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Ativismo judicial: suas influências políticas no Brasil

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DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/ativismo-judicial

CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

SANTOS, Fabyll Alves dos [1]

SANTOS, Fabyll Alves dos. Ativismo judicial: suas influências políticas no Brasil. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano 08, Ed. 12, Vol. 03, pp. 37-55. Dezembro de 2023. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/lei/ativismo-judicial, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/lei/ativismo-judicial

RESUMO

A partir da promulgação da Constituição em 1988, no Brasil, diversos direitos fundamentais passaram a fazer parte do ordenamento jurídico e, junto a isso, uma atitude proativa dos magistrados para efetivar esse direito vem ocorrendo dia após dia. Diante disso, esse trabalho tem como objetivo analisar esse ativismo judicial e seus efeitos políticos no país. Foi realizado um estudo bibliográfico profundo para identificação dessas correlações. Os resultados encontrados mostraram o excesso de proeminência do Poder Judiciário em detrimento dos outros poderes constitucionais e, principalmente, sua politização devido às decisões processuais de conteúdos voltados às políticas públicas. Ao final, foi discutida a necessidade de ponderação nas decisões ativistas, para que se alcance a harmonia e o equilíbrio necessário entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

Palavras-chave: Princípios, Ativismo, Judicialização da política, Segurança jurídica.

1. INTRODUÇÃO

A criação de novos direitos fundamentais e legitimação de novos atores para reivindicá-los, ocorrida com a promulgação da Constituição em 1988, trouxe à tona junto o fenômeno do ativismo judicial. A postura proativa dos magistrados, invadindo a seara dos demais Poderes da República foi evidente e aumentou bastante com o passar dos anos.

A partir da década de noventa o crescimento de decisões ativistas no Brasil tomou proporções imensas, principalmente na área da saúde. Salomão (2018) informa com suas pesquisas que o Supremo Tribunal Federal, impondo o pagamento de remédios caros às custas da iniciativa privada, ultrapassou a casa de 1 bilhão de reais no ano de 2010. Essas decisões, por um lado podem salvar a vida de quem realmente está necessitando, mas, por outro, pode ser um excesso por parte do Judiciário.

Além disso, países como os Estados Unidos, berço do ativismo judicial no mundo, vêm repensando a forma de agir de seus juízes e tribunais, caminhando cada vez mais para uma autocontenção do Judiciário. Isso ocorre justamente com o fim de evitar a politização desse poder (Andrade, 2014).

Este trabalho tem o objetivo de analisar o ativismo judicial e suas influências políticas no país, além de enumerar as vantagens e desvantagens do ativismo judicial, bem como diferenciá-lo da judicialização da política, facilitando a maior compreensão e possibilitando um melhor debate sobre o tema.

A importância desse estudo é evidente, já que a discussão sobre os efeitos do ativismo judicial é extremamente atual e controversa, merecedora de destaque, podendo definir o caminho a ser tomado pelo Judiciário nos próximos anos em nosso país. Isto posto, a relevância desse trabalho se demonstra pela necessidade de uma definição dos limites desse ativismo dos juízes e tribunais.

As discussões, opiniões dos doutrinadores e as exemplificações trazidas à baila por esse trabalho vão ajudar a compreender as mudanças ocorridas não só no Judiciário nos últimos anos, mas na sociedade em geral. Por fim, esse trabalho busca responder a seguinte pergunta de pesquisa: “quais os efeitos políticos do ativismo judicial no Brasil?”.

2. O ATIVISMO JUDICIAL

2.1 PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA

Conceituar segurança jurídica hodiernamente não é uma tarefa simples, dada a gama conceitual que a expressão dispõe. É possível encontrar em dicionários jurídicos a conceituação da segurança jurídica como sendo a certeza do direito e da proteção retroativas. A segurança jurídica traz ideia de singularidade, conservação como também renovação e adaptação social das áreas do Direito (Leite, 2018).

Canotilho (1993) informa que o princípio da segurança jurídica e da confiança são atributos que compõe o Estado de Direito desde a sua aparição, a qual se tratava de uma adequação da vontade do Rei com os mandamentos legais advindos da vontade do povo.

Uma das maiores características do princípio da segurança jurídica é fornecer segurança e estabilidade no convívio social, não permitindo grandes e inoportunas mudanças, sustos decorrentes de ações do governo. Esse princípio é um fundamento geral do complexo de leis jurídicas, podendo ser aplicado na totalidade dos ramos do Direito (Mazza, 2019).

2.1.1 APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA

Um clássico exemplo de utilização do princípio da segurança jurídica é o artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), onde “a lei não prejudicará o direito adquirido, a coisa julgada e o ato jurídico perfeito” (Brasil, 1988).

Na aplicação do princípio em tela, há uma correlação com a Autotutela exercida pela Administração Pública, já consagrada tanto na doutrina e legislação pátria quanto pelos Tribunais Superiores. A bem dizer, a eterna plausibilidade de se revisar atos administrativos pode ser mais perigosa do que a sua própria permanência (Carvalho Filho, 2018).

Dentre as mais modernas aplicações do princípio em análise, temos a prospective overruling, onde, com base na segurança jurídica, os tribunais podem aplicar um novo entendimento advindo de mudanças nas leis apenas em casos futuros. Determinado tribunal decide, determina a mudança de posicionamento sobre o assunto, mas isso só afetara casos posteriores ao julgado naquele momento, o que garante a proteção amparada pela segurança jurídica (Oliveira, 2018).

2.1.2 ASPECTOS DO PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA

Di Pietro (2019) afirma que o princípio da segurança jurídica possui dois aspectos, sendo eles o objetivo e o subjetivo. O objetivo diz respeito às relações jurídicas, enquanto o subjetivo informa à proteção à confiança ou confiança legítima. Este oriundo do direito alemão e importado para o direito brasileiro.

O aspecto duplo do princípio da segurança jurídica, abarcado por grande parte da doutrina, tem como pretensão que o cidadão não seja pego de surpresa com uma mudança súbita de um posicionamento da Administração Pública, sem que exista o mínimo respaldo às situações jurídicas já firmadas, mesmo que não tenham se transformado ainda em direitos adquiridos (Carvalho Filho, 2018).

2.1.3 PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E O PRINCÍPIO DA CONFIANÇA

Oliveira (2018) explicita que na aplicação do princípio da segurança jurídica temos diferenciações com relação ao princípio da confiança, já que este tem a ver com o aspecto subjetivo do princípio antes citado, sendo aplicado apenas quando a relação se der na esfera jurídica do particular, protegendo-o dos arbítrios do Estado.

Já o princípio da segurança jurídica tem caráter amplo, abrangendo as relações privadas e as públicas.

Os princípios da proteção da confiança e da segurança jurídica são indissociáveis. Alguns autores, inclusive, consideram o princípio da confiança como sendo um subprincípio da segurança jurídica.

Em relação ao princípio da confiança, “Seu desenvolvimento traduz um dos fatores mais relevantes de um regime democrático, não se podendo perder de vista que é ela que dá sustentação à entrega dos poderes aos representantes eleitos” (Carvalho Filho, 2018, p. 92).

2.1.4 LEI 13.655 DE 2018 QUE ALTEROU A LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO (LINDB) – “LEI DA SEGURANÇA JURÍDICA”

A lei mencionada incluiu na LINDB “disposições sobre a segurança jurídica e eficiência na criação e na aplicação do direito público” (Spitzcovsky, 2019).

Respaldando o caráter geral e aplicabilidade da lei em todo o ordenamento jurídico, “essa emblemática lei nunca foi só do Direito Privado, mas do Direito em geral, inserindo dispositivos sobre segurança jurídica e eficiência na criação e aplicação do Direito Público” (Peixoto, 2018).

A importância e objetivo dessa nova lei, ainda, segundo o autor, é conseguir o maior benefício possível com o menor gasto para o interesse público, além de manter estável as relações jurídicas, dando proteção a todos os administrados e aos investidores no plantel econômico do Brasil.

2.2 PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES

Segundo Fernandes (2017), a CRFB trouxe o princípio da separação de poderes em seu artigo 2º e, com o fim de protegê-lo de eventuais e simplificadas modificações posteriores, elencou o mesmo no rol do artigo 60, §4º, inciso III. Sendo que as primeiras bases desse princípio foram construídas por Aristóteles, que via uma necessidade de separar as funções de administração do governo e da resolução de divergências na sociedade.

Silva (2019), informando sobre a base do princípio em estudo, por outro lado, diz que John Locke, Rousseau, além do próprio Aristóteles, conceberam o princípio da separação de poderes, sendo o mesmo solidificado na obra “O Espírito das Leis” de Montesquieu, quando foi explicitamente citado nas Constituições das ex-colônias inglesas da América e, depois, na Constituição dos Estados Unidos da América (EUA) de 1787.

Lima (2015) opina que o princípio da separação dos poderes é violado diretamente pelo ativismo judicial, só devendo ser aplicado, de fato, quando houver colisão deste com o princípio da dignidade da pessoa humana.

2.2.1 PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Fernandes (2017) considera a dignidade da pessoa humana não como um princípio, mas sim como um metaprincípio, o qual irradia valores e vetores para aplicação dos demais princípios, haja vista sua superioridade.

Não faltam definições para o princípio da dignidade da pessoa humana, inexistindo, no entanto, consenso. O que se pode encontrar são vários pontos de contato, suficientes para a compreensão universal do que venha a significar e qual deve ser seu alcance (Nucci, 2017, p. 126).

Conforme nos ensina Escher (2014), quando houver colisão entre o princípio da separação dos poderes e o princípio da dignidade da pessoa humana, deverá ponderar-se qual deles engloba com eficiente força a supremacia constitucional e respalda direitos e garantias fundamentais.

2.3 JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA

 Segundo Streck (2011), quando do início do liberalismo o parlamento detinha a vontade geral do povo. Já quando do wefare state, suas políticas indicavam o Executivo como o comandante da satisfação dos direitos sociais.

Lopes (2016), nesse contexto, pondera que ao término dos regimes ditatoriais no final do século XX, o Judiciário atingiu a proeminência, demonstrada em três campos: na garantia do direito, no abuso de poder e controle da legalidade e na judicialização da política. Isso ocorre depois do fim de um Estado intervencionista, tanto desenvolvimentista, quanto com fulcro nas políticas de warfare state da Europa.

Hirschl (2006), por outro lado, refere-se à judicialização como sendo uma transferência de poder. Induz, o autor, que a judicialização pode ocorrer de várias maneiras, sendo a principal delas através da megapolítica ou judicialização pura, a qual interfere de maneira direta na política em si.

Para Junior (2016), foi na Itália, em 1992, que cunhou a locução “judicialização da política”, e diz que, sem dúvida, no conceito de judicialização da política podem ser expostos como a presença de um ativismo judicial e, também, de interesses políticos em utilizar os métodos e procedimentos judiciais em suas deliberações.

2.3.1 JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA NO BRASIL

Segundo Ferreira Filho (1994), no Brasil, posicionamentos fundamentados na CRFB, a partir de 1988, foram causas da quebra da forma de funcionamento do Judiciário, passando a ser entendido como um poder político.  Dentro deste contexto, exemplifica as modificações estabelecidas pela Carta Magna, dividindo em cinco principais mudanças a seu ver, sendo elas: a criação da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO); aumento dos que possuem legitimidade para propor a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI); criação do mandado de injunção; expansão do objeto das ações populares; por último, alargamento das atribuições do Ministério Público. Além dessas cinco, considera também o comando das eleições exercido pelo Poder Judiciário como outra importante criação da CRFB como causa da judicialização política no Brasil.

A fim de exemplificar, afirma “[…]ação de impugnação do mandato eletivo, art. 14, §10 da CRFB […] Tire-se desta análise o primeiro registro de algo que se repetirá, o papel do Judiciário torna-se acentuadamente de caráter político. […]” (Ferreira Filho, 1994, p. 11).

Complementando essa questão, com a promulgação da CRFB e suas modificações, a judicialização da política no Brasil foi implementada, criando formas de proteções judiciais e permitiu que o Judiciário se transformasse no ator principal na questão das resoluções de problemas controversos (Aragão, 2013).

2.3.2 DIFERENÇAS ENTRE A JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA E O ATIVISMO JUDICIAL

Escher (2014) expõe que as expressões judicialização da política e ativismo judicial são contíguos colocados por certos doutrinadores como iguais, mas algumas distinções devem ser observadas. Ativismo judicial pode ser compreendido como a colaboração ativa do juiz ao chefiar o processo judicial, materializando os mandamentos da Constituição e, assim como também explicita Barroso (2013), a judicialização da política quando órgãos do Judiciário decidem questões de grande abrangência social ou política. Isso ocorre pela falta de atuação do Poder Legislativo, mesmo que fundamentada.

Alexy (2007) afirma que no âmbito da judicialização da política é que o ativismo judicial aparece como um significado do papel principal do Judiciário diante das demais instituições constitucionais. Esse ativismo demonstra um efeito engrandecedor e inovador de hermenêutica do direito, acarretando o engrandecimento do sentido e aumento da abrangência das normas, invadindo a atribuição dos demais poderes. Tal fato pode corroborar em um desvio do processo político, por perfazer ao Judiciário a possibilidade de criação de novos métodos que não estão previstos em leis.

Encerrando o tema, Gomes (2009) conceitua a judicialização da política como sendo um acontecimento que é consequência da nossa forma de Estado e de Direito, se tratando do acesso por toda população ao Judiciário quando ocorrer qualquer lesão ou ameaça a um direito. De outra monta, o ativismo judicial pode ser considerado a invasão do Judiciário na atuação legislativa, com o magistrado produzindo uma nova norma, tomando para si a atividade do legislador, inovando com uma lei que não é explicitada nem em tratados internacionais nem na própria CRFB ou em legislação infraconstitucional.

2.4 ATIVISMO JUDICIAL EM SENTIDO ESTRITO

2.4.1 CONCEITO E ESPÉCIES DE ATIVISMO JUDICIAL

Confirmando a ampla divergência e dificuldade para conceituar o ativismo judicial, Barroso (2013) confirma que não há harmonia doutrinária em relação a essa conceituação, tendo em vista as inúmeras definições extraídas desse termo.

Já em relação as espécies do ativismo judicial, Dias (2013) define quatro dimensões: o ativismo contra majoritário, o jurisdicional, o criativo e o remedial. O contra majoritário existe quando os tribunais não acatam as determinações dos representantes políticos da população, enquanto o jurisdicional é o que procura aumentar as balizas do Poder Judiciário. Já o ativismo criativo se trata de trazer novos direitos às pessoas através da interpretação, com fundamento de que o juiz não pode deixar de julgar fundamentando-se em inexistência de lei.

Por fim, o ativismo remedial ocorre quando o Judiciário impõe ao agente político uma conduta proativa com o fim de resolver uma precariedade criada pelo Poder Executivo por não aplicar uma diretriz de política urbana satisfatória.

2.4.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO ATIVISMO JUDICIAL

Tassinari (2013) declara que o ativismo judicial nasceu em 1803, não obstante não ter a mesma nomenclatura nos Estados Unidos da América (EUA), local onde começaram as discussões sobre essa matéria, quando da posse como juiz de paz no Willian Marbury. No entanto, o primórdio da expressão ativismo judicial veio em 1947 através do jornalista, historiador e político Arthur Schlesinger Jr., em uma publicação com objetivo de discutir o trabalho realizado pela Suprema Corte Americana. A partir desse fato, uma corrente doutrinária filiou-se ao ativismo judicial, enquanto outra, contra, direcionou-se à autocontenção, definindo as políticas públicas como de responsabilidade dos governantes eleitos.

Dias (2013) entende que há uma certa divergência entre os autores, de um lado os que afirmam ter sido o Arthur Schlesinger Jr. o responsável pela origem do termo ativismo judicial, de outro, os que defendem a origem do termo ao caso Marbury vs. Madison, no ano de 1803, jurisprudência pioneira em introduzir esse fenômeno.

Barroso (2013), explicando esse famoso caso, expressa que Marbury vs. Madison foi o precedente onde a Suprema Corte Americana definiu sua competência de realizar o controle de constitucionalidade, negando a utilização de leis federais as quais eram inconstitucionais conforme observância da Corte, mesmo sem a própria Constituição dos EUA conferir a ela, de modo explícito, tal competência. No julgamento, a Corte explicitou que essa competência era implícita na Constituição, cabendo ênfase aqui ao Presidente da Corte, John Marshall, cuja fundamentação do julgado é tida por genial pela maior parte da doutrina.

Dias (2013) diz que, no Brasil, em meados de 1990, podem ser identificadas as primeiras decisões pelo STF com fulcro em discussões relativas aos direitos sociais e demais questões constitucionais relevantes, todas por causa de omissão do Legislativo ou falta de execução de políticas públicas necessárias. No entanto, no ano de 2008 o ativismo judicial prosperou, com inúmeras decisões proferidas pelo STF com base nesses fundamentos. Como exemplo, cita a decisão de constitucionalidade do estudo sobre as células-tronco.

2.4.3 AUTOCONTENÇÃO JUDICIAL

Dias (2016) sustenta que, como oposição direta ao ativismo judicial, temos a autocontenção judicial, termo criado pela doutrina. A autocontenção dispões que o Poder Judiciário não possui competência para adentrar nas questões políticas, sendo necessária a diminuição de suas atividades nas áreas dos outros poderes, principalmente em relação às atividades social ou politicamente polêmicas.

Barroso (2013), em sua obra, propõe que a autocontenção é a atitude do Judiciário em diminuir sua ingerência nas searas dos demais Poderes. Com isso, o autor entende que, até 1988, com a promulgação da CRFB, não existe dúvidas que a autocontenção era o método de atuação do Judiciário nesse país. A partir da Carta Magna, iniciou lentamente, uma posição ativista dos magistrados em geral, onde a principal diferença de métodos entre as duas formas é que o ativismo judicial tenta retirar o maior potencial possível da Constituição sem, todavia, adentrar no campo de livre criação do Direito.

Andrade (2014) supõe que o ativismo judicial não foi mais bem visto nos EUA a partir da Corte de Warren, entre 1954 e 1969, sendo identificado como uma atividade irregular do Poder Judiciário. Dessa forma, os últimos anos foram marcados pelo primórdio da autocontenção do Judiciário americano. Como objeção ao ativismo, essa autocontenção se baseia na hermenêutica restrita nas leis, bem como a obediência às deliberações do Executivo.

2.4.4 ATIVISMO JUDICIAL NO BRASIL

Lima (2018) inicia afirmando que o ativismo judicial se tornou preponderante no país a partir da CRFB de 1988, com objetivo de resolver problemas sociais e casos de grande complexidade e polêmicos que são levados ao Poder Judiciário constantemente. Assume a autora como fundamental esse ativismo judicial, reconhecendo como indispensável para que se mantenha a ordem social e que se realizem os mencionados direitos fundamentais.

Nascimento e Weiers (2017) complementam dizendo que não existia uma supremacia judicial antes de 1988, enquanto Salomão (2018), em seu artigo, diferencia o ativismo judicial nos países onde se utiliza o sistema da common law dos que usam o sistema da civil law. No Brasil, usuário do sistema jurídico da civil law, da legalidade estrita, onde magistrados podem decidir sobre a mesma lei de forma diferente, é um exemplo onde o ativismo judicial pode ser arriscado, justamente porque essa subtaneidade pode acarretar clara insegurança jurídica.

O Judiciário tem adentrado fundo em um campo indeterminado da CRFB, onde decisões com conteúdo político se tornaram cada vez mais frequentes. Sendo assim, devem os juristas debruçarem sobre as discussões a respeito do ativismo judicial, procurando opções para essa contundente e difícil questão, sendo esse, provavelmente, um dos principais desafios do Direito atualmente.

3 METODOLOGIA

O presente trabalho foi realizado utilizando, em caráter teórico e natureza básica, o levantamento bibliográfico, possibilitando captar posições de diversos doutrinadores e pesquisadores sobre o tema abordado.

Uma pesquisa qualitativa, com natureza exploratória e descritiva, foi usada para se obter acesso aos posicionamentos, opiniões e definições necessários para elaboração do conteúdo demonstrado.

Como técnica de coleta de dados para o presente trabalho foi executada análise bibliográfica. Foram pesquisados diversos livros, artigos científicos publicados, publicações de periódicos jurídicos na internet, posicionamentos de doutrinadores, autores consagrados e magistrados.

Para concluir, a forma de tratamento dos dados obtidos pela pesquisa foi a análise de conteúdo, sendo realizado estudo sobre cada decisão, publicação ou opinião doutrinária que serviu como fundamento para esse trabalho.

4. ANÁLISE DE DADOS E RESULTADOS

O presente trabalho procurou na literatura demonstrar que o ativismo judicial produz efeitos tanto políticos quanto jurídicos no Brasil. Para isso, foi realizado amplo levantamento bibliográfico com a finalidade de se esmiuçar cada elemento desse tema, dissociando as vertentes e explorando suas influências.

4.1 CATEGORIA 1 – NATUREZA JURÍDICA E EVOLUÇÃO DO ATIVISMO JUDICIAL

Streck (2011) entende que o ativismo judicial ocorre quando o juiz decide com base em argumentos não jurídicos, substituindo o Direito por afirmações pessoais. Não obstante o conceito exato, já que são termos com uma amplitude de significado muito extensa e que pode variar em seus detalhes a depender do caso concreto, provou-se evidente a diferença entre ativismo judicial e a judicialização da política. Ativismo judicial está relacionado muito mais com uma atitude de um juiz ou tribunal e a judicialização da política a um conjunto de fatos. Importante traçar essa diferença para se conseguir analisar os efeitos causados pelo ativismo judicial.

Apesar das pequenas divergências doutrinárias sobre a origem do ativismo judicial, é mais certo que tudo tenha efetivamente começado nos EUA, no caso Marbury vs Madison. A atitude proativa dos magistrados, seja adentrando em temas dos demais poderes, seja efetivando políticas públicas ou garantindo direitos constitucionais conforme suas próprias convicções, aumentou progressivamente em diversos lugares do mundo, como no Brasil, onde atingiu seu ápice nos últimos quinze anos.

4.2 CATEGORIA 2 – O DESTAQUE E POLITIZAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM VIRTUDE DO ATIVISMO JUDICIAL

Junior (2016), Nascimento e Weiers (2017), e outros autores ora estudados, dizem que tanto o ativismo judicial quanto a judicialização da política demonstram o protagonismo do Poder Judiciário perante os poderes Executivo e Legislativo. Já Alexy (2007) vai além, afirmando que não só esse protagonismo fica evidente, mas ao invadir a esfera dos outros poderes estabelecendo condutas não previstas em leis ou na Constituição, na prática, acaba por fazer um verdadeiro contorno no processo político majoritário

Barroso (2013) informa que o ativismo judicial explicita uma politização do Judiciário, fazendo com que esse Poder tenha uma forma de atuação semelhante à dos demais Poderes, apesar dos seus membros não serem eleitos democraticamente no Brasil.

As informações trazidas tornam evidentes a caracterização política do Judiciário quando imiscuem na seara dos outros Poderes. As decisões na área de políticas públicas, como na saúde, por exemplo, deixam claro o viés político angariado pelo Judiciário e sua sobreposição em detrimento do Executivo e Legislativo.

4.3 CATEGORIA 3 – A AUTOCONTENÇÃO COMO RESPOSTA AO ATIVISMO JUDICIAL

Salomão (2018) enuncia que o ativismo judicial merece ser repensado e a avaliado de acordo com as experiências já sedimentas. Com a grande quantidade de decisões jurídicas envolvendo conteúdo político, bem como o avanço do Judiciário sobre espaço indeterminado na Constituição, Nascimento e Weiers (2017) complementam essa opinião informando que todos os juristas devem promover discussões sobre o tema, pois se trata de um desafio do direito contemporâneo.

Barroso (2013) e Andrade (2014) entendem não parecer adequada uma atuação mais contida do Poder Judiciário, conhecida como autocontenção, pois o ativismo judicial se trata de um importante mecanismo de efetivação de direitos.

Por outro lado, Dias (2016) e Salomão (2018) explanam que essa autocontenção judicial é importante, pois a atuação do Judiciário na área dos demais Poderes deve ser de alguma maneira minimizada, deixando as atuações em matérias sociais ou politicamente controvertidas para o Legislativo e Executivo, já que a eles cabem a regulamentação e possuem membros eleitos democraticamente para tanto.

Conforme explanação dos autores, fica demonstrada a importância do ativismo judicial e seus claros efeitos políticos e jurídicos. No entanto, a autocontenção é bem-vista em determinados casos, evitando que o Judiciário exceda demasiadamente seus limites.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com esse estudo foi possível elencar os principais efeitos políticos do ativismo judicial no Brasil, como a politização do Poder Judiciário e sua proeminência sobre os Poderes Executivo e Legislativo.

Sobre a politização do Judiciário, diversos doutrinadores são unívocos ao afirmar que esse Poder abraça um viés político ao decidir sobre temas de responsabilidade do Executivo ou Legislativo, como exemplifica Dias (2013) no caso da decisão sobre as células-tronco pelo STF.

Ao se analisar a evolução do ativismo judicial, foi possível elencar suas vantagens e desvantagens, bem como diferenciá-lo do fenômeno da judicialização da política. Iniciando com o caso americano Marbury vs Madison, o ativismo judicial ganhou espaço ao passar dos anos, chegando ao atual cenário de possível autocontenção do próprio Judiciário.

Durante a execução do presente estudo, foram constatadas diversas manifestações, tanto positivas quanto negativas, da autocontenção judicial em âmbito político, quanto jurídico. Todavia, devido à extensão das análises necessárias, essas manifestações foram limitadas às explicitadas no presente estudo.

Pode-se finalizar que o ativismo judicial vem exercendo um papel importante no meio judicial e político, já que magistrados podem efetivar direitos fundamentais importantes, atender às demandas das minorias, entre outras atuações necessárias. No entanto, a autocontenção, muitas vezes, é entendida pela doutrina como a saída para que o Judiciário não exceda em suas atitudes. Tal medida parece acertada, pois a ponderação e a razoabilidade devem caminhar lado a lado em cada caso, balizando e limitando tanto o ativismo quando a autocontenção.

REFERÊNCIAS

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[1] Pós-graduação Lato Sensu em Direito penal. Bacharelado em Direito. ORCID: 0009-0009-9466-1902.

Enviado: 26 de agosto de 2023.

Aprovado: 13 de novembro de 2023.

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Fabyll Alves dos Santos

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