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Livros Acadêmicos

2. Ônus da prova nas infrações e nas sanções administrativas: contratações diretas da Nº lei 14.133/2021

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Jerffleson Luiz Pereira [1]

DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/livros/1766

Introdução

A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, nº 14.133, de 1º de abril de 2021 (NLLCA) (BRASIL, 2021), unificou e simplificou os processos licitatórios mais utilizados pela Administração Pública para aquisição de bens e serviços. Todavia, teve um desempenho abaixo do esperado em alguns pontos.

A Advocacia-Geral da União (AGU), conforme Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, tem por atribuição, entre outras funções, realizar examine prévio e conclusivo sobre texto de editais e seus anexos; sobre processo de inexigibilidade; e sobre dispensa de licitação. Em razão desses encargos, a AGU disponibiliza diversos modelos, em conformidade com o Novo Diploma, para serem utilizados pelos órgãos assistidos.

No que tange ao processo de responsabilidade administrativa, a lei determinou à AGU atuar, compulsoriamente, apenas na sanção de declaração de inidoneidade para licitar ou contratar. Em relação à sanção de impedimento de licitar e contratar, o legislador ordenou criar uma comissão composta por servidores do órgão, que for prejudicado pela inexecução contratual, para analisar e emitir juízo de valor nos processos sob sua responsabilidade.  No entanto, em relação à sanção de multa, pouco falou e à sanção de advertência, ficou em silêncio. Observa-se ainda,  concernente ao processo de apuração de responsabilidade, a lei apenas editou as diretrizes basilares do processo. Logo, os membros do órgão/comissão devem se socorrer de todas as leis e normas no ordenamento jurídico sobre o tema e os melhores métodos de hermenêutica.

Mister se faz destacar que este estudo versa sobre contratação direta, porém as premissas apresentadas nos capítulos abaixo, podem, mutatis mutandis, ser utilizadas nos contratos oriundos de outras modalidades de contratação da NLLCA, bem como não foram analisadas as questões recursais, em razão da delimitação do tema.

Infrações e sanções administrativas nas contratações diretas

A NLLCA, nos termos do rol exemplificativo do art. 74, prevê a contratação direta quando não for viável a competição por meio de licitação. Outras hipóteses de contratação direta são para os casos de obras e serviços de engenharia ou de serviços de manutenção de veículos automotores, no valor de até R$ 1000.000,00 (cem mil reais) ou prestação de quaisquer outros serviços ou compras no valor de até R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), nos termos dos incisos I e II do art. 75 da mesma lei (BRASIL, 2021).

A Advocacia-Geral da União (2023), por meio de seu site eletrônico, disponibiliza os modelos de Aviso de Dispensa Eletrônica, de Editais e de Contratos que devem ser utilizados quando a União for a contratante nas hipóteses acima. Estes modelos sujeitam às contratadasas mesmas infrações dos incisos I ao XI, do art. 155 e sanções trazidas pelos incisos I ao IV, do art. 156 da Nova Lei, quando houver inadimplemento das cláusulas do Aviso de Dispensa ou do Termo de justificativa de inexigibilidade de licitação (TJIL) seus anexos. As cláusulas nº 10.5 nos modelos de contrato e nº 8.1 do Aviso também conferem aos contratados às garantias do devido processo legal, nos termos da NLLCA e da Lei nº 9.784/99, in verbis:

10.5 A aplicação das sanções realizar-se-á em processo administrativo que assegure o contraditório e a ampla defesa ao Contratado, observando-se o procedimento previsto no caput e parágrafos do art. 158 da Lei nº 14.133, de 2021, para as penalidades de impedimento de licitar e contratar e de declaração de inidoneidade para licitar ou contratar (BRASIL, 2023)

8.10.     A aplicação de qualquer das penalidades previstas realizar-se-á em processo administrativo que assegurará o contraditório e a ampla defesa ao fornecedor/adjudicatário, observando-se o procedimento previsto na Lei nº 14.133, de 2021, e subsidiariamente na Lei nº 9.784, de 1999 (BRASIL, 2023a).

À vista disso, percebe-se que a AGU elaborou seus modelos em estrita uniformidade com os preceitos da NLLCA e da Lei nº 9.784/99. Assim, houve o afastamento da Administração Pública do princípio do venire contra factum proprium e prestigiou a previsibilidade, a estabilidade, a não surpresa nos atos públicos, ou seja, valorizou a segurança jurídica que é, para Fernanda Marinela (2011), um dos mais importantes princípios gerais do direito no ordenamento jurídico.

Aplicação subsidiária da lei N º 9.784/99 na NLLCA

O Novo Diploma apresentou avanços significativos na questão da responsabilização das contratadas que não respeitarem as cláusulas contratuais pactuadas com a Administração. A NLLCA tipificou as condutas e vinculou as modalidades de sanções. Trouxe ainda diretrizes básicas na condução do processo de responsabilidade e impõem a todos os entes federativos estas padronizações. Uma das maiores inovações trazidas pela lei, na visão de Alexandre Freitas (2021), foi a positivação das práticas do Tribunal de Contas da União (TCU) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), quanto à desconsideração da personalidade jurídica da contratada (empresa), em sede administrativa.

No que tange ao rito processual sancionador, advindo de inexecução contratual, o legislador determinou a criação de uma comissão processante, cuja atribuição é conduzir o processo de responsabilidade, quando houver infração que a sanção cominada seja de restrições de direitos, quais sejam: impedimento de licitar e contratar com administração e declaração de inidoneidade para licitar ou contratar. Para estas penalidades, atribui-se à comissão a responsabilidade de notificar a contratada; avaliar os fatos e as circunstâncias; conceder prazo para apresentação de provas; indeferi-las quando for o caso; conceder prazo para alegações finais; e, dependendo das normas internas do órgão, até proferir a decisão. Para isso, a comissão utilizar-se-á de todo o ordenamento jurídico, conforme se pode ler dos ensinamentos de Heinen (2021, p. 761, grifo nosso): “A Comissão Processante deverá proferir a decisão fundamentada, enfrentando as alegações das partes, considerando as provas produzidas e cotejando tudo isso com a legislação aplicável ao tema. Poderá aplicar uma pena ou absolver a empresa.”

Por outro lado, a NLLCA deixou a desejar no que concerne às regras para aplicação das sanções de advertência e de multa (BRASIL, 2021). Numa leitura desavisada, aparenta que a sanção de advertência pode ser aplicada ex officio e de multa sem necessidade de constituir qualquer comissão para esse fim. Se fosse realmente assim, revelar-se-ia uma forte contradição com as garantias elencadas nos incisos LV do art. 5º da Constituição Federal do Brasil de 1988 (BRASIL, 1988).  José Niebuhr et al. (2021, p. 240), prelecionando sobre o tema, afirma que o texto da NLLCA trouxe celeumas no processo de apuração e aplicação de penalidade, pois, para ele: “A criação de processos distintos traz mais problemas do que se pode ver, sobretudo quando relacionada com a forma fluida e imprecisa das especificações entre conduta e penalidade.”

Diante disso, em nome do princípio da segurança jurídica, da transparência e da eficiência, é de bom alvitre criada uma comissão permanente e editar normas de procedimentais para conduzir todos os processos de responsabilidade no órgão, nos termos do art. 30 da LINDB: “As autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas, inclusive por meio de regulamentos, súmulas administrativas e respostas a consultas” (BRASIL, 1999).

Apesar de existirem algumas normas procedimentais aplicáveis às sanções dos incisos III e IV do art. 156, do Novo Diploma, essa lei não contempla todos os atos necessários para o exercício dos direitos e garantias do devido processo legal e ampla defesa da contratada (BRASIL, 2021). Desse modo, a comissão precisa buscar auxílio nos mandamentos do art. 69 da Lei nº 9.784/99, que diz: “Os processos administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei.” (BRASIL, 1999, grifo nosso).  O Douto professor Victor Aguiar Jardim de Amorim (2021) assevera que a Nova Lei de Licitação, no geral, foi omissa no que se refere às fases processuais (postulatória, instrutória, decisória, recursal e executória), em suas palavras:

Em relação à intimação, dada à omissão da Lei nº 14.133/2021, aplica-se subsidiariamente o disposto no art. 26 da Lei nº 9.784/1999. Da mesma forma, pugnamos pela aplicação das regras atinentes à instrução processual e à produção de provas contidas na referida Lei do Processo Administrativo federal, salvo quando houver previsão específica na NL (AMORIM, 2021, p. 279, grifo nosso).

Observa-se ainda que a normatização simplificada de processo administrativo, com base no princípio do formalismo moderado, não se confunde com omissão normativa. O STJ, assim, não reconheceu o cerceamento do direito de defesa do particular, quando não lhe foi dado a oportunidade de apresentar alegações finais, nos termos do art. 44 da Lei nº 9.784/99 (BRASIL, 1999), visto que a norma específica do órgão não previa esta faculdade. Para o Tribunal, a otimização do processo, com respaldo em leis e normas próprias, não pode ser considerado lacuna normativa:

      1. A Lei n. 9.784/1999 se aplica de forma subsidiária aos processos administrativos em geral, na hipótese de haver lacuna normativa. 3. A falta de previsão na Resolução ANTT n. 442/2004 (base na Lei n.º 8.987/1995 e Lei n.º 10.233/2001) para oferecimento de alegações finais não acarreta omissão normativa, mas simplificação do processo administrativo, razão pela qual não há cerceamento de defesa em sua não oportunização. (BRASIL, 2022, grifo nosso).

Em complemento aos ensinamentos acima, para a doutrina e para a jurisprudência, as garantias processuais penais devem ser aplicadas, em grau máximo, sem mitigações ou flexibilizações, nos processos administrativos sancionadores, porque entre ambos os processos há estreita similaridade. Zardo (2014) afirma que o conceito dominante de crime pode ser vislumbrado na persecução administrativa, uma vez que neste processo é encontrado o fato típico, o ilícito e a culpabilidade. Nesse aspecto, as garantias e os princípios típicos do Direito Penal/Processo Penal devem ser aplicados na persecução das infrações administrativas, já que se busca, em ambos, a apuração do ilícito e a aplicação dos meios repressivos e retributivos pelo Estado (AMORIM, 2021). O Tribunal Regional Federal da Primeira Região exarou sentença em concorda com a visão dos doutrinadores, vejamos:

4. No exercício da sua atividade sancionatória, não pode a Administração Pública utilizar, sem qualquer fundamentação, os critérios mais desvantajosos para o acusado. A jurisprudência, a propósito, tem assentado a necessidade de observância dos princípios do processo penal em tais casos, como o do “in dubio pro reo” (BRASIL, 2018, grifo nosso).

Isto posto, infere-se que são aplicados nos processos administrativos os institutos próprios do direito penal e processo penal, tais como: verdade material; presunção de inocência; proibição de aplicação dos efeitos da revelia; in dubio pro reo; irretroatividade de leis mais severas; e, quiçá, a reformatio in pejus[2] Em perspectiva congruente, em 2017, o STJ afirmou que todas as garantias constitucionais do direito penal são aplicadas no administrativo, assim:

A despeito da divergência existente, vem prevalecendo na doutrina e na jurisprudência a posição de que o grau de proximidade entre o direito administrativo sancionador e o direito penal autoriza que seja estendida àquele todas as garantias inerentes a este último, dentre as quais a retroatividade a lei mais benigna prevista no art. 5º, XL, da Constituição da República (BRASIL, 2017, grifo nosso).

Para Marçal, tanto no Brasil quanto no exterior, o regime jurídico do direito penal tem a mesma equivalência do direito administrativo sancionador, ipsis litteris seus ensinamentos: “A doutrina nacional e estrangeira concorda, em termos pacíficos, que as penalidades administrativas apresentam configuração similar às de natureza penal, sujeitando-se a regime jurídico senão idêntico, ao menos semelhante” (JUSTEN FILHO, 2016, p. 1.338).

Ônus da prova no processo administrativo

Inicialmente cabe registar, de modo geral, que a questão sobre o ônus da prova segue os mesmos fundamentos do direito civil, conforme se observa das lições do Artigo sobre o Ônus da Prova de Reis e Melo (2023): “O direito à prova no processo administrativo é consagrado no ordenamento jurídico pátrio, seguindo as mesmas regras civis.” Neste sentido, a jurisprudência do TCU reconhece a aplicação, concomitante, da teoria geral e da distribuição dinâmica do ônus da prova, previstos nos incisos e nos parágrafos do art. 373, do Código de Processo Civil (BRASIL, 2015), nos processos administrativos, porém essa só pode ser utilizada quando aquela for insuficiente ou ineficaz na formação da convicção do julgador, assim:

A teoria não descarta por completo as regras tradicionais de distribuição do ônus probatório; ao contrário, mantém nelas a base probatória processual. A aplicação das cargas probatórias dinâmicas é subsidiária, devendo ser aplicada naqueles casos em que a consumação das regras básicas traz prejuízos à ampla defesa do cidadão perante o processo administrativo (BRASIL, 2019).

Dessa forma, considerando a aplicação subsidiaria do CPC ao processo administrativo em geral, não vislumbro irregularidade na fundamentação e na condução processual da formação do débito em causa. (BRASIL, 2020).

Observa-se ainda que as provas sobre inexecução contratual incidem sobre as alegações de fatos pretéritos – principais (inadimplementos) ou secundários (consequências/gravidades) – os quais resultaram na criação, na modificação ou na extinção de obrigação contratual ou extracontratual para as partes. Desse modo, pela apresentação das provas, que podem ser diretas (por si só demonstra o fato) e/ou indiretas (demonstra um fato do qual se deduz o fato que se quer provar), cria-se o juízo de certeza para comissão processante ou para o julgador sobre os acontecimentos à luz da lei e do contrato.

Em regra, na perspectiva subjetiva da prova, os fatos arguidos devem ser provados pelas partes que os alegaram no curso do processo, competindo-lhes o ônus probante. Cabe registrar que o ônus probatório não se confunde com uma obrigação, visto que para esse caso, há sanção pelo descumprimento e para aquele, apenas consequência em razão da inércia de um encargo processual.

Dito isso, compete à comissão, conforme se observa no art. 158 da NLLCA (BRASIL, 2021) e no art. 36 da Lei nº 9.784/99 (BRASIL, 1999), provar o inadimplemento e, por outro lado, a contratada apresentar as justificativas (caso fortuito, força maior, fatos de terceiros, atos da própria administração etc.) e as respectivas provas ou indicar quais provas que pretende produzir até 15 dias após da intimação. A NLLCA apenas trouxe os direitos já previstos no art. 38 da Lei nº 9.784/99: “O interessado poderá, na fase instrutória e antes da tomada da decisão, juntar documentos e pareceres, requerer diligências e perícias, bem como aduzir alegações referentes à matéria objeto do processo” (BRASIL, 1999).

Dá-se que a comissão não é obrigada aceitar todas as provas apresentadas ou solicitadas pela contratada, visto que no §3º, do art. 158 da NLLCA (BRASIL, 2021) e §2º, do art. 38 da Lei nº 9.784/99 (BRASIL, 1999), proíbem a produção de provas ilegais, impertinentes, intempestivas, protelatórias e desnecessárias. Juntam-se a essas, as vedações do art. 374 do CPC (provar fatos notórios; afirmados por uma parte e confessados pela parte contrária; admitidos no processo como incontroversos; em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade) (BRASIL, 2015).

Veda-se ainda, em caso de dúvida sobre as provas dos fatos, aplicar a presunção de veracidade e legalidade dos atos do Poder Público como fator principal da decisão do julgador. Mesmo que exista o reconhecido pacífico, na doutrina e na jurisprudência, a respeito da importância destes princípios, eles não podem sobrepor às garantias fundamentais do contratado, conforme se ler no trecho do artigo do juiz Federal Adriano Santos:

A presunção de legitimidade do ato administrativo revela-se necessária para a salvaguarda do interesse público. Não há interesse público, no entanto, nas hipóteses de violação a garantias constitucionais. Logo, a presunção de legitimidade do ato administrativo não pode subsistir quando for incompatível com o exercício do direito de defesa dos administrados (SANTOS, 2015, grifo nosso).

Deste modo, utilizando a mesma lógica e guardadas as devidas diferenças, não se pode aplicar a inversão do ônus da prova, em razão do reconhecimento da extensão das garantias constitucionais do direito penal nos processos administrativos. Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar (2016) afirmam que há incompatibilidade na aplicação das regras sobre ônus da prova do CPC nos processos penais, assim: 

O Novo CPC fortalece os poderes do juiz, outorgando-lhe maior ativismo para iniciativa probatória, o que soa incompatível com os princípios processuais penais que delineiam um sistema de garantias. Daí que, no ponto, as novas regras do CPC não devem ser aplicadas ao processo penal, salvo se tiver o fito de assegurar as garantias individuais fundamentais do acusado (favor rei) (TÁVORA e ALENCAR, 2016, p. 1.056).

Em igual tese, Amorim (2021) defende que a verdade material, que é instituto do processo penal, seja aplicada ao lado da verdade formal. Em suas palavras: “Em atenção ao disposto no art. 5º, LV, da CRFB, por concernir atividade administrativa sancionatória, sempre se deverá observar o devido processo legal formal e substantivo.” (AMORIM, 2021, p. 278).

Assim sendo, em caso de dúvida sobre os fatos e provas trazidas aos autos, cabe à Administração complementar as provas de ofício, nos termos do art. 29 da Lei nº 9.784/99 (BRASIL, 1999) ou aplicar o in dubio pro reo do artigo 5º, inciso LVII da CRFB/88 (BRASIL, 1988).

Conclusão 

Destarte, conclui-se que a NLLCA e a AGU simplificaram e uniformizaram as infrações e sanções cabíveis nos processos de responsabilidade oriundos de inexecução contratual, como também possibilitaram à Administração realizar a desconsideração da personalidade jurídica da contratada, quando essa agir com abuso de direito para encobrir ou dissimular atos ilícitos praticados no processo licitatório, porém a lei foi omissa no que diz respeito à sanção de advertência e multa, da mesma maneira não foi clara quanto aos aspectos dos procedimentos para aplicação das sanções. Por esse motivo, a comissão processante deve aplicar não só, subsidiariamente, Lei nº 9.784/99 (BRASIL, 1999), como também todo arcabouço jurídico que versão sobre o tema.

No aspecto do ônus da prova, constata-se que a comissão não pode aceitar diversos tipos de provas nem aplicar procedimentos próprios do direito/processo civil que restrinjam, de alguma forma, as garantias e os direitos constitucionais do contratado, previsto no art. 5º da CRFB/88 (BRASIL, 1988). Logo, a verdade formal; a presunção de veracidade e legalidade dos atos administrativos; a aplicação dos efeitos da revelia; o in dubio pro societate; a retroatividade de leis mais severas, a inversão do ônus da prova em desfavor do contratado; cobrança de taxas processuais; efeito apenas devolutivo do recurso; e outros são inadmissíveis nos processos para apuração de responsabilidade administrativa.

À vista disso, em nome da segurança jurídica, da transparência e da eficiência, é recomendado que os órgãos com grande fluxo de processos licitatórios e contratos pactuados anualmente, como são os casos, e.g, dos Centros de Intendência da Marinha do Brasil, editem normas internas pautadas nos apontamentos alhures e nomeie comissões permanentes para apreciar e julgar os casos de inexecuções contratuais dos seus respectivos órgãos públicos.

Por último, não se pode olvidar que o texto utilizou como referência à contratação direta da Lei nº 14.133/2021 (BRASIL, 2021), contudo, pela densidade e riqueza demonstradas, as premissas gerais deste estudo podem ser utilizadas nas outras modalidades de contratação que usem as leis citadas e os modelos da AGU.

Referências

AMORIM, Victor Aguiar Jardim de. Licitações e contratos administrativos: teoria e jurisprudência. 4ª Ed. Brasília, DF: Senado Federal, Coordenação de Edições Técnicas, 2021.

BRASIL. Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021. Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Brasília. DF: Presidência da República, 2021. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm. Acesso em: 10 fev. 2023.

BRASIL. Constituição de República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 08 fev. 2023

BRASIL.  Decreto-Lei nº 4.657, de 4 DE setembro de 1942. Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro.  Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del4657compilado.htm. Acesso em: 08 fev. 2023

BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Brasília, DF: Presidência da República, 1999. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 10 fev. 2023

BRASIL. Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999. Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. Brasília, DF: Presidência da República, 1999. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9784.htm. Acesso em: 10 fev. 2023.

BRASIL. Advocacia-Geral da União. Modelos de Licitações e Contratos. Advocacia-Geral da União, 2023. Disponível em: https://www.gov.br/agu/pt-br/composicao/cgu/cgu/modelos/licitacoesecontratos. Acesso em: 11 fev. 2023.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (STJ). Recurso Especial: 1967182 PR 2021/0324129-6, Relator: Ministra Regina Helena Costa, Data de Publicação: DJ 01/08/2022. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/1597617748/decisao-monocratica-1597617774. Acesso em:  11 fev. 2023

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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (STJ) Recurso Especial: 1605661 MG 2016/0148117-8, Relator: Ministro Benedito Gonçalves, Data de Publicação: DJ 25/05/2017. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/stj/464527305/decisao-monocratica-464527323. Acesso em:  11 fev. 2023

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Tomada de contas especial (TCE): 00012920151, Relator: Benjamin Zymler, Data de Julgamento: 14/04/2020, Primeira Câmara. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tcu/835294829/inteiro-teor-835294849. Acesso em: 13 fev. 2023.

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Tomada de Contas Especial (TCE): 04679420123, Relator: Aroldo Cedraz, Data de Julgamento: 02/07/2019, Segunda Câmara. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tcu/729283899/relatorio-729283971. Acesso em: 13 fev. 2023.

FREITAS, Alexandre Mattos de, Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos [Livro Eletrônico]. Comentários à Lei nº 14.133/2021 [et al] 1. Ed. Brasília. Ed. Dos Autores, 2021.

HEINEN, Juliano. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 1ª Ed. Salvador: JusPODIVM, 2021.

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 17ª Ed. Ver., atual. e Ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.

MARINELA, Fernanda.  Direito administrativo. 4ª Ed. Niterói: Impetus, 2011.

NIEBUHR, José de Menezes. et al. Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 2ª Ed. Curitiba: Zênite, 2021.

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SANTOS, Adriano Vitalino dos. A prova diabólica e sua influência sobre a presunção de legitimidade do ato administrativo. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 67, ago. 2015. Disponível em: https://revistadoutrina.trf4.jus.br/index.htm?https://revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao067/Adriano_dosSantos.html. Acesso em: 13 fev. 2023.

TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 11ª Ed. Revista Ampliada e Atualizada. Salvador: JusPODIVM, 2016.

ZARDO, Francisco. Infrações e sanções em licitações e contratos administrativos. 1ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. 

[1] Especialista em Direito Administrativo e Licitações. ORCID: 0000-0002-0993-5094. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8675348541593860.

[2] A doutrina e jurisprudência são unanimes no reconhecimento da possibilidade de se agrava a sanção em grau de recurso, nos termos do parágrafo único, do art. 64, da Lei nº 9.784/99: “O órgão competente para decidir o recurso poderá confirmar, modificar, anular ou revogar, total ou parcialmente, a decisão recorrida, se a matéria for de sua competência. Parágrafo único. Se da aplicação do disposto neste artigo puder decorrer gravame à situação do recorrente, este deverá ser cientificado para que formule suas alegações antes da decisão.” Todavia, é perceptível que as garantias penas estão, progressivamente, sendo aplicadas nos processos administrativos. Logo, é possível, que a reformatio in pejus faça parte das garantias das contratadas, em processos administrativos sancionadores, em futuro próximo.

Jerffleson Luiz Pereira

Jerffleson Luiz Pereira

Especialista em Direito Administrativo e Licitações. ORCID: 0000-0002-0993-5094. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8675348541593860.

Uma resposta

  1. Agradeço ao meu bom Deus, que me concede saúde; à minha ama Michele, por reconhecer os meus esforços e incentivar-me no aperfeiçoamento profissional; e aos meus campanhas da Divisão de Obtenção do Centro de Intendência da Marinha em São Pedro da Aldeia/RJ: SO Trajano, SO Severo, SO Silveira, 2ºSG Lenimberg e 2ºSG Pasquali , os quais são meus melhores críticos e inspiradores dos meus trabalhos acadêmicos.

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