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Proteção à infância frente a situações de violência sexual

RC: 142454
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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/protecao-a-infancia

CONTEÚDO

REVISÃO INTEGRATIVA

BERNARDES, Marina Moura [1]

BERNARDES, Marina Moura. Proteção à infância frente a situações de violência sexual.  Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 08, Ed. 03, Vol. 03, pp. 154-167. Março de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/protecao-a-infancia, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/protecao-a-infancia

RESUMO 

Observando o cenário atual, acerca dos desafios relacionados à salvaguarda da criança, visando manter a integridade do menor frente a situações de abuso sexual, percebe-se que, no Brasil, esse é um problema recorrente, cometido, sobretudo, por pessoas da própria família ou ocultado por esses. Assim sendo, esta pesquisa visa abordar, com base em estudos realizados sobre essa temática, a proteção do menor em face de salvaguarda em decorrência de violência sexual praticada por ou com a conivência de genitores ou responsáveis, tendo como propósito trazer o seguinte questionamento: como garantir a proteção do menor, vítima de violência sexual praticada por um parente, considerando todos os seus direitos e sua salvaguarda? O objetivo deste artigo é gerar uma reflexão acerca da importância da proteção da infância perante esses casos. A metodologia utilizada foi uma revisão integrativa a partir de buscas nas bases de dados eletrônicos Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scielo e Google Acadêmico, entre os anos de 2012 e 2022. Como resultado, pode-se estabelecer que a demora durante o desenvolvimento do processo, que se inicia na notificação do caso e vai até o depoimento judicial e à aplicação das penalidades cabíveis, pode acarretar, para a vítima, além da falta de proteção necessária, danos físicos e psicológicos. Pode-se observar, também, com base nos estudos analisados, que os trâmites de salvaguarda à criança, conforme previstos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), não são contínuos, o que se caracteriza como uma contrariedade para a justiça brasileira. A conclusão a que se chegou é que a proteção na infância é uma prioridade constitucionalmente estabelecida, no entanto, esse processo ainda não é efetivamente eficaz. Assim sendo, há uma necessidade de políticas públicas consistentes que facilitem e acelerem a salvaguarda dessa criança, protegendo-a na convivência com o genitor agressor.

Palavras-chave: Direito processual penal, Direito de família, Criança, Abuso sexual, Salvaguarda.

1. INTRODUÇÃO 

A proteção da infância é, no Brasil, uma prioridade constitucionalmente estabelecida. Os direitos das crianças são defendidos através de leis instituídas na Constituição Federal (BRASIL, 1988), no ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) e no Código Penal (BRASIL, 1940), garantindo proteção contra abuso e exploração sexual infantil.

De acordo com Estatuto da Criança e do Adolescente, através da lei n.º 8.069, de 13 de julho de 1990, define-se como criança aquelas que possuem a faixa etária até doze anos incompletos, e adolescentes, aquelas que se encontram entre doze e dezoito anos (BRASIL, 1990). Para a realização desta pesquisa, será utilizado o recorte entre 0 e 12 anos.

Sendo assim, tendo em vista os desafios relacionados à proteção da criança, e visando manter a integridade do menor frente a situações de abuso sexual, o que, no País, de acordo com dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), é um problema recorrente, cometido, sobretudo, por pessoas da própria família ou ocultado por esses (BRASIL, 2020), esta pesquisa visa abordar a proteção do menor como direito constitucional estabelecido, enfatizando o seguinte questionamento: como garantir a proteção do menor, vítima de violência sexual praticada por um parente, considerando todos os seus direitos e sua salvaguarda?

O princípio da proteção integral, de acordo com Vicinguera (2019), é um paradigma que compreende a infância e a adolescência no Brasil, consistindo na proteção dos direitos da criança e do adolescente através de corresponsabilidade entre sociedade, família e Estado, por intervenção de políticas públicas determinadas para resguardar a totalidade desses direitos.

Entretanto, é de fundamental importância ressaltar que, geralmente, esses casos de violência acontecem no ambiente intrafamiliar. Segundo Walteman (2015), essa é uma realidade que ocorre em diversos países, independente da classe social, e, ainda, o incesto pode acontecer em até 10% das famílias, sendo praticado, principalmente, pelos genitores ou por alguma pessoa que faça parte do convívio da criança, pessoa essa que, em geral, é detentora de sua confiança e carisma.

Essa pesquisa tem como principal proposta abordar, com base em estudos realizados sobre essa temática, a proteção do menor e sua salvaguarda em decorrência de violência sexual praticada por ou com a conivência de genitores ou responsáveis. Entretanto, apesar desse assunto estar em pauta na atualidade, e haver uma grande corrente no enfrentamento à violência sexual sofrida por menores, ainda há muito a progredir, principalmente no que tange ao acompanhamento da vítima e das famílias após o período de investigação. Dessa forma, este estudo é relevante, pois contribui de forma teórica e prática para uma maior conscientização no que tange a violação de direitos da infância, incentivando ações efetivas que auxiliem no atendimento e na rede de proteção ao menor vítima de violência sexual.

Em vista disso, a metodologia utilizada foi uma revisão integrativa a partir de buscas nas bases de dados eletrônicos Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), Scielo e Google Acadêmico, entre os anos de 2012 e 2022. Foram analisados e selecionados estudos de casos publicados através de artigos científicos, livros, manuais e diretrizes. Os critérios de aceitação foram estudos de casos correlacionados a crianças de 0 a 12 anos, vítimas de abuso sexual praticado por ou com a conivência de genitores ou responsáveis, com foco nas ações tomadas para garantir a salvaguarda dessa criança. Já como critérios de exclusão, foram adotados os seguintes preceitos: estudos sobre outras categorias de violência infantil e casos que compreendiam faixa etária diferente da base dessa pesquisa.

Os termos utilizados foram adequados conforme os descritores determinados pela base de jurisprudência dos conselhos da Ordem dos Advogados (2007): “abuso sexual”, “crianças”, “intrafamiliar” e “abordagem constitucional”. Os termos de busca foram utilizados com os operadores booleanos “OR” entre sinônimos e “AND” entre os descritores.

Para a busca dos artigos na literatura, inicialmente, foram encontrados 4 estudos na BVS: 1 na BDENF-Enfermagem e 3 na LILACS. Na base de dados Scielo, foram recuperados 8 estudos, e no Google acadêmico, foram recuperados 7.260 resultados. Após extensa análise dos estudos encontrados, foram selecionados 1 estudo na BVS, 1 estudo na Scielo e 3 estudos no Google Acadêmico, tendo por base o objetivo pressuposto nesta revisão integrativa.

2. O ABUSO SEXUAL CONTRA CRIANÇAS E O ENQUADRAMENTO PROCESSUAL PENAL

Durante o estudo a respeito do conceito relacionado a “abuso sexual infantil”, foram vistas algumas definições. De acordo com Lopes (2014), entende-se por abuso sexual contra criança ou adolescente o ato praticado por um indivíduo com o objetivo de satisfazer anseios sexuais, aproveitando-se da fragilidade característica da idade do menor.

Sob o mesmo ponto de vista, a Organização Mundial de Saúde – OMS (2003, online) declara que abuso sexual infantil pode ser definido como:

Qualquer atividade sexual (incluindo intercurso vagina/anal, contato gênito-oral, contato gênito-genital, carícias em partes íntimas, masturbação, exposição a pornografias ou a adultos mantendo relações sexuais), envolvendo uma criança incapaz de dar seu consentimento.

Da mesma forma, Lopes (2014) define a “violência sexual” como uma forma de agressão física e psicológica que implica em relação sexual não consentida, podendo ser intrafamiliar ou extrafamiliar. Além disso, Neves Neto, Rezende e Carvalho (2021), em sua pesquisa, destacam que o abuso sexual infantil se constitui como uma violação de direitos, conforme previsto no ECA (BRASIL, 1990), sendo caracterizado como violência sexual qualquer ato que viole as regras sociais e os papéis familiares, incluindo casos de pedofilia, abusos sexuais violentos e incesto.

Em consequência disso, o número de casos de violação infantil vem crescendo cada vez mais. Segundo Oliveira (2022), das 4.486 denúncias recebidas pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, 18,6% estão ligadas a abuso sexual. No ano de 2021, das denúncias que o MMFDH recebeu, cerca de 74% dos registros de violência sexual contra crianças e adolescentes eram de meninas. E, ainda, dos 18.681 registros recebidos, em quase 60% dos casos, a vítima tinha entre 10 e 17 anos. As informações também mostraram que, em 8.494 casos, a vítima e o suspeito moravam na mesma residência. Outros 3.330 casos aconteceram na casa da vítima e 3.098 na casa do suspeito. Entre os suspeitos, em 2.617 dos casos, estavam o padrasto e a madrasta, em 2.443, o pai, e em 2.044 denúncias, a mãe era acusada.

É importante frisar que a Constituição Federal (BRASIL, 1988), o ECA (BRASIL, 1990) e o Código Civil Brasileiro (BRASIL, 2002) preveem, em seus artigos, o princípio da parentalidade, sendo definido como a obrigatoriedade que os pais e/ou responsáveis pelo menor têm de assegurar a assistência afetiva, moral, intelectual, material e espiritual. Para Cardin e Mochi (2015), esse princípio tem a função de assegurar a proteção do menor, considerando-se que, a partir de sua aplicação, a criança e o adolescente estarão assistidos, o que fará com que eles se tornem adultos pacíficos e seguros, contribuindo, dessa forma, para uma sociedade mais justa e igualitária.

Nesse contexto, Vicinguera (2019), em sua pesquisa, destaca os sinais e sintomas que uma criança ou adolescente vítima de violência apresenta, que podem incluir alterações comportamentais, cognitivas e emocionais, afetando o desenvolvimento cognitivo e sócio afetivo da vítima, entendendo-se que não há uma padronização.

Nota-se que, quando se trata de abuso sexual intrafamiliar, os danos emocionais são extensos, pois, como se pode evidenciar nos estudos de Paixão e Souza Neto (2020), esse tipo de violência independe de classe ou grupo social, sendo relacionado a diversos fatores, sejam de ordem social ou cultural, podendo envolver situações de abandono, desemprego, entre outras causas. No entanto, para os autores, a falta de comunicação entre a vítima e a família contribui para que situações de violência como essa se mantenham em sigilo por mais tempo.

No que compete ao enquadramento processual penal, de acordo com Almeida (2020), ele é evidenciado a partir da aplicação da Lei 13.431 (BRASIL, 2017), que estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente, criando, dessa forma, um sistema de proteção integral a crianças e adolescentes vítimas de violência. Entretanto, para isso ocorrer, o primeiro passo é a notificação do ocorrido ao sistema de justiça, que, no caso de crianças e adolescentes, deve ser feita ao Conselho Tutelar, assim como determina o art. 13 do Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), ou em uma delegacia de polícia mais próxima.

Defronte a perspectiva de abuso sexual, o delegado de polícia deve receber a denúncia, e não apenas fazer o encaminhamento da vítima para o órgão competente, afim de que se evite o “arrependimento da denúncia”. Tendo por base o Código Penal (BRASIL, 1940), a denúncia é o elemento que dá início ao processo penal, sendo entregue ao promotor de justiça, pelo delegado responsável pelo caso, para ser aplicada a sanção penal, em caso de prova de culpa por parte do acusado.

Com base na aplicação da denúncia realizada, a intervenção legal é feita por fases. Martins (2017) destaca que o Código de Processo Penal determina procedimentos práticos, como o exame de corpo de delito, considerado indispensável pelo artigo 158 (BRASIL, 1941), no entanto, a autora destaca que, conforme é debatido, nem sempre o crime sexual deixa marcas.

Visando garantir a segurança do menor, é importante que todo o processo legal até a proferição da sentença do acusado seja feito da maneira mais rápida possível, a fim de garantir uma reparação à vítima, assim como sua segurança. Entretanto, o período de tramitação do processo e a prestação jurisdicional, como se pode observar nos estudos analisados, ainda é um processo demorado. A resposta do Estado e a aplicação da lei prevista, por vezes, são tardias, acarretando prejuízos, em alguns casos, irreparáveis à vítima, conforme observado no desenvolvimento desta pesquisa.

A progressão do processo penal por acusação de abuso sexual, de acordo com Guedes (2020), pode durar, em média, de 60 dias a 2 anos, até o acusado ser julgado e a lei ser cumprida. Com relação ao tempo para a efetuação de uma denúncia contra abuso sexual infantil, a Lei foi alterada em 18 de maio de 2012, sendo nomeada de “Joanna Maranhão”, em referência à nadadora brasileira molestada sexualmente, em sua infância, pelo treinador (na época ela tinha nove anos).

Assim sendo, tendo por base a Lei n.º 12.650/2012, que altera o Código Penal (Decreto-Lei n.º 2.848/40), a contagem para a prescrição de crimes sexuais cometidos contra crianças e adolescentes passou a ser calculada a partir de quando as vítimas completam 18 anos, e não mais da data de quando o abuso foi praticado, e o crime prescreve em 20 anos, contando da maior idade da vítima. No Brasil, a pena prevista para o abuso de menores de 14 anos é a reclusão de 8 a 15 anos de prisão (BRASIL, 2012).

3. POLÍTICAS PÚBLICAS E AS AÇÕES PREVISTAS NA PROTEÇÃO INTEGRAL DA INFÂNCIA 

Em vista da atual situação, com relação ao aumento dos casos de abuso sexual infantil, é eminente a aplicação de políticas públicas para prevenção com vista a ações que tenham como enfoque a proteção integral da infância. Vicinguera (2019, p. 29), em sua pesquisa, destaca que “a concepção de infância e adolescência passou por uma série de transformações ao longo da história”. Por certo, a introdução da Constituição Federal (1988) e do ECA (1990) mudou o cenário, fazendo da infância e da adolescência um lugar de direito, a partir da criação de leis que buscam garantir a proteção integral da infância.

A implantação do Estatuto da Criança e do Adolescente, segundo Rodrigues (2017), foi um passo decisivo na luta contra a violência sexual. Entretanto, apesar de sua importância, embora o ECA represente a vanguarda no que tange a proteção integral da infância, faz-se necessário o desenvolvimento de outras políticas públicas, pois, no enfrentamento ao abuso sexual infantil, apenas essa legislação não é suficiente.

Desse modo, visando a efetivação dessas diretrizes, segundo Lopes (2014), foram realizadas, no decorrer dos anos, ações preventivas que têm como princípio a proteção integral da criança, como a implantação da Lei n.º 9.970/2000, que instituiu o dia 18 de maio como o dia nacional de combate ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes. Essa Lei visa a formação de ações com o intuito de informar a todos sobre a violência sexual, conscientizando a população sobre a importância da denúncia de casos de violência sexual. (BRASIL, 2000).

Com relação à implantação dessa Lei, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) destaca que essa data é uma forma de conscientização sobre o assunto, visto que, em 2021, 48,4% (9.053) das denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes foram realizadas de forma anônima, e os casos foram encaminhados ao conselho tutelar e, quando comprovada a violação, a uma delegacia de polícia. Ainda com relação à importância dessa data, um levantamento realizado pela UNICEF (Fundo das Nações unidas para a Infância) mostra que, entre os anos de 2017 e 2022, no Brasil, foram registrados 179.277 casos de estupro de vulnerável com vítimas de até 19 anos, ou seja, uma média de quase 45 mil casos por ano. Dos casos apresentados, 62 mil vítimas tinham menos de 10 anos. (OLIVEIRA, 2022).

Tais ações fazem as pessoas refletirem, e representam um avanço significativo no que diz respeito à elaboração de Políticas Públicas para o enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes. Vicinguera (2019) acrescenta que, apesar dos avanços, o número de casos de abuso sexual infantil ainda é muito alto, o que demonstra um grande lapso entre as leis e suas aplicações. Faz-se necessária uma ressignificação das práticas cotidianas e profissionais a fim de garantir um atendimento humanizado e qualificado no que tange a rede de proteção integral e dos direitos humanos, das crianças e adolescentes.

4. DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA 

Com base nos estudos analisados, aludindo informações acerca dos desafios relacionados à salvaguarda da criança, visando manter a integridade do menor frente a situações de abuso sexual, pôde-se observar que, no Brasil, esse é um problema recorrente, e os casos de abuso intrafamiliar aumentam a cada ano. Além disso, percebe-se que os trâmites de salvaguarda à criança, conforme previstos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, não são contínuos, o que se caracteriza como uma contrariedade para a justiça brasileira.

De acordo com Chaves et al. (2020), o combate ao abuso sexual envolvendo crianças demanda que se conheçam aspectos relacionados a essa categoria de caso para que se possa elaborar políticas públicas de enfrentamento. Dessa forma, o desafio atual é a articulação efetiva da rede de atenção e proteção com intercomunicação dinâmica e efetiva na identificação de variáveis que influenciam o desenvolvimento e a consolidação da rede, ou, ainda, a cooperação na investigação de outros elementos sociais e culturais pertinentes a essa problematização.

Fonseca et al. (2012), em sua pesquisa, evidencia a análise da reincidência da violência infantil. Para o autor, o princípio da proteção integral, tendo por base os direitos das crianças e adolescentes, ganhou visibilidade a partir da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e da implantação de suas diretrizes. Sendo uma das principais diretrizes, o princípio da parentalidade, prevê que a família, com o Estado, tem a obrigatoriedade de garantir o bem-estar, a proteção e a promoção do crescimento saudável do menor. Entretanto, a reincidência de violência contra a criança ocorre, principalmente, em abusos intrafamiliares, causando danos não só físicos mas psíquicos à criança.

Para Verçoza (2019), em casos de violência intrafamiliar, o direito de família e o direito penal preveem a destituição do poder familiar pelo abuso sexual do menor. Dessa forma, é importante analisar as inovações legislativas em prol da criança e do adolescente e a atenção que se deve ter com vítimas de violência intrafamiliar.

Endossando a pesquisa dos autores citados anteriormente, Pereira (2020) destaca que a aplicação de políticas públicas, tendo como enfoque o enfrentamento ao abuso sexual sofrido por crianças e adolescentes, tem uma grande importância para o campo jurídico, tendo em vista que é a partir da aplicação do direito que o Estado manifesta sua reação preventiva e reparatória à pessoa agredida e estabelece uma punição ao agressor. Assim sendo, pode-se evidenciar que a constatação da necessidade da salvaguarda da moralidade infantil, ainda que tenha ocorrido gradualmente, trouxe a adoção de um conjunto de políticas públicas que busca ações voltadas especificamente à proteção integral da criança e do adolescente em face da violência sexual.

Frente à essa realidade, Lago (2021) destaca, em sua pesquisa, que, ao observar as medidas de proteção à vítima de abuso sexual infantil intrafamiliar, pode-se intuir que o poder judiciário ainda está muito despreparado para lidar de forma rápida e assertiva com esses casos, dado que ocorrem muitos casos de revitimização.

Em vista dos dados apresentados, pode-se perceber que, como Lago (2021) cita em seus estudos, apenas uma simples punição não irá solucionar o problema de segurança da criança vitimada. Infelizmente, trata-se de uma situação complexa, que exige apoio de todos os órgãos competentes, assim como uma melhor preparação de todos os profissionais que prestam atendimento, para que a vítima tenha uma escuta especializada.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Com base em tudo o que foi elucidado no desenvolvimento desta pesquisa, após revisão integrativa, destaca-se que a proteção na infância é uma prioridade constitucionalmente estabelecida, no entanto, esse processo ainda não é efetivamente eficaz. Assim sendo, há uma necessidade de políticas públicas consistentes que facilitem e acelerem a salvaguarda dessa criança, protegendo-a na convivência com o genitor agressor.

Pode-se observar, também, que, geralmente, a demora durante o desenvolvimento do processo, que se inicia na notificação do caso e vai até o depoimento judicial e à aplicação das penalidades cabíveis, podem acarretar, para a vítima, além da falta de proteção necessária, danos físicos e psicológicos. E, ainda, os trâmites de salvaguarda à criança, conforme previstos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), não são contínuos, o que se caracteriza como uma contrariedade para a justiça brasileira.

No desenvolvimento desta pesquisa, pode-se perceber que este estudo contribui de forma teórica e prática para uma maior conscientização no que tange a violação de direitos da infância, incentivando ações efetivas que auxiliem no atendimento e na rede de proteção ao menor vítima de violência sexual. Entretanto, destaca-se a relevância de uma ampliação na rede de proteção à criança, sendo importante um trabalho interdisciplinar.

Dessa forma, o estudo realizado ainda encontrou algumas limitações para um melhor aprofundamento, como a falta de dados gerais no que se refere a pesquisas anteriores que destaquem de forma efetiva a atuação da justiça brasileira mediante a esses casos, sendo uma boa temática para estudos futuros, visando uma continuidade às reflexões elencadas nesta pesquisa.

Portanto, percebe-se a necessidade de uma adequação dos procedimentos judiciais às necessidades da criança vítima de violência, sendo necessária uma sensibilização maior dos operadores do direito, principalmente quando o caso de abuso sexual é de conotação intrafamiliar. Faz-se necessária uma maior agilidade no processo, de forma a evitar revitimização e maiores danos à criança, pois, apesar de o ECA impor a proteção ao menor, ela não ocorre efetivamente, gerando, na vítima, sensação de desamparo e sentimento de impunidade e frustração.

REFERÊNCIAS 

ALMEIDA, Erinelma de Azevedo. Rede de proteção a crianças e adolescentes em situação de violência sexual na cidade de Manaus. 2020. 143f. Dissertação (Mestrado em Serviço Social e Sustentabilidade na Amazônia) – Universidade Federal do Amazonas, Manaus, AM, 2020. Disponível em: https://tede.ufam.edu.br/bitstream/tede/8166/5/Disserta%c3%a7%c3%a3o_ErinelmaAlmeida_PPGSS.pdf. Acesso em: 26 fev. 2023.

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Brasília, DF: Diário Oficial da República Federativa do Brasil, 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. Acesso em: 26 fev. 2023.

BRASIL. Decreto- Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Brasília, DF: Diário Oficial da República Federativa do Brasil, 2002.Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm. Acesso em: 26 fev. 2023.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 26 fev. 2023.

BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília, DF: Diário Oficial da União, 1990. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 26 fev. 2023.

BRASIL. Lei nº 9.970, de 17 de maio de 2000. Institui o dia 18 de maio como o dia nacional do combate ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes. Brasília, DF: Diário Oficial da União, 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9970.htm. Acesso em: 26 fev. 2023.

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Diário Oficial da República Federativa do Brasil, 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm#:~:text=LEI%20N%C2%BA%2010.406%2C%20DE%2010%20DE%20JANEIRO%20DE%202002&text=Institui%20o%20C%C3%B3digo%20Civil.&text=Art.,e%20deveres%20na%20ordem%20civil. Acesso em: 26 fev. 2023.

BRASIL. Lei nº 12.650, de 17 de maio de 2012. Altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, com a finalidade de modificar as regras relativas à prescrição dos crimes praticados contra crianças e adolescentes. Brasília: DF: Diário Oficial da União, 2012. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12650.htm. Acesso em: 26 fev. 2023.

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CARDIN, Valéria Silva Galdino; MOCHI, Tatiana de Freitas Giovanini. Das políticas públicas de prevenção no combate à violência intrafamiliar praticada contra a criança e o adolescente. 2015. Disponível em: http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=05edf455cb266ccb. Acesso em: 26 fev. 2023.

CHAVES, Larissa Nogueira et al. Epidemiologia do abuso sexual contra crianças e adolescentes admitidas em um hospital de referência da Amazônia brasileira: um estudo exploratório-descritivo. Revista Diagnóstico & Tratamento, v. 25, n. 4, p. 138-146, 2020. Disponível em: https://docs.bvsalud.org/biblioref/2021/02/1146909/rdt_v25n4_138-146.pdf. Acesso em: 26 fev. 2023.

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GUEDES, Lenilson. Acusado de estupro de vulnerável é julgado no prazo de 71 dias na Comarca de Alagoa Grande. Tribunal de Justiça da Paraíba, 2020. Disponível em: https://www.tjpb.jus.br/noticia/acusado-de-estupro-de-vulneravel-e-julgado-no-prazo-de-71-dias-na-comarca-de-alagoa-grande. Acesso em: 26 fev. 2023.

LAGO, Beatriz Rodrigues. Família do lado esquerdo do peito? Uma análise da proteção jurídico-penal em face do abuso sexual infantil intrafamiliar com enfoque na revitimização da vítima. 2021. 57f. Monografia (Graduação em Direito) – Centro Universitário UNDB, São Luís, MA, 2021. Disponível em: http://repositorio.undb.edu.br/bitstream/areas/517/1/BEATRIZ%20RODRIGUES%20LAGO.pdf. Acesso em: 26 fev. 2023.

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[1] Especialista em Direito Digital e Segurança Pública pela Faculdade Focus. ORCID: 0000-0002-4504-4678.

Enviado: 04 de Janeiro, 2023.

Aprovado: 06 de Março, 2023.

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Marina Moura Bernardes

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