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Prática transfusional de sangue: História, desafios e principais exames de triagem nos serviços de hemoterapia

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CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

FERREIRA, Rafael André [1], VELLOSO, Ricardo Viana [2]

FERREIRA, Rafael André. VELLOSO, Ricardo Viana. Prática transfusional de sangue: História, desafios e principais exames de triagem nos serviços de hemoterapia. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 03, Vol. 04, pp. 181-194. Março de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/pratica-transfusional

RESUMO

Este artigo tem por objetivo abordar a prática transfusional no Brasil, a qual evoluiu muito no que diz respeito à vigilância e à normatização de procedimentos para que as bolsas de sangue sejam disponibilizadas para doação. É notório que o perfil da doação de sangue no Brasil segue o padrão dos países em desenvolvimento, onde há muita procura pelo material e pouca disponibilidade deste. Desta forma, faz-se indispensável promover políticas públicas para maior disseminação da cultura transfusional. A história dos bancos de sangue no Brasil, a prática de doação voluntária e a abordagem dos principais exames que são realizados no processo de triagem sanguínea compreendem tópicos de elevada importância. Ante os desafios enfrentados nessa seara, tais informações devem se fazer acessíveis, uma vez que os conhecimentos nessa seara podem promover a consciência quanto à importância da doação de sangue, tanto da parte dos agentes dos serviços de hemoterapia como um todo, quanto da parte dos demais cidadãos em nossa sociedade, os quais podem ser ora doadores de sangue, ora beneficiários da doação. A tomada de consciência sobre o tema pode contribuir também para o estabelecimento de um olhar crítico acerca do processo de triagem que, por sua vez, garantirá qualidade do produto final e segurança tanto para o doador quanto para o indivíduo que receberá a doação. Para tanto, este artigo vale-se da revisão de literatura, que inclui autores e publicações de referência na área.

Palavras-chave: Banco de sangue, exames de triagem, hemoterapia.

INTRODUÇÃO

Os procedimentos que envolvem o ato da transfusão de sangue no Brasil têm evoluído muito nos últimos anos, porém a passos lentos, quando comparados com outros países do mundo. De modo geral, a prática transfusional começou a contar com investimentos científicos a partir de 1900, sendo que no nosso país a primeira transfusão sanguínea ocorreu em Salvador (Bahia), realizada pelo professor Garcez Fróes, que lecionava no curso de clínica médica. Por meio de um aparelho improvisado, o médico conseguiu transfundir um volume equivalente a 129 ml de sangue de um funcionário do hospital onde trabalhava, para uma paciente operada de pólipo (MACIEL, 1937).

Logo após, novos equipamentos de apoio à transfusão foram elaborados e adotados para as práticas pertinentes.  Com a descoberta dos grupos sanguíneos foi possível o desenvolvimento de vários serviços especializados. Em 1933 foi estabelecido o Serviço de Transfusão de Sangue (STS) que proporcionou a abertura de várias filiais pelo país, o que significou mais que a expansão dos serviços, uma vez que redimensionou a percepção das comunidades quanto à relevância do tema (ROSENBLIT, 2002).

Vários artigos de cunho científico foram publicados durante este período do advento da expansão mencionada. Todavia, é de se registrar que, por muitos anos os doadores recebiam honorários pelo sangue que ofereciam. Os doadores selecionados recebiam em torno de 500 réis à época, sendo que aqueles que eram imunizados poderiam receber até o dobro do valor oferecido (CHOU & FASANO, 2016). Ainda segundo Chou & Fasano (2016) o desconhecimento da população sobre o ato de doação de sangue favoreceu a instalação do comércio e o lucro, além da proliferação de doenças transmissíveis pelo sangue e o baixo rendimento transfusional. A ética nos Bancos de Sangue era questionável, pois a indústria de hemoderivados não primava pela saúde dos doadores, além de estimular doadores sem condições adequadas fisicamente e nutricionalmente, o que afirmava uma relação mercantil com a prática de doação de sangue, diferentemente da doação voluntária, como se verá adiante.

Com o desenvolvimento acentuado da biotecnologia nos últimos anos, os testes sorológicos utilizados em bancos de sangue do país foram redesenhados, apresentando uma alta sensibilidade e qualidade. Entretanto, existem poucos estudos na literatura brasileira sobre os bancos de sangue (ROSENBLIT, 2002), o que sugere a relevância e necessidade de mais estudos sobre esse objeto.

Nesse contexto, o objetivo deste trabalho é desenvolver uma abordagem sobre a história dos bancos de sangue no Brasil, bem como dos principais exames que são realizados no processo de triagem sanguínea, considerando as principais técnicas empregadas nos exames de triagem. Para a elaboração do presente estudo foi realizada revisão de literatura para a qual nos valemos de autores e publicações de referência na área.

1. DIACRONIA DOS BANCOS DE SANGUE NO BRASIL

Desde seus primórdios, nos idos de 1818, a doação de sangue foi utilizada para salvar vidas, sendo toda atividade de hemoterapia reconhecida como especialidade médica. No Brasil, mais especificamente, o registro que se tem do início da hemoterapia data de 1930. Os primeiros serviços de transfusão deram-se no âmbito dos hospitais, de forma ainda rudimentar e as transfusões se realizavam de braço a braço, por não se dispor ainda de recursos de anti-coagulação Em 07 de dezembro de 1942, foi inaugurado o primeiro banco de sangue que tinha sede no Instituto Fernandes Figueira, no estado do Rio de Janeiro. Em primeiro plano este banco de sangue iria atender às necessidades do hospital e prestar assistência aos feridos em confrontos de guerra. Todo este trabalho foi financiado pelo empresário Francis Hime.  Em 1944 o presidente Getúlio Vargas sancionou um projeto que estabelecia a abertura de um banco de sangue no Distrito Federal, que ficou conhecido como Banco de Sangue da Lapa (ROSENBLIT, 2002).

Muitos eventos marcantes aconteceram na década de 40, entre eles o primeiro curso de pós-graduação em Hematologia, ministrado pelo Walter Oswaldo Cruz na cidade de Maguinhos, e o Primeiro Congresso paulista de Hematologia, ministrado por Carlos da Silva Lacaz, que conciliou as atividades de hematologia e hemoterapia (JUNQUEIRA, 2002).

Na década de 50 foi eleita a Sociedade Brasileira de Hematologia e Hemoterapia (SBHH) que visava à consolidação das duas especialidades. Em 1950 foi promulgada a lei n° 1075, de 27 de março de 1950 que prescreve o caráter voluntário da doação de sangue, sendo também criada a Associação voluntária de Doadores de Sangue do Brasil, que teve como presidente a Sra. Nair Aranha.  Em 1956 o prefeito do Distrito Federal transformou o Banco de Sangue em um Instituto de Hematologia (JUNQUEIRA, 2002).

O Ministério da Saúde criou, em 1964, um grupo de trabalho para estudo e regulação disciplinadora da Hemoterapia no Brasil, que possibilitou a formação da Comissão Nacional de Hemoterapia. Essa Comissão juntamente com o Ministério da Saúde estabeleceu o primado da doação voluntária de sangue e ressaltou a necessidade de medidas de proteção a doadores e receptores, criando princípios para o fornecimento da matéria-prima industrial, fracionamento plasmático e a importação e exportação de hemoderivados.  Nesse contexto, instituiu-se a obrigação de utilização de testes sorológicos, para segurança no ato da transfusão GUERRA, 2005).

Em 1979 foi criado o Programa Nacional de Sangue e Hemoderivados (Pró-Sangue).  Até o ano de 1979, embora o país já tivesse a normatização para a hemoterapia e contasse com uma política rígida de fiscalização, cada vez mais rigorosa, ainda se enfrentavam sérios problemas referentes à má qualidade dos serviços públicos nessa área. Com a promulgação da constituição de 1988, o panorama da hemoterapia no Brasil começou vivenciar um processo de evolução mais expressivo e houve muita mobilização em favor da doação voluntária. Nesse mesmo ano, o Pró-Sangue já estava consolidado e tinha como modelo as normas francesas. Dessa forma, foram criados em todo o país vários hemocentros focados nas diretrizes da doação voluntária não remunerada em oposição ao viés mercantilista, mencionado anteriormente, que caracterizou a primeira fase da prática de doação de sangue na sociedade.  Houve também deliberada concentração de esforços na direção da maior atenção à segurança dos doadores (e receptores).  Neste período a direção do Pró-Sangue passou do Ministério da Saúde para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (SANTOS, 2002).

Em 1980 ocorreu a extinção da doação remunerada no Brasil. Houve uma campanha publicitária de apoio à doação voluntária liderada por Rafael Sampaio, da Associação Paulista de Propaganda, além da contribuição de outras associações da área de saúde do nosso país. A motivação para doação de sangue de modo voluntário teve início com a chamada doação de reposição, que consistia na doação e estoque de sangue por familiares daqueles que necessitavam de transfusão (GUERRA, 2005).

A busca do doador voluntário e habitual deve envolver todo aspecto de segurança e economia. O teste e o reteste em doadores significa oferecer bolsas de sangue com maior margem de segurança para o receptor, aumentando, assim, todo caráter preventivo do ato transfusional (MACIEL, 1937).

A partir da constituição de 1988, foram estabelecidas medidas para facilitar o processo de transfusão de sangue e seus componentes, vedando todo tipo de comercialização. As mudanças do padrão de controle e segurança no que diz respeito à doação de sangue no Brasil ocorreram principalmente com a chegada da AIDS.  Na década de 1980, cerca de 2% dos casos de contaminação pelo vírus HIV era por meio da transfusão de sangue e 50% dos hemofílicos se apresentavam como portadores do vírus HIV (HAMERSCHLAK, 1991).

Nesse cenário, o profissional hemoterapeuta ganhou maior importância e maior participação nas atividades de assistência a pacientes, assumindo o importante papel de orientação a colegas das diversas especialidades médicas. O avanço da genética molecular concebeu o conhecimento das estruturas moleculares e isso possibilitou o avanço do diagnóstico.

A chegada das terapias celulares e a descoberta dos anticorpos monoclonais proporcionaram o desenvolvimento dos centros de transplantes de células tronco-hematopoiéticas (JUNQUEIRA, 1979). Na figura 1 é possível observar uma representação esquemática dos principais acontecimentos relacionados aos bancos de sangue do país nas últimas décadas.

Figura 1: Principais eventos relacionados aos bancos de sangue do país nas últimas décadas.

Fonte: Autores

A referida figura evidencia uma preocupação com as demandas e práticas de transfusão de sangue, que avançaram, gradativamente, na organização dos processos e na sua normatização, a partir de instâncias de gestão e controle dos processos.

Outra preocupação e desafio que se coloca no cenário da hemoterapia é a prática de doação de sangue, inicialmente com um viés mercantil e subsequentemente com caráter voluntário, como se verá a seguir.

2. DOAÇÃO DE SANGUE: IMPORTÂNCIA E DESAFIOS DESSA PRÁTICA

Do ponto de vista clínico, a transfusão de sangue é de suma importância em situações nas quais os pacientes são submetidos a intervenções cirúrgicas, transplantes, procedimentos oncológicos ou são ainda portadores de doenças crônicas graves, como doença falciforme e talassemia, entre outros, em que os componentes do sangue podem fazer a diferença entre viver ou morrer, já que o sangue é insubstituível (DANIELS, 2002).

Nesse sentido, é inconteste a relevância da doação, o que não tem sido suficiente para que as pessoas se disponham sumariamente a se fazerem doadoras, ainda que se deva considerar que toda pessoa é potencialmente passível de receber ou doar sangue (JUNQUEIRA, 2002).

Nesse contexto, a situação que se tem atualmente no Brasil é que aproximadamente 1,8% da população é doadora de sangue, enquanto o índice preconizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) é da ordem de 3% a 5% da população (DANIELS, 2002).

A doação de sangue observa protocolos específicos e parte da consideração de que o doador deve ter entre 16 e 69 anos e pesar mais de 50kg. Há restrição para ser doador que recai sobre pessoas em situação de febre, gripe ou resfriado, diarreia recente, estendendo-se ainda a gestantes mulheres no pós-parto (JUNQUEIRA, 2002).

Observados os protocolos pertinentes, a prática da doação constitui-se em ato simples e sem risco para o doador, que é preservado quanto à sua segurança na coleta de sangue, que prevê a prática por profissionais habilitados e com o uso de material descartável, repelindo qualquer possibilidade de contaminação. É importante lembrar que O processo de doação de sangue possui uma logística rigorosa denominada ‘Ciclo do Sangue’, a qual é dividida em nove etapas: captação do doador, conscientização, cadastro, triagem clínica, triagem hematológica, coleta, triagem laboratorial das amostras, distribuição e procedimentos transfusionais (DANIELS, 2002).

Não obstante a irrefutável relevância da doação de sangue e à segurança que é inerente a essa prática, os números mostram que os doadores estão quantitativamente aquém do que preconiza a OMS, tornando, então relevante, refletir sobre os desafios que se enfrenta nessa seara. Assim, embora as motivações para a doação sejam muito fortes, envolvendo desde o altruísmo inerente ao perfil dos doadores, movidos ora por uma demanda de familiares, ora pela solidariedade para com o próximo, muito se tem ainda a compreender sobre as motivações para a não doação de sangue de forma sistemática. Nesse sentido, um passo especialmente importante para transformar o não-doador em doador seria a concentração de esforços durante a primeira doação e o uso desta oportunidade para a conversão destes em doadores regulares, através da persuasão, do atendimento e das informações prestadas a respeito de todos os procedimentos (MACIEL, 1937).

Ainda na seara das motivações para a doação, é importante disponibilizar informações para esse fim, que não só contribuem para persuadir os potenciais doares, como lhes pode conferir subsídios para tomada de decisão. Nesse sentido, passamos a abordar os exames de triagem a que é submetido o material coletado.

3. EXAMES DE TRIAGEM

Conhecer os exames de triagem, além de ser fundamental para a comunidade de saúde nos níveis federal, estadual e municipal, é de relevância para o cidadão em geral, na medida em que possibilita a ele perceber implicações positivas do ato de doar sangue.

Assim, é importante assinalar que, no ano de 2011, o Ministério da Saúde estabeleceu cadastro obrigatório dos doadores de sangue e elaborou diretrizes para a realização de exames laboratoriais no sangue coletado para prevenção da propagação de doenças. Assim, tornou-se compulsória a realização de exames laboratoriais de alta sensibilidade a cada doação, para detecção de marcadores para as seguintes infecções: sífilis, doença de Chagas, hepatites B e C, HIV e HTLV I e II (MS, 2011), como será possível verificar a seguir.

3.1 TIPAGEM SANGUÍNEA (SISTEMA ABO/Rh)

Os tipos sanguíneos são determinados pela presença, na superfície das hemácias, de antígenos que podem ser de natureza bioquímica variada, podendo ser compostos por carboidratos, lipídeos, proteínas ou a combinação uma mistura desses compostos. Os sistemas ABO e Rh são os mais importantes sistemas de tipagem sanguínea, pois se relaciona com a gravidade das reações transfusionais hemolíticas (FUCHINOUE, et al. 2001; GARRATTY, et al. 2008). A definição do grupo sanguíneo de um indivíduo se dá por algumas provas rotineiras e adicionais, que no caso destas últimas, são realizadas pesquisas para sorotipos raros. Hoje são utilizadas técnicas em tubo, gel centrifugação e PCR (ainda pouco utilizado no Brasil). Além disso, há necessidade de realizar a pesquisa para D fraco e controle, que devem ser feitas quando na classificação do Rh (D) existir ausência de aglutinação (resultado negativo), a fim de detectar o anticorpo fracamente formado contra o antígeno D fraco (ISSIT, 2005)

 3.2 TESTE DE COOMBS

É um exame pertencente a classe de testes de antiglobulina, sendo de dois tipos: o direto (DAT) e o indireto (IAT). Ambos pesquisam a presença ou não de anticorpos (geralmente IgG ou anticorpos do complemento) na hemácia (direto) ou livres no soro (indireto) (BARROS, 2006). Assim, este tipo de teste é muito útil na avaliação da origem de doenças hemolíticas.

3.3 TESTE PARA SÍFILIS

A sífilis é causada por uma bactéria chamada Treponema pallidum, transmitida por contato sexual (sífilis adquirida) ou verticalmente (sífilis congênita) (BAUM E.W. et al., 1983). O T. pallidum promove o desenvolvimento de dois tipos de anticorpos: as reaginas (anticorpos inespecíficos IgM e IgG contra cardiolipina), dando origem aos testes não treponêmicos, e a anticorpos específicos contra o T. pallidum, que originaram os testes treponêmicos (MS, 2005; RYSGAARD C. et al., 2014). Os testes não treponêmicos são úteis para triagem em grupos populacionais e monitorização do tratamento, enquanto os treponêmicos são utilizados para confirmação do diagnóstico. Na rotina de um banco de sangue é realizado inicialmente o teste não treponêmicos para a triagem, o qual é conhecido como VDRL (Venereal Disease Research Laboratory), e utiliza um antígeno constituído de lecitina, colesterol e cardiolipina purificada (SINGH, 1999), tendo maior sensibilidade entre cinco e seis semanas após a infecção. Para todos os exames sorológicos realizados é utilizado o mesmo padrão, e sendo o candidato positivo para o teste de sífilis, é realizado o teste específico denominado FTA-ABS (AZULAY, 2004; LYNN W.A. et al. 2004).

3.4 TESTE PARA HEPATITES B E C

Para as hepatites virais podemos citar os testes sorológicos da Hepatite B (Vírus HBV) e Hepatite C (Vírus HCV), sendo realizada a sorologia da hepatite B por meio de testes HBsAg e Anti-HBc e a sorologia para hepatite C por testes de ELISA ou Imunoblots, visando a detecção de anticorpos reagentes contra proteínas recombinantes ou peptídeos sintéticos do HCV (TREPO C., et al., 2014; TIOLLAIS P., et al., 1985). O teste Anti -HBsAg é um teste para a detecção qualitativa da presença do antígeno no soro ou plasma humano. O teste utiliza anticorpos monoclonais para detectar vários subtipos do HBsAg no soro ou plasma.  No teste Anti-HBc, o anti-HBc é um anticorpo dirigido contra as proteínas do core ou nucleocapsídeo do HBV. A presença de anti-HBc IgM se relaciona com o processo de infecção recente ou aguda pelo HBV. A imunidade IgG para anti-HBc é a mais duradoura. Por isso esse marcador tende ser um bom preditor de contato anterior com o vírus (SACHER et. al., 2000; SCHADLER S., et al., 2009). O teste Anti- HCV positivo, apenas indica o contato com o vírus HCV, por isso não é um bom marcador de imunidade. Atualmente já se encontram disponíveis os testes de Enzyme Linked Immuno Sorbent Assay (ELISA) de 1a, 2a e 3a geração. Esse último é capas de identificar as regiões não estruturais NS3, NS4 e NS5 e do core (MS, 2005; DANDRI, et al. 2008).

3.5 TESTE PARA DOENÇA DE CHAGAS

Por ser uma doença crônica que produz alterações cardíacas e gastrointestinais, podendo ser transmitida por contato com sangue contaminado, é de suma importância que o sague a ser transfundido seja isento de contaminação com o protozoário causador desta doneça, que é Trypanosoma cruzi (CAMARGO, 1979; MILLS, 2005; COURA, et al., 2012). Atualmente há quatro testes para triagem em relação à doença de Chagas: hemaglutinação indireta (HAI); imunofluorescência indireta (IFI); teste imunoenzimático (ELISA) e aglutinação direta com 2 mercapto-etanol (AD2ME), sendo que o teste mais utilizado é o imunoenzimático de alta Sensibilidade (ELISA) como prioritário (VIOTTI, et al., 2011; FERREIRA, 1992).

3.6 TESTE PARA O VÍRUS T-LINFOTRÓPICO HUMANO (HTLV)

Em 1993, tornou-se obrigatória no Brasil a triagem para o HTLV em bancos de sangue em virtude da grande taxa de transmissão do vírus durante hemotransfusões, que resultou em uma diminuição significativa na janela de infecção por esses retrovírus via transfusão de sangue (MARTIN, et al., 2014; CHANG, et al., 2014). Existem dois tipos de HTLV, sendo o tipo 1 associado, principalmente, a doenças neurológicas e hematológicas, enquanto que o tipo 2 não está comprovadamente associado a nenhuma doença humana, embora apresente tropismo por linfócitos T CD8. O diagnóstico é feito somente por sorologia, sendo específico para pesquisa de anticorpos anti-HTLV-1/2. O teste mais utilizado é o ELISA e, em caso de positividade, deverá haver repetição do exame pelas técnicas de Western blot ou PCR a fim de confirmar a infecção (CATERINO‐DE‐ARAUJO, et al., 2010; NORRGREN, et al., 1995).

3.7 TESTE PARA O VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA (HIV)

A pesquisa de anticorpos anti-HIV é usada para triagem e diagnóstico da infecção pelo HIV. Anticorpos anti-HIV em geral são detectados por ELISA, que é um método muito sensível, sendo necessário confirmar por outro método, em caso de positividade, como o Western Blot, por exemplo (PEÇANHA, 2002; LAZZAROTTO, 2010). O algoritmo de testes para gestantes e crianças com menos de 18 meses é um pouco diferente.  De acordo com a portaria 151 do Ministério da Saúde a triagem para HIV deverá realizada por um teste capaz de detectar anticorpos anti-HIV-1, incluindo o grupo O e anticorpos anti-HIV-2. Poderão ainda ser utilizados, também, testes que combinem a detecção simultânea desses anticorpos e de antígeno. É permitido o uso de ensaio imunoenzimático (ELISA), ensaio imunoenzimático de micropartículas (MEIA), ensaio imunológico com revelação quimioluminescente (EQL), imunológico fluorescente ligado a enzima (ELFA), ensaio imunológico quimioluminescente magnético (CMIA), e testes rápidos como imunocromatografia, aglutinação de partículas em látex ou imunoconcentração. A amostra reagente na triagem deve ser submetida fluxogramas específicos para cada situação (MS, 2004; FARAONI, et al., 2013; SMALLWOOD, et al., 2016).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A transfusão de sangue, que é o ato de receber o sangue ou produtos sanguíneos por via intravenosa, é indicada em várias situações que visam suprir a falta de algum dos componentes sanguíneos. Apesar dos diversos avanços que ocorreram na área da hemoterapia, ainda há certas limitações, como o fato de não haver substitutos disponíveis para o transporte de oxigênio, que é o objetivo típico de uma transfusão de glóbulos vermelhos do sangue, por exemplo. Mesmo com estas limitações quanto ao uso dos hemocomponentes, os diversos serviços de hemoterapia que existem no Brasil, contam com um controle rigoroso de qualidade, visando à preservação, tanto do doador, quanto do indivíduo a ser transfundido, fato que torna essa prática, atualmente, extremamente segura.  É importante aprimorar o mecanismo de divulgação e conscientização da importância de manter estes centros de hemoterapia sempre bem abastecidos, para que todas a demandas possam ser supridas.  Isso implica políticas públicas de estímulo à doação, bem como a difusão de informações que favoreçam as tomadas de decisão dos potenciais doadores, de modo que se instaure uma cultura não só de expressão da sensibilidade para com o tema, nem apenas de solidariedade para com o próximo, mas fundamentalmente que seja consolidada e sedimentada uma cultura de doação com ato de cidadania.

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[1] Doutorando em Bioquímica e Imunologia, Mestre em Bioquímica e Imunologia, Especialista em Hematologia e Imuno-hematologia, Especialista em Biomedicina Estética, Graduado em Biomedicina, Graduado em Formação Pedagógica para Graduados Não Licenciados – Biologia.

[2] Doutor em Educação, Mestre em Educação. Especialista em Ensino de Língua Portuguesa. Especialista em Direito Civil. Especialista em Psicopedagogia. Licenciado em Letras. Licenciado em Pedagogia. Bacharel em Direito.

Enviado: Outubro, 2019.

Aprovado: Março, 2020.

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Rafael André Ferreira

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