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“As funções didáticas da história da matemática no ensino de trigonometria”

RC: 141827
893
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/ensino-de-trigonometria

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

SILVA, Cláudio Lima da [1], SILVA, Ana Kely Martins da [2]

SILVA, Cláudio Lima da. SILVA, Ana Kely Martins da.  “As funções didáticas da história da matemática no ensino de trigonometria”. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 08, Ed. 03, Vol. 02, pp. 81-95. Março de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/educacao/ensino-de-trigonometria, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/ensino-de-trigonometria

RESUMO 

Este artigo apresenta os resultados de uma pesquisa bibliográfica que buscou responder a seguinte problemática: quais as funções didáticas da história da matemática no ensino de trigonometria presentes em livros didáticos do ensino médio?  Para tanto, teve como objetivo analisar as funções didáticas da história da matemática no ensino de trigonometria, presentes nos livros didáticos do ensino médio. As informações foram produzidas nos meses de outubro a dezembro de 2022, por meio da consulta a 7 coleções de matemática do ensino médio, PNLD – Plano Nacional do Livro Didático: Iezzi et al (2014), Chavante; Prestes (2016, 2020), Leonardo (2020), Souza (2020), Dante; Viana (2020) e Andrade (2020). A análise das informações ocorreu de forma qualitativa, a partir das menções a história da trigonometria desempenhada nos livros analisados. Os resultados indicam que, dentro da perspectiva das funções didáticas desempenhadas pela história da matemática, quanto ao objeto matemático em questão, destacam-se três: (1) elucidação dos porquês e do para quê?  (2) formação cultural e (3) história da matemática como estratégia didática. Concluiu-se que, de modo geral, a história da matemática precisa ser abordada de forma mais enfática nos livros didáticos de matemática do ensino médio, uma vez que, em algumas obras, não são trabalhadas as três funções aqui mencionadas.

Palavras-chave: Ensino de matemática, História da matemática, Funções didáticas.

1. INTRODUÇÃO 

Ao considerar a matemática uma criação humana, seus objetos tornam-se um produto sócio-histórico-cultural que contribuem para o avanço da sociedade, seja na educação, ciência ou cultura. No âmbito escolar, em sua maioria, a matemática é apresentada ao aluno como algo mecânico, sem se fazer referência a sua história, seus significados (SCHMIDT; PRETTO; LEIVAS, 2016). Esse é um dos grandes desafios dos atuais e futuros profissionais da educação que atuarão na área da matemática: desenvolver metodologias de ensino que permitam que o aluno deixe de ser mero espectador dentro da sala de aula e se torne um ser ativo, capaz de construir o conhecimento a partir de reflexões, investigações e análises.

Em face desta situação, no presente artigo, por meio de uma pesquisa qualitativa de cunho bibliográfico de consultas a livros didáticos do ensino médio, buscou-se responder a seguinte problemática: quais as funções didáticas da história da matemática no ensino de trigonometria presentes em livros didáticos do ensino médio? Desta forma, o objetivo que norteou o processo investigativo foi analisar as funções didáticas da história da matemática no ensino de trigonometria, presentes nos livros didáticos do ensino médio.

Assim, segundo Mendes (2017), é fundamental a inserção da história da matemática em sala de aula. Entretanto, segundo o autor, é importante considerar a história no plural, em face das múltiplas linguagens representativas das produções de conceitos e ideias matemáticas. Com isso, não se pode desprezar essa multiplicidade plural, em decorrência de empobrecer sua abordagem histórica no processo de ensino e aprendizagem.

Desta forma, tais histórias devem apresentar como foco principal a sistematização dos objetos matemáticos no tempo e no espaço, sem perder de vista os personagens e o seu contexto sociopolítico-cultural. Neste sentido, a história, compreendida como importante para o desenvolvimento da aprendizagem matemática dos estudantes, deve buscar explicar os conceitos matemáticos produzidos historicamente.

Outrossim, a estrutura deste artigo está assim configurada: na seção aspectos teóricos, apresenta-se um breve relato histórico da trigonometria, mostrando sua origem, evolução, autores e suas principais contribuições para o avanço da matemática, ciência, cultura e sociedade. Além disso, apresenta-se a importância da história da matemática como recurso didático, sob a perspectiva de Mendes (2017) e D’Ambrósio (1996). Na seção metodologia, detalha-se o percurso metodológico utilizado na pesquisa, a caracterização das obras analisadas e os instrumentos de análises. Por fim, na seção análises e resultados, apresentam-se as funções didáticas desempenhadas pela história da matemática no ensino de trigonometria, presentes nos livros didáticos do ensino médio.

2. ASPECTOS TEÓRICOS

2.1 BREVE HISTÓRIA DA TRIGONOMETRIA

Os primeiros tratados, que hoje são conhecidos como trigonometria, surgiram na Idade Média. A palavra trigonometria foi criada pelo alemão Bartholomeo Pitiscus (1561 – 1613), e é derivada de dois termos gregos, trigonon, que tem por significado a palavra triângulo e metria, que significa medida, portanto, significando medida do triângulo (COUTINHO, 2015).

O astrônomo Hiparco de Nicéia (180 a.C – 125 a.C) é notadamente conhecido como o “pai da trigonometria”. Hiparco publicou um tratado sobre a construção da primeira tabela trigonométrica, incluindo a tábua de corda, em doze livros (COUTINHO, 2015). Neste período, a trigonometria era baseada no estudo da relação entre um arco arbitrário e sua corda. Os matemáticos gregos não faziam uso do conceito atual de seno, mas sim do cálculo de comprimentos das cordas do arco duplo, pois, uma vez que conhecessem o valor do seu comprimento, poder-se-iam calcular o seno da metade do arco. Isto porque o comprimento da corda subtendida por um ângulo Equação 1 é Equação 2, conforme a figura 1:

Figura 1 – Corda do arco duplo

Corda do arco duplo.
Fonte: Organização dos autores.

A dificuldade em lidar com ângulos dos astros na esfera celeste levou os astrônomos babilônicos a pensar em substituir o arco de um ângulo central pela sua corda. No entanto, como demonstrado anteriormente, a corda de um arco é o dobro do seno do arco metade. Com isso, a ideia de substituir o arco pela corda do ângulo central foi o início do que se conhece hoje como seno (COUTINHO, 2015).

Mesmo com tantos estudos relacionados à trigonometria, ainda não se tinha o devido rigor matemático. Euclides e Arquimedes conseguiram, em seus estudos, evidenciar de forma mais clara o que viria ser a trigonometria que se conhece hoje. Nos estudos realizados por ambos, é possível identificar fórmulas equivalentes às razões trigonométricas, isto é, seno cosseno e tangente.

No entanto, a trigonometria alcançou o status atual quando Leonhard Euller (1707 – 1783) atribuiu ao seno a função de arco de um círculo unitário. Cabe ressaltar que a palavra seno é oriunda de tradução incorreta da palavra árabe jiba para jaib, assim, traduziram como sinus, que no latim significa seno. Por sua vez, o termo cosseno surgiu por volta do século XVII, como sendo o seno complementar de um ângulo, ao passo que o conceito de tangente surgiu da necessidade de se calcular alturas e distâncias inacessíveis (BOYER, 2010).

Por sua vez, o auge da trigonometria na Grécia Antiga ocorreu com Cláudio Ptolomeu de Alexandria. A Syntaxis mathematica, popularmente conhecida como Almagesto, escrita por Ptolomeu por volta do ano 150 d.C, foi a obra mais significativa para os estudos da trigonometria que relacionou ângulos centrais com cordas de um círculo. Constituído por 13 livros, o Almagesto é uma obra na qual consta a primeira aproximação notável, após Arquimedes, do valor de , com um valor dado de 3,1416. Além disso, dentre as várias contribuições para a trigonometria, no Almagesto, consta o cálculo das cordas, uma proposição conhecida como o teorema de Ptolomeu (BOYER, 2010).

Figura 2 – Teorema de Ptolomeu

Teorema de Ptolomeu
Fonte: Organização dos autores.

O presente teorema afirma que, em um quadrilátero convexo inscrito numa circunferência, a soma dos produtos dos comprimentos dos lados opostos é igual ao produto dos comprimentos das diagonais, isto é,  Equação 3.

Os árabes, os persas e os hindus também contribuíram para a criação da trigonometria. Além disso, foi aperfeiçoada por outras civilizações, a exemplo dos egípcios e babilônicos, responsáveis pelos primeiros indícios de achados rudimentares com uso de razões entre lados de triângulos semelhantes. Assim, mesmo com toda essa origem histórica, estudos apontam que a sua formulação, com o rigor que utiliza-se hoje, é datada do século XVII, sendo possível graças ao desenvolvimento da álgebra (BOYER, 2010).

2.2 A HISTÓRIA DA MATEMÁTICA COMO FERRAMENTA DIDÁTICA-PEDAGÓGICA

A história da matemática como ferramenta didática-pedagógica contribui significativamente para o processo de aprendizagem da matemática, uma vez que ela permite aos alunos ampliarem a compreensão dos conceitos e do processo evolutivo do objeto matemático estudado (SCHMIDT; PRETTO; LEIVAS, 2016). Assim, conhecendo a história, é possível atribuir significado ao que é aprendido e ensinado.

É sabido que cada conteúdo matemático foi desenvolvido de acordo com as necessidades socioculturais da sociedade da época, e para trazer algo que foi criado há vários séculos para a realidade de hoje, é fundamental que se volte ao passado. Desta forma, segundo Mendes (2017), a história da matemática considerada adequada para ser introduzida no desenvolvimento dos alunos deve levar em consideração o desenvolvimento epistemológico das ideias, conceitos e relações matemáticas, relacionadas aos aspectos matemáticos em seu processo de criação, reinvenção e organização lógica, estabelecidos no tempo e no espaço.

Assim, quando se trabalha com a história da matemática em sala de aula, mostra-se que essa é uma temática que não foi pensada por uma pessoa, mas, sim, por um conjunto de pessoas, em uma determinada época, que possuíam uma determinada cultura, uma determinada filosofia de vida. Deste modo, para incorporar novas práticas e novas metodologias na sala de aula usando a história, deve-se pensar na elaboração de atividades que favoreçam a construção de conceitos matemáticos pelos alunos.

Segundo D’Ambrósio (1996), esta relação entre a teoria e prática é fundamental, pois é importante conhecer como a matemática surgiu e evoluiu no passar dos tempos, posto que:

A história da matemática é um elemento fundamental para perceber como teorias e práticas matemáticas foram criadas, desenvolvidas e utilizadas num contexto específico de sua época. Essa visão crítica da matemática através de sua história não implica necessariamente o domínio das teorias e práticas que estamos analisando historicamente. (D’AMBRÓSIO, 1996, p. 29).

Como afirma o autor, conhecer a história é saber sua finalidade, sua essência. Nesta perspectiva, é fundamental que os conteúdos curriculares de matemática estejam voltados para a realidade dos educandos. Desta forma, estudando a história da matemática, é possível fazer uma análise sobre as noções e a construção básica de conceitos matemáticos. Com isso, o aluno, além de reviver as novas descobertas, perceberá que a matemática não está ligada a um conteúdo escolar isolado, mas, sim, a um conhecimento que perpassa por evoluções como qualquer ciência.

Portanto, uma vez que a história permite uma maior visualização da matemática no mundo atual, é necessário que o professor, enquanto mediador do conhecimento, busque trabalhar com a interdisciplinaridade, criando um elo entre a matemática e os demais conteúdos curriculares, mostrando que a matemática se desenvolveu após um longo processo e partindo da necessidade cotidiana do homem enquanto sociedade.

3. ASPECTOS METODOLÓGICOS

Para alcançar o objetivo proposto nesta pesquisa, a metodologia adotada fundamenta-se na abordagem qualitativa, uma vez que se prioriza o processo, as análises e reflexões acerca da abordagem. Segundo Minayo (2015, p. 21), “a pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa, nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado.” Assim, inicialmente, realizou-se de forma intencional a seleção dos livros didáticos a serem analisados, por meio de consulta aos sites das editoras, conforme a tabela a seguir:

Tabela 1 – Caracterização dos livros analisados

Livro Autor(es) Título Editora Ano
LD 1 Gelson Iezzi et al. Matemática: ciências e aplicações Saraiva 2014
LD 2 Eduardo Chavante e Diego Prestes Quadrante matemática SM 2016
LD 3 Eduardo Chavante e Diego Prestes Quadrante matemática SM 2020
LD 4 Fabio Martins de Leonardo Conexões Moderna 2020
LD 5 Joamir Roberto de Souza Multiversos matemática FTD 2020
LD 6 Luiz Roberto Dante e Fernando Viana Matemática em contextos Ática 2020
LD 7 Thais Marcelle de Andrade Matemática interligada Scipione 2020

Fonte: Elaborada pelos autores.

Outrossim, as fases posteriores caracterizaram-se pela análise dos dados. Segundo Gil (2008), na abordagem qualitativa, esta fase constitui-se de três etapas, as quais foram seguidas nesta pesquisa, conforme descritas a seguir:

Na primeira etapa, realizou-se a redução dos dados. Esta etapa envolve a identificação e seleção das informações mais relevantes e significativas para a pesquisa, a fim de simplificar e sistematizar a compreensão dos resultados (GIL, 2008). Desta forma, ao realizar-se a leitura dos recortes históricos, categoriza-se as informações obtidas em três funções didáticas desempenhadas pela história da trigonometria: (1) elucidação dos porquês e do para quê?  (2) formação cultural e (3) história da matemática como estratégia didática.

Em seguida, na segunda etapa, realizou-se a apresentação dos dados. Essa etapa é a oportunidade de mostrar as descobertas da pesquisa e interpretá-las. A apresentação deve ser clara, concisa e lógica, de forma a transmitir as informações de maneira eficaz e envolvente, podendo ser realizada por meio de citações, gráficos ou imagens (GIL, 2008). Desta forma, apresenta-se os dados por meio de imagens, acompanhadas de citações históricas explicativas do fato analisado.

Por último, na terceira etapa, é realizada a conclusão/verificação.  Na abordagem qualitativa, esta etapa envolve a interpretação dos dados coletados e a elaboração de uma conclusão consistente com os objetivos da pesquisa (GIL, 2008). Assim, na presente pesquisa, apresenta-se uma visão clara e significativa dos resultados e sua importância para o campo de estudo da educação matemática.

4. ANÁLISES E RESULTADOS

4.1 FUNÇÕES DIDÁTICAS DA HISTÓRIA DA MATEMÁTICA 

A história da matemática examina o desenvolvimento das ideias matemáticas ao longo do tempo. Mostra como as teorias matemáticas foram formadas e como elas foram usadas em diferentes contextos históricos e culturais. Além disso, pode ajudar a entender o “porquê” e “para quê” das teorias matemáticas atuais, mostrando como elas se relacionam com problemas e desafios do passado e como são aplicadas a diferentes campos do conhecimento. Assim, quanto a sua função didática, identificaram-se três funções desempenhadas pela história da matemática no ensino de trigonometria, presentes nos livros didáticos analisados, a saber:

 4.1.1 ELUCIDAÇÃO DOS PORQUÊS E DO PARA QUÊ?

Quanto a história da matemática e a elucidação dos “porquês” e do “para quê”, a história pode contribuir na explicação do porquê de se estudar certos conhecimentos matemáticos, e porque estes conteúdos foram desenvolvidos. Desta forma, são apresentadas as funções e aplicações dos conteúdos matemáticos ao longo do tempo, seja na própria matemática ou em outras áreas do conhecimento.

A figura 3 representa a história da matemática e a elucidação dos porquês e do para quê.

Figura 3 – História da trigonometria

História da trigonometria.
Fonte: Dante e Viana (2020, p. 15).

Esta figura apresenta informações sobre a forma como o astrônomo Aristarco de Samos, por meio da semelhança de triângulos, fez comparações das medidas de distância entre a terra e o sol, bem como entre a terra e a lua. Além disso, mostra que Tales de Mileto desenvolveu muitos cálculos por meio do método que se conhece hoje como teorema de Tales.

Na figura 4, tem-se o que se pode chamar de “a corda de 13 nós”, utilizada no Egito Antigo nas medições de terras.

Figura 4 – A corda dos 13 nós

A corda dos 13 nós
Fonte: Chavante e Prestes (2016, p. 223).

Desta forma, ao considerar a distância entre dois nós consecutivos da corda uma unidade de medida, com espaçamentos iguais entre cada nó, era possível a construção de um triângulo retângulo com medidas 3 unidades, 4 unidades e 5 unidades, o qual conhece-se hoje como triângulo retângulo. Assim, o presente recorte histórico da trigonometria mostra o conhecimento matemático construído para a busca por soluções de problemas práticos do cotidiano da sociedade.

Neste sentido, as menções que apresentam a história da matemática para a elucidação dos “porquês” e do “para quê” como função didática:

[…] podem contribuir para que seja atribuído sentido ao conteúdo a ser aprendido pelo estudante, na medida em que apresenta a Matemática como ciência em desenvolvimento, às vezes vinculado às questões utilitárias, e às vezes vinculado às questões intrínsecas à própria ciência Matemática (CARLINI; CAVALARI, 2017, p. 82).

Assim, no contexto atual, a trigonometria é um dos ramos fundamentais da matemática dentro e fora do ambiente escolar, pois suas relações trigonométricas servem para calcular, além das medidas de ângulos, as distâncias teoricamente inacessíveis.  Neste sentido, o ensino de trigonometria apresenta grande relevância, pois é um conteúdo matemático que está relacionado diretamente com o cotidiano do aluno.

4.1.2 A HISTÓRIA DA MATEMÁTICA COMO ESTRATÉGIA DIDÁTICA

 A história da matemática como estratégia de ensino consiste em ensinar matemática com base no estudo da história e desenvolvimento de conceitos matemáticos. Assim, ao examinar como os conceitos matemáticos se desenvolvem ao longo do tempo, os alunos questionarão as suposições subjacentes às ideias matemáticas e o conhecimento que os matemáticos utilizam para desenvolver essas ideias. Desta forma, o estudante pode aprender a avaliar evidências e argumentos que o ajudará a desenvolver aptidões críticas para resolver problemas e entender o mundo.

Na figura 5, apresenta-se uma menção que trata da demonstração do teorema de Pitágoras.

Figura 5 – Demonstração do teorema de Pitágoras

Demonstração do teorema de Pitágoras
Fonte: Iezzi et al. (2014, p. 417).

Na figura 5, tem-se uma demonstração do teorema de Pitágoras realizada por James Abraham Garfield, o vigésimo presidente dos Estados Unidos. Antes de entrar na vida política, Garfield foi professor de matemática, e era conhecido por sua habilidade matemática e por ter ensinado o teorema de Pitágoras de forma inovadora.

Neste recorte histórico, é apresentada a ideia que Garfield utilizou para demonstrar o teorema de Pitágoras, por meio de forma visual, utilizando uma tábua de carpinteiro e pregos para construir modelos tridimensionais do triângulo retângulo. Neste sentido, “[…] uma das formas de utilizar a HM em sala de aula pode ser por meio da apresentação de uma pequena narrativa, que mostre a lógica utilizada pelos matemáticos para a criação do conteúdo que está sendo trabalhado” (CARLINE; CAVALARI, 1997, p. 80).

Assim, o raciocínio de Garfield aplicado ao teorema de Pitágoras ajuda os alunos a entenderem a fórmula para calcular a medida de um dos lados do triângulo retângulo quando se tem a medida dos outros dois lados. Nesse caso, o importante não é que o estudante reproduza o raciocínio garfieldiano, tão pouco o pitagórico, mas, sim, que ele entenda como as fórmulas foram criadas. Desta forma, esse fato da história da matemática pode contribuir com o entendimento do objeto matemático. Nesse sentido, ao compreender a história, os alunos serão capazes de reconstruir fórmulas sempre que necessário, compreendendo a lógica matemática envolvida.

4.1.3 FORMAÇÃO CULTURAL

Na história da matemática e formação cultural, são apresentados fatos históricos da vida dos estudiosos que contribuíram para o desenvolvimento da matemática. Estes relatos históricos são apresentados de forma sucinta, e não contribuem para a aprendizagem da matemática, mas, sim, para uma formação cultural do estudante.

Figura 6 – História de Tales de Mileto

História de Tales de Mileto
Fonte: Souza (2020, p. 58).

A menção representada na figura 6 expõe um breve recorte histórico da vida, obra e contribuições para a matemática de um dos gênios mais versáteis da antiguidade – o filósofo, matemático, engenheiro e astrônomo grego Tales de Mileto (624 a.C. – 547 a.C.). Tales levou para a Grécia os conhecimentos da geometria desenvolvidos pelos egípcios e passou a aplicar os métodos da filosofia grega a eles. Usando o método de comparação de sombras, atualmente conhecido como teorema de Tales, Mileto fez muitos cálculos inéditos. O mais famoso deles foi o método de medir distâncias inacessíveis.

Estes fatos históricos são apresentados nos livros didáticos como curiosidades da vida desses estudiosos, no entanto, não apresentam grande relevância e contribuições acerca do conhecimento matemático para a aprendizagem dos conceitos e do objeto matemático em questão (trigonometria). Desta forma, sua contribuição está voltada para proporcionar aos estudantes um contato com a história da matemática, contribuindo, assim, com a sua formação cultural.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo teve como escopo analisar as funções didáticas da história da matemática no ensino de trigonometria, presentes nos livros didáticos do ensino médio. Desta forma, ao final deste trabalho, por meio da análise dos dados coletados neste estudo, algumas reflexões sobre o ensino de matemática podem ser feitas ao responder-se a seguinte problemática: quais as funções didáticas da história da matemática no ensino de trigonometria presentes em livros didáticos do ensino médio?

Com base na análise realizada, constatou-se que as funções “elucidação dos porquês e do para quê” e “formação cultural” estão presentes em todas as coleções analisadas. No entanto, a “História da matemática como estratégia didática” foi constatada unicamente em uma das coleções do PNLD (Plano Nacional do Livro Didático) de 2014. Destaca-se que esta última é a função que julga-se ser a mais interessante, pois seu papel é proporcionar ao aluno o desenvolvimento do raciocínio matemático, levando-o a compreender os conteúdos ou conceitos matemáticos.

Ao analisar-se os livros didáticos do PNLD 2020, voltado para o Novo Ensino Médio (NEM), consta-se que são as coleções com referências à história da trigonometria com maior limitação. Quase que em sua totalidade, as menções históricas estão voltadas à “formação cultural do aluno”. Ressalta-se que nenhuma das coleções analisadas do NEM abordam a função da história da trigonometria como “estratégia didática”.

Deste modo, pode-se afirmar que os livros didáticos de matemática carecem de maior atenção quanto a abordagem da história da matemática como função didática, pois esta pode ser uma ferramenta importante na formação cultural do aluno, ajudando-o a compreender como a matemática se relaciona com outras áreas do conhecimento e como tem sido utilizada ao longo do tempo para resolver problemas teóricos e práticos da sociedade. Além disso, a história da matemática pode fornecer informações sobre o desenvolvimento de ideias matemáticas e como elas se relacionam com as necessidades e preocupações da sociedade e da cultura.

REFERÊNCIAS

ANDRADE, Thais Marcelle de. Matemática interligada: trigonometria, fenômenos periódicos e programação. São Paulo: Scipione, 2020.

BOYER, C. B. História da matemática. 3ª ed. São Paulo: Blucher, 2010.

CARLINI, Elisângela Miranda Pereira; CAVALARI, Mariana Feiteiro. As funções didáticas da história da matemática nos livros didáticos de matemática do ensino médio. Hipátia – Revista Brasileira de História, Educação e Matemática. v. 2, n. 2, p. 73-88, dez. 2017.

CHAVANTE, Eduardo; PRESTES, Diego. Quadrante matemática, 1º ano: ensino médio. São Paulo: Edições SM, 2016.

CHAVANTE, Eduardo; PRESTES, Diego. Quadrante matemática e suas tecnologias: trigonometria e sequências. São Paulo: Edições SM, 2020.

COUTINHO, Lázaro. Trigonometria esférica: a matemática de um espaço curvo. Rio de Janeiro: Interciência, 2015.

D’AMBRÓSIO, Ubiratan. Educação matemática: da teoria à prática. Campinas: Papirus, 1996.

DANTE, Luiz Roberto; VIANA, Fernando. Matemática em contexto: trigonometria e sistemas lineares. São Paulo: Ática, 2020.

GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social.  6ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.

IEZZI, Gelson et al. Matemática: matemática, ciência e aplicações. São Paulo: Saraiva, 2014.

LEONARDO, Fabio Martins de. Conexões: matemática e suas tecnologias. São Paulo: Moderna, 2020.

MENDES, Iran Abreu. História para o ensino da matemática: uma reinvenção didática para a sala de aula. Revista COCAR, Belém, edição Especial n. 3, p. 145-166, jan./jul. 2017.

MINAYO, Maria Cecília de Souza (org.). Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. 34ª ed. Petrópolis: Vozes, 2015.

SCHMIDT, Giovani Marcelo; PRETTO, Valdir; LEIVAS, José Carlos Pinto. História da matemática como recurso didático-pedagógico para conceitos geométricos. Revista Caderno Pedagógico, Lajeado-RS, v. 13, n. 1, 2016.

SOUZA, Joamir Roberto de. Multiversos matemática: sequências e trigonometria – Ensino Médio. São Paulo: Editora FTD, 2020.

[1] Licenciatura em Matemática – Universidade do Estado do Pará (UEPA). Pós-Graduação em Gestão, Supervisão e Orientação Escolar – Faculdade de Tecnologia Equipe Darwin (FTED). Pós-Graduação em Método de Ensino da Matemática – Faculdade para o Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (FADESA). Pós-Graduação Educação Especial e Inclusiva – Faculdade de Ciências de Wenceslau Braz (FACIBRA). Mestrando em Ensino de Matemática (PPGEM) – Universidade do Estado do Pará (UEPA). ORCID: 0000-0001-8479-7085. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/9436478551615501.

[2] Orientadora. Doutora em Educação – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO). E Pós-Doutorado em Educação com ênfase em Psicologia Cognitiva – Universidade de Flores – Buenos Aires (ARG). ORCID: 0000-0002-2893-9138. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/7592735932303176.

Enviado:  07 de Fereiro, 2023.

Aprovado: 01 de Março, 2023.

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Cláudio Lima da Silva

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