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 A matriz disciplinar da enfermagem: um relato de experiência

RC: 141814
626
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/matriz-disciplinar

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

SILVA, Hallyson Leno Lucas da [1], SILVA, Jéssica Íris Franco da [2], CARNEIRO, Shayanna Mickaela Duque [3], MEDEIROS, Katarine Florêncio de [4], MENEZES, Rejane Maria Paiva de [5], MEDEIROS, Soraya Maria de [6], OLIVEIRA, Jonas Sâmi Albuquerque de [7]

SILVA, Hallyson Leno Lucas da.  et al. A matriz disciplinar da enfermagem: um relato de experiência. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 08, Ed. 03, Vol. 02, pp. 67-80. Março de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/matriz-disciplinar, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/matriz-disciplinar

RESUMO 

Este estudo tem como objetivo relatar a experiência de pós-graduandos sobre os elementos que constituem a matriz disciplinar da enfermagem durante a apresentação de um seminário apresentado em uma disciplina de pós-graduação.  Trata-se de um estudo descritivo, do tipo relato de experiência, desenvolvido na disciplina de bases filosóficas e teóricas de enfermagem na atenção à saúde, no curso de mestrado acadêmico em enfermagem, de um programa de pós-graduação em enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Kuhn acrescenta quatro elementos para constituição desta matriz, que seriam: generalizações simbólicas (expressões aceitas e utilizadas pelo grupo, formais ou formalmente formalizáveis), crenças em modelos (fornecem analogias e/ou sua ontologia), valores (largamente partilhados, mesmo quando não aplicados de forma igual) e exemplares ou soluções de problemas concretos (que foram realizados no passado e servem para a pesquisa futura), sendo este último, talvez, o mais importante para o autor. A Enfermagem possui matriz disciplinar. A concepção da matriz disciplinar da enfermagem foi entendida diante da sugestão da mudança do termo paradigma para matriz disciplinar, realizada por Kuhn, e perante o que se tem hoje como instrumentos, processos e prática, além do entendimento da enfermagem como ciência em evolução.

Palavras-chave: Matriz disciplinar, Enfermagem, Educação superior. 

1. INTRODUÇÃO

No contexto atual da enfermagem enquanto disciplina e profissão, pode-se destacar que os fenômenos dominantes na ciência da enfermagem são: pessoa, saúde, ambiente e enfermagem. Diante do exposto, a definição de pessoa refere-se a um ser composto de necessidades físicas, intelectuais, bioquímicas e psicossociais; um campo de energia humana; um ser holístico no mundo. A saúde é a capacidade de funcionar independentemente, a adaptação bem-sucedida aos estressores da vida, a aquisição do potencial total da vida, a unidade mente, corpo e alma. Quanto ao ambiente, ele refere-se, geralmente, aos elementos externos que afetam o indivíduo, às condições internas e externas que influenciam o organismo. E como último fenômeno, destaca-se o da enfermagem, que se floresce por ser uma ciência, uma arte e uma disciplina prática, e envolve o cuidado. Suas metas incluem o atendimento dos saudáveis, dos enfermos, a assistência nas atividades de autocuidado, o auxílio aos indivíduos para atingir seu potencial humano, descoberta e o uso das leis naturais de saúde. (MCEWEN et al.,2009).

Levando em consideração o anteriormente mencionado, autores consideram que o processo histórico da enfermagem perpassa por inúmeros momentos, entre eles o período empírico da profissão até o início de sua cientificação, chegando, finalmente, à sua profissionalização.

É neste contexto que alguns estudiosos relatam que, no início do século XIX, o paradigma cientificista ganha espaço na tentativa de superar a concepção mágico-religiosa vigente. É a partir deste período que o nome de Nightingale passa a ganhar importância na área de enfermagem a partir da sistematização de um campo de conhecimentos, instituindo-se “uma nova arte e uma nova ciência”, para a qual é preciso uma educação formal, organizada e com bases científicas. (OLIVEIRA; PAULA; FREITAS, 2007)

Entretanto, é no sentido histórico que se tem Florence Nightingale como uma das mulheres mais notáveis e expressivas da história. E atentando para sua trajetória de vida, percebe-se grande empenho em identificar quais ações, relativas ao paciente e ao ambiente, poderiam desencadear a manutenção e a recuperação da saúde. Também é notável seu interesse em delinear, por meio da definição dos padrões morais, o perfil da profissional de enfermagem. Assim, a configuração do campo da enfermagem, com seus interesses, seus jogos de poder, seus valores e crenças, além da identificação dos saberes que requeriam investimento, receberam e ainda recebem significativa influência deste período. (GOMES et al., 2007)

A partir da visão acurada de Florence, seu trabalho constituiu um marco para a história da enfermagem moderna. Na guerra da Criméia (evento ocorrido entre os anos de 1854 e 1856), ela destacou-se tanto pela administração dos hospitais de guerra quanto pela humanização dos cuidados dispensados aos soldados. Nessa ocasião, estabelecendo melhores condições sanitárias e de tratamento dos feridos, conseguiu reduzir de 47,2% para 2,2% a taxa de mortalidade entre os soldados, num período de apenas seis meses. Essa experiência a fez pensar que precisaria encontrar uma forma de honrar a profissão de enfermagem, “tornando-a uma profissão respeitável, dentro de padrões de conduta e de conhecimentos que todas as enfermeiras deveriam ter”  (OLIVEIRA; PAULA; FREITAS, 2007; GOMES et al., 2007).

Outro legado importante de Florence para a enfermagem mundial foi o que se chamou de teoria ambientalista, ou seja, se orientava por princípios relacionados ao ambiente físico, psicológico e social, que eram essenciais para o bem-estar e recuperação dos pacientes internados. Já no ano de 1859, Florence publicou “Notes of nursing”. Esse livro foi traduzido para o português em 1989, sob o título de Notas sobre enfermagem: o que é e o que não é. Por meio dele, a autora procurou distinguir o saber da enfermagem, do saber médico. Com base em suas sistemáticas observações, em dados estatísticos, em suas reflexões sobre o cuidado e na teoria miasmática vigente na época, ela enfoca os fundamentos da enfermagem moderna. (GOMES et al., 2007).

Após este período, a enfermagem vivenciou inúmeros momentos para seguir o caminho do conhecimento. Entretanto, ainda se fundamentava em princípios, crenças, valores e normas tradicionalmente aceitas. No período de 1950, surgiu a necessidade de desenvolver um corpo de conhecimento específico, o que seria possível somente pela elaboração de teorias próprias. Neste sentido, sua relevância na evolução da profissão consistiu no afastamento do caráter empírico para a adoção da prática profissional baseada em conhecimento científico. Assim, as teorias apresentam propostas para a assistência, revelando propósitos e limitações, direcionando as relações de cuidado. (MERINO et al., 2018; OLIVEIRA; PAULA; FREITAS, 2007).

Nesta perspectiva, as teorias constroem parâmetros e modelos de assistência para o desempenho da profissão. São referenciais imprescindíveis na composição disciplinar da profissão, por sua relevância para as áreas do ensino, pesquisa e prática assistencial. Elas permitem que sejam reveladas nuances e tendências desta área do saber, ressaltando sua importância enquanto disciplina ou conteúdo transversal. (MERINO et al., 2018)

Outros parâmetros para construção da assistência e desempenho da profissão consistem na utilização de instrumentos como o Processo de Enfermagem (PE), que é a maneira definida para planejar, realizar e documentar as atividades de enfermagem, e faz parte das ações de Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE). Sua documentação é viabilizada através da utilização de terminologias. De acordo com a resolução do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) 358/2009, o PE deve ser realizado através de cinco etapas: coleta de dados de enfermagem ou histórico de enfermagem; diagnóstico de enfermagem; planejamento da assistência de enfermagem; implementação; e avaliação de enfermagem. (BOAS et al., 2019).

Quanto aos instrumentos inerentes à enfermagem, eles começaram a ser utilizados no Brasil, em 1960, com a NANDA (North American Nursing Diagnosis Association), por Wanda de Aguiar Horta. Em 1980, a CIPE (Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem) foi recomendada pela OMS (Organização Mundial da Saúde), mas somente em 2003 a CIPE é introduzida pela Universidade de São Paulo (USP), pela Dra Heimar de Fátima Marin, membro do Grupo Consultivo Estratégico da CIPE, e implementada em Florianópolis-SC, em João Pessoa-PB, na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), e em Belo Horizonte – MG, em Unidades de Terapia Intensiva (UTI). A Classificação das Práticas de Enfermagem em Saúde Coletiva (CIPESC) é um projeto desenvolvido pela Associação Brasileira de Enfermagem (ABEn), e foi implementada entre os anos de 1996 e 2000, como contribuição brasileira à CIPE. (BOAS et al., 2019; NICHIATA et al., 2012).

A Prática Baseada em Evidências (PBE), como forma segura e organizada de estabelecer condutas profissionais, possui seu enfoque na solução de problemas alicerçado nas melhores evidências científicas. Envolve a definição de um problema, a busca e avaliação crítica das evidências disponíveis para uma melhor tomada de decisão, implementação e avaliação dos resultados obtidos, assim como a integração desses elementos com a competência clínica do profissional de saúde e as preferências do paciente. (PEDROSA et al., 2015).

Em primeiro lugar, este relato de experiência justifica-se por abordar uma nova temática, pouco discutida e dificilmente replicada através de estudos que consigam fomentar discussões acerca deste processo de construção da matriz disciplinar da enfermagem. Em segundo lugar, por ainda existir variações de conceitos entre países sobre algumas ferramentas (NANDA, NIC, NOC, CIPE, CIPESC e SAE). Ainda se justifica devido a pós-graduação de enfermagem no Brasil ter sido iniciada na década de 80, período em que o conhecimento científico começou a ser inserido nos cursos de pós-graduação do país e passou a ser disseminado.

Assim, este estudo tem como objetivo relatar a experiência de pós-graduandos sobre os elementos que constituem a matriz disciplinar da enfermagem durante a apresentação de um seminário apresentado em uma disciplina de pós-graduação.

2. MÉTODO

Trata-se de um estudo descritivo, do tipo relato de experiência, desenvolvido na disciplina de bases filosóficas e teóricas de enfermagem na atenção à saúde, no curso de mestrado acadêmico em enfermagem, de um programa de pós-graduação em enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

O levantamento do estudo documental para construção do seminário consistiu nas referências básicas apontadas pelos docentes da disciplina e dispostas no SIGAA (Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas), um AVA (Ambiente Virtual de Aprendizado) de uso comum entre discentes e docentes da instituição, além do acréscimo complementar, através da busca, em bases de dados e no Google Acadêmico, do material disposto para nortear o sequenciamento e a leitura dos demais discentes da turma.

Para tanto, os dados adicionais foram levantados em bases de dados como LILACS, PUBMED e BVS, a partir de palavras-chave (teorias de enfermagem; processos de enfermagem; prática baseada em evidências; enfermagem; enfermeiras). Quanto aos critérios de inclusão, optou-se por artigos dispostos gratuitamente, em qualquer idioma e sem recorte temporal. Quanto aos critérios de exclusão dos materiais, foram artigos que não atendiam a temática. Para fins éticos, este relato não necessitou ser encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP).

3. RELATO DA EXPERIÊNCIA 

3.1 A DISCIPLINA 

A disciplina teve seu início no dia 11 de abril de 2022 e seu término em 01 de agosto do referido ano, com carga horária de 60h, e contou com 04 docentes (sendo uma docente ouvinte/convidada). Quanto à turma, ela foi composta por dezessete discentes do mestrado acadêmico em enfermagem, dois homens e quinze mulheres. Vale salientar que, no período que antecede o início dos seminários, ocorreu a desistência de uma aluna.

Desde o início da disciplina de bases filosóficas e teóricas de enfermagem na atenção à saúde, foram abordadas fundamentações e discussões sobre introdução à filosofia, a práxis e a prática, paradigmas da ciência, correntes de pensamentos (positivismo, materialismo, fenomenologia e pensamento sistêmico), o saber em saúde e em enfermagem (teoria e prática), o contexto dos fenômenos da saúde e da enfermagem e a consciência moral e ética na construção do conhecimento.

No decorrer do semestre, a turma foi dividida em cinco grupos. O primeiro grupo foi composto por quatro mestrandas, e os outros quatro grupos, por três discentes cada. Os temas que compreenderam as apresentações dos seminários, foram: grupo I – os paradigmas da sociedade; grupo II – os paradigmas que permeiam os modelos de atenção à saúde no Brasil; grupo III – os paradigmas e as práticas em enfermagem; grupo IV – a pós-modernidade e prática profissional do (a) enfermeiro (a); e grupo V – a matriz disciplinar da enfermagem.

A formação de grupos é um método interessante de organização da prática pedagógica.  Os grupos representam uma amostra da sociedade, e é por meio deles que os alunos se preparam para viver coletivamente. A vivência das situações com o grupo desencadeia no educando um preparo para uma conduta social adequada, pois por meio da interação com os semelhantes se formará uma consciência democrática. (NUNES, 2012).

3.2 PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO SEMINÁRIO

O período de orientação consistiu em dois encontros presenciais com os docentes responsáveis pela disciplina e os facilitadores do seminário. Após o primeiro encontro, iniciou-se a construção do plano de seminário: a delimitação do tema, os objetivos, conteúdo programático, materiais necessários, metodologia e estratégias de ensino e aprendizagem, além de cronograma, avaliação, referências básicas e complementares.

O cronograma de apresentação consistiu em quatro momentos, sendo eles: primeiro momento: acolhimento dos docentes e discentes da disciplina, juntamente com a explanação do plano de seminário; segundo momento: desenvolvimento do tema a partir da exposição dialogada sobre a temática pelos facilitadores do seminário e demais discentes (neste momento foi aberto um espaço de vinte minutos para construção de um mural); terceiro momento: síntese do seminário; quarto momento: intervalo da turma; e quinto momento: o feedback dos discentes e docentes da turma.

A construção do mural como orientação aos participantes da turma consistiu, inicialmente, na divisão dos grupos (teorias, instrumentos, PBE e processos), na disponibilização de materiais (cartolina, cola, imagens e outros) a serem utilizados para realizar a construção durante a apresentação dos facilitadores e discussão realizada em sala.

Ao final do segundo momento do seminário, foi disponibilizado um período de 20 minutos para que os grupos realizassem a montagem e construção de seus cartazes. A ideia de construção do mural surgiu a partir da consideração sobre as matrizes disciplinares serem os alicerces para a profissão.

3.3 EXPLANAÇÃO DO SEMINÁRIO E CONTEXTUALIZAÇÃO DO TEMA (A APRESENTAÇÃO)

Os facilitadores iniciaram o primeiro momento do seminário com a explanação do conteúdo programático, utilizando-se, inicialmente, do texto de Jackson (2015), disposto como referência complementar, no qual a autora traz as definições de paradigmas e teoria e discorre sobre três exemplos de paradigmas.

O primeiro exemplo de paradigma trazido é o empírico. Dentro dele, o conhecimento se estabelece controlando as circunstâncias em torno das variáveis, para determinar sua relação. Este paradigma possui uma vertente positivista, ou seja, está enraizado em uma abordagem livre de valores, e encontra-se em desuso. Neste mesmo contexto, observa-se outra corrente, a pós-positivista (atualmente na enfermagem), que reconhece que a verdade absoluta não pode ser determinada, e é aplicável à pesquisa de enfermagem e à prática. (JACKSON, 2015).

Dando continuidade ao exposto pela autora, ela também traz a visão de um outro paradigma, o interpretativo, que examina um fenômeno através dos olhos de quem o vê ou vivencia, e contribui para a enfermagem holística. Neste sentido, ainda traz como exemplo a teoria da resiliência de Polk, que preocupa-se com os sentimentos e sensações humanas.

O terceiro paradigma trazido pela autora é o paradigma crítico, centrado nas lutas sociais, na dominação e instituições com a intenção de criar uma sociedade igualitária. Neste momento, foi trazido como exemplo a teoria feminista e suas implicações vivenciadas na área de enfermagem, que se trata de uma profissão formada majoritariamente por profissionais do sexo feminino.

Logo após essa explanação, foi lançada à turma uma questão: “o que é enfermagem?”. Neste momento, os mestrandos discorreram sobre os conceitos e contextualizações, vivências e experiências. Também foi questionado “o que vocês acreditavam ser enfermeira (o)?”, e, a partir desse momento, necessitou-se retirar todos os conhecimentos adquiridos durante os períodos de graduação, experiências profissionais e vivência no programa de pós-graduação para que os ouvintes, através de discussões, representassem a figura da enfermeira (o) através do senso comum.

Em seguida, foi passado um vídeo alusivo de vinte e dois minutos, disposto em Heróis da Humanidade, sobre a história de Florence Nightingale. Nesse momento, foi verbalizada a importância de Florence como enfermeira, além de como ela estava à frente do seu tempo e já demonstrava preocupação sobre o conhecimento específico da enfermagem e a denominação de seus fenômenos.

Ao que tange o processo do seminário, também foram trazidas questões relacionadas às evoluções dos conhecimentos científicos da enfermagem, através da divisão por fases do conhecimento da enfermagem, divididos em quatro estágios, sendo eles: 1ª fase – a contribuição de Florence Nightingale; 2ª fase – o domínio do fazer técnico; 3ª fase – o advento dos princípios científicos; e 4ª fase – a construção de teorias de enfermagem.

Neste contexto, os autores trazem que, na primeira fase, tendo como precursora Florence Nightingale, e através da primeira teoria de enfermagem (teoria ambientalista), o foco da investigação da enfermagem centrou-se em “o que fazer?”, e na segunda, tentando conquistar o domínio técnico, a enfermagem procurou definir “como fazer?” (GOMES et al., 2007).

Na terceira fase, a enfermagem empenhou-se em fundamentar suas ações. Para tanto, baseou-se em princípios científicos e investigou “por que fazer?”. Atualmente, dedica-se à pesquisa científica, na tentativa de construir uma resposta para a questão “qual o saber próprio da enfermagem?”. No entanto, cabe destacar que, no processo histórico, tais fases não se sucederam de forma linear, originando marcos. Na realidade, elas se sobrepuseram e ainda se sobrepõem. (GOMES et al., 2007).

O seminário transcorreu com a explanação sobre as teóricas da enfermagem e suas teorias, sendo elas: Hildegard Peplau – teoria das relações interpessoais, Dorothéa Orem – teoria do déficit do autocuidado, Martha Rogers – teoria humanística, Madeleine Leininger – teoria da enfermagem transcultural, Jean Watson – teoria do cuidado transpessoal, Betty Neuman – teoria de sistemas e Wanda Horta – processo de enfermagem.

Após este período, foi lançada mais uma questão disparadora para viabilizar as discussões entre os presentes em sala: “quais são os nossos instrumentos de trabalho?”. Diante das falas dos colegas, chegou-se ao denominador de que o principal instrumento de trabalho da enfermagem é o seu cuidado. Este cuidado reflete-se na atenção ao paciente, e não só pode como deve ir além das práticas assistências, voltando a atenção para suas necessidades como ser biológico, psíquico e social, para sua família e para seu bem-estar geral.

Quanto aos instrumentos inseridos nas práticas, observam-se inúmeros modelos que auxiliam na preconização de uma assistência eficaz. Neste momento do seminário, abordou-se sobre a NANDA-I, NIC, NOC, CISPE e CIPESC e sua utilização para a prática. Foram trazidos exemplares de livros para a visualização dos instrumentos pelos demais integrantes da turma. Vale salientar, que, neste momento, os livros mencionados anteriormente foram colocados no mural que estava sendo construído em sala.

Neste ponto do seminário, e após discorrer sobre os instrumentos e processos que norteiam a prática de enfermagem, foram lançadas mais duas perguntas-gatilho para os participantes, sendo elas: “o que é uma matriz disciplinar? A enfermagem possui matriz disciplinar?”. Levantaram-se inúmeras questões, e esta pergunta foi respondida através da discussão dialogada entre os facilitadores, mestrandos e docentes da turma, e a resposta será apresentada no próximo tópico.

4. A MATRIZ DISCIPLINAR POR THOMAS KUHN E A MATRIZ DISCIPLINAR DA ENFERMAGEM

Em seu posfácio em “A estrutura das evoluções científicas”, Kuhn (2000) não só sugere, mas realiza a mudança do termo paradigma e traz a definição da palavra como matriz disciplinar: “disciplinar” porque se refere a uma posse comum aos praticantes de uma disciplina particular; “matriz” porque é composta de elementos ordenados de várias espécies, cada um deles exigindo uma determinação mais pormenorizada.

Neste contexto, o autor ainda acrescenta quatro elementos para constituição desta matriz, que seriam: generalizações simbólicas (expressões aceitas e utilizadas pelo grupo, formais ou formalmente formalizáveis), crenças em modelos (fornecem analogias e/ou sua ontologia), valores (largamente partilhados, mesmo quando não aplicados de forma igual) e exemplares ou soluções de problemas concretos (que foram realizados no passado e servem para a pesquisa futura), sendo este último, talvez, o mais importante para o autor. (KUHN, 2000).

Diante do que foi abordado durante o processo de discussão e construção dessa matriz, e de acordo com o que Kuhn sugere como matriz disciplinar, chegou-se à conclusão que as teorias de enfermagem descrevem e explicam o cuidado de enfermagem, e ela se encaixa com os valores que foram partilhados pela classe. Os processos de enfermagem distinguem-se como uma forma sistemática para a prestação de cuidados, coincidindo com a generalização simbólica.

Já na PBE, busca-se definir um problema e a contextualização, através do embasamento científico, para aplicar à prática profissional, para tanto, considera-se como ponto da matriz os exemplares ou a busca de soluções para os problemas concretos da profissão. E por último, destacam-se os instrumentos utilizados na experiência hospitalar da enfermagem, atrelando estes aos modelos.

Figura 1 – A matriz disciplinar da enfermagem à luz de Thomas Kuhn. Natal, Rio Grande do Norte, 2022

A matriz disciplinar da enfermagem à luz de Thomas Kuhn. Natal, Rio Grande do Norte, 2022
Fonte: elaborada pelos autores.

Após a contextualização, a partir da imagem anterior, foi viabilizado um intervalo de 20 minutos para que os grupos selecionados montassem os cartazes que seriam utilizados como tijolos, ou seja, fazendo referência ao alicerce da enfermagem enquanto disciplina e profissão, utilizando-se dos elementos para construção desta matriz disciplinar.

No período destinado à síntese, foi levantada uma questão: “a enfermagem é uma ciência?”. Esta pergunta, inicialmente, foi levantada em uma das primeiras aulas da disciplina, e este questionamento foi trazido para o fechamento, justamente para fomentar as ideias sobre a enfermagem enquanto disciplina e profissão. Para fins de síntese, entendeu-se, através das discussões realizadas entre docentes, discentes e facilitadores, que a enfermagem é uma ciência e uma profissão em evolução, é uma disciplina profissional que possui áreas de conhecimento que derivam de outras disciplinas (medicina, nutrição, sociologia, filosofia e outras).

Entende-se, também, que a enfermagem é uma ciência aplicada ou prática, influenciada por várias escolas filosóficas de pensamento ou visões de mundo, incluindo a visão recebida (empirismo, positivismo e positivismo lógico), a visão percebida (humanismo, fenomenologia e construtivismo) e o pós-modernismo. A filosofia da enfermagem refere-se à visão(ões) de mundo da profissão e traz conhecimentos específicos da disciplina com foco no processo humano-ambiente-saúde, com articulação com teorias de enfermagem e origem na pesquisa de enfermagem. A filosofia da ciência da enfermagem estabelece o significado da ciência pelo exame dos conceitos, teorias e leis da enfermagem, na medida em que se relacionam à prática da enfermagem. (MCEWEN, 2009).

A epistemologia da enfermagem (formas de conhecimento em enfermagem) tem foco em quatro maneiras predominantes, ou “fundamentais”, de conhecimento: conhecimento empírico, conhecimento estético, conhecimento pessoal e conhecimento ético. Com o desenvolvimento da ciência da enfermagem, surgiu um debate quanto aos métodos de pesquisa a utilizar. Há uma tendência crescente ao “pluralismo metodológico” para uma melhor garantia de que os achados das pesquisas sejam aplicáveis à prática da enfermagem. (MCEWEN, 2009).

Quanto às limitações para a fomentar este relato e a construção do seminário, se dão pela escassez de publicações e estudos mais específicos do processo de construção desta matriz disciplinar da enfermagem no Brasil.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao que tange a experiência acadêmica em relatar a matriz de disciplina, considera-se que não foi um caminho fácil a ser construído. Salienta-se, ainda, neste processo, a conclusão de que a enfermagem, apesar de ser considerada uma nova ciência, necessita dos conhecimentos empíricos, estéticos, pessoais e éticos.

Neste contexto, a concepção da matriz disciplinar da enfermagem foi entendida diante da sugestão da mudança do termo paradigma para matriz disciplinar, realizado por Kuhn, e perante o que se tem hoje como instrumentos, processos e prática, além do entendimento da enfermagem enquanto ciência em ascensão/evolução.

Para tanto, cabe salientar que a matriz disciplinar da enfermagem não está declarada por meios diretos na literatura, além de que sua estrutura implica na somatização de várias correntes teóricas e filosóficas que dão base, fornecem instrumentos, guiam processos e práticas, ou seja, são os alicerces para as ferramentas de enfermagem e atuação profissional no Brasil.

No cenário atual, são necessárias futuras discussões a fim de fomentar uma base literária capaz de solidificar este processo relacionado à matriz disciplinar da profissão.

REFERÊNCIAS

BOAS, Milene Aparecida Aguiar Vilas et al. Análise crítica do potencial de utilização das nomenclaturas de enfermagem na atenção primária à saúde. Enfermagem em Foco, v. 10, n. 7, 2019.

GOMES, Vera Lúcia de Oliveira et al. Evolução do conhecimento científico na enfermagem: do cuidado popular à construção de teorias. Investigación y educación en enfermería, v. 25, n. 2, p. 108-115, 2007. Disponível em: http://aprendeenlinea.udea.edu.co/revistas/index.php/iee/article/view/ 2888/2447. Acesso em: 14 mar. 2023.

JACKSON, Jennifer Irene. Nursing paradigms and theories: a primer. 2015. Disponível em: https://sigma.nursingrepository.org/handle/10755/338888. Acesso em: 14 mar. 2023.

KUHN, Thomas Samuel. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 2000.

MCEWEN, Melanie. et al. Bases teóricas para enfermagem. São Paulo: Artmed, 2009.

MERINO, Maria de Fátima Garcia Lopes et al. Nursing theories in professional training and practice: perception of postgraduate nursing students. Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, v. 19, n.19, p. e3363, 2018.

NICHIATA, Lúcia Yasuko Izumi et al. Classificação Internacional das Práticas de Enfermagem em Saúde Coletiva-CIPESC®: instrumento pedagógico de investigação epidemiológica. Revista da Escola de Enfermagem da USP, v. 46, n.3, p. 766-771, 2012. Disponível em: https://www.scielo.br/j/reeusp/a/zgLyPbMxVqLCfhbhHhH4YJf/?format=pdf. Acesso em: 14 mar. 2023.

NUNES, Vilani Medeiros Araújo. Monitoria em semiologia e semiotécnica para a enfermagem: um relato de experiência. Revista de Enfermagem da UFSM, v. 2, n. 2, p. 464-471, 2012.

OLIVEIRA, Marcela Lino de; PAULA, Taís Romano de; FREITAS, João Batista de. Evolução histórica da assistência de enfermagem. ConScientiae Saúde, v. 6, n. 1, p. 127-136, 2007.

PEDROSA, Karilena Karlla Amorim et al. Enfermagem baseada em evidência: caracterização dos estudos no Brasil. Cogitare Enfermagem, v. 20, n. 4, 2015.

[1] Mestrando em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN. ORCID: 0000-0001-7237-1706. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/5526889363361625.

[2] Mestranda em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN. ORCID: 0000-0001-8220-2172. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/7249899826003915.

[3] Mestranda em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN. ORCID: 0000-0002-1807-4345. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/1984708294972835.

[4] Mestranda em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN. ORCID: 0000-0002-1724-6408. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/7556473431100732.

[5] Doutora em Enfermagem pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – USP. ORCID: 0000-0002-1491-3439. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/5190926575194616.

[6] Doutora em Enfermagem pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – USP. ORCID: 0000-0003-2833-9762. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/2068281775213576.

[7] Orientador. Doutor em enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. ORCID: 0000-0003-0303-409X. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/4740097927047538.

Enviado: 02 de Fevereiro, 2023.

Aprovado: 02 de Março, 2023.

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Hallyson Leno Lucas da Silva

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