com a organização por meio da cooperativa tiveram uma melhoria significativa na qualidade de vida, em relação à redução da exposição da vida, considerando o ambiente hostil que é o Aurá.

Um fator a se destacar é a falta de instrução pelos cooperados que, na maioria, não terminaram o ensino fundamental e nem tem perspectiva de voltar a estudar. Considerando a alta despesa que possuem, a remuneração obtida é menor que a realizada na CONCAVES, contudo apesar dessa realidade, os catadores se dizem mais felizes ganhando menos, mas não expostos às hostilidade e periculosidades do Aurá.

Quanto à realização de cursos, os cooperados realizam cursos junto a Cáritas Brasil, Instituição com quem contém parceria, já tendo realizado cursos sobre a importância da coleta seletiva, e sempre que necessitam recorrem à ajuda da OACB, para realização de cursos na área contábil e administrativa.

Quanto às perspectivas para a Cooperativa, acreditam que com as novas legislações e preocupação ambiental, o trabalho das cooperativas de coleta seletiva vai ser valorizado, possibilitando um maior retorno financeiro e possibilidade de melhorar a infraestrutura física do galpão e a aquisição de equipamentos e materiais que facilitem e maximizem o trabalho realizado, consequentemente gerando uma estrutura para conseguir agregar o maior número de catadores.

Devido aos diversos problemas apresentados pelas antigas administrações, devido conflitos de interesses e desvio de recursos e equipamentos, identificou-se a unanimidade quanto ao perfil de um bom diretor de cooperativa estar vinculado ao caráter da transparência e ao senso de coletividade e fraternidade com os demais cooperados. Considerando que a nova administração ainda completará um ano e que foi colocada no cargo por indicação de todos os cooperados, ela possui a aceitação de todos e apresenta as características necessárias para reerguer a COOTPA e defender o interesse de todos.

Quando interrogados o que é ser um bom cooperado, as principais características apontadas estão ligadas a 1) perseverança, considerando que o trabalho de coleta seletiva é árduo e acaba por fragilizar a saúde devido alta exposição a bactérias e germes; 2) união, pois para manter a cooperativa o espírito de coletividade tem que prevalecer em relação ao querer individual; 3) cooperação, pois exige disponibilidade para realização de qualquer tarefa que seja necessária ser cumprida.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As mudanças socioeconômicas ocorridas no mundo levaram ao aumento da informalidade e do trabalho precário. Uma situação na qual boa parte dos trabalhadores se sujeita a qualquer ocupação para garantir a sobrevivência, mesmo que seus direitos sociais não sejam atendidos. No entanto, surgiram outras formas de organização do trabalho como alternativa de geração de renda.

A economia solidária é uma dessas formas, firmando-se como um instrumento de inclusão social. É um jeito diferente de produzir, comprar, vender e trocar o que é necessário para viver, sem que haja vantagem para um ou outro lado da negociação. As atividades da economia solidária se opõem à exploração do trabalho baseado no desenvolvimento sustentável, ou seja, o crescimento econômico em harmonia com a proteção da natureza.

Segundo uma pesquisa feita pela associação Compromisso Empresarial para Reciclagem (CEMPRE), apesar da importância que tem para o processo de reciclagem, a coleta seletiva só existe em 443 cidades brasileiras (8% do total). Atualmente há várias cidades brasileiras com programas de coleta seletiva implementados, estas coletas seletivas municipais seguem basicamente dos sistemas operacionais: sistema porta-a-porta e sistema entrega voluntária.

Em Belém, o gerenciamento da limpeza urbana é caracteristicamente Municipal, gerido por meio da Secretaria de Saneamento do Município de Belém- SESAN, através de seu Departamento de Resíduos Sólidos – DRES que é responsável pela operacionalização das atividades relacionadas à coleta e destinação do lixo. Cabe ressaltar, que conforme previsto no PNRS, essas atividades deveriam ser tratadas de modo integrado e constituir parte de um Plano Diretor de Saneamento e Meio Ambiente do Município de Belém.

A partir da pesquisa realizada junto ao DRS, detectou a inexistência de uma efetiva gestão de resíduos sólidos e a ausência de apoio e o fomento a criação de cooperativas voltadas para atividade de coleta seletiva. Atualmente, o único projeto voltado para coleta seletiva visa à educação ambiental para orientação de morados e posterior efetiva implantação da coleta seletiva.

Focando no objetivo da investigação, após a pesquisa de campo realizada identificou-se que, quanto a trajetória da qualidade de vida dos trabalhadores associados das duas cooperativas, ocorreu uma melhoria, pois com o desenvolvimento do trabalho coletivo nas cooperativas, muitos catadores que viviam desenvolviam suas atividades no lixão do Aurá obtiveram uma redução significativa da exposição da vida, considerando o ambiente hostil.

Cabe ressaltar que apesar da redução relativa da precarização das condições de trabalho se comparado com antes da entrada nas cooperativas, ainda está longe da perspectiva almejada pelas cooperativas, isto se deve a falta de apoio e cumprimento da legislação referente à atividade de coleta seletiva por parte da gestão pública municipal de Belém.

Em relação a  busca pela conquista da autonomia administrativa e operacional das cooperativas em relação à gestão pública em todos os níveis, ressalta-se que devido a inobservância e inexistência de políticas públicas e uma efetiva gestão de resíduos sólidos em Belém, as cooperativas estudadas tem a total autonomia sobre as ações e deliberações de suas atividades, contudo em especial a COOTPA, considerando ter sido constituída por intermédio do poder público municipal, ainda encontra-se em estágio em que se faz necessário a intervenção do Governo.

Um ponto a destacar a fator da CONCAVES é a presença de conhecimento e instrução por parte de seus cooperados, que conhecem a legislação que rege o cooperativismo no Brasil, em especial no Estado do Pará, e sobre o status das ações referente à coleta seletiva de resíduos sólidos em âmbito nacional, e assuntos ligados ao processo logístico, como logística reversa e a importância da manutenção de parcerias com empresas, o que os coloca em vantagem comparativa em relação a COOTPA.

Cabe ressaltar ainda a presença da CONCAVES nas redes sociais, tendo página própria, blog, a saber, < http://concaves.blogspot.com.br/ > e perfil no facebook o que aumenta sua visibilidade e ajuda na obtenção de parceiros.

REFERÊNCIAS

ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. Disponível em: <http://www.abnt.org.br> Acesso em: 15 de abril de 2010.

ADRIANO, P. L. Educar para a autogestão: uma nova metodologia e seus desafios. In: RI, N. M. D. Trabalho associado, economia solidária e mudança social na América Latina. Marília: Cultura acadêmica , 2010. 276p.

ALVES, Giovanni. Trabalho e subjetividade. São Paulo: Boitempo, 2011. 168p.

ALVES, Giovanni. O novo (e precário) mundo do trabalho: reestruturação produtiva e crise do sindicalismo. 1ª. ed. – São Paulo: Boitempo Editorial, 2000.

ANTUNES, R. Adeus ao trabalho?: ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. São Paulo: Cortez; Campinas: Editora da Universidade de Campinas, 2000.

BOAVENTURA, Edivaldo M. Metodologia da pesquisa: monografia, dissertação, tese. São Paulo: Atlas, 2004.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1>. Acesso em: 28 mar. 2009.

BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Evolução do cooperativismo no Brasil: DENACOOP em ação. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Brasília: MAPA, 2006.

BRASIL, M. S. A produção social das utopias: uma análise a partir da economia solidária / Manuela Salau Brasil. – Curitiba, 2011. 282 f.

CORAGGIO, J. L. (2000), “Da economia dos setores populares á economia do trabalho”, in Gabriel Kraychete, Francisco Lara e Beatriz Costa (orgs). Economia dos setores populares: entre a realidade e a utopia. Petrópolis, Rio de Janeiro, Vozes.

CNPQ. Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil. Identificação COOTPA. Disponível em: <http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/detalheempresa. jsp?id=0044605TBNQ68D&cnpj=05273609000158&codInst=J5IN00000005>. Acesso em 25 maio 2012.

DAL RI, N. M .Trabalho associado, economia solidária e mudança social na América Latina. Marília: Cultura acadêmica , 2010.

EID, F.; PIMENTEL, A. E. B.; SEVERINO, M. R.; CHIARIELLO, C. L. Cadeias produtivas em assentamentos de reforma agrária. In: DAL RI, N. M, (organizadora).Trabalho associado, economia solidária e mudança social na América Latina. Marília: Cultura acadêmica , 2010. 276p.

EID, F.; LAFORGA, G.; LIMA, A. M. Implantação da coleta seletiva: um estudo de caso no município de Tangará da Serra-MT. 2010.

FRANÇA FILHO, G. C. Terceiro setor, economia social, economia solidária e economia popular: traçando fronteiras conceituais. Bahia Análise & Dados. Salvador: v.12, n.1, p.9-19, jun/ 2002.

GAIGER, L. I. A economia solidária diante do modo de produção capitalista.

GIL, Antonio Carlos, 1946 – Como elaborar projetos de pesquisa. 4ª Ed. – 10 reimpr. -São Paulo: Atlas, 2007.

IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Relatório ambiental da região metropolitana de Belém. Belém, 1997.

LAVILLE, Jean-Louis. Economía social y solidaria: una visión europea. Buenos Aires: Altamira, 2004.

LEITE, M. P. A economia solidária e o trabalho associativo: teorias e realidades. Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol. 24, n. 69, p. 31-51, fev.2009.

LIMA, A. M. Análise da transição do trabalho individual para o trabalho coletivo dos associados da COOPERTAN de Tangará da Serra-MT. 2010. 154 f. Dissertação de Mestrado apresentada ao programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção do Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia. São Carlos. 2010.

MARX, K. O capital: crítica da economia política. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

________. Manuscritos econômico-filosóficos. São Paulo: Martin Claret, 2002.

MIRANDA; N. C. A. Economia Solidária no Estado do Pará: tramas e desafios. 2009. 144 f. Trabalho de Conclusão de curso (Mestrado em Serviço Social). Instituto de Ciências Sociais Aplicadas. Belém, 2009.

MIRANDA; N. C. A. et al. Economia solidária na Amazônia: experiências nas áreas urbana e rural no Estado do Pará. In 19ª Conferência Mundial de Serviço Social. Salvador: Centro de Convenções, agosto, 2008.

OWEN, R. O livro do novo mundo moral. In: TEIXEIRA, A. Utópicos, heréticos e malditos: os precursores do pensamento social de nossa época. Rio de Janeiro: Record, 2002.

Secretaria Municipal de Saneamento. Serviços. Disponível em http://www.belem.pa.gov.br/app/c2ms/v/?id=11&conteudo=2735. Acessado em 28 de novembro de 2012.

_____________________________. Revisão do Plano Diretor do Município de Belém. Disponível em: http://www.belem.pa.gov.br/planodiretor/. Acessado em 28 de novembro de 2012.

SINGER, P. A recente ressurreição da economia solidária no Brasil. In: SANTOS, B. Produzir para viver: os caminhos da produção não capitalista. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.

________. I. A economia solidária no governo federal. Mercado de Trabalho, v. 24, p. 3, ago, 2004.

________. I. É possível levar o desenvolvimento a comunidades pobres? Texto para discussão. Brasília: SENAES, 2004.

TEIXEIRA, A. Utópicos, heréticos e malditos: os precursores do pensamento social de nossa época. Rio de Janeiro: Record, 2002.

WEBER, M. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Martin Claret, 2003.

APÊNDICE – NOTA DE RODAPÉ

5. Dados SENAES/MTE, conforme Atlas da Economia Solidária do Brasil.

6. Secretaria de Estado de Trabalho, Emprego e Renda (Seter) / Diretoria de Economia Solidária (Decosol).

7. A RPP, criada em 07.06.2011, possibilita a integração de várias cooperativas e associações de catadores, antes da rede elas estavam dispersas e cada uma tentava isoladamente garantir espaço dentro do mercado da reciclagem e das políticas públicas do setor. A RPP passa a aglutinar as seguintes cooperativas e associações: COOTPA, COOCAPE, COOPROREM, CONCLIMA, CIDADANIA PARA TODOS, ASSOCIAÇÃO DE CURUÇÁ, COOPERATIVA DE CASTANHAL, ARAL, ASSOCIAÇÃO DOS CATADORES DE BELÉM, COOMARCA, ASSOCIAÇÃO DOS CATADORES DE BENEVIDES, ASSOCIAÇÃO DOS CATADORES DO MARAJÓ, COOPERATIVA DE ABAETETUBA, ASCAMARE e PROJETO AÇÃO E CIDADANIA.

8. Associação de Catadores da Coleta Seletiva de Belém (ACCSB), atuante em Belém desde 2002, responsável pelo recolhimento de materiais recicláveis separados por moradores e estabelecimentos comerciais nos bairros do Umarizal, Nazaré e parte do Reduto. A associação executa o projeto Coleta Seletiva de Porta em Porta

9. O projeto Cataforte – Fortalecimento do Associativismo e Cooperativismo dos Catadores de Materiais Recicláveis tem contribuído para a transformação da vida de milhares de catadores em todo o Brasil. O Cataforte é fruto da parceria entre a Fundação do Banco do Brasil e a Secretaria Nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego e envolve a capacitação de 10.600 catadores em 17 estados e no Distrito Federal.

10. O Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre) é uma associação sem fins lucrativos dedicada à promoção da reciclagem dentro do conceito de gerenciamento integrado do lixo. Fundado em 1992, o Cempre é mantido por empresas privadas de diversos setores. O Cempre trabalha para conscientizar a sociedade sobre a importância da redução, reutilização e reciclagem de lixo através de publicações, pesquisas técnicas, seminários e bancos de dados. Os programas de conscientização são dirigidos principalmente para formadores de opinião, tais como prefeitos, diretores de empresas, acadêmicos e organizações não-governamentais (ONG’s).

[1] Graduado em Administração pela Faculdade de Belém- Fabel.

[2] Mestre em Ciência da Educação pela Universidad de Asuncion- UAA . Especialista em Gestão de Recursos Humanos pela Faculdade Faci. Graduado em Administração Comércio Exterior pelo Centro Universitário do Pará- CESUPA.

[3] Especialista em Administração Financeira e Análise de Investimentos pela Fundação Getúlio Vargas- FGV. Graduado em ciências contábeis pela Universidade Federal do Pará – UFPA.

[4] Mestre em Economia pela Universidade Federal do Pará – UFPA. Especialista em Auditoria e Controladoria pela Faculdade Faci. Graduada em Administração Comércio Exterior pelo Centro Universitário do Pará- CESUPA.

5/5 - (4 votes)
Diego Ventura Magalhães

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

POXA QUE TRISTE!😥

Este Artigo ainda não possui registro DOI, sem ele não podemos calcular as Citações!

SOLICITAR REGISTRO
Pesquisar por categoria…
Este anúncio ajuda a manter a Educação gratuita