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Desestatização: conceito, espécies e um panorama geral sobre o atual cenário

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CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

MIRANDA, Carolina dos Santos Lopes [1]

MIRANDA, Carolina dos Santos Lopes. Desestatização: conceito, espécies e um panorama geral sobre o atual cenário. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 07, Ed. 04, Vol. 05, pp. 193-214. Abril de 2022. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/desestatizacao

RESUMO

A recente inclusão de diversas empresas estatais no Programa Nacional de Desestatização demonstra o impulsionamento da agenda de desestatização no atual cenário brasileiro. Nesse contexto, surge a questão norteadora deste material: O que é desestatização e quais são seus principais resultados? O objetivo deste artigo é trazer um panorama geral do instituto da desestatização, através da apresentação da evolução histórica das concepções de Estado, da sua conceituação, da definição de suas espécies, da análise das decisões do Supremo Tribunal Federal e da demonstração dos principais resultados obtidos com a sua implementação. A metodologia adotada foi a pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, que nos trouxe à conclusão de que a desestatização é medida utilizada para reajustar a atuação do Estado na ordem econômica, o qual deve intervir diretamente apenas nos casos previstos na Constituição da República, resultando, principalmente, em melhorias na prestação dos serviços de interesse da sociedade, por meio de ganhos de eficiência e geração de riqueza.

Palavras-chaves: desestatização, privatização, reforma do Estado.

1. INTRODUÇÃO

O atual cenário brasileiro revela um engajamento na realização das desestatizações (MATTOS, 2019). Este fato se comprova por uma série de desestatizações que vem sendo planejada nos últimos anos, a exemplo das seguintes empresas: Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), incluída no Programa Nacional de Desestatização pelo Decreto nº 9.852, de 25 de junho de 2019 (BRASIL, 2019); Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, incluída no Programa Nacional de Desestatização pelo Decreto nº 10.674, de 13 de abril de 2021 (BRASIL, 2021); Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras) prevista na Lei nº 14.182, de 12 de julho de 2021 (BRASIL, 2021).

Para melhor compreensão do tema desestatização, este artigo objetiva traçar um panorama geral do instituto, partindo da evolução histórica das concepções de Estado, as quais influenciaram os níveis de intervenção estatal na ordem econômica ao longo do tempo, chegando à reforma do Estado e à implementação da desestatização.

A partir daí, serão apresentadas as divergências doutrinárias no que tange à conceituação do instituto e a definição de suas espécies, as quais consistem em instrumentos utilizados para promover o adequado posicionamento do Estado na economia.

Além disso, analisaremos as recentes decisões do Supremo Tribunal Federal sobre a necessidade de previsão em lei para a efetivação do processo de desestatização de empresas estatais.

Ao final, serão demonstrados os principais resultados obtidos com a adoção das medidas desestatizadoras.

Através da pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, e com base na Constituição da República, abordaremos o tema a fim de responder a seguinte questão: O que é desestatização e quais são seus principais resultados?

2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Ao longo da história, a atuação do Estado na economia oscilou entre períodos de maior e menor intervenção.

A Revolução Francesa do século XVIII, contrária ao Estado Absolutista, fez nascer a ideia de Estado Liberal marcado pela proteção aos direitos individuais fundamentais ligados ao valor liberdade e propriedade e pelo dever de abstenção, isto é, a mínima intervenção do Estado na economia (Estado Mínimo), garantindo a livre iniciativa (MÂNICA; MENEGAT, 2017).

A partir da II Guerra Mundial, devido à crise econômica e ao aumento da demanda por direitos sociais, ocorre a ruptura do liberalismo, exigindo do Estado o abandono da postura abstencionista. Surge, então, o modelo de Estado Social, o qual adota uma atuação mais positiva, assumindo a função de principal provedor das necessidades individuais e coletivas dos cidadãos (MÂNICA; MENEGAT, 2017).

Nesse cenário, o Estado passa a intervir nas mais variadas áreas, inclusive na prestação direta de atividades econômicas, o que fez com que multiplicasse o número de empresas estatais. Exemplo disso é o advento, no Brasil, nas décadas de 1960 e 1970, de holdings empresariais públicas, como a Eletrobrás, Telebrás, Siderbras, Petrobras e Vale do Rio Doce (ARAGÃO, 2018).

Segundo Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2014, p. 586), o crescimento da estrutura do Estado, no período das guerras mundiais, levou o Brasil a

(…) uma formidável concentração de capitais à disposição do Estado, alimentada por tributos crescentes, que saltaram gigantescamente, durante o século XX, de cerca de três por cento a mais de trinta e cinco por cento, do produto interno bruto do País.

No entanto, continua o autor (MOREIRA NETO, 2014, p. 586):

(…) o País só viria a sentir o peso de suas galáxias de estatais e o absurdo de suas redundâncias e irredutíveis ineficiências, quando a dívida externa e o déficit interno acusaram, alarmantemente, a absurda deformação econômica que resultou desse período: era um Estado empresário e rico e uma sociedade dependente e pobre.

O crescimento desordenado gerou sobrecarga estatal, comprometendo a eficiência da prestação dos serviços à população. Assim, revelou-se necessária uma nova reforma do Estado, por meio da redução de sua atuação direta no campo econômico, de modo a permitir que o particular assuma o protagonismo no desenvolvimento de atividades econômicas e serviços públicos. Em tal cenário, a intervenção estatal torna-se preponderantemente indireta, com o Estado assumindo o papel de regulador (Estado Regulador) (MÂNICA; MENEGAT, 2017).

Com base na visão de Estado Regulador ou Neoliberal, a Constituição da República de 1988 trouxe restrições para a exploração direta da atividade econômica pelo Estado. Segundo o art. 173, ressalvados os casos expressamente previstos no texto constitucional, a participação direta estatal na ordem econômica só pode ocorrer por necessidade de imperativos de segurança nacional ou relevante interesse coletivo, circunstâncias imprescindíveis que devem ser identificadas por lei (BRASIL, 1988).

Na década de 90, sob a proposta de reajustar o tamanho do Estado, diminuindo seu aparato, o Brasil adotou medidas de abertura da economia ao capital estrangeiro, de redução dos monopólios estatais e de implementação do processo de desestatização (OLIVEIRA, 2017).

A normatização do processo de desestatização iniciou-se com a edição da Lei nº. 8.031, de 12 de abril de 1990, que instituiu o Programa Nacional de Desestatização, estabelecendo a privatização como instrumento (BRASIL, 1990). Entre 1990 e 1992, dezoito empresas foram desestatizadas, arrecadando cerca de quatro bilhões de dólares norte-americanos, sendo a maioria em títulos representativos da dívida pública federal (GUERRA, 2006).

Em 1995, foram promulgadas as seguintes Emendas Constitucionais fundamentadas nessa nova política: n.º 5, de 5 de agosto de 1995, que permitiu ao Estado explorar, diretamente ou por concessão, os serviços de gás canalizado; n.º 6, de 15 de agosto de 1995, que extinguiu o tratamento diferenciado ao capital nacional em detrimento do estrangeiro; n.º 8, de 15 de agosto de 1995 que pôs fim ao monopólio dos serviços de telecomunicação; e n.º 9, de 9 de novembro de 1995, que flexibilizou o monopólio da exploração de petróleo e gás natural (MAZZA, 2018).

Naquele mesmo ano, foi editada a Lei n.º 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, que versa especificamente sobre a concessão de serviços públicos, iniciando uma nova fase do processo de desestatização, com a concessão para a iniciativa privada de diversos serviços, como telecomunicações, energia elétrica e transporte (BRASIL, 1995).

Em 1997, a Lei n.º 9.491, de 9 de setembro, revoga a Lei n.º 8.031/90 e altera os procedimentos relativos ao Programa Nacional de Desestatização, prevendo outros instrumentos além da privatização. Seus objetivos principais são assim definidos por José dos Santos Carvalho Filho (2011, p. 320 e 321):

reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público” (art. 1º, I), mostrando que a busca desse objetivo acarretará, por via de consequência, a redução da dívida pública líquida (art. 1º, II) e a concentração da Administração Pública em atividades nas quais seja fundamental a presença do Estado em vista das prioridades nacionais (art. 1º, V). Assim agindo, será possível “permitir a retomada de investimentos nas empresas e atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada” (art. 1º, III), propiciando o fortalecimento do mercado de capitais pela oferta de valores mobiliários (art. 1º, VI) e a reestruturação do setor privado para aumentar sua competitividade e modernizar sua infraestrutura (art. 1º, IV).

É importante ressaltar que surgiram outras normas as quais, em certa medida, também promoveram a desestatização, a exemplo da Lei n.º 11.079, de 30 de dezembro de 2004, que instituiu a parceria público-privada, abrangendo os contratos de concessão patrocinada e concessão administrativa (BRASIL, 2004), e da Lei 13.334, de 13 de setembro de 2016, que criou o Programa de Parcerias de Investimentos – PPI (BRASIL, 2016).

3. DA DESESTATIZAÇÃO E SUAS ESPÉCIES

3.1 CONCEITO DE DESESTATIZAÇÃO

Entende-se a desestatização pela redução da interferência do Estado na ordem econômica, isto é, “(…) retirar o Estado de certo setor de atividades (…)” (CARVALHO FILHO, 2011, p. 322), diminuindo ou removendo sua participação em atividades econômicas, por meio de instrumentos como a desregulamentação, privatização, concessão e permissão e terceirização.

Segundo Rafael Carvalho Rezende Oliveira (2017, p. 530), desestatização

(…) significa a redução ou a retirada da presença do Estado das atividades econômicas em sentido estrito, reservadas constitucionalmente à iniciativa privada, e da execução direta dos serviços públicos, nesse último caso, delegados ao mercado, por meio da concessão ou permissão. São espécies de desestatização a) desregulamentação: redução quantitativa das normas restritivas da atividade econômica; b) privatização: alienação do controle societário sobre determinada estatal à iniciativa privada; c) concessão/permissão: transferência da execução de serviços públicos, por contrato, ao mercado, preservando o Estado (Poder Concedente), a titularidade da atividade; d) terceirização: contratação de entidades privadas, normalmente mediante licitação, para prestação de serviços ao Estado.

Semelhantemente, Fernando Moreno Machado (2014, p. 112):

Pelo ordenamento vigente a partir da entrada em vigor da Lei nº 9.491/1997, o panorama relativo à redução do âmbito de atuação estatal passou a abranger diversos instrumentos jurídicos, todos abarcados sob o gênero desestatização, rol em que inserta a privatização, em sua concepção mais precisa, de alienação de controle acionário, de empresas estatais, prestadoras de serviço ou de atividade econômica, à iniciativa privada, além de outros, como a concessão ou permissão de serviço público, que jamais poderia ser tratada sob a alcunha de privatização, ante a absoluta discrepância entre tais institutos.

Entretanto vale observar que não há um consenso a respeito desse conceito. Alguns autores utilizam tal definição referindo-se à privatização em sentido amplo, conforme abordado por Fernando Borges Mânica e Fernando Menegat (2017, p. 100) ao citarem Odete Medauar e Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

Odete MEDAUAR, seguindo a doutrina europeia, afirma aparecer o vocábulo privatização num sentido amplo, abrangendo os “vários mecanismos de redistribuição de atividades do setor público para o setor privado”, e num sentido restrito, dizendo respeito “à transferência de empresas estatais ao setor privado”.

Em sentido semelhante, também Maria Sylvia Zanella DI PIETRO constata a existência de um conceito amplo e de um conceito restrito de privatização. O conceito amplo abrangeria, na dicção da autora, “todas as medidas adotadas com o objetivo de diminuir o tamanho do Estado”, englobando, portanto, dimensões como: (i) a desregulação (diminuição da intervenção estatal no domínio econômico); (ii) a desmonopolização de atividades econômicas; (iii) a venda de ações de empresas estatais ao setor privado (para a autora, trata- -se do conceito de desestatização ou desnacionalização); (iv) a busca por formas privadas de gestão (concessões e PPPs); (v) a terceirização de bens e serviços; e (vi) a liberalização dos serviços públicos. Num sentido restrito, privatização significaria apenas “a transferência de ativos ou de ações de empresas estatais para o setor privado”, sendo essa, de acordo com a autora, a modalidade prevista na Lei n. 9.491/97.

Explanadas as divergências, adotaremos neste artigo a conceituação mencionada no início do tópico, em consonância com as lições de Rafael Carvalho Rezende Oliveira (2017), em que privatização é uma das espécies do gênero desestatização.

Pontuada a premissa acima, passamos agora a abordar, de forma mais detida, a desestatização em âmbito constitucional.

No contexto da reforma da economia, a Constituição da República limitou a atividade empresarial do Estado, ao fundamentar a ordem econômica no princípio da livre iniciativa (arts. 1º, IV, c/c 170, caput e parágrafo único), segundo o qual cabe ao particular o livre exercício da atividade econômica, independente de autorização pública, ressalvados os casos previstos em lei (BRASIL, 1988).

Ocorre que, conforme já mencionado, o texto constitucional também previu exceções à vedação de atuação direta do Estado na economia, quando configuradas as hipóteses de imperativos de segurança nacional ou relevante interesse coletivo, cuja caracterização deve estar definida em lei, de acordo com o art. 173 (BRASIL, 1988).

Observa-se, portanto, que o particular tem primazia em relação ao Estado no desempenho de atividades econômicas, devendo este atuar somente quando aquele não atender aos anseios da sociedade. Tal preceito denota o Princípio da Subsidiariedade, previsto implicitamente no referido art. 173 da Constituição da República (BRASIL, 1988).

Porém, vale asseverar que, mesmo nos casos reservados exclusivamente à iniciativa privada, o Estado, de forma indireta, permanece presente por meio do exercício das funções de fomento, coordenação e fiscalização das atividades do particular (DI PIETRO, 2015).

Portanto, verifica-se que o Estado pode intervir na economia de forma direta e indireta. A atuação direta refere-se ao Estado como empresário, de acordo com Alexandre Santos de Aragão (2018, p. 36 e 37), “ele próprio realiza as atividades econômicas, vendendo, comprando, prestando ou tomando serviços”, nos termos dos arts. 173, 175 e 177 da Constituição (BRASIL, 1988). Quanto à participação indireta, “o Estado atua sobre a economia: ele não realiza operações econômicas, mas apenas tenta influenciar atividades econômicas exercidas por terceiros” (ARAGÃO, 2018, p. 36), mediante a regulamentação, planejamento, fiscalização etc., consoante o art. 174 da Carta Magna (BRASIL, 1988).

Considerando o conceito de desestatização utilizado neste ensaio, convém que façamos um breve apontamento sobre as distinções entre atividades econômicas em sentido estrito e serviços públicos, dos quais se pretende reduzir ou afastar a presença do Estado pelo processo de desestatização.

A doutrina trata atividades econômicas em sentido estrito e serviços públicos como espécies do gênero atividades econômicas em sentido amplo, a saber:

Daí a verificação de que o gênero — atividade econômica — compreende duas espécies: o serviço público e a atividade econômica.

Estamos em condições, assim, de superar a ambigüidade que assume, no seio da linguagem jurídica e no bojo do texto constitucional, esta última expressão. Para que, no entanto, se a supere, impõe-se qualificarmos a expressão, de modo que desde logo possamos identificar de uma banda as hipóteses nas quais ela conota gênero, de outra as hipóteses nas quais ela conota espécie do gênero. A seguinte convenção, então, proponho: atividade econômica em sentido amplo conota gênero; atividade econômica em sentido estrito, a espécie (GRAU, 2010, p. 101 e 102).

Em vista disso, atividade econômica em sentido estrito corresponde à área de atuação reservada à iniciativa privada, cuja exploração direta pelo Estado, ressalvados os casos previstos na Constituição Federal, só será permitida quando necessária aos imperativos de segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, nos termos do art. 173 da Constituição (BRASIL, 1988). Caso em que o Estado atua por meio das empresas estatais (MAZZA, 2018).

Já os serviços públicos são atribuições próprias do Estado, consideradas indispensáveis à sociedade, prestadas diretamente pela Administração Pública ou delegadas a particulares, através de concessão ou permissão, de acordo com o art. 175 da Carta da República (BRASIL, 1988).

3.2 ESPÉCIES DE DESESTATIZAÇÃO

Conforme já vimos, a desestatização abrange as medidas de desregulamentação, terceirização, concessão e permissão e privatização. Isto posto, passemos à breve definição de cada uma dessas espécies.

A Desregulamentação é a forma de atenuar a ingerência do Estado na economia, por meio da redução do nível de regulamentação sobre o setor econômico, facilitando as condições de atuação da iniciativa privada e estimulando a competitividade (CELLI JUNIOR, 2009).

Não se trata de eliminar as normas regulatórias, mas um abrandamento dos impedimentos e condicionamentos, permitindo maior liberdade de acesso e exploração pelo particular de determinadas atividades econômicas. Dessa forma, entende Umberto Celli Junior (2009, p. 413 e 414):

A desregulamentação pode ser vista como um processo que visa a reduzir a quantidade e a densidade de normas e regras, de forma a permitir menos interferência estatal na economia ou sobre as forças de mercado. Nesse cenário, as normas e as regras seriam mais simples, transparentes e eficazes. Esse último componente (i.e., normas e regras mais simples, transparentes e eficazes) sugere que a desregulamentação não é caracterizada apenas pela redução da quantidade de normas e regras, mas, também, pela substituição delas por outras com viés menos intervencionista.

A terceirização, por sua vez, é a contratação de particulares pela Administração Pública para a prestação de serviços de seu interesse, os quais seriam desempenhados diretamente pelo Estado. Corresponde à grande parte dos contratos administrativos realizados pelo Poder Público com a iniciativa privada. Geralmente ocorre através de licitação, para a prestação de serviços complementares, a exemplo dos serviços de engenharia e limpeza, prestados pelo particular ao Estado. Em consonância com os ensinamentos de Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2015, p. 396):

O conceito é o mesmo para a Administração Pública que, com muita frequência, celebra contratos de empreitada (de obra e de serviço) e de fornecimento, com fundamento no artigo 37, XXI, da Constituição, observadas as normas da Lei nº 8.666/93. Trata-se da execução indireta a que se referem os artigos 6º, VIII, e 10.

Cada vez que a Administração Pública recorre a terceiros para a execução de tarefas que ela mesma pode executar, ela está terceirizando.

No que concerne à Concessão e Permissão, cumpre destacar que, apesar de alguns doutrinadores analisarem as diferenças entre os contratos de concessão e de permissão de serviços públicos, neste artigo, não aprofundaremos essa questão. Trataremos de forma genérica ambos como institutos semelhantes, com base no entendimento de Rafael Carvalho Rezende de Oliveira (2017, p. 173), para quem “(…) não existem diferenças substanciais entre a concessão e a permissão de serviços públicos.”.

Sendo assim, concessão ou permissão é o contrato administrativo pelo qual o Estado delega a prestação de serviços públicos à iniciativa privada (OLIVEIRA, 2017).

Nesse caso, não há transferência da titularidade da atividade, ou seja, o Estado (Poder Concedente) permanece titular do serviço público concedido, atribuindo apenas sua execução ao particular (Concessionário).

O instituto encontra-se previsto no art. 175 da Constituição (BRASIL, 1988), a qual determina expressamente a realização de procedimento licitatório para sua efetivação, além de estar disciplinado também na Lei n.º 8987/95 (BRASIL, 1995).

Por fim, antes de adentrar o conceito de Privatização, vale observar que não há uma definição uníssona, por vezes explicada por conceitos amplos, outras por conceitos restritos, ora corresponde a gênero ora espécie. Não obstante isso, conforme mencionado acima, abordaremos privatização como uma das espécies de desestatização.

Destarte, privatização é a alienação do controle acionário de empresas estatais à iniciativa privada, configurando umas das formas de redução da intervenção estatal na economia (desestatização) (OLIVEIRA, 2017).

Conforme veremos adiante no estudo das ações decididas recentemente pelo Supremo Tribunal Federal, tem sido questionada a exigência de lei autorizando a privatização das empresas estatais, em razão do Princípio do Paralelismo das Formas. Em outras palavras, considerando-se a necessidade de lei para a instituição de empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 37, inciso XIX da Constituição (BRASIL, 1988), argumenta-se que também seria preciso lei autorizativa de sua privatização (SOUTO, 2005).

Cabe lembrar que o art. 173 da Carta Magna de 1988 estabelece uma excepcionalidade à intervenção do Estado no setor econômico, autorizando a exploração direta (por meio das estatais) da atividade econômica apenas quando for necessário aos imperativos de segurança nacional ou relevante interesse coletivo (BRASIL, 1988). Ocorre que tais hipóteses excepcionais devem ter previsão legal. Dessa forma, havendo lei que reconheça a existência de imperativo de segurança nacional ou de relevante interesse coletivo, justificando a criação da empresa estatal, também seria imprescindível lei para autorizar o afastamento dessas hipóteses, permitindo a privatização daquela estatal.

A questão foi objeto de debate no Supremo Tribunal Federal em duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade, que passaremos a analisar a seguir.

4. DAS DECISÕES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

No Brasil, houve um retorno da agenda de desestatização em tempos recentes, o que se verifica pela edição de diversos atos normativos incluindo estatais no Programa Nacional de Desestatização (MATTOS, 2019).

Esse incremento na implementação de ações desestatizadas tem provocado questionamentos judiciais. É o caso das Ações Diretas de Inconstitucionalidade n.º 6.241 e n.º 5.624, as quais levaram ao Supremo Tribunal Federal a discussão acerca da necessidade de lei para a transferência do controle acionário de empresas estatais.

Na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 6.241, questionou-se a constitucionalidade da inclusão de empresa estatal no Programa de Desestatização pelo Chefe do Poder Executivo Federal, sem lei autorizativa prévia e específica. Esta ação impugna, entre outros atos, os Decretos Presidenciais editados nos anos de 2019 e 2020, que incluíram no citado programa as seguintes empresas estatais: Agência Brasileira Gestora de Fundos Garantidores e Garantias S.A. – ABGF; Empresa Gestora de Ativos S.A. – Emgea; Casa da Moeda do Brasil; Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada S.A. – Ceitec; Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência – Dataprev e Serviço Federal de Processamento de Dados – Serpro (BRASIL, 2021).

No julgamento ocorrido em 8 de fevereiro de 2021, a Suprema Corte entendeu que a desestatização é uma questão de política pública autorizada pelo Congresso Nacional, através da legislação que institui o Programa de Desestatização, e que não há arbitrariedade na atuação do Chefe do Poder Executivo, vez que está vinculada às condições estabelecidas na lei (BRASIL, 2021).

A decisão encontra-se no Informativo n.º 1004/2021 do Supremo Tribunal Federal, a saber:

É desnecessária, em regra, lei específica para inclusão de sociedade de economia mista ou de empresa pública em programa de desestatização.

Para a desestatização é suficiente a autorização genérica prevista em lei que veicule programa de desestatização. A autorização legislativa genérica não corresponde a delegação discricionária e arbitrária ao Chefe do Poder Executivo. Essa autorização é pautada em objetivos e princípios que devem ser observados nas diversas fases deliberativas do processo de desestatização. A atuação do chefe do Poder Executivo vincula-se aos limites e condicionantes legais previstos.

A retirada do Poder Público do controle acionário de uma empresa estatal, ou a extinção dessa empresa pelo fim da sua personalidade jurídica, é consequência de política pública autorizada pelo Congresso Nacional, em previsão legal pela qual se cria o Programa de Desestatização, objetivando a redução da presença do Estado na economia e fixando-se, objetivamente, os parâmetros a serem seguidos para a efetivação de eventual desestatização pelo Poder Executivo.

No entanto, com relação às empresas estatais cuja lei instituidora tenha previsto, expressamente, a necessidade de lei específica para sua extinção ou privatização, é necessário que o administrador público observe a norma legal.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou improcedente o pedido formulado em ação direta para declarar a constitucionalidade dos arts. 2º, caput, e 6º, I, § 1º, da Lei 9.491/1997 (BRASIL, 2021).

Desta forma, ficou assentado que a alienação do controle acionário de empresas estatais não depende de lei específica, sendo suficiente a autorização genérica disposta na lei que instaura o programa de desestatização.

Por oportuno, cabe esclarecer que a alienação do controle acionário de empresas estatais não se confunde com a alienação do controle acionário das empresas subsidiárias, as quais, segundo José dos Santos Carvalho Filho (2011, p. 455), são:

(…) aquelas cujo controle e gestão das atividades são atribuídos à empresa pública ou sociedade de economia mista diretamente criadas pelo Estado. Em outras palavras, o Estado cria e controla diretamente determinada sociedade de economia mista (que podemos chamar de primária) e esta, por sua vez, passa a gerir uma nova sociedade mista, tendo também o domínio do capital votante. É esta segunda empresa que constitui a sociedade subsidiária. Alguns preferem denominar a empresa primária de sociedade ou empresa de primeiro grau, e, a subsidiária, de sociedade ou empresa de segundo grau. Se houver nova cadeia de criação, poderia até mesmo surgir uma empresa de terceiro grau e assim sucessivamente.

A temática foi objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 5.624 (BRASIL, 2019).

No julgamento ocorrido em 6 de junho de 2019, que referendou, em parte, a medida cautelar anteriormente parcialmente concedida, o Plenário do Supremo Tribunal Federal conferiu ao art. 29, caput, XVIII, da Lei n.º 13.303, de 30 de junho de 2016 (dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias) interpretação conforme a Constituição, no sentido de que a alienação do controle acionário de empresas públicas e sociedades de economia mista exige autorização legislativa e licitação, porém esta exigência não se aplica à alienação do controle de suas subsidiárias e controladas. Ademais, neste último caso, a operação pode ser realizada sem licitação, desde que siga procedimentos que atendam aos princípios da administração pública previstos no art. 37 da Constituição da República, sempre com a promoção da competitividade (BRASIL, 2019).

Vale destacar o voto do Ministro Alexandre de Moraes, em que aborda, de forma esclarecedora, que a venda do controle acionário de empresa estatal configura privatização, fazendo-se mister autorização legal para que se concretize, o que não deve ser confundido com a alienação de suas subsidiárias e controladas, procedimento que corresponde a atos de gestão, forma de administração, não havendo, portanto, necessidade de lei autorizativa para sua efetivação. Senão vejamos:

(…) em relação às subsidiárias, que é uma autorização genérica, e o empresário, no caso, o Estado atuando como empresário, ele é que poderá ou não criar, fundir, investir, tirar daqui pra ali, entendo que ele possa, o Estado, vender todas as suas ações de uma determinada subsidiária; possa investir em outra; numa que ele é majoritário, ele vira minoritário; na outra que ele é minoritário, agora é interessante virar majoritário; ele está nas regras aqui de mercado do Direito privado. O que ele não pode – e aí me parece ser a única limitação – é perder o controle acionário da empresa-mãe, aí nós estamos falando de privatização.

A privatização é regida por lei específica, ou seja, se houve uma lei específica que autorizou a criação, volta ao exemplo Petrobras: autorizou a criação da Petrobras e uma lei genérica para criar ou não subsidiárias. No tocante às subsidiárias, é para manter a saúde financeira empresarial da empresa-mãe, aí, é o administrador, é o Poder Executivo que tem o comando.

O que não pode é desconstituir um ato complexo, a lei complementar que falou qual área de atuação, a lei ordinária específica que criou a Petrobras é por vontade unilateral. Nesse caso, a meu ver, é a única limitação; a única limitação é a venda do controle acionário da empresa-mãe, não das subsidiárias.

(…)

A Lei 13.303/2016 trata de atividade gerencial, de modo que não me parece que seja exigível autorização legislativa específica para que sejam vendidas ações das subsidiárias ou controladas. (…) Obviamente, se estivéssemos falando da perda do controle acionário da empresa-mãe, isso significaria privatização, o que não é regulamentado pela Lei 13.303/2016, muito menos pelo art. 29, XVIII (BRASIL, 2019).

Ainda nesse cenário, os votos proferidos no julgamento da referida ação acrescentam importante distinção entre desestatização e desinvestimento, nas palavras do Ministro Alexandre de Moraes:

O desinvestimento não se confunde com desestatização, pois nessa última hipótese, regulamentada pelas Leis 8.031/1990 e 9.491/1997, o Poder Público pretende afastar-se da intervenção econômica estatal em determinada área setorial, enquanto na primeira não haverá nenhuma alteração em relação à intervenção econômica estatal, que permanecerá, porém, buscando uma readequação empresarial para melhor poder cumprir suas finalidades, seja por meio de alteração de portfólios de investimentos da Empresa-mãe, seja por meio de liquidação total ou parcial de parcerias com subsidiárias ou empresas privadas.

Por exemplo, no caso da PETROBRAS, os procedimentos de desinvestimento em momento algum apontam para o encerramento de suas atividades ou para qualquer possibilidade de perda do controle acionário do Estado (BRASIL, 2019).

Em igual sentido, o Ministro Luiz Fux orienta:

É aí que assumem relevância os chamados planos de desinvestimento, os quais não se confundem com o conceito jurídico de desestatização.

Enquanto os primeiros são estratégia de gestão empresarial, voltada ao manejo e otimização do portfólio da sociedade, por meio de alienações e retrações na presença de mercado, a segunda significa a retirada completa do Estado do desempenho direto de uma atividade econômica lato sensu.

(…)

Trata-se, apenas, de dizer que, em casos de mero desinvestimento – ainda que este seja realizado pela via da alienação do controle de subsidiárias –, tal paralelismo seria despiciendo, porquanto (i) não houve abdicação, pelo Estado, da sua posição de intervenção direta, haja vista a subsistência da estatal controladora; (ii) a alienação de uma subsidiária não corresponde necessariamente a um juízo de ausência de interesse público na intervenção do Estado empresário; e (iii) a alienação de ativos pode servir para assegurar a estabilidade econômica da estatal controladora, mantendo hígidos os objetivos buscados pelo legislador quando da autorização para a sua criação (BRASIL, 2019).

Desse modo, a alienação de ações, e até mesmo do controle, de empresas subsidiárias e controladas caracteriza hipótese de desinvestimento, estratégia de administração empresarial, e não desestatização, pois o Estado permanece intervindo na economia, por meio da empresa estatal subsistente.

Ante o exposto, em um panorama geral do atual cenário brasileiro, temos que a desestatização de empresas estatais foi intensificada nos últimos anos, trazendo dúvidas quanto à obrigatoriedade de previsão em lei para a realização desta medida. O Supremo Tribunal Federal, então, firmou entendimento no sentido de que, para a alienação do controle acionário de empresas estatais (desestatização, por meio de privatização), há necessidade de lei, porém esta lei não precisa ser específica, basta a autorização genérica da lei que cria o programa de desestatização.

5. DOS RESULTADOS DA DESESTATIZAÇÃO

Diante do presente contexto de avanço no planejamento das ações desestatizadoras, é importante apresentarmos os principais resultados obtidos pelas empresas que passaram por este processo.

Inicialmente, recorda-se que no período do Estado intervencionista restou evidente que as empresas estatais não cumpriram os objetivos de eficiência, gerando grandes déficits e dívidas ao Tesouro público. Consoante Valter Saurin e Breno Augusto D. Pereira (1998, p. 47):

Uma das conseqüências da estatização da economia no Brasil é o elevado endividamento do setor público – tesouro nacional e empresas estatais – e principalmente a falta de recursos para investimentos em infraestrutura; como pode ser observado a “poupança em conta corrente” das administrações públicas em relação ao PIB vem declinando de 5,46% em 1970 para 1,09 em 1981, sendo negativas de 1982 a 1995.

Por isso, a partir da década de 80, surge um movimento de desestatização, cuja ideia é reduzir a presença estatal na economia, transferindo ao setor privado atividades antes abarcadas pelo Estado, com os fins de atenuar os prejuízos das empresas estatais, promover a desburocratização e propiciar maior agilidade e segurança jurídica à iniciativa privada (GUERRA, 2006).

As análises empíricas comprovam que o desempenho da iniciativa privada tem sido mais eficiente do que o das empresas estatais, segundo Cesar Mattos (2019, p. 638):

Boardman e Vining (1989) acharam que empresas estatais puras e mistas tiveram performance “substancialmente pior” que as companhias privadas similares. Na resenha de Megginson e Netter (2001), comprova-se que a eficiência das empresas privatizadas em termos de produtividade e crescimento foi, na média, superior às empresas que não foram privatizadas. La Porta e Lopez de Silanes (1997) acharam para o México grandes aumentos da eficiência e lucratividade com a privatização. Pinheiro (1996) achou para o Brasil que a privatização aumentou a produção, eficiência, lucratividade, investimento e aumentou outros indicadores de performance financeira. Anuatti-Neto e colaboradores (2005) mostram que, de forma geral, as empresas brasileiras tornaram-se mais eficientes com a privatização, com aumento da lucratividade e eficiência operacional.

No mesmo sentido (VERNALHA, 2017):

Nesse sentido, os ganhos de eficiência e de produtividade das empresas privatizadas vêm sendo diagnosticados historicamente por estudos e levantamentos empíricos, como o relatório Privatising State-Owned Enterprises, produzido pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). São números que não devem ser desconsiderados no discurso das ideias. Por aqui, tivemos também experiências exitosas, como foi a privatização das telecomunicações.

Vale ainda destacar os efeitos da desestatização da Telebras, de acordo com André Borges Uliano (2018):

… antes da privatização, havia pouco mais de 22 milhões de linhas no Brasil (entre telefones fixos e celulares).

Após a desestatização, o número cresceu numa média de quase 20 milhões por ano.

O investimento anual da estatal, na média de 25 anos, foi de apenas 2,4 bilhões.

Após privatizada, os números dispararam para mais de 16 bilhões por ano. Perceba: investimento quer dizer geração de emprego, renda e bens e serviços melhores para os consumidores.

A linha telefônica custava cerca de US$ 1.000,00 (mil dólares). Era inacessível para população mais carente. A instalação de um telefone fixo demorava entre 1 e 2 anos. Era algo tão caro e demorado que havia aluguel de linhas telefônicas. Existia, inclusive, um mercado negro, com instalação mais rápida, porém a custos que alcançavam US$ 10.000,00 (dez mil dólares).

Hoje uma linha é gratuita; e a instalação, imediata.

Embora a desestatização traga benefícios para a sociedade, sabe-se que as empresas estatais continuarão existindo, como “principal instrumento de atuação direta do Estado na economia”. (ARAGÃO, 2018, p. 394)

Assim é preciso uma revisão das estratégias de atuação das empresas estatais para que se tornem mais eficientes e estejam em condições de competição com o setor privado, adequando-se ao atual cenário de reformas econômicas, como indica Alexandre Santos de Aragão (2018, p. 47 e 48):

Se sempre existiu atuação direta empresarial do Estado na economia, essa atuação hoje se dá, como é da substância da história, em um novo contexto, que exige novas estratégias e novos instrumentos de ação empresarial estatal. Não é concebível hoje, por exemplo, uma grande estatal sem perspectiva de atuação internacional e de parcerias com agentes particulares, valendo-se de mecanismos privados para aumentar a sua eficiência, como a abertura do seu capital em níveis que lhe demandam requisitos de governança mais rígidos.

Por fim, cabe salientar que a atuação do Estado em determinada atividade econômica somente será legítima caso este possa ser mais eficiente do que o particular, atendendo ao interesse público com qualidade, quantidade e prazo, com o mínimo de prejuízo ao administrado e operando na melhor relação custo/benefício, cumprindo, assim, os princípios da eficiência e economicidade (SOUTO, 2005).

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da ineficiência do Estado intervencionista, surge o modelo de Estado Neoliberal, com a redução da presença estatal na atividade econômica, em respeito aos Princípios da Livre Iniciativa e da Subsidiariedade, amparados pela Constituição da República de 1988.

Nessa circunstância, foi implementada a desestatização no Brasil por meio da retirada da participação direta do Estado nas atividades econômicas, através da diminuição das normas restritivas ao setor econômico (desregulamentação), da contratação de particulares para prestar serviços ao Estado (terceirização), da transferência da execução de serviços públicos à iniciativa privada (concessão e permissão) e da alienação do controle acionário de empresas estatais (privatização).

Segundo o entendimento recente do Supremo Tribunal Federal, a inclusão de empresa estatal em programa de desestatização não exige autorização legislativa específica, sendo suficiente a autorização genérica prevista em lei que cria o referido programa.

Além disso, decidiu ainda a Suprema Corte que a venda do controle acionário de empresa estatal (privatização) depende de autorização legal e de licitação. Contudo, quando se tratar de alienação do controle das subsidiárias e controladas não há exigência de lei autorizativa nem de licitação, bastando que se observem os princípios da administração pública e respeite a competitividade.

Assim, uma vez demonstrado o panorama geral da desestatização no atual cenário, resgatamos a questão norteadora deste artigo, qual seja: O que é desestatização e quais são seus principais resultados?

Conclui-se que a desestatização é a redução da presença do Estado na economia a fim de concentrar a exploração das atividades econômicas devidamente na iniciativa privada, resultando em mais qualidade e eficiência no atendimento ao interesse público e maior geração de empregos e riqueza.

REFERÊNCIAS

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[1] Pós-graduada em Direito Público, Pós-graduando Direito Processual Civil, Graduação em Direito. ORCID: 0000-0001-6453-4309.

Enviado: Março, 2022.

Aprovado: Abril, 2022.

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Carolina dos Santos Lopes Miranda

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