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A Importância da Contação de Histórias e dos Contos de Fadas na Educação Pré-Escolar

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CONTEÚDO

SALES, Gutemberg Martins de [1]

SALES, Gutemberg Martins de. A Importância da Contação de Histórias e dos Contos de Fadas na Educação Pré-Escolar. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 03, Ed. 07, Vol. 03, pp. 5-18, Julho de 2018. ISSN:2448-0959

Resumo

Neste artigo analisaram-se documentos que abordam o tema literatura infantil e os contos de fadas. Objetivou-se abordar a literatura infantil, focando seus aspectos históricos e importância no cenário escolar. Questiona-se sobre como surgiram os contos de fadas e qual sua importância na formação das crianças? Por hipótese acredita-se ser nesse universo do imaginário que as crianças mergulham no intuito de aproximar sua realidade aos contos da literatura infantil e se descobrem enquanto sujeitos da leitura que se apropriam. Por meio da revisão de literatura pode-se afirmar que o mito, a fantasia, o inusitado fazem parte da formação da pessoa humana desde o início do seu processo de desenvolvimento, quando a criança passa a associar sua realidade aos contos de fadas no mundo considerado maravilhoso.

Palavras-chave: Contação de Histórias, Literatura, Imaginação.

Introdução

Ouvir e ler histórias são como entrar em um mundo encantador, cheio ou não de mistérios e surpresas, mas sempre muito interessante, curioso, que diverte e ensina. É na relação lúdica e prazerosa da criança com a obra literária que temos uma das possibilidades de formarmos o leitor. Escolhemos este assunto por acreditarmos que as experiências literárias na primeira infância são decisivas para o desenvolvimento integral da criança, e diante disso nos preocupa a situação da leitura em nosso país e a perda de interesse dos nossos alunos.

Justifica-se estar cientes de que o gostar de ler não tem nada a ver com herança genética ou biológica, ninguém nasce gostando da leitura, aprendemos a gostar e essa herança é cultural. O fato demonstra, então, que o modo de abordar a literatura não está recebendo a atenção necessária, um estímulo adequado. Vê-se, portanto, a necessidade de buscar, criar soluções para que as crianças tenham uma experiência positiva em relação à leitura.

Objetiva-se abordar a literatura infantil, focando seus aspectos históricos e importância no cenário escolar, mostrando que a literatura constitui um elo privilegiado entre o homem e o mundo, pois supre as fantasias, desencadeia nossas emoções, ativa o nosso intelecto, trazendo e produzindo conhecimento, processando transformações. Trataremos sobre o papel exercido pela literatura no imaginário infantil e algumas das formas existentes de se desenvolver o gosto literário na tenra idade.

Acredita-se ser nesse universo do imaginário que as crianças mergulham no intuito de aproximar sua realidade aos contos da Literatura Infantil e se descobrem enquanto sujeitos da leitura que se apropriam. São os contos de fadas que permitem que as crianças se identifiquem com as dificuldades ou alegrias de seus heróis, cujos feitos narrados expressam, em suma, a condição humana frente às provações da vida. As crianças encontram por meio dos contos de fadas uma melhor maneira de viver.

Como problema questiona-se sobre como surgiram os contos de fadas e qual sua importância na formação das crianças? Tais questões nos permitem inúmeras reflexões, todavia, o foco primordial deste trabalho é analisar documentos que permitem entender a genuinidade dos contos de fadas na vida das crianças e oferecer mais uma ferramenta indispensável para seu processo de formação e aprendizado.

Por meio da revisão de literatura tratou-se sobre o papel que a literatura exerce no imaginário infantil e as formas existentes de se desenvolver o gosto literário na tenra idade. Pretendeu-se mostrar a importância dos contos de fadas no que diz respeito à aquisição de valores, como na construção do aprendizado e no despertar do interesse pela leitura de maneira intrínseca pela criança.

1. Os contos de fadas e a aquisição do conhecimento

Sabe-se que o mito, a fantasia, o inusitado fazem parte da formação da pessoa humana, pois é por meio da simbologia que a pessoa representa e exprime seus pensamentos, desde muito nova.  Por isso, os contos infantis ajudam na aquisição do conhecimento e levam a pessoa a conviver harmoniosamente consigo mesmo compreendendo seus conflitos e superando-os na medida em que cresce cognitivamente e estrutura sua personalidade.

Portanto, é essencial se compreender todo o potencial que está resguardado pela simbologia dos contos de fadas. Também é possível aos pais, avós e professores perceber que contar histórias é necessário, pois esse momento se converte em um precioso auxiliar do desenvolvimento infantil.

Relacionando de uma maneira harmoniosa a realidade e a fantasia, construindo sua identidade e buscando o caminho para superar as dificuldades inerentes ao crescimento, a criança enfrenta seus temores e se sente confiante para enfrentar sua vida adulta. Por isso, a grande importância dada por psicólogos, professores, ao conto de fadas, ao maravilhoso na composição de uma personalidade sadia (ABRAMOVICH, 2004).

Hoje, o contato com texto escrito é feito através do convívio familiar, pais e avós iniciam á criança, se tornando ponte entre o imaginário e o real, a criança e o mundo da imaginação. Entende-se que para as crianças, o narrador responde questões que ela deixa de enunciar e lhe oferece a possibilidade de descobrir seus conflitos, impasses ao mesmo tempo em que as personagens das histórias vão resolvendo os problemas com que se defrontam.

Assim, as histórias infantis auxiliam na imaginação criadora ao levar a criança a viver como sua, as experiências de outras crianças que foram pelo mundo, que desejaram viver suas próprias emoções. Para a criança, o ato de a personagem poder retornar ao convívio familiar implica no desejo de um renascimento, de poder voltar ao útero materno, lugar onde viveu resguardada e aconchegada. Nesse contexto, quando o professor auxilia a criança a criar personagens e pode desenhar sobre elas, surgem condições de ver com mais clareza as coisas da vida, seus relacionamentos e entender como se apresentam.

Para isso, o professor ao contar histórias no cotidiano da sala de aula, trabalha com o processo de investigação e questionamento das ações que transcorrem. Dessa forma, faz com que o aluno possa estar em permanente contato com seus sentimentos e emoções. Estabelecendo com seu aluno um clima de cumplicidade permite que ele compreenda que há um elo entre ele o aluno e os personagens do livro.

Envolvendo a criança no imaginário, torna a história um objeto de reflexão, que melhora a qualidade da aprendizagem e promove a conscientização do aluno do valor da arte na vida, demonstrando que ela tem condições de vencer sua timidez e sua percepção. Nos contos de fadas, é necessário que o professor esteja seguro em relação ao conteúdo tratado, que ele seja capaz de fazer questionamentos instigantes, que levem à reflexão e ensejem discussões produtivas.

Para entender essas transformações que a criança manifesta em sua vida em sociedade, bem como as relações que se formam no seu interior, é preciso que se notem as projeções que a criança vive ao construir sua personalidade. Porém, o professor também deve estar atento às mudanças por que passou a humanidade ao longo dos séculos. Pois em sua busca de equilíbrio as pessoas utilizam o pensamento, constroem sua cultura.

Por isso, a interpretação de um assunto, imagem, fato ou ação vai depender do ponto de vista do observador, para interpretar de forma pessoal, o que lhe está sendo oferecido. Essa maneira da criança se expressar lhe dá caminhos para ser alfabetizada, para contar histórias orais e estimular sua imaginação criadora.

O professor atua como um mediador entre o conhecimento articulado e o aluno, competindo-lhe desencadear a ação que desenvolve nos alunos a sensibilidade e a criatividade. O ato de ouvir envolve um processo ligado à forma de ver as coisas como elas se apresentam e ele depende das informações recebidas e da maneira como surgem.

Tendo em vista que as pessoas buscam maneiras de registrar e transmitir aos demais seus sentimentos e emoções, o que lhes vai à alma e na mente, os contos de fadas se convertem em um meio de concretizar os sentimentos que são abstratos de levar ao conhecimento das demais pessoas aquilo que estão sentindo e experimentando. O aluno encontra maneira de deixar fruir a imaginação, transformando o cotidiano da sala de aula, provendo situações onde entra em permanente contato com seus sentimentos e emoções.

Ao professor cabe oferecer a oportunidade para que seu aluno compreenda suas emoções e se aperfeiçoe cada vez mais, sabendo compreender o que se passa consigo e tendo coerência em seus atos. Uma pessoa criativa é capaz de processar as informações que dispõe, através de dados sensoriais que são acessíveis a todos os indivíduos. Ela percebe intuitivamente as possibilidades que lhe permitem transformar princípios em uma modalidade cognitiva responsável pelo pensamento, pelo raciocínio e por um complexo funcionamento mental.

Nesse sentido, é importante compreender a forma como a criança pensa para, só então, trabalhar em direção à construção de seu conhecimento, utilizando objetos sócio-culturais como a Literatura Infantil para que ela possa decifrar esses objetos, usufruindo deles e reconstruindo seus pensamentos. A linguagem da criança, seja ela: gráfica, gestual, falada ou escrita, expressa a originalidade que possui e a escola deve considerar seu modo de pensar e a partir dele construir espaços para a elaboração de pensamentos.

Todo contato humano se dá por meio da leitura, em seu sentido mais amplo: têm-se as histórias que possuem aquelas crianças, as histórias que ela deseja possuir, as histórias do professor que tocam as crianças e, se esse momento for tratado com cuidado e carinho nascerá toda uma nova família de histórias, uma rede delicada cuja beleza poderá gerar fios que se entrelaçam infinitamente (PIETRO, 1999, p. 33).

Coelho (2002) ressalta que quando contamos histórias vividas, a nossa intenção muitas vezes é de influenciar nossos alunos, quer seja em termos de atitudes, quer seja na sua conduta afetiva. Desta forma devemos ter clareza do “para que” contar. Não contar apenas no intuito de “passar uma lição”, mas para que se tenha um contraste de experiências em locais e tempos diferentes, para alimentar a imaginação. É preciso ainda criar no ouvinte o desejo de ouvir a história e ter a curiosidade de conhecer seu desfecho.

2. Utilizações de histórias

Piaget (1996 apud BARROS, 2002, p. 180) em seus estudos do desenvolvimento moral, observou como a criança decide se uma ação é boa ou má. Ele formulou pequenas histórias que mostravam situações em que pessoas praticavam ações tais como roubar, mentir, quebrar objetos, desobedecer aos pais, entre outras ações.

Apresentava essas histórias às crianças de diferentes idades para que as julgassem. Piaget viu uma evolução nesses julgamentos infantis e a resumiu em dois grandes estágios.

O julgamento moral, segundo Piaget (1996 apud BARROS, 2002) começa no primeiro estágio: realismo moral também chamado “moralidade de repressão” ou “moralidade heterônoma”. Neste primeiro estágio estão as crianças menores, que julgam uma ação boa ou má conforme a gravidade de suas consequências, sem levar em consideração as intenções de quem age.

A título de exemplo: uma criança que quebra 15 xícaras é considerada pior do que aquela que quebra apenas uma, mesmo que a primeira criança tenha quebrado as xícaras quando tentava ajudar sua mãe e a segunda criança o tenha feio de propósito ou por descuido.

O realismo moral pode ser assim resumido: a obediência a qualquer regra é considerada desejável; a lei deve ser obedecida ao pé da letra, e não pela interpretação que lhe damos; as ações devem ser avaliadas com relação à obediência às regras, e não de acordo com sua intenção.

A criança, enquanto é realista moral, acredita que as regras e ordens são sagradas e imutáveis; ela ainda não reconhece que as regras resultam de convenções sociais.

Segundo estágio: relatividade moral. Durante a meninice, a criança evolui para um estágio em que seus julgamentos tornam-se mais flexíveis, em contraste com a rigidez e o autoritarismo observado nas crianças mais novas. As regras e ordens são consideradas como questões de mútuo consentimento e estão sujeitas a mudanças.

Piaget observou que, ao avaliar a gravidade das ações praticadas pelos personagens das histórias por ele contadas, a criança deste estágio leva em conta as intenções de quem age e não mais apenas as conseqüências de sua ação. (BARROS, 2002, p. 180-181).

Abramovich (2004) ressalta que ao ler uma história a criança também desenvolve todo um potencial crítico. A partir daí ela pode pensar, duvidar, se perguntar, questionar… Pode se sentir inquietado, cutucada, querendo saber mais e melhor ou percebendo que se pode mudar de opinião… E isso não sendo feito uma vez ao ano. Mas fazendo parte da rotina escolar, sendo sistematizado, sempre presente o que não significa trabalhar em cima dum esquema rígido e apenas repetitivo.

Conforme Bettelheim (2008) tentando fazer uma criança aceitar explanações cientificamente corretas, os pais com muita freqüência não levam em conta as descobertas científicas de como a mente de uma criança funciona. As pesquisas sobre os processos mentais da criança, especialmente as de Piaget, demonstram convincentemente que a criancinha não está apta a compreender os dois conceitos abstratos vitais de permanência de quantidade, e de reversibilidade, por exemplo, que a mesma quantidade de água atinge um ponto alto num receptáculo estreito e permanece baixa num outro largo; e que a subtração inverte o processo de adição. Até que possa compreender conceitos abstratos como este, a criança só pode vivenciar o mundo subjetivamente.

Barros (2002, p. 57) explica o estágio pré-operacional, que vai dos 2 aos 7 anos de idade. Neste período nota-se uma grande transformação na qualidade do pensamento em relação ao primeiro estágio. O pensamento da criança não está mais limitado ao seu ambiente sensorial imediato em virtude do desenvolvimento da capacidade simbólica. A criança começa a usar símbolos mentais, imagens ou palavras, que representam coisas e pessoas que não estão presentes.

Nesta época, há uma verdadeira explosão linguística. Há um considerável aumento de vocabulário, bem como da habilidade de entender e usar as palavras. A criança que, aos 2 anos, possuía um vocabulário de duzentas a trezentas palavras, por volta dos 5 anos entende mais de duas mil palavras e já forma sentenças gramaticalmente corretas. Nesta fase, em que as crianças estão prontas para aprender a linguagem, um efeito significativo no desenvolvimento infantil é exercido pelos adultos que falam muito com elas, que lêem para elas, que lhes ensinam cantos e poesias infantis, em outras palavras, exercitam a linguagem para comunicar-se com elas.

Conforme Bettelheim (2008) para que uma história realmente prenda a atenção da criança, deve entretê-la e despertar sua curiosidade. Mas para enriquecer sua vida, deve estimular-lhe a imaginação: ajudá-la a desenvolver seu intelecto e a tornar claras suas emoções; estar harmonizada com suas ansiedades e aspirações; reconhecer plenamente suas dificuldades e, ao mesmo tempo, sugerir soluções para os problemas que a perturbam.

Em suma, deve de uma só vez relacionar-se com todos os aspectos de sua personalidade e isso sem nunca menosprezar a criança, buscando dar inteiro crédito a seus predicamentos e, simultaneamente, promovendo a confiança nela mesma e no seu futuro.

2.1 O que dizem os contos?

Em essência, os contos de fada podem ser vistos como pequenas obras de arte, capazes que são de nos envolver em seu enredo, de nos instigar a mente e comover-nos com a sorte de seus personagens. Causam impactos em nosso psiquismo porque tratam das experiências cotidianas, e permitem que nos identifiquemos com as dificuldades ou alegrias de seus heróis, cujos feitos narrados expressam, em suma, a condição humana frente às provações da vida. É o que afirma Urban (2001, p. 34).

Mas por que nos impressionam tanto os contos de fada? Por certo, não apenas pelos expoentes citados que se dedicaram à sua compilação, visto que tais contos sempre foram populares como tradições orais, mas, antes, porque suas histórias são instigantes. Não há como alcançar completamente seu sentido em termos puramente intelectuais, fato que nos desperta a percepção intuitiva (URBAN, 2001).

Urban (2001) retrata ainda que a fantasia, irracional a ponto de permitir que a vovó engolida pelo lobo mal permaneça viva em sua barriga até ser salva, ou que Bela Adormecida durma enfeitiçada um sono de cem anos, e João suba num pé de feijão até alcançar no céu o castelo de um gigante, justamente pelo inverossímil que expõe, provoca uma reviravolta em nosso mundo psíquico que, estimulado, aguça-se na tentativa de compreendê-la. E não há como explicá-la pelos padrões da razão metódica.

A história de fadas é per si sua melhor explicação, do mesmo modo que as obras de arte encerram aspectos que fogem do alcance do intelecto, já que suscitam emoções capazes de comover os que diante delas se colocam. O significado desses contos está guardado na totalidade de seu conjunto, perpassado pelos fios invisíveis de sua trama narrativa. Claro que, diante desse mistério, muitas formas de abordá-lo são possíveis e igualmente válidas, posto que acrescentem luz à sua compreensão (URBAN, 2001, p. 34).

Para Urban (2001) Branca de Neve, a propósito, cuja narrativa remonta há mais de mil anos, permite inúmeras interpretações à luz da psicanálise ou da psicologia junguiana. Prefiro ver neste conto, contudo, uma das jóias raras produzidas pelo saber dos alquimistas. Na alegoria de “Branca de Neve” estão depositados inúmeros segredos do ocultismo. A rainha, que morre ao parir, fora bem clara em seu desejo: “Quero ter uma filha de pele alva como a neve, lábios vermelhos como o sangue, e cabelos tão negros quanto à noite!” É como começam as versões originais deste fabuloso conto. Implícita está, desde o início, a alusão às três grandes fases da transmutação alquímica: albedo (o branco), rubedo (o vermelho) e nigredo (o negro). Expulsa de seu castelo aos 7 anos, a menina é abandonada pelo servo na floresta; miticamente, este é o lugar desconhecido onde primeiro nos perdemos na busca da verdade. A casa dos 7 anões representa o núcleo orientador capaz de nos levar de volta ao caminho iniciático dos alquimistas. E os anões, todos mineradores da caverna, representam a necessidade de trabalharmos nossas entranhas em busca do ouro filosofal. Na alegoria dos 7 acham-se velados os 7 metais alquímicos, bem como seus 7 planetas regentes, também os 7 degraus para o preparo da Pedra Filosofal. A madrasta, por sua vez, traduz arquetipicamente os perigos do caminho de provações, revelando-se como bruxa perdida (por estar presa à vaidade) na busca da beleza eterna, enganada quanto à natureza do “Elixir da Longa Vida”. Ela morrerá em desgraça, e Branca de Neve, após pagar o preço de sua ingenuidade, acabará por renascer de sua morte simbólica nos braços de seu príncipe encantado, a representar a coroação dos ideais da alma.

No conto histórico Branca de Neve a tendência que aparece desde cedo entre mãe/mulher e filha/mulher em desenvolvimento, quando competem pela atenção do homem/pai, ou pela vantagem que a mãe tem sobre a filha, por ser adulta e a filha sobre a mãe, por ser jovial e se encontrar no desabrochar da sexualidade: “Esta não é a primeira estória de uma mãe ciumenta da sexualidade florescente da filha, nem é tão raro uma filha acusar mentalmente a mãe de sentir ciúmes” (BETTELHEIM, 2008, p. 246).

Muitas vezes os conflitos externos são simbólicos e a competição entre as mulheres são alegorias, pois reproduzem conflitos internos.

As relações entre Branca de Neve e a rainha simbolizam algumas dificuldades graves que ocorrem entre mãe e filha. Mas são também projeções, em figuras separadas, das tendencias incompatíveis dentro de uma pessoa. (BETTELHEIM, 2008, p. 250).

Em seu livro A psicanálise dos contos de fadas, Bettelheim (2008) escreve que o conto “Os três porquinhos” ensinam à criança, da forma mais deliciosa e dramática, que não devemos ser preguiçosos. Por meio deste conto, podemos pensar sobre questões pessoais, sobre como lidar com esse tipo de problema e aprender a lidar com nossas dificuldades.

Em Pequeno Polegar, explica Chauí (1991) Como seu nome indica Pequeno Polegar é uma anomalia, o tamanho compensado pela inteligência fora do comum. As botas de sete léguas, que com astúcia consegue, além de ser capacidade mágica para vencer o espaço e o tempo, são também meio de assegurar à criança que seus órgãos sexuais pequenos não exigem renúncia dos desejos, mas imaginação para satisfazê-los. É interessante observar que, se nos Três Cisnes a menina empunha o arco, aqui o menino entra num enorme e protetor “recipiente”: as botas. E se sai muito bem.

O Pequeno Polegar é um dos contos onde melhor aparece tanto o medo que a criança tem da rejeição (ser morta pelos pais) quanto à necessidade de reparação, sito é, de recompor a bondade dos pais depois da fantasia de sua imensa maldade. Por isso mesmo as proezas maiores são feitas.

Polegar substitui para si próprio e para os irmãozinhos o pai e a mãe por pais ideais: as botas acolhedoras e salvadoras do menino que não abandona os irmãos, os protege contra os perigos da floresta e contra o gigante, os traz de volta a casa com fortuna, garantindo a sobrevivência da família. Não há príncipes nem princesas, tudo depende da inteligência e imaginação da criança pobre e minúscula.

Há nos contos contínua intervenção de bons adultos, mas que não intervêm de modo casual ou arbitrário e sim de acordo com várias regras, entre as quais se destaca a escolha dos mais fracos (o caçula, o órfão, a vítima) e dos que têm senso de justiça, além da coragem. O uso dos talismãs também está submetido às regras, os transgressores sendo punida (perda da potência do objeto mágico, retorno do objeto contra o usuário) ou protelada a chegada à meta (a sequência de provas recomeçando ou tornando-se mais árdua).

Heróis e heroínas precisam demonstrar que são dignos do talismã (seja por suas qualidades anteriores à recepção do objeto, seja pelo uso que dele faz, seja pela obediência às regras de seu emprego).

Em resumo as condutas estão reguladas por normas e valores, a finalidade do conto sendo persuadir a criança de que tais normas são boas e verdadeiras e que o sofrimento decorre apenas de sua desobediência. É o compromisso do conto, situado entre o lúdico e a repressão.

Chauí (1991) ainda afirma que os contos de fadas, tais como os conhecemos, são resultado de muitas elaborações na sociedade européia, fixados nos séculos XVIII e XIX, carregando as concepções desses séculos sobre a sexualidade (e sobre outras coisas também).

Ora, é interessante observar que, no século XIV, ao lado desses contos, surge, na Inglaterra, outro tipo de estória, em certo aspecto semelhante ao maravilhoso dos contos, mas com uma diferença fundamental: o mundo adulto não é apresentado com divisões e ambiguidades, bom e mau, difícil e desejável, mas como mau e indesejável. Estamos pensando em Peter Pan e em Alice – o menino que recusou crescer, ficando na Terra do Nunca, e a menina cujo autor não desejou que ela crescesse, fazendo-a conhecer a luta mortal e absurda com a Rainha do Baralho num tabuleiro de xadrez. Muitos comentadores, de formação psicanalítica, afirmam que o medo de Peter Pan o faz preferir a imaturidade sexual, o homossexualismo e a masturbação (o pó de pirlimpimpim e o vôo), e que as “perversões” de Lewis Carrol (o autor de Alice) o faziam sentir atração sexual pelas meninas, não desejando que ficassem adultas.

Chauí (1991) não pretende refutar nem concordar com esses comentadores, mas gostaria de lembrar que essas estórias foram imaginadas num período conhecido como o da “moral vitoriana”, quando a Inglaterra, passando pela Segunda revolução industrial, mantinha o controle capitalista sobre o mundo. A sociedade desse período é narrada e descrita por inúmeros autores como uma das sociedades mais repressivas da sexualidade.

Assim sendo, podíamos considerar a recusa do mundo adulto por Peter Pan e por Alice, em vez de “anormal”, talvez muito saudável e lúcida. A Terra do Nunca, apesar do Capitão Ganho, é perfeita, mas o País das Maravilhas é feito de ameaças e de frustrações.

Antes do término deste trabalho, gostaria de ressaltar que os contos não são quaisquer histórias, são histórias que falam sobre a nossa vida e sobre o nosso dia a dia. Por meio deste, a criança criará conceitos que poderá levar consigo para o resto de sua vida.

Urban (2001) escreve magnificamente tudo quanto um conto representa: Era uma Vez uma criança que adorava ouvir histórias ela nada mais esperava que vivesse cada momento, mas a cada passo dado neste seu mundo de sonhos e fantasia, pouco a pouco, sem o perceber, ia encontrando um sentido para a vida.

Considerações finais

Acredita-se que a literatura e a contação de histórias como suporte pedagógico na aprendizagem das séries iniciais das crianças, seja o resultado das vivências do aluno, na perspectiva do professor e da escola. Nessa perspectiva, o conto de histórias por meio da literatura pode ser visto como um espelho de qualidade do trabalho que é desenvolvido no ambiente escolar, e na dimensão do direito, de que a escola realiza sua missão de educação escolar e apontam a família às necessidades do aluno.

Abordando o tema sobre contos de fadas, não se pretendeu uma inserção na área pedagógica, apenas outro olhar, na perspectiva da utilização qualitativa sobre o assunto. Durante o desenvolvimento da pesquisa, observou-se que a aprendizagem da criança e do adolescente, desenvolve, reorganiza e reformula sua base para o crescimento como pessoa e como leitor. Enquanto a observação e a avaliação são tarefas diárias dos professores, o objetivo de promover o entusiasmo, a versatilidade e a formação de leitores habilidosos deve ser o foco do professor.

A leitura de literatura e o gosto pela mesma, de fato sugere-nos um indicador de maturidade de uma proposta que nela explicite as dificuldades que implicam seu possível desenvolvimento. Precisamos de tempo para desenvolver os recursos necessários para enfrentar esse ambicioso projeto.

Logo, é preciso adquirir o conhecimento da correspondência de compreender a natureza e o funcionamento do sistema alfabético dentro de uma prática ampla de leitura literária. É errônea a ideia de que ler é simplesmente decodificador, converter letras em sons, pois, a partir disso a escola vem produzindo grandes quantidades de leitores capazes de decodificar qualquer texto, mas com enormes dificuldades para compreender o que tentam ler.

Talvez fosse interessante que tanto os professores do ensino fundamental e ensino médio quanto os professores universitários nos sentíssemos orgulhosos por estar participando dessa fascinante empreitada, e não acovardados pela sensação difusa de que as coisas não estão sendo bem feitas.

Formar leitores implica em ter condições favoráveis para a prática da leitura.

Torna-se consenso entre os educadores e a sociedade em geral, que a escola na atualidade não deve ter apenas o papel de educar no sentido estreito da palavra, mas sim de formar cidadãos críticos e capazes de construir uma sociedade igualitária e mais humana.

As inúmeras mudanças que ocorrem na sociedade e consequentemente na estrutura de organização familiar exigem um papel mais atuante da escola na vida de cada criança, pois na maioria das vezes é a escola responsável pela transmissão do conhecimento e de valores fundamentais na definição do caráter do individuo, que ali vive boa parte da sua vida e constrói vínculos afetivos e de amizade que muitas vezes não encontra no interior do seu lar.

Os contos têm o poder de tocar profundamente as crianças, no seu desenvolvimento. No momento que a criança passa a ter contato com os contos de fadas inicia-se um processo de construção do “eu”, assim os contos despertam a fantasia e a imaginação sendo possível com que a ela tenha seu processo de autovalorização, tornando consciência, por meio da fantasia e situações inconscientes.

Por este, ser um trabalho de análise documental, não se pretende dar por encerrada a discussão sobre a importância dos contos de fada na formação das crianças, mas sim, criar possibilidades de ampliar o leque de debates e propor experimentos que venham a considerar os contos infantis como uma ferramenta pedagógica que deve ser utilizada pelos educadores no processo de alfabetização das crianças.

Referências

ABRAMOVICH, F. Literatura infantil gostosuras e bobices. São Paulo: Scipione, 2009.

ABRAMOVICH, F. O estranho mundo que se mostra às crianças. São Paulo: Summus, 2004.

BARROS, C. S. G. Psicologia e construtivismo. São Paulo: Ática, 2002.

BETTELHEIM, B. Psicanálise dos contos de fadas. 22. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008.

COELHO, B. Contar histórias – uma arte sem idade. São Paulo: Ática, 2002.

CHAUÍ, M. Repressão sexual: essa nossa (des) conhecida. Ed. Brasiliense, 1991.

LOBATO, M. Contos de Grimm. São Paulo: Nacional, 2005.

MARTINS, C. O Gato e os Gatunos. 1. ed. Livraria Paulus Ltda, 2005.

PIETRO, H. Quer ouvir uma história? Lendas e mitos no mundo da criança. São Paulo: Ed. Angra, 1999.

URBAN, P. Psicologia dos contos de fadas. Revista Planeta. n. 345, p. 32-34, junho/2001.

[1] Licenciado em Matemática pela Universidade Guarulhos, Pós-Graduado em Pedagogia com administração e supervisão escolar, Pós-Graduado em Matemática, Pós-Graduado em Docência do ensino Superior pela Universidade Iguaçu (UNIG). Experiência profissional na Rede Pública e Privada de Ensino nas disciplinas de Matemática e Física – Atuou como Coordenador Pedagógico, Diretor e Vice-Diretor de Escola.

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Gutemberg Martins de Sales

2 respostas

  1. Excelente artigo! Adorei todos os conhecimentos compartilhados. Trabalho com histórias infantis, contando e escrevendo histórias, gostei muito de ler o post!

  2. Ótimo artigo. Possibilita a reflexão por diversos ângulos no que diz respeito a cultura e a vida.

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