RELATO DE CASO
TELES, Guilherme Cunha dos Santos [1], CASTRO, Ana Flávia de Oliveira [2], MATOS, Luis Carlos Vieira [3]
TELES, Guilherme Cunha dos Santos. CASTRO, Ana Flávia de Oliveira. MATOS, Luis Carlos Vieira. Infarto agudo do miocárdio em paciente com aneurisma de artéria coronária direita e fístula para o ventrículo direito: um relato de caso. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 08, Ed. 06, Vol. 01, pp. 143-149. Junho de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/aneurisma-de-arteria, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/aneurisma-de-arteria
RESUMO
As fístulas coronarianas são entidades raras em que há comunicação entre as artérias coronárias e câmaras cardíacas ou vasos sanguíneos. Apresentamos o caso de uma paciente feminina de 38 anos que foi diagnosticada com fístula coronariana de coronária direita com comunicação ao ventrículo direito e aneurisma desta artéria após sofrer Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) e realizar cateterismo cardíaco para angioplastia de resgate.
Palavras-chave: Fístula coronariana, Fístula de coronária direita, Fístula coronário-cavitária, Aneurisma coronariano.
INTRODUÇÃO
As Fístulas das Artérias Coronárias (FAC) são comunicações entre essas artérias e câmaras cardíacas ou vasos sanguíneos. São entidades raras que representam cerca de 0,2 a 0,4% das malformações cardíacas. [4]
A maioria dos pacientes não apresentam sintomas. No entanto, quando presentes, podem se manifestar com fadiga, dispneia, taquicardia e dor torácica. [5]
A etiologia é embrionária, derivada do folheto mesodérmico, e parece estar relacionada à persistência de espaços intertrabeculares em que o miocárdio é suprido na vida intrauterina. [5]
Neste relato, apresentaremos o caso de uma paciente com fístula da Artéria Coronária Direita (ACD) para o ventrículo direito que teve como complicação aneurisma de coronária direita e infarto do miocárdio.
APRESENTAÇÃO DO CASO
Paciente feminino, 38 anos, sem comorbidades. Iniciou dor torácica de característica anginosa e procurou a unidade de pronto atendimento 03 horas após. Na unidade, ao exame do aparelho cardiovascular, apresentava ritmo cardíaco regular em 2 tempos, bulhas normofonéticas sem sopros, PA 135/90 mmHg e FC 61 bpm; ausculta respiratória com murmúrio vesicular conservados, sem ruídos adventícios. O ECG inicial evidenciou supradesnivelamento do segmento ST em parede inferior (Imagem 1). Realizado trombólise com tenecteplase e posteriormente fora encaminhada ao Hospital de Base do DF por não ter preenchido critérios de reperfusão (sem melhora da dor torácica).
Logo após a admissão no hospital terciário, seguiu para cateterismo cardíaco visando angioplastia de resgate. O exame evidenciou ACD dominante, ocluída no terço distal imediatamente após grande aneurisma coronariano. Havia fístula de baixo débito do ponto aneurismático comunicando com o ventrículo direito. Demais coronárias normais, sem lesões obstrutivas. Procedido com a recanalização mecânica da ACD com cateter balão, seguido do implante de dois stents farmacológicos com sucesso e o resultado mostrava fluxo anterógrado completo (Classificação III do Thrombolysis In Myocardial Infarction Study Group – TIMI III).
Após o tratamento houve melhora da dor torácica e diminuição do supradesnivelamento do segmento ST em parede inferior (Apêndices 2 e 3).
Realizado ecocardiograma, um dia após o evento: Fração de Ejeção do Ventrículo Esquerdo (FEVE) 55%, acinesia do segmento basal da parede ínfero-septal, hipocinesia do segmento médio da parede ínfero-septal e dos segmentos médio e basal da parede inferior. A alta ocorreu 05 dias após o episódio inicial. A paciente retornou ao serviço para consulta ambulatorial em 60 dias bem clinicamente, sem dor torácica e sem restrição às atividades cotidianas (classe funcional I de acordo com a New York Heart Association – NYHA)
DISCUSSÃO
O caso em questão destaca o diagnóstico incidental de fístula da coronária direita comunicando com a cavidade do ventrículo direito associado a aneurisma da coronária direita, após o evento complicador de IAM.
As fístulas coronarianas são, principalmente, de etiologia congênita; mas podem ocorrer por causas infecciosa, traumática ou iatrogênica. [6] As FACs originam-se mais comumente da ACD (50%) e drenam mais frequentemente no ventrículo direito (41 %). [7]
O IAM é uma das complicações menos presentes em casos de FAC (3%).[8] Pode ocorrer devido a diminuição do fluxo sanguíneo coronário distal à fístula e tem sido documentado em pacientes com fístulas coronarianas sem evidência de aterosclerose coronariana, conforme demonstrado neste caso. [9]
O aneurisma associado a fístula da artéria coronária é encontrado em 17% dos casos e pode ser formado a partir da destruição crônica da camada média de fibras elásticas na parede interna do vaso sanguíneo, ocasionado pelo shunt esquerda-direita. [10]
Os pacientes podem permanecer assintomáticos por anos, sendo diagnosticados após uma complicação, como no caso relatado. [11]As manifestações clínicas, quando presentes, se revelam com sopros cardíacos, arritmias, IAM e síncope. Insuficiência cardíaca por sobrecarga de volume e hipertensão arterial pulmonar também podem ocorrer. [12]
O tratamento da fístula pode ser conservador, cirúrgico ou de forma percutânea.[13]A intervenção transcatéter é adotada como padrão por ser minimamente invasiva e ter excelentes resultados. Pode-se utilizar a embolização com coils ou a interposição de stent na lesão. A cirurgia é recomendada quando não é possível o fechamento por cateter (presença de calcificação acentuada, tortuosidade) e/ou quando há necessidade da realização de outra intervenção cirúrgica. Ligadura externa da fístula, patch interno ou fechamento por sutura do orifício de comunicação são formas de se realizar o procedimento cirúrgico. [14] O prognóstico é bom e a expectativa de vida é a mesma da população em geral, com taxas de recorrência de 9 a 19% no fechamento percutâneo e 25% em caso de ligadura cirúrgica. [15]
O caso clínico em questão aborda uma condição clínica rara, com poucos casos relatados na literatura médica: a associação de fístula e aneurisma coronarianos, complicados com IAM. Neste relato, além de apresentar uma ocorrência incomum, pudemos descrever o sucesso do tratamento executado, bem como a estabilidade clínica após 60 dias do ocorrido.
REFERÊNCIAS
[4] PARRA-BRAVO, José Rafael; BEIRANA-PALENCIA, Luisa G. Fístula de artéria coronária derecha drenando al ventrículo derecho: Hallazgos ecocardiográficos y manejo intervencionista. Reporte de un caso. Archivos de cardiología de México, v. 73, n. 3, pp. 205-211, 2003.
[5] ABELIN, Anibal Pereira et al. Fístula coronária. Revista Brasileira de Cardiologia Invasiva, v. 16, n. 2, pp. 242-243, 2008.
[6] MENDONÇA, Roberto Moreno et al. Fístula coronariana para ventrículo esquerdo: diagnóstico por tomografia computadorizada. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 97, n. 4, p. e82-e85, 2011.
[7] WILCOX, W. Dean et al. Localized occurrence of congenital coronary artery fistula in the Southeast United States. The American Journal of Cardiology, v. 57, n. 4, pp. 361-363, 1986.
[8] JHA, Neerod Kumar et al. Congenital aneurysmal right coronary artery with a fistula to the left atrium in an adult. Journal of Cardiothoracic Surgery, v. 14, n. 33, pp. 1-5, 2019
[9] FORTUNATO JÚNIOR, Jeronimo Antonio et al. Videotoracoscopia para fechamento de fístula coronário-pulmonar: relato de caso. Brazilian Journal of Cardiovascular Surgery, v. 25, n. 1, pp. 109-111, 2010.
[10] MORI, Atsuo et al. Coronary Artery Fistula Aneurysm: Pathological Analysis After Surgery. Cureus, v. 13, n. 5, pp. 1-11, 2021.
[11] ATA, Yusuf et al. Coronary arteriovenous fistulas in the adults: natural history and management strategies. Journal of Cardiothoracic Surgery, v. 4, n. 62, pp. 1-5, 2009.
[12] GOWDA, Ramesh M.; VASAVADA, Balendu C.; KHAN, Ijaz A. Coronary artery fistulas: clinical and therapeutic considerations. International Journal of Cardiology, v. 107, n. 1, pp. 7-10, 2006.
[13] FEITOSA, Israel Nilton de Almeida et al. Fístula Coronária Gigante da Artéria Circunflexa para o Seio Coronariano: Diagnóstico Inicial por Ecocardiografia. ABC imagem Cardiovascular, v. 33, n. 4, pp. 1-4, 2020.
[14] REDDY, Gautam et al. Coronary artery fistulae. Circulation: Cardiovascular Interventions, v. 8, n. 11, p. e003062, 2015.
[15] BUCCHERI, Dario et al. Coronary artery fistulae: anatomy, diagnosis and management strategies. Heart, Lung and Circulation, v. 27, n. 8, pp. 940-951, 2018.
APÊNDICES
Imagem 1 – ECG de admissão evidenciando supradesnivelamento do segmento ST em DII, DIII e a VF
Imagem 2 – Angiografia coronariana evidenciando coronária direita ocluída no seu terço médio, presença de aneurisma coronariano e fístula da coronária para o ventrículo direito
Imagem 3 – Angiografia coronariana evidenciando a coronária direita após tratamento de angioplastia com stent farmacológico
[1] Pós-graduado em Clínica Médica, Graduado em Medicina. ORCID: 0009-0006-5677-5341. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/7003497155009631.
[2] Pós-graduado em Clínica Médica, Graduado em Medicina. ORCID: 0000-0002-4018-9210. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8063863838566248.
[3] Orientador. ORCID: 0000-0001-9835-1906.
Enviado: 22 março de 2023.
Aprovado: 24 abril de 2023.