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Sociologia jurídica: Ferramenta para a construção do ente jurídico humanista

RC: 61503
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/sociologia-juridica

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

MORAIS, Carlos Nascimento de [1], DUARTE, Nayane Gonçalves dos Santos [2]

MORAIS, Carlos Nascimento de. DUARTE, Nayane Gonçalves dos Santos. Sociologia jurídica: Ferramenta para a construção do ente jurídico humanista. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 05, Ed. 10, Vol. 05, pp. 51-66. Outubro de 2020. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/sociologia-juridica, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/sociologia-juridica

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo analisar a necessidade do estudo aprofundado da Sociologia Geral e Sociologia do Direito nas universidades brasileiras. Percebe-se que atualmente não há uma evolução humana, sociológica e científica acerca do assunto em questão. A Sociologia Jurídica ou Sociologia do Direito é uma disciplina propedêutica, normalmente lecionada no primeiro ano dos cursos de direito, juntamente com a Filosofia do Direito. Podemos afirmar também, que estas duas ciências são oriundas, ou filhas, da Filosofia, ciência mãe de todas as outras ciências, nomeadas de Exatas, Humanas e Biológicas. O objetivo deste estudo é analisar as legislações brasileira sobre os cursos superiores de direito. Os objetivos específicos são: entender como é negligenciado por parte dos acadêmicos e professores, o estudo da Sociologia do Direito e Filosofia do Direito nas graduações. Não generalizando, mas através de pesquisa bibliográfica, empírica, pode-se constatar uma tendência ao abandono dessas ciências, seja por preconceito, ou por interesses mais objetivos, como exames da Ordem dos Advogados do Brasil, ou outras provas. Para atingir estes objetivos, optamos por realizar pesquisa de caráter bibliográfico, com referencial teórico.

Palavras-Chave: Sociologia do Direito, Pensamento Crítico, Humanismo, Universidades, Ensino.

1. INTRODUÇÃO

O curso de direito é um dos mais desejados atualmente por aqueles que querem cursar uma graduação. É o curso mais ofertado em todo o Brasil, com mais de 1500 faculdades distribuídas em todo o território, conforme fontes da Folha de São Paulo. Desde o começo de 2018 até 10 de abril do corrente ano, foram criadas 52 mil novas vagas no referido curso.

Indaga-se qual a motivação de tantos cursos espalhados pelo país. Questiona-se o porquê de tanta procura. Será que é o sonho dos jovens de ingressar na carreira pública? Será que todos os acadêmicos são vocacionados à profissão jurídica? Ou será apenas um meio de buscar estabilidade econômica através de concursos públicos?

Em suma, esses questionamentos são complexos e por vezes sem respostas, já que é no altero de cada um que se encontram as respostas. Dito isso, somente uma pesquisa empírica poderia responder essa complexidade.

Contudo, a única certeza que arriscamos a esclarecer, é que nem todas as faculdades de direito estão aptas a fornecer um conhecimento jurídico apropriado para o desenvolvimento do aluno. Bem como, os discentes também não estão preparados a receber tais ensinamentos, em virtude da falta de maturidade e desenvolvimento psicológico, principalmente nos estudantes da faixa etária de 18 a 30 anos.

A Sociologia Jurídica ou Sociologia do Direito é uma disciplina propedêutica, normalmente lecionada no primeiro ano dos cursos de direito, juntamente com a Filosofia do Direito.

Porém, na ânsia de estudar os compêndios, as legislações e jurisprudências, será que os alunos realmente se importam com a Sociologia Jurídica?

Em princípio, devemos conceituar o Direito. De modo que, diversos autores renomados citam a conceituação do Direito em suas obras, e nessa palavra (direito) pode assumir diferentes significados. Para André Galtieri de Oliveira, em sua obra Filosofia do Direito, a palavra direito pode ser utilizada no sentido de ciência (ciência do direito); sentido de justiça, quando se refere à ordenamento jurídico (direito objetivo) ou quando se diz que alguém possui uma prerrogativa de exercer um direito (direito subjetivo).

Segundo Miguel Reale, (2002, p. 18), o termo “Ubi societas, ibi ius”, traz uma noção clara do que pode ser direito, pois “onde há sociedade, há direito”. É uma exigência da vida em comunidade. O ser humano é um ser social em essência, pois ninguém é autossuficiente para viver isolado. Assim, conforme o autor André Galtieri de Oliveira (2012, p. 28), “O direito é, portanto, um conjunto de regras de conduta. Mais especificamente, o direito é um tipo de norma social, ou seja, normas que regulam o comportamento dentro de uma sociedade”.

Continuando com o autor Miguel Reale (2002, p. 18) diz que: “o Direito corresponde à exigência essencial e indeclinável de uma convivência ordenada, pois nenhuma sociedade poderia subsistir sem um mínimo de ordem, de direção e solidariedade.” Novamente observa-se que, na noção de vida em sociedade, segundo o autor, o direito é um fato ou fenômeno social e só existe na sociedade de forma que, não pode ser concebido fora dela.

O jurista Arnaldo Vasconcelos (2006, p.12) conceitua de forma resumida o direito como “uma ordem normativa”. Acrescenta que “Suas partes se integram na formação de um todo harmônico, com interdependência de funções. Cada norma ocupa posição intersistemática, única para a espécie.”

Com base nessa breve demonstração, vimos a ligação direta entre Direito e Sociologia. Podemos afirmar também, que estas duas ciências são oriundas, ou filhas, da Filosofia, ciência mãe de todas as outras ciências, nomeadas de Exatas, Humanas e Biológicas. Embora a relação e sistemática seja um pouco complexa, é necessário o estudo e leitura da Filosofia e Sociologia.

Assim, o cerne da questão é: Por que há tanto desinteresse em estudos filosóficos e sociológicos? Sabemos que o estudo das ciências humanas, além de tornar o sujeito mais erudito, também transforma o “eu” interior. O verdadeiro conhecimento não é somente aquele adquirido de forma cognitiva, racional, mas também aquele trazido para o interior de sua consciência, no campo das emoções, dos sentimentos. Em outras palavras, o conhecimento transforma o mundo, o indivíduo, e o meio no qual ele vive.

Será que a pressa cotidiana, a sede de conhecimentos técnicos, a modernidade, o individualismo, a clausura dentro de si, seriam fatores que desmotivam e desinteressam não somente os alunos de direito, mas todos o os indivíduos a negligenciarem os estudos em filosofia e sociologia? Ou seria o contrário? A falta de conhecimentos filosóficos e sociológicos, seria a causa da maioria das mazelas da humanidade, como frieza sentimental, falta de tolerância, empatia, resiliência?

De fato, a mecanização dos cursos de direito, transformam as pessoas desse ramo em robôs, de modo que, os mesmos fazem petições, sentenças, recursos, cobranças de honorários dentro outros sem a observação do sentido de justiça, equidade e solidariedade? A pressa em estudar matérias que caem nos exames da Ordem dos Advogados do Brasil e concursos, fazem com que deixemos de lado os princípios de solidariedade, compromisso com a Justiça e com o sentimento humanista? Em artigo publicado em periódico Miguel Reale Júnior (2014, p. 95) afirma:

Se no passado, até 1970, havia uma deficiência no ensino do direito, métodos meramente expositivos, análise circunscrita à interpretação dogmática, professores com pouca produção científica muitos apenas profissionais do direito, promotores, magistrados, advogados, alheios à carreira docente, exceção feita às faculdades oficiais, mas que contavam também com lentes envolvidos em muitas atividades, o problema atualmente é outro e mais grave. De quarenta anos para cá, a cada passo o curso de direito transformou-se em ensino de massa, com alunos e professores despreparados, transformando-se as escolas de direito em meras fontes arrecadadoras, voltadas antes ao lucro que à promoção de estudo aprofundado para a criação de formandos de qualidade.

O objetivo deste estudo é demonstrar a importância fundamental, primordial do estudo da Sociologia Geral e Sociologia do Direito para a formação não somente de operadores do direito, na forma estrita do termo, mas também na formação de autênticos juristas, humanos, que não buscam apenas a estabilidade econômica que o curso de direito pode proporcionar, mas que acima de tudo, busquem o crescimento individual e coletivo, intelectual e espiritual.

Ainda acrescenta o renomado jurista quanto aos cursos de direito (2014, p. 95):

Pode-se dizer que, se os cursos jurídicos jamais corresponderam a uma exigência de excelência, se sempre houve “crise” no ensino jurídico, todavia, agora há um processo de degenerescência que vem se prolongando há três décadas. Só o rigor na avaliação dos cursos, somado às medidas acima preconizadas e também às propostas pela Abedi, pode minimizar os males presentes.

Tem-se, portanto, como objetivo geral deste estudo, analisar as legislações brasileira sobre os cursos superiores de direito. Já os objetivos específicos são: entender como é negligenciado por parte dos acadêmicos e professores, o estudo da Sociologia do Direito e Filosofia do Direito nas graduações. Para atingir esses objetivos, optamos por realizar pesquisa de caráter bibliográfico.

Assim, este trabalho foi estruturado em dois capítulos. No primeiro capítulo, apresentaremos o conceito de Sociologia Geral e Sociologia do Direito, como ocorre o ensino no Brasil e no mundo.

No segundo capítulo, analisaremos os reflexos e prejuízos que a falta deste estudo pode ocasionar em uma sociedade, principalmente nos acadêmicos de direito.

2. CONCEITO DE SOCIOLOGIA GERAL E JURÍDICA

Antes de adentrarmos ao tema principal, recomendemos o conceito de Sociologia. O termo vem do latim socius (associação) e a palavra grega logos (razão, estudo). Simplificadamente, pode ser o estudo das associações humanas. Deve-se compreender que “associações humanas” ou “coletividades” são todos os tipos de “sociedades”, “grupos sociais”, “tribos”, “comunidades”, “empresas”, “famílias”, ou qualquer outra estrutura social. Isso se dá pelo fato de o homem ser um animal gregário.

A Sociologia é um saber científico, pois as explicações para o mundo sociais são racionais, conceituais, teóricas e sistemáticas. É um tipo de saber que se diferencia daqueles produzidos pelo senso comum e pelo pensamento religioso.

De acordo com Zygmunt Bauman (2010, p.11):

A sociologia engloba um conjunto disciplinado de práticas, mas também representa considerável corpo de conhecimento acumulado ao longo da história. Percorrer com o olhar a seção de sociologia das bibliotecas revela um conjunto de livros que representa essa área de conhecimento como uma tradição de publicação. Essas obras fornecem considerável volume de informação para novatos na área, queiram eles se tornarem sociólogos ou apenas ampliar seu conhecimento a respeito do mundo em que vivem.

Para este respeitável sociólogo, a sociologia além de ciência, também pode ser entendida como forma de consciência. E esta consciência nos ajuda a pensar melhor o mundo em que vivemos. Acrescenta ainda que: “A sociologia nesse sentido, é um espaço de atividade contínua que compara o aprendizado com novas experiências e amplia o conhecimento, mudando, nesse processo, a forma e o conteúdo da própria disciplina” (BAUMAN 2010, p.12). Ele está querendo dizer que a sociologia está em constante mutação, evolução, pois o comportamento social também muda com o passar do tempo. E o conhecimento teórico adquirido, combinado com novos fatos sociais e engrandece o saber sociológico. Sendo também, um “diálogo com a experiência humana”. Ele distingue os termos Erfahrungen (experiências) e Erlebnisse (vivências), palavras tiradas do alemão, e que em muitas línguas esses termos se misturam, dando quase um mesmo significado. “Erfahrung é o que acontece comigo ao interagir com o mundo; Erlebnis é ‘o que eu vivencio’ no curso desse encontro – o produto conjunto de minha percepção do(s) acontecimento(s) e meu esforço de absorvê-lo e torná-lo inteligível” (BAUMAN, 2015, p.18).

Ele ainda difere o pensar sociologicamente com o “senso comum”. Diferentemente das ciências físicas e biológicas, que não se preocupam em relacionar seu saber com o senso comum, “a relação com o senso comum é, na sociologia, conformada por questões importantes para sua permanência e sua prática” (BAUMAN 2010, p.17).

Continuando o entendimento de Bauman (2010, p.17) acrescenta que, a maioria das ciências possuem uma fronteira que se diferenciam umas das outras, o que não ocorre com a sociologia e o senso comum. Este conhecimento, ainda que seja rico, possui a qualidade de desordenado e não sistemático. As ciências exatas não se misturam com o senso comum, em virtude de seu conhecimento não lidar com experiências cotidianas. Na visão de Bauman (2010, p.21), as pessoas comuns não possuem tanto interesse nas ciências, e nem irão opinar a respeito de assuntos aos quais não conhece, ao contrário do que ocorre com a sociologia, onde conceitos não científicos, recheados de opinião própria, permeiam o senso comum.

Em primeiro lugar, a sociologia, à diferença do senso comum, empenha-se em se subordinar às regras rigorosas do discurso responsável. Trata-se de atributo da ciência para se distinguir de outras formas de conhecimento, sabidamente mais flexíveis e menos vigilantes em termos de autocontrole. Espera-se dos sociólogos, em sua prática, um grande cuidado para distinguir – de maneira clara e visível – afirmações corroboradas por evidências verificáveis e aquelas que reivindicam seu status a partir de meras ideias provisórias e não testadas. As regras de responsabilidade discursiva exigem que a “oficina” – o conjunto de procedimentos que conduz às conclusões finais e que, afirma-se, garantiria sua credibilidade – esteja sempre aberta para fiscalização.

Como dito anteriormente, a Sociologia é derivada da Filosofia, sendo que ambas se preocupam nas suas análises com o mundo humano. Era tarefa exclusiva da Filosofia estudar a racionalidade da vida humana até o fim do século XIX, quando surgiu na Europa os primeiros cientistas sociais.

Para o professor Reinaldo Dias (2005, p.05) conceitua a sociologia como “o estudo científico da sociedade e sua influência sobre o comportamento humano”. A sociologia é o estudo coletivo do ser humano, enquanto a psicologia é o estudo do indivíduo singular. Essa comparação foi feita por Émile Durkheim, na introdução de sua obra O Suicídio (2000), de forma muito objetiva e clara. Embora ele tenha se referido ao estudo específico da sociologia, tal comparação pode-se estender de forma ampla.

O professor Agérson Tabosa cita vários conceitos científicos de sociologia, de autores clássicos, sendo os de Auguste Comte e Émilie Durkheim os mais notáveis. Para Comte (2000, p.29) “Sociologia é o estudo positivo do conjunto das leis fundamentais relativas aos fenômenos sociais”. Já Durkheim (2000, p.31) conceitua sociologia como “a ciência das instituições, de sua gênese e evolução”.

Ora, mesmo com a citação de vários conceitos, a sociologia tem um objeto de estudo chamado de Fato Social, que Durkheim (2007, p.10) define como “poder de coerção externa que exerce ou é capaz de exercer sobre os indivíduos”. Ele entende que, fato social é qualquer norma imposta aos indivíduos pela sociedade. Essas normas não necessariamente serão escritas, mas sim, implícitas, com o seu descumprimento ocasionaria sanções.

De acordo com a Professora Ana Lúcia Sabadell (2002, p.45):

Durkheim denomina de fatos sociais as normas vigentes em determinada sociedade indicando dois elementos importantes: Primeiro, que a origem de todas as normas que influenciam o comportamento individual é a sociedade (e não o legislador ou determinados indivíduos). Segundo, que as normas não são simples palavras ou ordens, mas existem objetivamente na sociedade e o sociólogo deve estudá-las como fatos, ou seja, como “coisas”.

De acordo com os professores Cláudio Souto e Solange Souto (2003), evidencia que o objeto da Sociologia é estudar os fatos sociais em si mesmos, que é tudo aquilo externado ativamente, oriundo de uma atividade mental. Ou seja, o ser pensa e age, interligando sua atitude com as ações dos demais indivíduos da sociedade.

3. A CONSTRUÇÃO DO SER

Após as breves explanações superficiais e conceituais sobre a sociologia geral e direito, analisa-se o foco principal do problema na formação dos acadêmicos de direito. A resolução n˚ 5 do Conselho Nacional de Educação, datada em 17 de dezembro de 2018, institui as diretrizes curriculares nacionais do Curso de Graduação em Direito, disciplinando o que deve constar no Projeto Pedagógico do Curso (PPC). Vejamos o que consta no artigo 3º desta norma:

Art. 3º. O curso de graduação o em Direito deverá assegurar, no perfil do graduando, sólida formação geral, humanística, capacidade de análise, domínio de conceitos e da terminologia jurídica, capacidade de argumentação, interpretação e valorização dos fenômenos jurídicos e sociais, além do domínio das formas consensuais de composição de conflitos, aliado a uma postura reflexiva e de visão crítica que fomente a capacidade e a aptidão para a aprendizagem, autônoma e dinâmica, indispensável ao e exercício do Direito, à prestação da justiça e ao desenvolvimento da cidadania. (CNE, 2018, Online)

Observa-se aqui o enfoque na “formação geral” e “formação humanística”, além de “valorização dos fenômenos jurídicos e sociais”. Não há necessidade de uma dissecação mais aprofundada, para compreender claramente que se deve focar nas ciências filosóficas e sociais, como já dito, elas analisam o ser humano, seu comportamento e o meio que vivem.

Ainda no mesmo diploma, especificamente no artigo 5º nota-se:

Art. 5º O curso de graduação em Direito, priorizando a interdisciplinaridade e a articulação de saberes, deverá incluir no PPC, conteúdos e atividades que atendam s seguintes perspectivas formativas: I-Formação geral, que tem por objetivo oferecer ao graduando os elementos fundamentais do Direito, em diálogo com as demais expressões do conhecimento filosófico e humanístico, das ciências sociais e das novas tecnologias da informação, abrangendo estudos que, em atenção ao PPC, envolvam saberes de outras áreas formativas, tais como: Antropologia, Ciência Política, Economia, Ética, Filosofia, História, Psicologia e Sociologia. (CNE, 2018,Online)

Neste artigo, com a expressão “priorizando a interdisciplinaridade e a articulação de saberes” pode concluir que o conhecimento é sistemático, ou seja, uma rede interconectada de conceitos de diversas ciências que formam o todo universal. Disto isso, tira-se a conclusão de

que o “conhecimento filosófico e humanístico” é a pedra alquímica da transmutação do ser. As ciências que são postas como exemplo no inciso I, formam e constroem a personalidade dos estudiosos do direito, ativando o uso do pensamento crítico, do raciocínio, da lógica. Não é arbitrário encontrarmos ali, juntinhas, as palavras “Psicologia” e “Sociologia”.

Conforme Rodrigues e Grubba (2012, p. 236), “conhecer o Direito – ou seja, produzir conhecimentos sobre o objeto Direito – pressupõe um conhecimento interrelacionado ou, em outras palavras, interdisciplinar.” Ora, o Direito não pode ser estudado isoladamente, de igual forma a Sociologia e Filosofia. Diferente das ciências exatas e biológicas, que são estritas e técnicas, as ciências humanas, as quais o Direito se classifica, englobam todo o conjunto sistemático do saber (GRUBBA, 2012, p.236).

Isso porque seria um discurso meramente tautológico se o Direito, como saber, fosse identificado ao seu componente formal, isto é, o Direito como norma. A norma é parte constitutiva do Direito, sem a qual ele não existe, mas este não se restringe a sua limitação formal; é ele também um ente social que se funda na própria práxis humana.

Acrescenta ainda Rodrigues e Grubba (2012, p. 237):

Diante disso, uma pesquisa científica do Direito não pode se limitar à problematização das normas jurídicas, como se elas não emergissem da sociedade e gerassem consequências na sociedade. Se o discurso do Direito é formal, mas igualmente comporta, dentre outros, os elementos social, político, econômico, cultural e ambiental – situados no tempo e no espaço, ou seja, contextualizados – a pesquisa no e do Direito deve dialogar com essas dimensões.

E corroboram com nosso entendimento quando finalizam (GRUBBA, 2012, p.237):

Assim, ainda que uma pesquisa tenha por objeto a problematização de uma norma ou de um código normativo, não pode ela ser considerada científica quando deixar de ter correspondência com o ente social, ou seja, estar empiricamente relacionada com a sociedade. Isso porque, sendo a dimensão normativa do Direito, uma construção humana, uma abstração e um produto social, ela é criada justamente para dar resposta a problemas da sociedade.

No mundo atual, no estágio de globalização avançada, o conhecimento se torna mais fácil de ser acessado, devido à modernização dos meios de comunicação e a tempestade de informações colhidas diariamente, fazendo com que tivéssemos critérios e cuidados ao escolher o que é científico e o que é senso comum, podendo ser verdadeiro ou falso. Por isso deve-se desenvolver o senso crítico, pensamento crítico.

Existe uma tendência a se aceitar e propagar ideias de forma acrítica, sem nenhum tipo de preocupação em se checar as fontes. O professor Dr. Valdemir Guzzo (2015, p.66), em seu artigo afirma que “é necessário que as escolas e universidades se preocupem com determinados aspectos da formação intelectual de seus alunos, especialmente aqueles que se relacionam ao desenvolvimento e fortalecimento do pensamento crítico”. Afirma ainda que o pensamento crítico é uma “ferramenta de defesa intelectual” (2015, p.69).

“Nós, humanos, temos um talento para nos enganar”, escreve Sagan (1996, p. 71), considerando que a avaliação crítica de ideias não parece ser uma instância cognitiva espontânea. De fato, estudos referentes à tomada de decisão em seres humanos, realizados principalmente por psicólogos cognitivos, psicólogos sociais e neurocientistas, apresentam evidências de que, de modo contrário ao que o senso comum supõe, parte considerável das decisões humanas é realizada de forma superficial, não reflexiva, rápida e irracional (ou seja, sem a adequada consideração de razões para dar suporte às conclusões), e que, além disso, as pessoas estão sujeitas a inúmeros vieses cognitivos e falhas perceptuais, mesmo que não se deem conta disso (CHABRIS; SIMONS, 2010; KAHNEMAN, 2012; SHERMER, 2012).

Ora, nada mais claro, como o que vem ocorrendo com o cenário político brasileiro, onde pessoas são iludidas e enganadas por ideias ideológicas, populistas e extremistas, não importando qual posição política (esquerda ou direita). Podemos arriscar, de forma empírica, que as fake news (termo institucionalizado recentemente) existem desde os primórdios da humanidade, onde a classe dominante utilizava (e ainda utiliza) de mentiras para submeter os menos favorecidos ao seu poder. Karl Marx, Friedrich Engels, Jean Jaques Rousseau, Friedrich Nietzsche, Norbert Elias, Michel Foucault, Paulo Freire são apenas alguns nomes, dos diversos ilustres que existiram, que retrataram de forma clara, e as vezes obscura, a dominação dos ricos contra os pobres. Foram todos menosprezados e atacados pela classe burguesa e clero, por tentarem tirar o véu da ignorância que ainda cobre os olhos das massas. Refletir sociologicamente sobre as consequências que a persistência da pobreza e da desigualdade socioeconômica provocavam, e evidentemente incomodaram muitas pessoas que tinham uma vantagem econômica.

Acrescenta Guzzo (2015, p.69) ainda:

Uma educação que priorize o desenvolvimento e fortalecimento de habilidades do pensamento crítico, e incentive o espírito crítico, se apresenta como uma maneira de contrapor algumas de nossas tendências cognitivas ao possibilitar aos estudantes que estes analisem ideias de forma mais racional.

Pensar criticamente significa se proteger contra a coação e a crença irrefletida. Podemos afirmar, sem medo de errar, que um “espírito” esclarecido está livre e imune das amarras do preconceito, da intolerância, da ignorância, da antipatia, sendo, portanto, um ser que caminha para o espírito de fraternidade, humanismo, igualdade. Sabiamente Guzzo (2015, p.70) expõem:

Temos dificuldade em assimilar e avaliar a veracidade da grande quantidade de informação a que estamos expostos diariamente, e boa parte dela é composta por asserções falsas. Em algumas ocasiões, asserções falsas nos são apresentadas deliberadamente, e o objetivo do interlocutor é manipular nossa opinião e crenças. Se não questionarmos as ideias de outras pessoas, nem as nossas próprias, não saberemos quais são as informações mais confiáveis a respeito de qualquer assunto. Nesse contexto, o pensar e o espírito crítico se apresentam não apenas como mecanismos de defesa intelectual que diminuem as chances de sermos enganados, mas também como ferramentas essenciais para compreendermos melhor o mundo e guiarmos o curso de nossas ações de modo mais razoável.

Este papel deve ser fomentado pelas instituições de ensino superior, ao estimular o acadêmico a pensar e refletir, assim, como o objeto deste trabalho é a importância do estudo da sociologia nas faculdades de direito, o acadêmico deve ser estimulado a ler, pensar e refletir. Sendo exposto os ensinamentos em várias correntes doutrinárias, jurisprudenciais e técnicas hermenêuticas, e se, o universitário não estiver disposto a aprender com a mente adaptada, trabalhada, possivelmente não compreenderá certos escritos científicos acadêmicos. Será apenas um “operador do direito” (GUZZO, 2015, p.71).

Considerando que as habilidades do pensamento crítico e o espírito crítico precisam ser fortalecidos nos estudantes, e assumindo que essas características são importantes para a vida de qualquer sujeito em uma sociedade democrática, é necessário que as escolas e universidades empreguem esforços para destacar o pensamento crítico em suas atividades educacionais.

Do mesmo modo, Edgar Morin afirma (2000, p.19) que “não há um estágio superior da razão dominante da emoção, mas um eixo intelecto/afeto e, de certa maneira, a capacidade de emoções é indispensável ao estabelecimento de comportamentos racionais”.

Ora, o escritor Morin (2000, p.19) fala que “Todo conhecimento comporta o risco do erro e da ilusão”. Ele ensina que erro e ilusão não se reconhecem, as pessoas estão certas de que estão certas. É o que vivenciamos atualmente. A educação deve enfrentar essa dupla face do erro e ilusão.

Erro e ilusão parasitam a mente humana desde o aparecimento do Homo sapiens. Quando consideramos o passado, inclusive o recente, sentimos que foi dominado por inúmeros erros e ilusões. Marx e Engels enunciaram justamente em A ideologia alemã que os homens sempre elaboraram falsas concepções de si próprios, do que fazem, do que devem fazer, do mundo onde vivem. Mas nem Marx nem Engels escaparam destes erros (MORIN, 2000, p.20).

Ainda conforme Morin (2000, p.20) é preciso conhecer o conhecimento, pois erros podem ser apreendidos durante o processo.

O conhecimento não é um espelho das coisas ou do mundo externo. Todas as percepções são, ao mesmo tempo, traduções e reconstruções cerebrais com base em estímulos ou sinais captados e codificados pelos sentidos. Daí resultam, sabemos bem, os inúmeros erros de percepção que nos vêm de nosso sentido mais confiável, o da visão. Ao erro de percepção acrescenta-se o erro intelectual. O conhecimento, sob forma de palavra, de ideia, de teoria, é o fruto de uma tradução/reconstrução por meio da linguagem e do pensamento e, por conseguinte, está sujeito ao erro. Este conhecimento, ao mesmo tempo tradução e reconstrução, comporta a interpretação, o que introduz o risco do erro na subjetividade do conhecedor, de sua visão do mundo e de seus princípios de conhecimento. Daí os numerosos erros de concepção e de ideias que sobrevêm a despeito de nossos controles racionais. A projeção de nossos desejos ou de nossos medos e as perturbações mentais trazidas por nossas emoções multiplicam os riscos de erro.

Somente com o pensamento crítico, com o “espírito de desconfiança”, o ser humano pode se imunizar contra inverdades produzidas e disseminadas na sociedade. Com o uso do raciocínio lógico, pode-se proteger a razão das percepções errôneas do cotidiano. E essas percepções errôneas fazem com que nos tornem defensores fiéis de uma “verdade” questionável.  Tornamos nossas opiniões, nosso senso comum em uma verdade científica.

Os cursos de filosofia e sociologia sempre dedicaram ao discentes o desenvolvimento dessa capacidade psíquica, e é salutar que as ciências jurídicas também devam focar nesse sentido.

4. CONCLUSÃO

Podemos concluir que o estudo das ciências humanas (sociologia e filosofia) deve ser fomentado não só na educação superior, mas também no ensino de base das escolas.

O cotidiano da vida moderna, nos apresenta diversos indivíduos enclausurados em suas verdades absolutas, indivíduos intolerantes e insensíveis. Dentre estes, nos deparamos com colegas de universidade, desde a juventude, até profissionais do direito ávidos e sedentos de poder, fama e dinheiro. Mergulhados em seus compêndios doutrinários, esquecem a sublime arte de lapidar a pedra bruta encrustada no peito. Tornam-se zumbis peregrinos de um cotidiano vazio e sombrio, cuja chegada, no fim da vida, sempre vem o questionamento do que é a vida, o sentido dela e seu propósito.

Especificamente nos cursos de Direito, as disciplinas humanas já são obrigatórias, conforme vimos na resolução N˚ 5 do Conselho Nacional de Educação, datada em 17 de dezembro de 2018, que institui as diretrizes curriculares nacionais do Curso de Graduação em Direito. Embora já sejam consideradas obrigatórias, deve-se aprofundar o estudo dos temas, tornando a sua exposição não apenas em um único semestre, mas em pelo menos três, dividindo-se em disciplinas de Sociologia Geral, Sociologia do Direito I e Sociologia do Direito II. O mesmo se aplica analogicamente em Filosofia.

Somente assim, aliado a técnicas pedagógicas alternativas e somando-se às aulas expositivas tradicionais, o acadêmico se verá obrigado a estudar, ler e aprender, o que nos ensinou os grandes mestres do conhecimento da nossa história e atualidade. A interdisciplinaridade das ciências jurídicas com o universo do conhecimento é inquestionável, sendo sistema intercomunicado, uma autêntica rede de saberes.

O tratado neste estudo dedicou-se ao tratamento planejado ao discente na graduação, mas o mesmo se aplica, com até mais intensidade, aos alunos dos cursos de mestrado e doutorado.

Podemos concluir que, à primeira vista, a formação humana e humanista do Direito é algo indispensável, pois é inadmissível e repulsivo os sentimentos de preconceito, orgulho, vaidade, seja de qualquer pessoa, mas principalmente de eruditos e intelectuais, não importando preferências políticas partidárias e ideológicas. O cientista jurídico é acima de tudo, um defensor da justiça, mesmo que a justiça esteja em oposição à lei.

A complexidade do pensamento científico do direito e sua interdisciplinaridade não se resume à estudos de leis, códigos, jurisprudências e livros doutrinários. É um autêntico estudo filosófico, hermenêutico e sociológico. Devemos não conhecer apenas as leis, mas as causas comportamentais, sociológicas, que levaram à sua edição. Nisto a Sociologia do Direito se torna uma ferramenta muito útil para a construção do ente jurídico humano e pleno.

O cotidiano, a vida moderna, nos apresenta diversos indivíduos enclausurados em suas verdades absolutas, indivíduos intolerantes e insensíveis. Dentre estes, nos deparamos com colegas de universidade, desde a juventude, até profissionais do direito ávidos e sedentos de poder, fama e dinheiro. Mergulhados em seus compêndios doutrinários, esquecem a sublime arte de lapidar a pedra bruta encrustada no peito. Tornam-se zumbis peregrinos de um cotidiano vazio e sombrio, cuja chegada, no fim da vida, sempre vem o questionamento do que é a vida, o sentido dela e seu propósito.

REFERÊNCIAS

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[1] Advogado, mestrando do Curso de Direito do Centro do Universitário 7 de Setembro (UNI7), pós graduado em Direito e Processo Tributário, pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR).

[2] Graduação em Direito pela Universidade de Fortaleza UNIFOR (2012). Tem certificado de pós-graduação nas áreas trabalhista e constitucional. Mestranda em Direito Constitucional, com ênfase nas relações privados da UNI7.

Enviado: Maio, 2020.

Aprovado: Outubro, 2020.

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Carlos Nascimento de Morais

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